A baiana que dá aulasdicas de palpites futebolnatação na praia a quem não pode pagar:dicas de palpites futebol

  • Victor Uchôa
  • De Salvador para a BBC Brasil
Peixinho ao lado da aluna Kátia Fernanda
Legenda da foto, Katinha sofredicas de palpites futebolinsuficiência renal, faz hemodiálise três vezes por semana e diz encontrar na natação energia para lutar pela saúde | Foto: Lorena Vinturini

dicas de palpites futebol Sulamita Araújo faz do Porto da Barra seu espaçodicas de palpites futebolensino há 17 anos. Na praia, contudo, ela não atende pelo nome. É a professora Peixinho, uma mulher cheiadicas de palpites futebolenergia que rege a turma com assobios, ordensdicas de palpites futebolexercício, rigidez, sorrisos e muita conversa.

Na Escola Peixinho Natação Porto da Barra, bebês, crianças, jovens e adultos têm aulasdicas de palpites futebolnatação com a baianadicas de palpites futebol52 anos seis vezes por semana (às vezes sete) nas águas calmas e cristalinas da Baíadicas de palpites futebolTodos os Santos.

Atualmente, são 105 alunos. Do total, 70 são isentos da mensalidadedicas de palpites futebolR$ 250. São crianças e adolescentes cujos pais não podem arcar com aulasdicas de palpites futebolnatação ou até mesmo adultos que trabalham, mas não poderiam encaixar as braçadas no orçamento.

"Muita gente acha que estou fazendo caridade, mas não é isso. Eu só quero dar uma chance a quem não pode pagar um clube ou uma academia. E até a quem poderia pagar, mas ainda sofre preconceito nesses lugares. Aqui tem gay, casal homossexual, tem negro, tenho uma aluna com um problemadicas de palpites futebolsaúde que um clube não aceitaria. Aqui, botou a touca, são pessoas iguais. Médico, porteiro, professora, estudante, desembargadora ou desempregado, não tem diferença nenhuma", define Peixinho.

Pagando ou não a mensalidade, todos os integrantes da escola ganham da professora, diariamente, um café da manhã na areia da praia, com frutas, pães e suco. Aos sábados, a variedade é maior. Se alguém faz aniversário, ganha bolo, cachorro quente e salgados.

Peixinho dá aula no Porto da Barra, nas águas cristalinas da Baíadicas de palpites futebolTodos os Santos
Legenda da foto, Peixinho comanda treinos no Porto da Barra, nas águas cristalinas da Baíadicas de palpites futebolTodos os Santos | Foto: Lorena Vinturini

Rotina intensa

A escola também organiza viagens para provasdicas de palpites futebolmaratona aquática, especialmente a Travessia dos Fortes e a Rei e Rainha do Mar, ambas no Riodicas de palpites futebolJaneiro. Também neste caso, os alunos que podem arcam com seus custosdicas de palpites futebolinscrição, passagens, hospedagem e alimentação. Para os que não conseguem, entra Peixinho.

"Ela é uma dessas pessoas que a gente encontra no Brasil e que deveria ser um espelho, como professoradicas de palpites futebolnatação e como educadora física. Ela se sacrifica, se dedica ao coletivo. Nós só podemos aplaudir", afirma Luiz Lima, ex-nadador profissional com participaçãodicas de palpites futebolduas olimpíadas, Atlanta 1996 e Sydney 2000.

Organizador da prova Rei e Rainha do Mar, Lima também mantém um projeto social com natação no Riodicas de palpites futebolJaneiro. Para ele, o trabalhodicas de palpites futebolPeixinho tem o méritodicas de palpites futebolser "democrático nas duas pontas".

"Não é só assistência social. Ela usa a natação para formar cidadãos e ainda dá a oportunidade a quem quiser progredir enquanto atleta, botando pra competir", observa.

Peixinho assobia dentro d'água
Legenda da foto, Peixinho se divide entre aulas na praia do Porto da Barra edicas de palpites futebolcondomínios, além da recreaçãodicas de palpites futebolfestas infantis | Foto: Lorena Vinturini

Para conseguir bancar os custos das aulas, dos materiais e das viagens dos alunos - e pagar as próprias contas - Peixinho dispõedicas de palpites futebolum leque variadodicas de palpites futebolrendas, cujos valores prefere não revelar.

Além das mensalidadesdicas de palpites futebolquem paga pela natação na praia, ela dá aulas na piscinadicas de palpites futebolum condomínio próximo ao Porto, realiza recreaçãodicas de palpites futebolfestas infantis e faz sessõesdicas de palpites futebolmassagem watsu, uma técnicadicas de palpites futebolrelaxamento executada, é claro, na água. Seus dias, entretanto, são prioritariamente no Porto, onde dá aulasdicas de palpites futebolmanhã, pela tarde e à noite.

