'Monstro, prostituta, bichinha': como a Justiça condenou a 1ª cirurgiacasino mobile bonusmudançacasino mobile bonussexo do Brasil:casino mobile bonus

Crédito, BBC Brasil
Cinco anos antes,casino mobile bonusdezembrocasino mobile bonus1971, Waldirene havia sido submetida a uma cirurgia para mudançacasino mobile bonussexo genital –casino mobile bonusmasculino para feminino. Ou melhor, "para a fixação do seu verdadeiro sexo, que sempre foi feminino", segundo ela mesma. Essa é considerada a primeira operação do tipo feita no Brasil.
A cirurgia foi realizada no Hospital Oswaldo Cruz,casino mobile bonusSão Paulo, por Roberto Farina, naquele momento um dos mais importantes cirurgiões plásticos do país. Antes disso, Waldirene foi acompanhada durante dois anos por uma equipe interdisciplinar do Hospital das Clínicas, que a identificou como transexual, condiçãocasino mobile bonusque o gênero é diferente do sexo físico.
Em outras palavras, é como ser mulher, tendo nascidocasino mobile bonusum corpo masculino – ou o contrário. A cirurgia é, assim, uma formacasino mobile bonusadequar o corpo ao verdadeiro gênero – quando assim desejado pelo indivíduo.
"Minha vida antes da operação era um martírio insuportável por ter que carregar uma genitália que nunca me pertenceu. Depois da operação fiquei livre para sempre – graças a Deus e ao dr. Roberto Farina – dos órgãos execráveis que me infernizavam a vida, e senti-me tão aliviada que me pareceu ter criado asas novas para a vida", escreveu Waldirene na época.
Tudo correu bem. Até que,casino mobile bonus1976, o Ministério Públicocasino mobile bonusSão Paulo descobriu a intervenção médica e denunciou Farina por lesão corporal gravíssima, sujeita a penacasino mobile bonusdois a oito anoscasino mobile bonusprisão.
Waldirene foi considerada vítima, àcasino mobile bonusprópria revelia. Os órgãos masculinos retirados na operação foram tidos como um "bem físico" tutelado pelo Estado, "inalienável e irrenunciável". "Dizer-se que a vítima deu consentimento é irrelevante", afirmou relatório policial sobre o caso.
"Não há nem pode haver, com essas operações, qualquer mudançacasino mobile bonussexo. O que consegue é a criaçãocasino mobile bonuseunucos estilizados, para melhor aprazimentocasino mobile bonussuas lastimáveis perversões sexuais e, também, dos devassos que neles se satisfazem. Tais indivíduos, portanto, não são transformadoscasino mobile bonusmulheres, e simcasino mobile bonusverdadeiros monstros", denunciou o procurador Luizcasino mobile bonusMello Kujawskicasino mobile bonuspedidocasino mobile bonusinstauraçãocasino mobile bonusinquérito policial.
"Eu não tinha lei a meu favor, era tudo contra mim. Eu era tida como puta. Não consigo me desvencilhar dessas coisas até hoje", diz Waldirene, agora uma senhoracasino mobile bonus71 anos, ainda manicure no interiorcasino mobile bonusSão Paulo.
"Eu fui pioneira. Segurei bandeira até para quem não me conhece." Ela não quis ser fotografada hoje por medo do retorno do "pesadelo" que viveu no passado. Para preservá-la, a BBC Brasil omitiu o nome da cidade onde vive. Já Roberto Farina faleceucasino mobile bonus2001, aos 86 anos.

Crédito, Arquivo pessoal
A garota brasileira
Waldirene nasceucasino mobile bonus1945, no interiorcasino mobile bonusSão Paulo. O pai, caminhoneiro, e a mãe, donacasino mobile bonuscasa, tiveram nove filhos: "quatro meninos, quatro meninas e eu", diz ela.
Os meninos dormiamcasino mobile bonusum quarto, as meninascasino mobile bonusoutro. Já para Wal (seu apelido), o pai construiu um dormitório separado, onde antes ficava a despensa da casa. É ali que ela dorme até hoje – agora, a única moradora da residência.
