O que é a Síndrome da Resignação, a misteriosa doença que só ocorre na Suécia:go bets app

  • Linda Pressly
  • BBC
Fotogo bets appSophie

go bets app Quando seu pai a retira da cadeirago bets approdas, o corpogo bets appSophie,go bets appnove anos, parece sem vida. Mas o cabelogo bets appmenina é espesso e brilha como ogo bets appuma criança saudável.

Os olhosgo bets appSophie estão fechados e,go bets appvezgo bets appcalcinhas, ela usa fraldas por baixo da calçago bets appmoletom. Uma sonda gástrica adentra seu nariz. Ela se alimenta desse jeito há quase dois anos.

Sophie ego bets appfamília são origináriosgo bets appuma das antigas repúblicas da União Soviética e pediram asilo à Suéciago bets appdezembrogo bets app2015. Vivemgo bets appacomodação destinada a refugiados,go bets appuma pequena cidade na região central do país nórdico.

"A pressão sanguínea dela é normal", diz a médica Elisabeth Hultcrantz, voluntária da ONG Médicos do Mundo.

"Mas seu pulso está um pouco acelerado hoje. Talvez ela esteja reagindo à visitago bets appmuitas pessoas hoje".

Hultcrantz testa os reflexosgo bets appSophie. Tudo parece normal. Mas a criança não se mexe.

A médica se preocupa, pois Sophie sequer abre a boca. Isso pode ser perigoso, pois a menina pode se engasgar se houver qualquer problema com a sonda gástrica.

Elisabeth Hultcrantz
Legenda da foto,

Elisabeth Hultcrantz diz que crianças simplesmente "desligam" partes do cérebro

Mas como uma criança que gostava tantogo bets appdançar ficou tão inerte?

"Quando explica aos pais o que aconteceu, digo que o mundo foi tão terrível que Sophie trancou-se dentrogo bets appsi própria, desconectando as partes conscientesgo bets appseu cérebro", diz a médica.

Sophie não é um caso único: por quase vinte anos, a Suécia tem enfrentado uma misteriosa doença, batizadago bets appSíndrome da Resignação. Ela afeta apenas crianças solicitantesgo bets appasilo ou refugiadas, e todas simplesmente "desligam"- paramgo bets appandar, falar ou mesmo abrir os olhos. A boa notícia é que, eventualmente, se recuperam.

Mistério

Mas porque esses casos ocorrem apenas na Suécia?

Os profissionaisgo bets appsaúde tratando dessas crianças argumentam que o trauma é a causa deste afastamento das crianças. As mais vulneráveis são justamente as que passaram por episódiosgo bets appviolência extrema ou cujas famílias fugiramgo bets appambientes perigosos.

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Fim do Podcast

Os paisgo bets appSophie sofreram extorsãogo bets appuma máfia localgo bets appseu paísgo bets apporigem. Em setembrogo bets app2015, o carrogo bets appque a família viajava foi parado por homensgo bets appuniformes policiais.

"Fomos retirados do carro à força. Sophie viugo bets appmãe e seu pai serem espancados", conta o pai da menina.

Depoisgo bets applibertar a mãe, que fugiu do local com a filha, os homens levaram o pai embora.

"Não me lembrogo bets appmais nada (do que aconteceu depois)", diz ele.

Sophie conta que a menina ficou transtornada com o sequestro do pai. Três dias mais tarde, ele finalmente fez contato com a família.

A família permaneceu escondida nas casasgo bets appamigos até viajar para a Suécia, três meses depois.

Ao chegar à Escandinávia, foram detidos por horas pela polícia sueca. A partir daí, a saúdego bets appSophie deteriorou rapidamente.

"Após alguns dias, percebi que ela não estava brincando muito comgo bets appirmã", diz a mãego bets appSophie, grávidago bets appoito meses.

Foi na mesma época que a família teve negado o pedidogo bets appasilo,go bets appuma audiência na qual Sophie esteve presente. Naquele momento, ela parougo bets appfalar e comer.

Sophie na cama
Legenda da foto,

Sophie há 20 meses vivem estado vegetal

Histórico

A Síndrome da Resignação foi reportada pela primeira vez na Suécia, nos anos 1990. Mas apenas no biênio 2003-05, maisgo bets app400 casos foram registrados.

