Mais conversa, menos exames e remédios: o que propõe o movimento por 'Medicina sem Pressa':blaze double crash
- Tomás Chiaverini
- De São Paulo para a BBC Brasil

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A Slow Medicine faz parte do movimento que começou na gastronomia italianablaze double crash1986 e tem milharesblaze double crashadeptosblaze double crashtodo o mundo
blaze double crash Uma medicina mais lenta e atenta às necessidades individuaisblaze double crashcada paciente, que priorize o diagnóstico clínico - e não os exames - e a prevençãoblaze double crashvez da medicação.
Esses são alguns dos pontos defendidos pelo movimento Slow Medicine ("medicina sem pressa",blaze double crashtradução livre), que desembarcou há pouco no Brasil.
Trata-se da versão medicinalblaze double crashuma filosofia que teve origem na gastronomiablaze double crash1986, na Itália, e ganhoublaze double crash2004blaze double crashbíblia, o livro Devagar - Como um Movimento Mundial está Desafiando o Culto da Velocidade (Record), do jornalista britânico radicado no Canadá Carl Honoré.
Ao destrinchar um movimento que pede calma numa sociedade estressada pela pressa, o autor agradou leitoresblaze double crashtodo o mundo e acabou na estante dos mais vendidos. E a moda "Slow" ganhou adeptos ao redor do planeta - eblaze double crashdiversas áreas.
Na medicina, o termo foi usado pela primeira vez pelo cardiologista italiano Alberto Dolara, num artigo publicadoblaze double crash2002. Para ele, o movimento Slow seria uma contrapartida ao "constante impulsoblaze double crashaceleração na sociedade moderna".

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Slow Medicine defende menor usoblaze double crashmedicamentos
Consultas mais demoradas são um dos pilares da filosofia - a ideia é que o paciente seja visto como uma pessoa completa, não como um conjuntoblaze double crashenfermidades -, mas há outros aspectos envolvidos.
Entre eles estão o compartilhamento das decisões, a ênfase na saúde e não na doença e a prevenção como terapia.
As propostas, no entanto, recebem críticasblaze double crashoutros especialistas, que defendem haver outras prioridades na medicina.
"Até louvo as entidades que queiram ter uma medicina mais personalizada", disse o ex-presidente da Sociedade Brasileirablaze double crashUrologia Aguinaldo Nardi.
"É o que nós devíamos ter mesmo. Mas estamos muito longe disso."

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José Carlos Campos Velho (esq.) e Dario Birolini (centro) são os fundadores da Slow Medicine no Brasil. Nardi (dir.) contesta o movimento e defende a campanha Novembro Azul, do Instituto Lado a Lado pela Vida
Para o médico, porém, o primeiro passo seria ter um bom sistemablaze double crashsaúde global. "Nós ainda estamos longeblaze double crashter uma saúdeblaze double crashqualidade para todos", afirmou.
Menos remédios e exames
Já os entusiastas da Slow Medicine afirmam que suas propostas poderiam baratear o sistemablaze double crashsaúde ao propor, por exemplo, um menor usoblaze double crashmedicamentos e exames.
"Acho nossos remédios uma maravilha", afirmou o clínico-geral, geriatra e cofundador da Slow Medicine no Brasil José Carlos Aquinoblaze double crashCampos Velho.
"Hoje temos a possibilidadeblaze double crashcurar ou controlar doenças que até 20 anos atrás matavam. Mas a questão é o uso abusivo e excessivoblaze double crashmedicamentos."
Segundo ele, é preciso questionar, por exemplo, certos casosblaze double crashque drogas são utilizadas como instrumentoblaze double crashprevenção.
"Um paciente com colesterol alto, mas que nunca teve nenhum episódio cardíaco mais grave, não fuma, não tem histórico familiarblaze double crashdoença do coração e se exercita, talvez não deva tomar remédio", disse.
Isso porque, avalia, é necessário medicar uma população enorme para se evitar um único infarto - o que aumenta os custosblaze double crashplanos particulares e do Sistema Únicoblaze double crashSaúde (SUS).
Por outro lado, afirma, cria-se uma ampla gamablaze double crashpacientes sujeitos aos efeitos colaterais dos medicamentos, como mialgia, miopatia, diabetes e problemas cognitivos.
Outro aspecto da medicina atual que é criticado pelos adeptos da Slow Medicine é o excessoblaze double crashpedidosblaze double crashexames.
Para Campos Velho, o fenômeno traz uma sérieblaze double crashproblemas, que vão dos custos elevados ao estresse, muitas vezes desnecessário,blaze double crashum paciente que temblaze double crashaguardar uma semana para saber, por exemplo, que aquela manchinhablaze double crashnascença não se transformoublaze double crashum câncer fatal.
"Não é que a gente seja contra os exames", disse. "Mas a gente defende que isso deve ser individualizado. Que a decisão deve ser tomadablaze double crashmaneira consciente pelo paciente, depoisblaze double crashele ser informado sobre os riscos e benefícios que pode ter."
Campos Velho usou como exemplo uma dor nas costas.
"Se não tiver nenhum indicador que possa sinalizar um problema mais sério como um câncer, por exemplo, não se deve nem fazer um exameblaze double crashimagem."
"Porque ao fazer uma ressonância ou um raio-X, é provável que se encontre alterações que talvez nem tenham relação com a dor, mas que possam ser passíveisblaze double crashprocedimentos."
A solução para casos como esse? Tempo, responde o médico. Se necessário medicar com analgésico e anti-inflamatório e esperar para ver como os sintomas se comportam, afirma.
O caso hipotético do paciente com dor nas costas ilustra o oitavo dos 10 princípios da Slow Medicine: colocar a segurança do pacienteblaze double crashprimeiro lugar. E se completa com a ideiablaze double crashque, na dúvida, para evitar um mal maior, o médico deve abster-seblaze double crashintervir.
Contra o azul e o rosa
O movimento ganha uma boa doseblaze double crashpolêmica por se colocar contra campanhas como o Outubro Rosa, voltado à prevenção do câncerblaze double crashmama, e o Novembro Azul, que incentiva o diagnóstico precoceblaze double crashcâncerblaze double crashpróstata.

