A perturbadora origem do mito popular dos zumbis:blog betnacional
Masblog betnacionalonde vieram essas criaturas?
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Costuma-se traçar a história contemporânea dos zumbis a partir do filmeblog betnacionalterror A Noite dos Mortos-Vivos (1968),blog betnacionalGeorge Romero.
Na verdade, o filme não menciona a palavra "zumbi". Ele é uma adaptação bastante livre do romanceblog betnacionalvampiros Eu Sou a Lenda (Ed. Aleph, 2015), do escritor americano Richard Matheson, publicado originalmenteblog betnacional1954. Nele, o último ser humano vivo tenta encontrar uma cura para o vírus dos vampiros.
A história dos filmesblog betnacionalzumbi parece ter começado um pouco antes, com Zumbi Branco,blog betnacionalVictor Halperin. O filme foi lançadoblog betnacional1932, meses antes das famosas adaptaçõesblog betnacionalFrankenstein e Drácula pela Universal Studios.
Zumbi Branco inclui diversas explicações detalhadas dos zumbis para o público norte-americano, transportando para a cultura popular uma sérieblog betnacionalcrenças do Haiti e das Antilhas francesas.
Algumas pessoas especulam que a palavra "zumbi" é derivada dos idiomas do oeste africano. Ndzumbi significa "cadáver" no idioma mitsogo, do Gabão, enquanto nzambi significa "espíritoblog betnacionaluma pessoa morta", no idioma congo.
Nessas regiões, navios negreiros europeus transportavam à força imensas quantidadesblog betnacionalpessoas através do Oceano Atlântico, para trabalhar nas plantaçõesblog betnacionalcana-de-açúcar das Índias Ocidentais (as Antilhas). Os vastos lucros das colônias alimentavam o crescimento da França e da Inglaterra, que se transformaramblog betnacionalpotências mundiais.
Os africanos levavam com eles suas religiões, mas as leis francesas exigiam que os escravizados se convertessem ao catolicismo.
Surgiu, então, uma sérieblog betnacionalelaboradas religiões sintetizadas, misturando criativamente elementosblog betnacionaldiferentes tradições: o vodu, no Haiti, obeah na Jamaica e santería,blog betnacionalCuba.
Mas o que é um zumbi? Na Martinica e no Haiti, zumbi é um termo geral para designar espírito ou fantasma – qualquer presença perturbadora à noite que possa assumir diferentes formas.
O termo se aglutinou, pouco a pouco,blog betnacionaltorno da crençablog betnacionalque um bokor, ou médico bruxo, poderia restituir a vida dablog betnacionalvítima aparentemente morta, seja com magia, com uma poderosa sugestão hipnótica ou, talvez, uma poção secreta. O bokor então a faria reviver como seu escravo pessoal, capturandoblog betnacionalalma oublog betnacionalvontade.
O zumbi, portanto, é o resultado lógicoblog betnacionalser escravizado: ele não tem vontade, não tem nome e foi capturadoblog betnacionaluma morte viventeblog betnacionaltrabalho sem fim.
A descoberta dos zumbis
As nações imperiais do hemisfério norte ficaram obcecadas com o vodu no Haiti por uma razão específica.
As condições na então colônia francesa eram tão assustadoras e a taxablog betnacionalmortalidade entre os escravizados era tão alta que uma rebelião acabou derrubando os senhoresblog betnacionalengenhoblog betnacional1791.
Depoisblog betnacionaluma longa guerra revolucionária, seu nome francês Saint-Domingue foi substituído por Haiti e a nação se tornou a primeira república negra independenteblog betnacional1804.
Mas a própria existência do novo país era considerada uma ofensa aos impérios europeus. Por isso, a nação foi insistentemente demonizada como um localblog betnacionalviolência, superstição e morte ao longo do século 19, quando eram constantes os relatosblog betnacionalcanibalismo, sacrifícios humanos e rituais místicos perigosos no Haiti.
Apenas no século 20, depois que os Estados Unidos ocuparam o Haitiblog betnacional1915, essas histórias e rumores sobre os zumbis começaram a se consolidar.
As forças americanas tentaram destruir sistematicamente a religião nativa do vodu, o que, naturalmente, serviu apenas para reforçar o seu poder.
É significativa a datablog betnacionallançamento do filme Zumbi Branco,blog betnacional1932, pouco antes do fim da ocupação do Haiti pelos americanos. As tropas deixaram o paísblog betnacional1934.
Os Estados Unidos tentaram "modernizar" um país considerado atrasado, mas voltaram para casa carregando a superstição "primitiva" do país.
Revistas americanas populares dos anos 1920 e 1930 passaram a publicar cada vez mais histórias sobre mortos-vivos vingativos que se levantavam dos túmulos para caçar seus assassinos. Eles eram espectros imateriais, que se transformavam na forma física realblog betnacionalcadáveresblog betnacionaldecomposição cambaleantes, que teriam saídoblog betnacionalcemitérios no Haiti.
