O que pensam os gays que apoiam Bolsonaro e rechaçam Jean Wyllys:f12 app
- Ingrid Fagundez e Rafael Barifouse
- Da BBC Brasilf12 appSão Paulo

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Smith Hays tem 34 mil seguidores no Facebook, onde se apresenta como um 'gayf12 appdireita'
"Esse vídeo vai ser sobre uma pessoa ilustre, sobre uma grande figura. É um deputado federal chamado Jair Messias Bolsonaro."
De costas para um armáriof12 appmadeira e usando um fonef12 appouvido como microfone, o arquiteto Clóvis Smith Hays Júnior,f12 app28 anos, grava emf12 appcasaf12 appSão Paulo mais um dos vídeos que costuma compartilhar com seus 34 mil seguidores no Facebook, onde ele se apresenta como um "gayf12 appdireta".
"Não tem como eu votarf12 appJair Messias Bolsonaro. Sabe por quê? Porque eu não sou do Riof12 appJaneiro (Risos). Se eu fosse do Riof12 appJaneiro, pode ter certeza que o meu voto seria dele. Nossa, mas como assim, você é um gay e você vai votar no Jair Messias Bolsonaro? Pois é, pois escute bem."
Emf12 apppágina na rede social, Smith Hays, como é conhecido, publica mensagens contra a chamada agenda LGBT, o "kit gay" e as "feminazis" e elogia Trump e o capitalismo.
Ele é um dos representantesf12 appum grupo que tem crescido na internet: of12 apphomossexuais que, contrariando o senso comum, se identificam mais com Bolsonaro (PSC-RJ) do que com o deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ), o único político declaradamente gay no Congresso Nacional.
Uma busca no Facebook revela dezenasf12 apppáginas com os termos "gayf12 appdireita" ou "gays por Bolsonaro", onde conteúdos semelhantes aof12 appHays são veiculados.
Seus administradores dizem que boa parte delas foi criada após as eleiçõesf12 app2014,f12 appmeio à polarização política vivida no país ef12 appcontraposição ao que consideram uma predominânciaf12 app"pensamentosf12 appesquerda" no movimento LGBT.

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Hays faz críticas aos militantes LGBT emf12 apppágina
Estimulado por uma eleição, esse grupo anseia por outra, a corrida presidencialf12 app2018. Muitos defendem Bolsonaro como um forte candidato.
"Apoiaria Bolsonaro para 2016 se fosse possível. É preciso fazer uma reviravolta nesse país. Não acho que se escolhe um presidente porque se gosta ou não da sexualidade alheia, mas porque ele é bom ou não", diz Junior Oliveira,f12 app31 anos, membrof12 appuma destas comunidades no Facebook.
Os motivos que o levam a exaltar o deputado se repetem nas falasf12 appoutrosf12 appseus apoiadores na comunidade gay ouvidos pela BBC Brasil. As opiniõesf12 appBolsonaro sobre o portef12 apparmas e a penaf12 appmorte estão entre algumas das razões mais citadas.
"Defendo a castração químicaf12 appcasof12 appestupro e o portef12 apparmas. Penaf12 appmorte... por que não? Por que uma pessoa não pode fazer um crime brutal e pagar com a própria vida? Temos leis muito brandas nesse país", diz Junior.
Declarações polêmicas

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Há várias comunidadesf12 app'gaysf12 appdireita' no Facebook
As declarações polêmicas do deputado sobre homossexuais não parecem afetar esta admiração. Em entrevistasf12 app2014, Bolsonaro chegou a dizer que os gays eram "fruto do consumof12 appdrogas" e que "ter filho gay é faltaf12 appporrada".
Mas, para quem participa destas comunidades na internet, esse assunto é coisa do passado. Eles dizem que Bolsonaro teria revisto suas posições.
"Ele já se retratou. Pensava que gays eram todos do mesmo tipo, mas viu que há gays casados, que pagam impostos e têm um relacionamento sem afrontar a sociedade", diz o artista plástico Leonardo Estellita,f12 app32 anos, coordenador do Movimento Brasil Livre na Região dos Lagos, no norte do Estado do Rio.
"Não vejo como contradição apoiá-lo. Bolsonaro prega o respeito à diferença. Mas ele ainda precisa ser lapidado, como aconteceu com o Lula ao longof12 appquatro eleições."
No entanto,f12 appcena da série documental Gaycation, do canal Viceland, divulgada neste ano, o deputado disse que a homossexualidade é "comportamental" e voltou a relacionar esta orientação sexual ao consumof12 appdrogas.
"Com o passar do tempo, com as liberalidades, as drogas e as mulheres trabalhando, aumentou bastante o númerof12 apphomossexuais", afirmou à atriz americana Ellen Page.

