Por que Brasil foi obrigado a se desculpar publicamente com quilombolas do Maranhão:quiz poker

O Estado brasileiro reconheceu que violou direitosquiz pokercomunidades quilombolas e emitiu um pedidoquiz pokerdesculpas às populações deslocadas forçadamente após a construção do Centroquiz pokerLançamentoquiz pokerAlcântara, no Maranhão.

A admissão ocorreu durante audiência pública da Corte Interamericanaquiz pokerDireitos Humanos (CIDH), na qual o Brasil foi julgado por violações contra os quilombolas.

O caso está relacionado à instalação da basequiz pokerlançamentosquiz pokerfoguetes da Força Aérea Brasileira (FAB) e à remoçãoquiz pokermaisquiz poker300 famílias da região onde o projeto foi construído na décadaquiz poker1980, durante o regime militar.

O julgamento, que aconteceuquiz pokerforma presencial na sede do Tribunal Constitucional do Chile,quiz pokerSantiago, foi encerrado nesta quinta-feira (27/4).

A audiência foi convocada após uma denúncia apresentada por representantes das comunidades afetadas e entidades da sociedade civilquiz poker2001.

A Corte é uma instituição autônoma ligada à Organização dos Estados Americanos (OEA), que tem como objetivo aplicar a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, ratificada pelo Brasilquiz poker1992.

É um dos tribunais regionaisquiz pokerproteção dos direitos humanos, ao lado do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos e da Corte Africana dos Direitos Humanos e dos Povos.

Diante das declarações feitas pelo Estado brasileiro no julgamento, a Corte Interamericanaquiz pokerDireitos Humanos determinou ao Brasil que apresente suas propostas por escrito, para que possam ser avaliadas pelos representantes das comunidades quilombolas e pelo próprio tribunal, antesquiz pokerque qualquer decisão oficial seja tomada.

Entenda a seguir quais foram as acusações contra o Brasil e qual a posição tomada pelo governo durante a audiência.

O que aconteceu?

O conflito na região remonta à décadaquiz poker1980, quando a base começou a ser construída durante o governo do general João Figueiredo.

Município com 22 mil habitantes a cercaquiz poker100 kmquiz pokerSão Luís, Alcântara fica numa península com localização privilegiada para o lançamentoquiz pokerfoguetes e satélites.

Próximo à linha do Equador, o centro - inaugurado pela FABquiz poker1983 - possibilita uma economiaquiz pokeraté 30% no combustível usado nos lançamentos.

A construção, porém, levou um territórioquiz poker52 mil hectares a ser declarado comoquiz poker"utilidade pública", segundo a CIDH.

Parte dessa área era habitada por 32 comunidades quilombolas que foram realojadasquiz pokersete "agrovilas" concebidas pelos militares.

E as disputas territoriais seguem até hoje. Alcântara é o município que tem o maior númeroquiz pokercomunidades quilombolas do país, com maisquiz poker17 mil pessoas, distribuídasquiz pokerquase 200 comunidades.

O quilombola Nonato Masson, advogado do Centroquiz pokerCultura Negra do Maranhão, afirmou à BBC News Brasil que os quilombosquiz pokerAlcântara viveram sem interferências externasquiz poker1700 até o início da construção do centroquiz pokerlançamentos.

O que foi julgado?

A principal violação denunciada pelas organizações sociais e representantes locais é a remoçãoquiz poker312 famílias quilombolas para a construção da base, à qual a CIDH se referiu como "usurpação do patrimônio coletivo" das comunidades.

A Corte também analisou a questão da titularidade do território - concessão do direitoquiz pokerpossequiz pokeruma área - e da reparação às comunidades.

A Constituição Federalquiz poker1988 assegura o direito aos remanescentes das comunidades quilombolas, que estejam ocupando suas terras, à propriedade definitivaquiz pokerseus territórios.

Além disso, a Convenção n° 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) também garante o direito fundiário dos povos originários a suas terras.

O caso chegou ao tribunal internacional após organizações peticionarem a denúncia na CIDH.

O órgão recomendouquiz pokerduas ocasiões ao Estado brasileiro que fosse feita a titulação do território, a reparação financeira dos removidos e um pedido públicoquiz pokerdesculpas.

Em 2008, o Instituto Nacionalquiz pokerColonização e Reforma Agrária (Incra), chegou a publicar um relatório apontando que maisquiz poker78 mil hectares deveriam ser tituladosquiz pokerfavor dos quilombolas, mas o processo não foi encaminhado.

Como as recomendações não foram cumpridas, a Comissão levou o caso à Cortequiz pokerjaneiroquiz poker2022.

Outro ponto também foi discutido na audiência: a realizaçãoquiz pokerconsultas públicas para efetuar novos deslocamentosquiz pokercomunidades na região ou fazer obrasquiz pokerampliação da base aérea.

Esse tópico tem relação principalmente com um projetoquiz pokerexpansão base, incentivado por um acordo entre Brasil e Estados Unidos assinadoquiz poker2019.

Apoiadores da proposta afirmam que ela seriaquiz pokergrande importância para ampliar o aproveitamento da base, que no passado foi pouco utilizada, e desenvolver o setor no país - mais recentemente o centro passou a negociar a operaçãoquiz pokerlançamentos comerciais.

Mas segundo Servulo Borges, militante do movimento quilombolaquiz pokerAlcântara afirmou à BBC, a ampliação estudada desde os anos 2000 poderia levar ao despejoquiz pokermaisquiz poker40 comunidades da região.

Na audiência pública foram ouvidos representantes quilombolas e moradores da região, alémquiz pokerespecialistas na área, indicados tanto pelos denunciantes como pelo Estado brasileiro.