As chamadas "crianças apáticas" se tornaram uma questão políticago bets appmeio a um debate crescente sobre as consequências da imigração na Suécia, país onde, segundo o Censogo bets app2010, quase 15% da população é imigrante.

Houve relatosgo bets appcasosgo bets appcrianças fingindo estar doentes e mesmogo bets apppais drogando ou envenenando crianças para garantir direitogo bets appresidência - nenhuma dessas histórias foi comprovada.

Na última década, o númerogo bets appcrianças afetadas pela síndrome diminuiu. O equivalente sueco ao Ministério da Saúde divulgou recentemente que houve 169 casos no biênio 2015-16.

A doença parece afetar criançasgo bets appperfis geográficos e étnicos mais vulneráveis: aquelas da antiga União Soviética, dos Balcãs, crianças ciganas e, mais recentemente, yazidis.

Apenas um pequeno númerogo bets appafetados égo bets appcrianças desacompanhadas, muito poucas são asiáticas e nenhuma africana.

Ao contráriogo bets appSophie, as crianças com a síndrome normalmente vivem na Suécia há anos quando ficam doentes, e já viviam vidas adaptadas ao estilo nórdico, falando até a língua local.

Inúmeras condições parecidas com a Síndrome da Resignação já foram observadas antes - entre sobreviventesgo bets appcamposgo bets appconcentração nazistas, por exemplo.

"Pelo que sabemos, nenhum caso foi identificado fora da Suécia", diz Karl Sallin, pediatra do Hospital Universitário Karolinska,go bets appEstocolmo.

Paisgo bets appSophie, comgo bets appirmã - todosgo bets appcostas para a câmera
Legenda da foto,

Famíliago bets appSophie diz ter fugido da máfia da antiga União Soviética

Mas como uma doença pode respeitar fronteiras nacionais?

Sallin, que estuda a Síndrome da Resignação emgo bets apptesego bets appdoutorado, diz não haver resposta definitiva para a pergunta.

"A explicação mais plausível é que existem alguns tiposgo bets appfatores socioculturais necessários para que a condição se desenvolva", explica.

Sendo assim, ainda que não conheçamos o mecanismo e nem a razão disso acontecer na Suécia, o tipogo bets appsintoma exibido pelas criança é explicado culturalmente: seria uma forma das crianças expressarem seu trauma.

Contágio?

Caso isso seja verdade, uma questão importante é levantada: poderia a Síndrome da Resignação ser contagiosa?

"Isso é meio implícito. Se você nutrir esses comportamentosgo bets appuma sociedade, terá mais casos", diz o pediatra.

"O primeiro caso da doença foi registradogo bets app1998, no norte da Suécia e, assim que se tornou público, houve outras ocorrências na mesma área. Tivemos ainda casosgo bets appirmãos desenvolvendo a condição", completa ele.

Mas Sallin ressalta que os estudos sobre a síndrome até agora não detectaram a necessidadego bets appcontato direto entre os casos.

Por sinal, há uma carênciago bets apppesquisas mais específicas sobre o assunto, especialmentego bets apprelação às crianças, o que impede a compreensão da doença.

Ao menos se sabe que as crianças podem se recuperar.

No entanto, é difícil para os paisgo bets appSophie acreditarem nessa possibilidade. Eles não viram qualquer melhora no estado da filhago bets app20 meses. Seus dias são vividosgo bets appfunção do tratamento da menina - sejago bets appexercícios para a manter a musculatura dela funcionando, alimentação, troca da fralda ou passeios.

"Você precisa ter o coração forte nesses casos", diz Lars Dagson, pediatrago bets appSophie.

"Eu só posso mantê-la viva. Não posso fazer com que ela melhore. Nós, médicos, não podemos decidir se essas crianças vão ou não ficar na Suécia", acrescenta.

Annica Carlshamre
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Annica Carlshamre: doença tem a ver com trauma, não asilo

Dagson faz partego bets appuma correntego bets appmédicos tratandogo bets appcrianças com Síndrome da Resignação cujo argumento é que elas se recuperam quando se sentem seguras. E que o direito permanente a residência é o que deflagra a convalescência.

"De certa forma, a criança vai precisar sentir que há esperança, algo para que valha a pena viver. Essa é a única maneirago bets appexplicar como,go bets apptodos os casos que vi até agora, o direitogo bets apppermanecer no país pode mudar a situação", diz.