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Comunidades publicam com frequência postsf12 appapoio a Bolsonaro e com críticas a Wyllys
"Talvez ele tenha erradof12 appalgumas afirmações porque confundia ativismo com gays", diz Hays. O arquiteto tem fotos com o deputado federal e seu filho Eduardo, também membro da Câmara, e já participouf12 appum programaf12 apptelevisão ao lado do parlamentar.
Ele diz que o político é "uma pessoa muito dócil, amiga" e o representa melhor do que Jean Wyllys, conhecido por atuarf12 appdefesa dos direitos LGBT.
A BBC Brasil procurou as assessoriasf12 appBolsonaro e Wyllys, mas não obteve resposta até a publicação desta reportagem.
'Discurso contraditório'
As críticas ao deputado do PSOL são frequentes e recaem sobref12 appformaf12 appdefender as bandeiras LGBT, que os integrantes desse grupo consideram agressivas e exageradas.
"É inaceitável que as pessoas se orgulhemf12 appum homossexual vestindo uma camisaf12 appChe Guevara. Como a gente pode elogiar um cara que detestava homossexuais? Partidosf12 appesquerda apoiam a Rússia e a Coreia do Norte, que perseguem homossexuais. É um discurso contraditório", diz Estellita.
Uma das mulheres mais proeminentes desse grupo majoritariamente masculino é Karol Eller,f12 app29 anos, que também diz repudiar as atitudesf12 appWyllys.
"Ele não representa a classe e nunca me representou. Uma das ações mais feias foi quando cuspiu num parlamentar. Quer chamar a atenção dos homossexuais."

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Leonardo Estellita considera o discursof12 apppolíticosf12 appesquerda 'contraditório'
Com quase 250 mil seguidores emf12 apppágina no Facebook, Eller conheceu Bolsonarof12 appmaio, quando ficou uma semanaf12 appBrasília acompanhando a rotina do deputado: "Só não fui ao banheiro com ele".
Funcionáriaf12 appuma empresaf12 appviagens e promotoraf12 appeventos, ela diz que ganhou a passagem do trabalho e fez a visita a pedidof12 appseus seguidores - boa parte deles é heterossexual, afirma.
Militância
A rejeição a Jean Wyllys como representante por parte destas pessoas se estende também ao movimento LGBT como um todo. A militância é descrita por eles como "intolerante" e "promíscua". Quem não quer participar do grupo é segregado, dizem.
"Quem na verdade está fazendo o discursof12 appódio é essa minoria dentro do movimento. Apontam o dedo para gays que lidam com a situaçãof12 appoutra maneira. Se você não levanta bandeiras, não vai ser um deles", diz Eller.
Lucas Lopes, criador da comunidade Gayf12 appDireita, Gay Direito, que tem 2 mil membros no Facebook, menciona a "faltaf12 appfoco" dos ativistas.
"Lutas LGBTs talvez algum dia serviram para alguma coisa, mas hoje não tem necessidade disso. Uma parada gay hoje só tem promiscuidade, são pessoas se beijando no meio da rua, fazendo sexo."
Dono do blog Minha Vida Gay, que soma um milhãof12 appacessos desde af12 appcriação,f12 app2014, o empresário Flávio Yuki diz que seus leitores reclamam da "pressão dos gaysf12 appesquerda".
"Já ouvi no blog que os gaysf12 appesquerda estão muito chatos, muito radicais, e as pessoas começam a gostar do Bolsonaro."
Para Adla Teixeira, professora da faculdadef12 appEducação da Universidade Federalf12 appMinas Gerais (UFMG) e pesquisadora sobre gênero e sexualidade, esse autoritarismo existef12 appfato. Ela explica que hoje há um radicalismo nos grupos militantes assim como nos religiosos.
"Tem um poucof12 appraiva desse excessof12 appoposição (feito pela militância). Esses gays são pessoas discretas, que têm o direitof12 appnão se envolver numa militância. Há dificuldadef12 appaceitar que o outro pode não querer entrar (na luta)."
Já Richard Miskolci, professorf12 appSociologia da Universidade Federalf12 appSão Carlos (UFScar) e pesquisador do Núcleof12 apppesquisaf12 appDiferenças, Gênero e Sexualidade, não vê autoritarismo no movimento LGBT.
"Usar esse adjetivo é uma estratégia da direitaf12 appatribuir a seus inimigos suas piores características. Como um político vinculado à ditadura militar e que defende torturadores pode considerar 'autoritário' um defensor dos direitos humanos? Como movimentos nascidos da democratização poderiam ser autoritários?"
Direitos iguais?
Mais do que questionar a atuação do movimento LGBT, os "gaysf12 appdireita" põemf12 appxeque a necessidadef12 appuma legislação voltada para os homossexuais.