"Ela não descansa, não tem férias nem folga. Desce pra praia no sol, na chuva, com trovoada, desce até com dordicas de palpites futeboldente. Só tem dois dias do ano que ela não dá aula: Natal e 1ºdicas de palpites futeboljaneiro, que é o aniversário dela. Mesmo assim, não duvido que ela desça se aparecer um aluno", diz Priscila Jatobá, que nada com Peixinho há 10 anos e hoje auxilia na gestão da escola.

Família

Ela tem duas justificativas pessoais paradicas de palpites futeboldedicação. De um lado, sente que tem obrigaçãodicas de palpites futebolpassar para os alunos aquilo que recebeu dos seus professores ao longo da vida.

A segunda razão ela reveladicas de palpites futebolmeio a um emocionado pranto: "Nunca tive afeto na minha família. Fui abusada por meu pai, minha mãe não me dava carinho e fui me afastando dos meus irmãos. Eu sempre sofri com essa carência e tento dar aos meus alunos aquilo que sempre quis ter".

Entre alunos e ex-alunosdicas de palpites futebolPeixinho, a ideiadicas de palpites futebolfamília é recorrente.

"Tia Peixinho é como uma mãe pra mim. A gente nunca teve patrocínio, mas nunca deixoudicas de palpites futebolcompetir edicas de palpites futebolviajar. A gente vendia rifa pra ajudar a pagar tudo", conta Jardeldicas de palpites futebolSouza,dicas de palpites futebol21 anos, nadando há 15 com Peixinho sem nunca ter pago mensalidade. Para ele, a natação virou sustento. Hoje, Jardel é salva-vidas num resort no Litoral Norte da Bahia.

Sulamita Araújo, mais conhecida como Peixinho, dentro do mar
Legenda da foto, Na praia do Porto da Barra,dicas de palpites futebolSalvador, Peixinho conta já ter dado aula para cercadicas de palpites futebol2 mil alunos - aproximadamente 70% com gratuidade | Foto: Lorena Vinturini
Pule WhatsApp e continue lendo
No WhatsApp

Agora você pode receber as notícias da BBC News Brasil no seu celular

Entre no canal!

Fim do WhatsApp

Outra que vê uma mãe na professora é Kátia Fernanda,dicas de palpites futebol37 anos, conhecida na praia como Katinha. Há 12 anos, ela sofredicas de palpites futebolinsuficiência renal e faz hemodiálise três vezes por semana. Em 2011, foi contemplada na filadicas de palpites futeboltransplantesdicas de palpites futebolrim, mas seu corpo rejeitou o órgão.

"Eu nem sei como estaria hoje sem a natação. É o que me dá força pra não desistirdicas de palpites futebollutar pela minha saúde. E eu sou grata a Peixinho por me aceitar do jeito que sou", diz a aluna, integrante da escola há 10 anos, também sem custos.

Contrariando os prognósticos médicos, Katinha já participoudicas de palpites futebolprovasdicas de palpites futebol1 km no mar. "É uma emoção muito grande ir se aproximando da praia e bater na faixadicas de palpites futebolchegada. É inesquecível", descreve ela, que dá aulasdicas de palpites futebolreforço escolar.

Já o operadordicas de palpites futebollogística Ricardo Sales,dicas de palpites futebol37 anos, até seis meses atrás não sabia nadar e, confessa, tinha medo do mar. Como levava o filho Caio,dicas de palpites futebol13 anos, para as aulas com Peixinho, Ricardo também ganhou atenção da professora.

Em pouco tempo, venceu o medo. Em janeiro, nadou 3 km, parte delesdicas de palpites futebolmar aberto. "Hoje eu sinto orgulhodicas de palpites futebolmim mesmo e a ajuda dela foi essencial. Nadar com Peixinho é uma terapia". Detalhe: com a natação, Ricardo perdeu 20 quilos.

"Aqui a gente encontra uma diversidadedicas de palpites futebolníveisdicas de palpites futebolnadadores e também uma diversidade social que jamais veria num clube. Peixinho junta todo mundo, experiente ou iniciante, profissional liberal, empresário ou gente que não trabalha. O que ela faz é um capítulo a parte", diz o aluno Eron Garciadicas de palpites futebolSantana,dicas de palpites futebol52 anos, médico anestesista.

Na natação, ele tem a companhia da esposa Ana Valéria, também médica.

Trajetória

Peixinho na sacadadicas de palpites futebolsua casa, que traz uma pinturadicas de palpites futebolIemanjá
Legenda da foto, 'Cheguei aqui no Porto e fiquei pensando, meditando. Foi como se minha mãe Iemanjá me dissesse: façadicas de palpites futebolescola aqui', lembra Peixinho | Foto: Lorena Vinturini

Sulamita começou a se tornar Peixinho muito cedo. Nascida no apartamentodicas de palpites futebolque mora até hoje, suas primeiras lembranças remetem ao Porto da Barra.