Qual a posição tomada pelo Brasil?

Durante a audiência, o Estado brasileiro reconheceu,quiz pokerforma oficial, que violou os direitosquiz pokerpropriedade equiz pokerproteção jurídica das comunidades quilombolasquiz pokerAlcântara.

A violação ao direitoquiz pokerpropriedade teria acontecido na medidaquiz pokerque o governo não levou a cabo a titulaçãoquiz pokerseu território.

Já o descumprimento do direito à proteção judicial ocorreu por não ter sido oferecido remédio judicial rápido e eficaz para a situação.

Na mesma audiência, o país fez um pedidoquiz pokerdesculpas formal aos quilombolas do município maranhense e informou ao Tribunal quequiz pokerdeclaração será divulgada por escrito e ficará disponível durante um anoquiz pokerpágina oficial do governo federal.

O posicionamento do Brasil foi manifestado pelo advogado-geral da União, Jorge Messias, durante o julgamento.

"Como consequência dessa violação, e ciente da natureza própriaquiz pokerque se revestem as medidasquiz pokerreparação por violações ao direito internacional,quiz pokernome do Estado brasileiro manifesto nosso mais sincero e formal pedidoquiz pokerdesculpas à senhora Maria Luzia, ao senhor Inaldo Faustino e aos demais membros das comunidades quilombolasquiz pokerAlcântara", afirmou Messias, se referindo a alguns dos envolvidos no caso que participaram da audiência.

O advogado também confirmou a criaçãoquiz pokerum grupoquiz pokertrabalho interministerial que terá o objetivoquiz pokerbuscar soluções para a titulação territorial das comunidades remanescentesquiz pokerquilombos.

Segundo o governo, o grupo terá participaçãoquiz pokerquilombolas e deverá concluir os trabalhosquiz pokeraté um ano.

Após esse período, a titulação progressiva das terras deverá ocorrerquiz pokeraté dois anos após a publicação da portariaquiz pokerreconhecimento territorial.

Messias afirmou ainda que o governo federal está comprometidoquiz pokerviabilizar recursos financeiros para compensação das violações.

Segundo ele, esses fundos serão entregues na formaquiz pokerimplementaçãoquiz pokerpolíticas públicas que beneficiem diretamente as comunidades.

As propostas agora deverão ser entregues por escrito à Corte e aos quilombolas antes da tomadaquiz pokeruma decisão final.

O que dizem os quilombolas?

Após o término da audiência, os representantes das organizações e comunidades quilombolas que entraram com a denúncia na Corte classificaram o pedidoquiz pokerdesculpas do Brasil como "incompleto".

Em nota, afirmaram que os anúnicos "foram cercadosquiz pokerzonas fundamentaisquiz pokerincerteza quanto ao seu efetivo conteúdo, com expressões pouco precisas, palavras vagas, que mantém o futuroquiz pokerAlcântaraquiz pokerum campoquiz pokergrande insegurança institucional".

Os representantes se queixaram que o Estado não precisou qual a extensão ou localização dos territórios a serem titulados, assim como a forma jurídicaquiz pokertais títulos.

Também criticaram a criaçãoquiz pokerum grupoquiz pokertrabalho sem antes fazer qualquer consulta às comunidades quilombolas envolvidas.

Segundo as organizações, a instalação da base alterou intensamente o modoquiz pokervida e as práticas culturais das comunidades.

"Nas sete agrovilas nas quais as comunidades foram reassentadas, elas sofreram uma alteração dos costumes e práticas atuais e são até os dias atuais privadasquiz pokercondições adequadasquiz pokervida, com a faltaquiz pokersaneamento básico equiz pokerpolíticas públicasquiz pokereducação, transporte e saúde,quiz pokerliberdade perante o território equiz pokerorganização social", afirmaram as instituições quilombolas equiz pokeroutros setores da sociedade civilquiz pokeroutro comunicado divulgado à imprensa.

Os denunciantes também se queixam da faltaquiz pokeriniciativasquiz pokerreparação ou reconhecimento da propriedade do território antes da audiência pública.

"O governo brasileiro teve diversas oportunidadesquiz pokerreconhecer e reparar as violações, mas não o fez. Os Quilombosquiz pokerAlcântara ainda não contam com títulosquiz pokerpropriedade coletiva sobre os seus territórios tradicionais", dizem.

Danilo Serejo, quilombola e representante do Movimento dos Atingidos pela Base Espacialquiz pokerAlcântara (MABE), uma das organizações envolvidas no processo, afirma também que mesmo as famílias que não foram deslocadasquiz pokerum primeiro momento tiveram suas vidas afetadas.

Por isso, a compensação buscada é para todas as comunidades locais.

"A área desapropriada alcança maisquiz poker150 comunidades. Mas além das pessoas deslocadas na décadaquiz poker1980, outras muitas perderam os direitos sobre suas terras e vivem há maisquiz poker40 anosquiz pokeruma situaçãoquiz pokerincerteza, sempre com o temorquiz pokerserem despejadas", afirmou à BBC News Brasil antes do julgamento.

Serejo explica ainda que o objetivo das instituições denunciantes não é encerrar as operações da base ou obrigar o centro a se retirar da região, mas garantir o direitoquiz pokerpropriedade e que as comunidades quilombolas tenham vozquiz pokerprojetos futuros envolvendo suas terras.

"Ninguém está pedindo que a base seja retirada do município, mas é preciso que se discuta formasquiz pokercompensação. Nosso entendimento équiz pokerque a base está no nosso território e não o contrário", diz.