"Eu sempre fui Waldirene", fala ela. Na infância, preferia as brincadeirascasino mobile bonusmenina. Enquanto os irmãos fingiam que eram caubóis, ela era a mocinha. "Queria ser igual às minhas irmãs. Por que eu nasci como eu era?"
Na adolescência, a feminilidade foi se acentuando. Não tinha pelos no rosto,casino mobile bonusvoz não engrossou,casino mobile bonuscintura era levemente marcada. Além disso, passou a se interessar por homens.
Os problemas com a família também foram aumentando. O pai, inclusive, tentou tratar o filho "meio-termo" com hormônios masculinos. Até que Wal decidiu se afastar da família e foi vivercasino mobile bonusuma cidade próxima, também no interiorcasino mobile bonusSão Paulo, ganhando a vida como manicure.
Era apaixonada pelo mundo do cinema. Um dos seus passatempos era recortar fotoscasino mobile bonusatores e atrizes estrangeiroscasino mobile bonusrevistas da época. Foi assim que conheceu a históriacasino mobile bonusCoccinelle, dançarinacasino mobile bonuscabaré francesa que nasceu homem e foi operada. Wal passou a desejar para si a mesma metamorfose.
Sua transformação começou quando um médico do interior lhe orientou a procurar a endocrinologista Dorina Epps no Hospital das Clínicascasino mobile bonusSão Paulo,casino mobile bonus1969. "Logo que ela me viu, quis me ajudar. Foi muito minha amiga, muito atenciosa, devo muito a ela", lembra Waldirene.
Dorina Epps, hoje com 94 anos e impedidacasino mobile bonusfalar por problemascasino mobile bonussaúde, foi pioneira nos estudoscasino mobile bonusgênero no Brasil. Nas Clínicas, sob direcionamento dela, Waldirene foi extensivamente examinada. Também passou a frequentar sessõescasino mobile bonusterapia semanais. Logo, veio o laudo: "Trata-secasino mobile bonuspaciente que demonstra possuir personalidade com características claramente femininas, estruturadas desde a infância".
Em um primeiro momento, foi aventada a possibilidadecasino mobile bonuslevar Waldirene para ser operada nos Estados Unidos – naquela época, a cirurgia só estava disponível no exterior. Foi então que o caso chegou a Roberto Farina, professor da Escola Paulistacasino mobile bonusMedicina. O médico já era pioneirocasino mobile bonuscirurgias urogenitais, mas nunca tinha feito operaçõescasino mobile bonusmudançacasino mobile bonussexo.
"Diante do caso, adquiri literatura especializada e realizeicasino mobile bonuscadáveres várias operações plásticas com a finalidadecasino mobile bonusalcançar conhecimento necessário para realizar a operaçãocasino mobile bonusWaldir", disse o médicocasino mobile bonusdepoimento judicial. A cirurgia consiste na retirada dos órgãos sexuais masculinos e na construçãocasino mobile bonusuma vagina.
Waldirene não temeu o pioneirismo. "Eu não tinha medo da operação, só queria resolver o meu problema", conta.
A cirurgia, feita sem nenhum custo para a paciente, ocorreu cercacasino mobile bonusvinte anos depois do primeiro caso bem-sucedido conhecido no mundo, o da americana Christine Jorgensen, operada na Dinamarcacasino mobile bonus1952. Ainda antes, na décadacasino mobile bonus1930, Lili Elba passou pela primeira tentativacasino mobile bonuscirurgia transgênero, mas morreucasino mobile bonusuma das operações –casino mobile bonushistória inspirou o filme A Garota Dinamarquesa (2015).
Já recuperada, Waldirene voltou paracasino mobile bonuscidade natal como uma nova mulher, os cabelos loiros crescidos, o corpo feminino e uma alegria inédita. Um dos motivos do retorno foi uma paixão por um estudante universitário que era a cara do personagem do ator Robert Redford no filme Proposta Indecente (1993), lembra ela. O romance ocorreu às escondidas. "Ninguém poderia saber, seria um escândalo para ele."
Mas, quando o rapaz terminou a faculdade, a história acabou. Waldirene ficou desolada. Seria só o começocasino mobile bonusuma históriacasino mobile bonusinfortúnios.