"Com 4 anos, eu estava nas pedras e uma tia começou a se afogar. Eu entrei com uma boia dessasdicas de palpites futebolcâmaradicas de palpites futebolpneudicas de palpites futebolcaminhão e trouxe ela pra areia", conta.

Então, começou a nadar num clube perto dali, que já nem existe mais. Pequena, magra e veloz, foi apelidadadicas de palpites futebol"pititinga" pelo primeiro treinador. Mas, aos 5 anos, mudoudicas de palpites futebolclube,dicas de palpites futeboltreinador edicas de palpites futebolapelido. Na primeira competição nacional, ganhou duas medalhasdicas de palpites futebolouro. Virou Peixinho.

"Conheço Peixinho desde que ela era um peixinho mesmo, pequeninha, solta nessa praia", diz o auditor fiscal aposentado Luiz Eládio Humbert, o Lalado,dicas de palpites futebol72 anos.

Hoje, ele faz questãodicas de palpites futebollevar a neta Maria Júlia,dicas de palpites futebol1 ano e 8 meses, para as aulas com a professora. "Maju começou com 7 meses. Com Peixinho, entrego sem medo".

Luiz Eládio Humbert e a neta, Maria Júlia
Legenda da foto, Lalado conheceu a professora Peixinho quando ela era criança. Agora, leva a neta Maju para as aulas na praia | Foto: Lorena Vinturini

Peixinho rememoradicas de palpites futeboltrajetória como competidora atravésdicas de palpites futebolrecortesdicas de palpites futeboljornal e fotografias que guarda numa mala. Foram muitas medalhas e recordes, dos quais ela lembra sem modéstia e com alguma mágoa. "Fui a melhor nadadora da Bahia, mas não tinha nome nem apoio da família."

Aos 14 anos, começou a se afastar das competições e, aos 18, virou assistente das aulasdicas de palpites futebolnatação infantildicas de palpites futebolum clube. "Foi quando descobri o que queria ser: professora. Pra mim, meus alunos são como meus filhos."

Nos anos seguintes, Peixinho passou por quase todos os clubes e academias da capital baiana, à frentedicas de palpites futebolescolinhasdicas de palpites futebolnatação ou comandando equipes competitivas. Aos 32, depoisdicas de palpites futebolidas e vindas, concluiu o cursodicas de palpites futebolEducação Física.

Em 2001, virou sóciadicas de palpites futebolum espaçodicas de palpites futebolnatação. Ali, uma mulher chegou com o filho - que tinha paralisia cerebral - e afirmou não ter dinheiro para as mensalidades do garoto. "Eu queria botar a criança na água, mas meu sócio não aceitou. Em um mês, saí da sociedade no prejuízo, mas não dava pra mim."

Adepta do candomblé e filhadicas de palpites futebolIemanjá, Peixinho afirma lembrar do momentodicas de palpites futebolque definiu seu destino. "Cheguei aqui no Porto e fiquei pensando, meditando. Foi como se minha mãe Iemanjá me dissesse: façadicas de palpites futebolescola aqui."

Desde então, são 17 anos sem férias, masdicas de palpites futebolboas histórias. Sem precisão na contagem, ela estima que maisdicas de palpites futebol2 mil pessoas já passaram por suas aulas na praia, sempre com uma médiadicas de palpites futebol70%dicas de palpites futebolgratuidade.

Peixinho mostra troféudicas de palpites futebol1º lugar conquistado por uma equipe sua
Legenda da foto, 'O pessoal passa raiva porque minha galera chega chegando', comemora Peixinho, ao ladodicas de palpites futebolum troféudicas de palpites futebol1º lugar conquistado por uma equipedicas de palpites futebol| Foto: Lorena Vinturini

"Não tem nada a ver com dinheiro. Muitas vezes eu fico endividada, outro dia estava com R$ 12 mil negativo no banco, mas o dinheiro volta, os alunos que podem ajudam e assim a gente segue. Minha maior conquista é ver meus alunos felizes", define.

Mar Grande

Uma das iniciativas mais ousadasdicas de palpites futebolPeixinho foi ter realizado cinco edições independentes da travessia Mar Grande-Salvador, uma das provasdicas de palpites futeboláguas abertas mais tradicionais do país.

Desde 1955, uma vez por ano, nadadores rompem a braçadas os 12 km da Baíadicas de palpites futebolTodos os Santos, entre Mar Grande, na Ilhadicas de palpites futebolItaparica, e o Porto da Barra,dicas de palpites futebolSalvador. Para isso, contudo, precisam desembolsar uma quantia salgadadicas de palpites futebolcada uma das etapasdicas de palpites futebolclassificação e com a taxadicas de palpites futebolfederação.