Mas não foi a ficção popular que realmente trouxe os zumbis para o panteão sobrenatural dos Estados Unidos. Dois importantes escritores do final dos anos 1920 não só viajaram para o Haiti como afirmaram algo extraordinário: eles teriam encontrado zumbisblog betnacionalverdade!
Não era apenas uma atração gótica imaginária: os zumbis, segundo eles, realmente existiam.
O jornalista, ocultista, escritorblog betnacionalviagens e alcoólico William Seabrook (1884-1945) viajou para o Haitiblog betnacional1927. Ele escreveu um livro sobre a viagem, intitulado A Ilha da Magia (Ed. Hemus, 2010).
Seabrook já havia praticado danças rodopiantes com dervixes na Arábia e tentado participarblog betnacionalum culto canibal no oeste africano. No Haiti, ele logo foi iniciadoblog betnacionalcerimônias vodus e afirmou ter sido possuído pelos deuses.
Em um capítulo sobre homens mortos que trabalhavam no canavial, a menção dos zumbis leva um habitante local a levar Seabrook para a plantação da Haitian-American Sugar Corporation. Lá, ele apresentou o escritor aos "zumbis" que trabalhavam à noite nos camposblog betnacionalcana-de-açúcar.
"O pior eram seus olhos", descreve Seabrook. "Eles eram, na verdade, como os olhosblog betnacionalum homem morto, não cegos, mas fixos, sem foco, sem ver."
Seabrook entra momentaneamenteblog betnacionalpânico, acreditando que todas as superstições que ele havia ouvido eram verdadeiras, até que ele encontrou uma explicação racional: eles eram "nada mais do que pobres seres humanos comuns insanos, forçados a labutar nos campos".
Este capítulo foi a base do filme Zumbi Branco. Seabrook afirmava com frequência que ele teria sido o responsável por levar a palavra "zumbi" para o vocabulário norte-americano.
Lenda imortal
A outra escritora foi a prestigiada romancista negra Zora Neale Hurston (1891-1960).
Muitos escritores do Renascimento do Harlem,blog betnacionalNova York (EUA), nos anos 1920 e 1930, estavam interessados pelo Haiti como modeloblog betnacionalindependência negra. Eles protestavam contra a ocupação americana. Mas Hurston, mais conservadora, era favorável à ocupação.
Hurston se destacou por estudar antropologia como profissão. Ela foi enviada para estudar o "hudu" (a versão afro-americana do vodu na Louisiana)blog betnacionalNova Orleans e, depois, passou vários meses no Haiti, treinando para ser sacerdotisa vodu.
Hurston ficou cada vez mais assustada com suas experiências, embora seus relatos antropológicos sejam cautelosos a este respeito.
Mas, no seu livroblog betnacionalviagem informal sobre o Haiti, Tell My Horse ("Conte ao meu cavalo",blog betnacionaltradução livre),blog betnacional1937, Hurston relata que os zumbis existem e afirma: "tive a rara oportunidadeblog betnacionalver e tocarblog betnacionalum caso autêntico".
"Ouvi os ruídos partidos nablog betnacionalgarganta e, então, fiz o que ninguém havia feito antes: eu o fotografei", afirma ela.
A imagemblog betnacionalFelicia Felix-Mentor, o zumbi "da vida real",blog betnacionalfato, é bastante assustadora.
Logo depois desse encontro, Hurston saiu apressada do Haiti, acreditando que sociedades secretas do vodu pretendiam envenená-la.
Se Hurston realmente tiver encontrado um zumbi no Haiti, a pobre mulher que ela fotografou talvez não fosse uma criatura morta-viva, mas uma pessoa que sofreu morte social, por ter sido expulsa dablog betnacionalcomunidade.
Talvez ela também sofresseblog betnacionalprofundas doenças mentais. Afinal, Hurston a conheceublog betnacionalum dos hospitaisblog betnacionalsaúde mental do Haiti.
Mas o trauma histórico da escravidão corrobora esta condição terrívelblog betnacionalser esvaziadoblog betnacionalsi próprio – uma mulher sem vínculos deixada vagando por uma morteblog betnacionalvida.
The Walking Dead é outro fruto dessa história. A série fez muito pouco uso desses antecedentes, mas diversas conexões dos sobreviventes passavam pela Geórgia, nos Estados Unidos – por cenários abandonados que, um dia, abrigaram imensas plantações mantidas por pessoas escravizadas.
Conhecer a história dos zumbis é compreender as ansiedades que essa figura ainda causa na cultura americana contemporânea, que considera a etnia uma questãoblog betnacionalfundamental importância até hoje.
*Roger Luckhurst é autor do livro Zombies: A Cultural History ("Zumbis: uma história cultural",blog betnacionaltradução livre), publicado pela editora britânica Reaktion Press.
Leia a versão original desta reportagem (em inglês) no site BBC Culture.