Crédito, Arquivo da famíliacasino mobile bonusRoberto Farina
O pioneiro
No finalcasino mobile bonus1975, Farina anuncioucasino mobile bonusum congresso científico que vinha realizando cirurgiascasino mobile bonusmudançacasino mobile bonussexo no Brasil. Alémcasino mobile bonusWaldirene, tinha feito cercacasino mobile bonusuma dezenacasino mobile bonusoperações – outros pacientes estavam na espera, entre eles um índigena da tribo carajás. A princípio, o caso foi visto pela comunidade médica como uma inovação. Porém, logo chegou à esfera judicial.
Ciente do caso, o Ministério Público pediu que Farina fosse investigado por lesão corporal, por estar "mutilando" homens. A polícia, então, intimou o médico a fornecer o nome completo e o endereçocasino mobile bonustodos os pacientes que tinha operado – o que ele se recusou a fazer.
A história poderia ter sido encerrada aí, não fosse por outro processo judicial. Waldirene tinha entrado na Justiça para mudar o nome nos documentos – oficialmente, ela ainda era Waldir. Assim, o Ministério Público descobriucasino mobile bonusidentidade. Era o que bastava para começar o cerco judicial.
O laudo do IML foi uma das primeiras providências. Apesar do constrangimento sofrido por Waldirene, os médicos-legistas concluíram que ela era mulher. Além disso, apoiaram Farina: "Acreditamos ter sido a intervenção terapeuticamente necessária".
O resultado, embora surpreendente, não freou o ímpeto do novo promotor do caso, Messias Piva: "Não deve o jurista impressionar-se com as atitudes sentimentais expressas por Waldir e afirmadas, com certo sensacionalismo pelos médicos, mediante alusões ao 'seu sonhocasino mobile bonusser mulher'. A realidade é outra (...) Waldir Nogueira é um doente mental". Piva já é falecido. O Ministério Públicocasino mobile bonusSão Paulo não quis comentar.
O processo provocou comoção na comunidade científica internacional. Quase duas dezenascasino mobile bonuspesquisadorescasino mobile bonusdiversos países enviaram cartascasino mobile bonusapoio a Farina – já no Brasil, foram poucos os que o apoiaram além da equipe que participou do casocasino mobile bonusWaldirene no Hospital das Clínicas.
"Seria um erro das autoridades judiciais no Brasilcasino mobile bonusprocessar o Dr. Farina por seguir um procedimento médico e cirúrgico internacionalmente respeitado e aceito", escreveu,casino mobile bonus1976, o cirurgião plástico John Money, da Escolacasino mobile bonusMedicina da Universidade Johns Hopkins.
"Em nenhum dos outros países do mundo onde esse tipocasino mobile bonustratamento médico foi praticado, um médico foi acusadocasino mobile bonusconduta criminosa pelo Estado. É um retrocesso muito danoso para a imagem do Brasil", apontou o psiquiatra Robert Rubin, da Escolacasino mobile bonusMedicina da Universidade da Califórniacasino mobile bonusLos Angeles, tambémcasino mobile bonus1976.
Nada disso bastou para convencer o juiz Adalberto Spagnuolo. Em 6casino mobile bonussetembrocasino mobile bonus1978, o magistrado condenou Roberto Farina a dois anoscasino mobile bonusreclusão por lesão corporalcasino mobile bonusnatureza gravíssimacasino mobile bonusWaldir Nogueira.
Na sentença, sugeriu que o paciente deveria ter sido "submetido a tratamento psicanalíticocasino mobile bonuslonga duração como tentativacasino mobile bonuscura". Spagnuolo tem hoje 80 anos e está aposentado. A BBC Brasil não conseguiu contato com o juiz. O Tribunalcasino mobile bonusJustiça não quis se manifestar.
"Foi um casocasino mobile bonusmanipulação da ciênciacasino mobile bonusnome dos costumes", resume Angela Caniato, coordenadoracasino mobile bonusgestão documental do Tribunalcasino mobile bonusJustiçacasino mobile bonusSão Paulo, que encontrou o processo.