Duas fotos mostram Peixinho dando aula na praia
Legenda da foto, Professora já organizou cinco edições independentes da travessia Mar Grande-Salvador | Foto: Lorena Vinturini

Como a maioriadicas de palpites futebolseus alunos não tem como arcar com os custos - e os organizadores, segundo ela, não chegaram a se sensibilizar com os pedidosdicas de palpites futebolgratuidades - ela resolveu fazerdicas de palpites futebolprópria travessia, batizadadicas de palpites futebolMar Grande-Salvador Sem Compromisso, quedicas de palpites futeboljaneiro deste ano chegou à quinta edição, com 19 alunos nadando os 12 km e maisdicas de palpites futebol20 completando distâncias menores.

Diego Albuquerque, presidente da Federação Baianadicas de palpites futebolDesportos Aquáticos (FBDA), que organiza a prova oficial, elogia o trabalhodicas de palpites futebolPeixinho e afirma desconhecer a solicitaçãodicas de palpites futebolcortesias, mas coloca a entidade à disposição da professora para conversas futuras.

Peixinho ao ladodicas de palpites futebolseus cachorrosdicas de palpites futebolcasa
Legenda da foto, No apartamentodicas de palpites futebolfrente à praia, Peixinho conta com a companhiadicas de palpites futebolseus cães | Foto: Lorena Vinturini

Quem participou da prova Sem Compromisso este ano foi Allan do Carmo, baiano que esteve nos Jogos Olímpicos do Rio 2016 e que já venceu a Mar Grande oficial seis vezes.

"Esse ano pude participar e foi um prazer, especialmente por nadar ao lado dos nadadores do projeto dela. Ela faz um trabalho social importante, traz para a maratona aquática pessoasdicas de palpites futebolcomunidades carentes, pessoas que não têm oportunidadedicas de palpites futebolnadar outras provas", diz.

Ter a presençadicas de palpites futebolum atleta olímpico na prova é simbólico para incentivar jovens como Pilar Rodrigues,dicas de palpites futebol13 anos, apontada por Peixinho como a próxima baiana a despontar nas maratonas aquáticas. Ela também completou os 12 quilômetros da travessia Sem Compromisso.

"Com tia Peixinho, o treino é sempre especial. Aqui é como ter uma segunda família. Ela cobra muito, mas também é carinhosa. Eu me sinto muito preparada para as competições", afirma a garota, que tem a companhia da mãe nos treinos no mar.

Dores

É nesta família e no filho Leonardo,dicas de palpites futebol30 anos, que Peixinho encontra apoio para suportar as dores que carrega - e que muita gente não vê.

Há cinco anos, ela descobriu nove miomas e um nódulo no útero. Nunca fez exames para investigar se o nódulo era (ou é) um tumor cancerígeno e, como se recusa a tomar medicamentos para abrandar as fortes cólicas que afirma sentir, buscou se tratar com cirurgias espirituais.

De um totaldicas de palpites futebol12 sessões, já teve nove encontros com um médium que diz manifestar o espírito do médico alemão Dr. Fritz. "A energia lá é muito forte. Não sei se vai me curar, só sei que saiodicas de palpites futebollá renovada. E não tenho nenhum medo da morte. Meu único medo é a solidão", entrega.

Peixinho ao ladodicas de palpites futebolaltar sincrético com orixás e santos católicos
Legenda da foto, Peixinho temdicas de palpites futebolcasa um altar sincrético com orixás e santos católicos | Foto: Lorena Vinturini

No dia a dia, a professora ainda lida com a audição restrita, apenas do ouvido esquerdo, pois o tímpano direito estourou há 12 anos, quando uma bombadicas de palpites futebolpesca explodiu perto dela no mar. Para ver, conta somente com o olho direito, pois um acidente lhe tomou a visão do outro olho há 25 anos.

"Mesmo assim, a visão dela é incrível. Ela conta quantas toucas entram no mar e enxerga a praia toda", diz Katinha.

Sua simplicidade se transporta para seu apartamento,dicas de palpites futebolfrente à praia. Não há TV e quase não há móveis. Ali, a prioridade no espaço é dos cães Teodoro e Boneca.

Reformas feitas no passar dos anos nunca tiveram acabamento. E isso não chega a ser um problema -dicas de palpites futebolcada marca disformedicas de palpites futebolcimento sem reboco ela consegue ver uma imagem que representa algo marcante emdicas de palpites futeboltrajetória.

A sala exibe um altar sincrético, com orixás unidos a santos católicos e uma bíblia. Junto a este santuário, Peixinho deita-se no chão e faz seus pedidos.

Se não convém revelar os pedidos, seus principais sonhos ela deixa escapar: ganhar uma boa festadicas de palpites futebolaniversário e realizar, a nado, a travessiadicas de palpites futebol34 km do Canal da Mancha, entre França e Inglaterra.