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Campanhas como o Novembro Azul viraram ação "de marketing", critica geriatra
"Virou uma campanhablaze double crashmarketing que gera um grande númeroblaze double crashsolicitaçãoblaze double crashexames", opina Campos Velho.
"Muitos desses exames acabam gerando procedimentos e muitos desses procedimentos são invasivos e levam a cirurgias que podem causar impotência e incontinência urinária", afirmou o geriatra, referindo-se ao Novembro Azul.
Segundo ele, além dos falsos positivos, há um grande númeroblaze double crashpacientes que vai, sim, desenvolver o câncer, mas que, por estarblaze double crashidade avançada ou sofrendoblaze double crashmales diversos, acabará morrendo por outros motivos.
A opiniãoblaze double crashCampos Velho ecoa um artigo do urologista Marcio D'Imperio, publicado no site da Slow Medicine Brasil.
O texto cita dadosblaze double crashum estudo publicadoblaze double crash2012 pelo semanário científico americano New England Journal of Medicine, que acompanhou 180 mil homens entre 50 e 74 anos.
Os resultados indicaram que, ainda que tenham sido diagnosticados mais tumores, a mortalidade geral dos pacientes que fizeram rastreamento por meio do exame PSA e dos que não fizeram foi praticamente a mesma:blaze double crashaproximadamente 18%.
Além disso, apontaram que, ao se fazer exames numa população ampla, sem triagem prévia, evita-se apenas uma morte para cada 1.055 homens examinados.
Campanhas como incentivo
O urologista Aguinaldo Nardi, do comitê científico do Instituto Lado a Lado pela Vida (organização que criou a campanha Novembro Azul), questionou os dados do estudo citado por D'Imperio.
Entre outras críticas, Nardi afirmou que uma parte dos pacientes, que não tiveram os níveisblaze double crashPSA monitorados durante a pesquisa, havia feito outros exames para identificar o câncerblaze double crashpróstata.
Ele também rebateu críticas da Slow Medicine ao excessoblaze double crashexames e às campanhasblaze double crashconscientização. "Como médicos, nosso dever é informar a população", disse.
Segundo Nardi, campanhas como o Novembro Azul e o Outubro Rosa muitas vezes servem como incentivo para que a população tenha contato com um médico, o que pode levar à identificaçãoblaze double crashoutros problemasblaze double crashsaúde.
Aindablaze double crashacordo com o urologista, no caso do câncerblaze double crashpróstata o maior problema não está na realização ou nãoblaze double crashexames, mas no que está sendo feito com os pacientes que apresentam a doença.
Nardi afirmou que dos 69 mil casosblaze double crashcâncerblaze double crashpróstata detectadosblaze double crash2015, 36 mil deveriam ser tratadosblaze double crashcirurgias feitas pelo SUS.

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Moacir Mariscal deixoublaze double crashlado examesblaze double crashrotina que sempre tinham resultado normal
Mas apenas seis mil foram operados. Ou seja, segundo o urologista existem 30 mil pacientes "perdidos no limbo do sistema públicoblaze double crashsaúde".
Paciente Slow
Polêmicas à parte, as ideias da Slow Medicine vêm conquistando adeptos.
O bancário aposentado Moacir Mariscal, por exemplo, passou 20blaze double crashseus 65 anos monitorando um órgão cuja existência sequer notaria, não fosse a medicina moderna: a próstata.
A despeito do sobrepeso, fatorblaze double crashrisco genérico que aumenta também as chancesblaze double crashdesenvolver vários tiposblaze double crashcâncer, os níveisblaze double crashPSAblaze double crashMariscal sempre estiveram dentro da normalidade.
Os exames periódicos, contudo, continuaram até que,blaze double crashmarço, numa consulta com o geriatra Campos Velho e após confabularem sobre o assunto, médico e paciente, decidiram deixar a próstatablaze double crashpaz.
"Ele me disse que, com todos esses anosblaze double crashresultados normais, não precisávamos mais fazer exame. E eu confiei na decisão dele", disse Mariscal.
O aposentado, que vê com bons olhos o movimento Slow e a Medicina sem Pressa, anda irritado com a boa e velha "medicina apressada".
Diante da dificuldadeblaze double crashmarcar uma consulta com a dermatologista para checar uma mancha dolorida na perna - só havia horário para o fimblaze double crashjaneiro -, Mariscal resolveu buscar uma clínica particularblaze double crashmúltiplas especialidades, dessas que se apresentam como alternativa aos planosblaze double crashsaúde.
A consulta durou cinco minutos, com uma médica que mal o olhou nos olhos, lembrou Mariscal.
O resultado? Um pedidoblaze double crashexame.