Crédito, BBC Brasil
Pessoa idônea
A condenaçãocasino mobile bonusFarina alarmou seus pacientes. Entre eles, João W. Nery. Quando ele leu a notícia nos jornais, "foi como se tivesse levado um soco no estômago. O coração parecia sair pela boca. O corpo todo tremia pedindo mais ar". "O meu médico foi condenado, não pode mais operar", disse ele.
Um ano antes,casino mobile bonus1977, João fora operado por Farina, deixando para trás o corpocasino mobile bonusJoana –casino mobile bonuscirurgia é considerada a primeira operaçãocasino mobile bonusum transexual masculino no Brasil. O relato está no livrocasino mobile bonusmemórias Viagem Solitária, no qual João agradece o médico "pelo pioneirismo cirúrgicocasino mobile bonusnos fazer renascer".
Tanto a defesa quanto a acusação recorreram da sentença, e o caso foi para a segunda instância. Farina pôde esperar pelo julgamentocasino mobile bonusliberdade.
O Ministério Público pediu o aumento da pena: "Admitindo-se que ele (Waldir) possa oferecercasino mobile bonusneovagina a homens, então somos forçados a concluir que agora ele é uma prostituta", afirmou o promotor Piva,casino mobile bonus1978. "Embora mutilado, Waldir continuará sendo o que sempre foi, ou seja, um homem que mantém relações sexuais com outros homens. Mas a práticacasino mobile bonusrelações sexuais entre pessoas do mesmo sexo será sempre uma aberração, tanto à natureza como à lei."
E continuou: "Farina quer que os portadorescasino mobile bonusdistúrbios mentais possam autorizar a realizaçãocasino mobile bonusseus próprios corposcasino mobile bonuscirurgias mutiladoras; que os homossexuais – 'bichinhas' – entremcasino mobile bonusfila para conseguirem a cirurgia; que os paiscasino mobile bonusfamília sejam obrigados a suportar,casino mobile bonusseus lares, filhos homossexuais – do que ninguém está livre – e ainda mutilados".
A defesa ficou indignada com o palavreado e acusou a Promotoriacasino mobile bonus"pura demagogia, preconceito e paixão, incompatíveis com um julgamento sério". Já Waldirene partiucasino mobile bonusdefesacasino mobile bonusFarina, a quem considerava seu "herói" e seu "segundo pai", recolhendo cartascasino mobile bonusapoio nacasino mobile bonuscidade natal,casino mobile bonus1978.
"Waldirene Nogueira é pessoacasino mobile bonusbom caráter,casino mobile bonusprincípios morais e comportamento exemplar, tratando-se poiscasino mobile bonuspessoa equilibrada e socialmente adequada", escreveu o então prefeito da cidade.
"Trata-secasino mobile bonuspessoa idônea,casino mobile bonusboa formação moral, intelectual e profissional, nada me constando, até a presente data, que possa vircasino mobile bonusdesabono acasino mobile bonusconduta no seio dessa comunidade", declarou o delegado localcasino mobile bonuspolícia.
Advogados, ex-prefeitos, presidentescasino mobile bonusassociações também emitiram suas cartas, todas registradascasino mobile bonuscartório. O próprio cartorário, comovido, resolveu aderir à causa. Além disso, um abaixo-assinado reuniu cercacasino mobile bonus350 assinaturas.
A última declaraçãocasino mobile bonusapoio juntada ao processo foicasino mobile bonusEspiridião, um homemcasino mobile bonusidade, que a princípio rejeitou a transformaçãocasino mobile bonusWaldir: "Declaro que minha filha Waldirene Nogueira sempre viveucasino mobile bonusnossa casa, com seus pais, achando-se depois da cirurgia realizadacasino mobile bonus1971casino mobile bonuscondições ótimascasino mobile bonussaúde e com comportamento normal, relacionando-se bem com todas as pessoascasino mobile bonussuas relações sociais".
Em novembrocasino mobile bonus1979, os desembargadores que julgaram o casocasino mobile bonussegunda instância anularam a condenaçãocasino mobile bonusFarina.