Burocracia

Até recentemente, as autoridades suecas permitiram que famílias imigrantes com uma criança doente permanecessem.

Mas a chegadago bets appmaisgo bets app300 mil pessoas nos últimos três anos mudou esse cenário.

No ano passado, uma lei temporária entrougo bets appvigor para limitar o númerogo bets appchances para solicitantesgo bets appasilo obterem residência permanente.

Candidatos recebem vistos com duração 13 meses ou três anos. A famíliago bets appSophie tem o primeiro, e o documento vencego bets appmarço.

"O que vai acontecer depois? A família está no limbo", diz Dagson, para quem Sophie não deve se recuperargo bets app13 meses.

"Tudo vai dependergo bets appcomo os pais vão se sentir, se vão acreditar que podem permanecer após 13 meses. Se eles não estão certos, não podem dar o Sophie a sensaçãogo bets appque está tudo bem".

Masgo bets appSkara, no sul do país, há evidênciasgo bets appcura mesmo sem que as famílias recebam direito a residência.

Trauma

"Do nosso pontogo bets appvista, essa doença está ligada ao trauma, não ao asilo", diz Annica Carlshamre, assistente social da Gryning Health, que administra Solsidan, um abrigo para crianças com problemas.

Solsidan
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Abrigogo bets appSolsidan registrou curas

Os especialistasgo bets appSolsidan acreditam que crianças perdemgo bets appmais significativa conexão com o mundo quando testemunham violência ou ameaça contra os pais.

"A criança percebe que 'minha mãe não pode tomar contago bets appmim'. E perde a esperança porque sabem que são totalmente dependentes dos pais. Quando isso acontece, para onde a criança pode ir - ou a quem pode recorrer?", explica Carlshamre.

A conexão familiar precisa ser reconstruída, mas primeiro a criança tem que se recuperar. Em Solsidan, o primeiro passo é separar as crianças dos pais.

"Mantemos a família informada sobre o progresso, mas não deixamos que fale com as crianças, porque elas precisam depender dos nossos funcionários. Ao separarmos as crianças, leva apenas alguns dias até vermos os primeiros sinaisgo bets appmelhora", diz Carlshamre.

As crianças frequentemente ficam sem qualquer contato com os pais até que consigam falar com eles ao telefone.

Conversas sobre o processo migratório são proibidas. No abrigo, recebem roupas diurnas e noturnas e são retiradas das camas todos os dias. Funcionárias como Clara Ogren ajudam-nas a colorir ou desenhar, segurando o lápisgo bets appsuas mãos.

"Brincamos por elas até que possam brincar sozinhas. Dançamos e ouvimos muita música. Queremos despertar seus sentidos. Colocamos um poucogo bets apprefrigerantego bets appsuas bocas para que provem algo doce. As que estão sendo alimentadas por sonda, a gente coloca na cozinha para sentirem cheirogo bets appcomida", explica Ogren.

"Temos a expectativago bets appque elas queiram viver e sabemos que suas habilidades ainda estão ali, mas as crianças se esqueceram delas ou ou não conseguem mais usá-las. Vivemos pelas crianças até que elas consigam viver por si próprias", acrescenta.

O mais longo tempo que uma criança levou para se recuperargo bets appSolsidan foi seis meses.

Das 35 crianças que Carlshamre tratou durante seus anosgo bets apptrabalho, apenas uma delas teve permissão para ficar na Suécia enquanto ainda estavago bets appSolsidan. As outras se recuperaram antes da concessão do asilo.

Esse tipogo bets apptratamento, ainda não muito conhecido no país, poderia ajudar Sophie? Vinte meses é um tempo muito longo para uma criança estar desconectada do mundo. O que pode ajudar, na opiniãogo bets appseus pais?

"Talvez a chegada do novo bebê", diz o pai.

A mãe da menina apenas repete o que ouviu do pediatra.

"Para Sophie acordar, o médico diz que ela e a família precisam se sentir seguras", defende.

No entanto, o maior medo da família é ser deportada e eventualmente encontrada pelos homens que a fizeram fugir.

Para a segurança da família, o nome realgo bets appSophie foi alterado nessa reportagem.