Crédito, BBC Brasil
Pênis no nariz
"Farina foi ridicularizado por causa do processo. Teve uma grande perdacasino mobile bonusclientela. Faziam piadas, diziam que quem fosse operar o nariz com ele sairia com um pênis implantado no rosto. Mesmo assim, continuou a fazer as operações (de mudançacasino mobile bonussexo). Dizia que não podia virar as costas para os transexuais", recorda Glaucio Farina, sobrinho do médico e também cirurgião plástico.
Depois da vitória na segunda instância, o pioneirismocasino mobile bonusFarina acabou produzindo um legado positivo. Aindacasino mobile bonus1979, uma emenda a um projetocasino mobile bonuslei abriu brecha para realizar esse tipocasino mobile bonuscirurgia no Brasil. Ficou estabelecido que a retiradacasino mobile bonusórgãos não era punível quando considerada necessáriacasino mobile bonusparecer médico unânime e com consentimento do paciente. O texto não fazia menção direta à mudançacasino mobile bonussexo, mas era uma formacasino mobile bonusproteger médicos como Farinacasino mobile bonusfuturos processos.
Porém, foi apenascasino mobile bonus1997 que o Conselho Federalcasino mobile bonusMedicina (CFM) autorizou a realizaçãocasino mobile bonuscirurgiascasino mobile bonusmudançascasino mobile bonussexocasino mobile bonustransexuais – inicialmente,casino mobile bonuscaráter experimental. A partircasino mobile bonus2008, a cirurgia foi incluída no Sistema Únicocasino mobile bonusSaúde (SUS) – os nomes utilizados atualmente são cirurgiacasino mobile bonusredesignação sexual, processo transexualizador ou cirurgiacasino mobile bonusafirmaçãocasino mobile bonusgênero. Desde então, maiscasino mobile bonus400 procedimentos hospitalares foram realizados na rede pública.
"Farina foi um grande pioneiro, mas seu trabalho é pouco divulgado até hoje. O processo judicial contribuiu muito para o afastamento da academia e até do CFMcasino mobile bonusrelação a ele. É preciso desfazer isso historicamente", diz o endocrinologista Magnus Regios Dias da Silva, coordenador do Núcleocasino mobile bonusEnsino, Pesquisa, Extensão e Assistência à Pessoa Trans da Universidade Federalcasino mobile bonusSão Paulo (Unifesp), batizadocasino mobile bonushomenagem a Roberto Farina.
Criado há um ano, com participação da população trans, o núcleo conta com um ambulatóriocasino mobile bonusatendimentocasino mobile bonussaúde. "Hoje,casino mobile bonus2018, é difícil trabalhar com esse ambulatório. Sofro todos os tiposcasino mobile bonuspressões transfóbicas – religiosas, políticas e até da academia. Imagina então naquela época, quarenta anos atrás. Farina foi um guerreiro, um visionário", compara Magnus. Segundo ele, o cirurgião antecipou a concepçãocasino mobile bonusatendimento à pessoa trans que o Brasil implementa hoje.
Em 1982, Farina publicou o livro Transexualismo e escreveu: "Lamentavelmente, as nossas leis, costumes e tradições não têm um mínimocasino mobile bonuscompreensão, tolerância e consideração para os transexuais (...) A investigação científica, paralelamente ao avanço da tecnologia, aos poucos vai vencendo os seus maiores inimigos que são a ignorância e a superstição".
Apesar da absolviçãocasino mobile bonusFarina, a Justiça condenou Waldirene a viver com o nomecasino mobile bonusWaldir. A manicure perdeu o processocasino mobile bonusque lutava para mudar os documentos. Isso inviabilizou, por exemplo, que pudesse exercer a carreiracasino mobile bonuscontabilidade, na qual tinha se formado antes da cirurgia. Afinal, como se apresentar como mulher, mas assinar os documentos dos clientes como homem? Para evitar esse mesmo constrangimento, ela nunca tirou carteiracasino mobile bonusmotorista.
Sua certidãocasino mobile bonusnascimento só foi alterada quando tinha 65 anos,casino mobile bonusoutubrocasino mobile bonus2010. O RG,casino mobile bonusjaneirocasino mobile bonus2011. A conquista veio depoiscasino mobile bonusuma nova batalha judicial, com um advogado que não cobrou nada pelo serviço, indicado por Dorina Epps, a médica que a recebeu nas Clínicascasino mobile bonus1969. "Meu pai e minha mãe morreram, e eu ainda não tinha o nome correto", lamenta.
Agora, mais nenhuma pessoa trans precisará passar por isso. Em primeirocasino mobile bonusmarço deste ano, o Supremo Tribunal Federal (STF) liberou a mudança do nome e do sexo diretamentecasino mobile bonuscartório, sem necessidadecasino mobile bonusautorização judicial. Também não é necessário ter passado por cirurgiacasino mobile bonusredesignação sexual ou terapia hormonal, nem apresentar pareceres ou laudos médicos – muito menos do IML, como ocorreu com Waldirene na décadacasino mobile bonus1970.

Crédito, BBC Brasil
Uma mulher fantástica
A vidacasino mobile bonusWaldirene mudou completamente depois do processo contra Farina. Humilhada na Justiça, na imprensa e na cidade, a garota extrovertida começou a ter medocasino mobile bonussaircasino mobile bonuscasa. Ainda hoje, quarenta anos depois, quando estácasino mobile bonuslocal público, ela tem a sensaçãocasino mobile bonusque está sendo observada ecasino mobile bonusque as pessoas estão comentando sobre ela. O resultado é que passa a maior parte do tempo sozinha. A única exceção é o Carnaval, "uma oportunidadecasino mobile bonussair da ostra".
Waldirene continua a trabalhar como manicure, para complementar a aposentadoriacasino mobile bonusum salário mínimo. A clientela é esporádica – no dia da visita da BBC Brasil, atendeu apenas uma pessoa. Cobra 30 reais para fazer pé e mão. O salão fica na antessala da casa onde vive. Os móveis, os objetos e parte dos eletrodomésticos parecem brotar dos anos 1980, intocáveis desde que os paiscasino mobile bonusWal morreram.
"Tenho uma vidinha boa. Mas é uma vidinha. Não posso ter grandes sonhos", diz ela. "Falar que a vida é bela? Não dá." Os problemascasino mobile bonussaúde estão se acumulando, e é difícil encontrar médicos que entendam – e aceitem – suas cirurgias do passado. Um médico urologista com quem se consultou disse que "não acreditava" nacasino mobile bonusvagina. Um oftalmologista quase caiu da cadeira quando ela contou que nasceu Waldir.
A garota do interior nunca se casou nem teve um relacionamento duradouro. Os homens da cidade falavam para ela: "Se eu posso ter uma mulher normal, por que vou ficar com uma imitação?". Ela reclama que eles só queriam sexo, nunca amizade, companheirismo, romance. "Hoje eu sou solitária porque eu não quero ninguém se divertindo à minha custa." Ainda hoje é uma mulher bonita, loira, curvilínea, quase sem rugas – embora custe a acreditar nisso.
Entre solidões e amarguras, Waldirene faz uma pausa na conversa com a BBC Brasil por causacasino mobile bonusuma lembrança. Na juventude, ela cantavacasino mobile bonusserenatas, mas parou porque o pai achava que estavam tirando sarro dela. Agora, se recordoucasino mobile bonusuma interpretaçãocasino mobile bonusNora Ney para um sambacasino mobile bonusNelson Cavaquinho e sentiu vontadecasino mobile bonuscantar outra vez. Ela abre os braços e solta a voz:
"Sei que amanhã Quando eu morrer, Os meus amigos vão dizer Que eu tinha um bom coração / Alguns até hãocasino mobile bonuschorar E querer me homenagear, Fazendocasino mobile bonusouro um violão / Mas depois que o tempo passar, Sei que ninguém vai se lembrar Que eu fui embora / Por isso é que eu penso assim, Se alguém quiser fazer por mim, Que faça agora / Me dê as florescasino mobile bonusvida, O carinho, a mão amiga, Para aliviar meus ais / Depois que eu me chamar saudade, Não precisocasino mobile bonusvaidade, Quero preces e nada mais."

Crédito, BBC Brasil