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Karol Eller passou uma semana acompanhando a rotinaf12 appBolsonaro
A maioria dos entrevistados é contra a lei que criminaliza a homofobia - um projeto sobre o assunto foi arquivado pelo Senadof12 app2015 - e acha que a decisão do STF sobre o casamento homossexual já é suficiente. Para eles, criar leis específicas seria uma nova formaf12 appsegregação.
"Já temos direitos iguais nessa matériaf12 appunião civil. Perante o Estado é igual. Não posso obrigar que uma igreja faça um casamento. Não tem mais necessidade, morreuf12 app2013", diz Hays.
Sobre a lei que criminaliza a homofobia, ele diz que agressões contra qualquer pessoa já são punidas. "Interessa que o agressor seja punido, não interessa a situação, se é gay ou mulher."
Além disso, parte dos que se identificam com posicionamentos mais conservadores têm restrições à adoçãof12 appcrianças por casais homossexuais.
Alguns até consideram que uma família formada por dois homens ou duas mulheres têm mais chancesf12 appafetarf12 apporientação sexual.
"Há pessoas que não têm condiçõesf12 appadotar, porque vão fazer com que as crianças cresçam sexualizadas, sejam abusadas sexualmente. A gente vê casos assim", diz Junior Oliveira, frequentador destas comunidades.
Ter acesso a uma legislação específica não é um privilégio, pondera José Reinaldo Lopes, professorf12 appDireito da Universidadef12 appSão Paulo (USP), mas uma concessãof12 apprecursos a quemf12 appsituações normais não consegue exercer seus direitos.
Ele cita o caso dos transexuais, que têm mais dificuldadef12 appalterar seu nomef12 appcomparação com outras pessoas, segundo uma pesquisa feita pela universidade. Um caso assim demanda uma lei que conceda direitos explícitos a esse público.
"A lei vem para compensar um preconceito que vem da sociedade. Hoje, não temos uma situaçãof12 appigualdade. O importante é que haja condições para que todos exerçam direitos considerados universais. E várias leis fazem isso", diz Lopes.

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Smith Hays com Bolsonaro, que já encontrou algumas vezes e diz ser uma "pessoa dócil e amiga"
'Momento conservador'
Gays defendendo posições conservadoras quanto ao avançof12 appdireitos LGBT é algo que pode causar estranhamentof12 appalgumas pessoas.
No entanto, especialistas ouvidos pela reportagem explicam que, apesarf12 appser algo novo no Brasil, isso já ocorref12 appoutros países, com "os republicanos gays nos Estados Unidos e,f12 appcerta medida, também na Europa", segundo Lopes.
"A orientação sexual não determina ideologia política", diz o professor da USP.
A afirmação pode parecer óbviaf12 appoutros lugares, mas não no Brasil, onde se costuma relacionar a militância LGBT com posiçõesf12 appesquerda.
Segundo a professora Vera Lucia Marques da Silva, pesquisadora do Departamentof12 appDireitos Humanos, Saúde e Diversidade Cultural da Escola Nacionalf12 appSaúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), os partidosf12 appesquerda - e especialmente o PT - abraçaram a causa LGBT.
Até 2007, todos os discursos a favorf12 appdireitosf12 apphomossexuais feitos na Câmara vieramf12 appparlamentaresf12 appesquerda, "principalmente os petistas",f12 appacordo com uma análise feita por ela.
Portanto, o que causa surpresa não é exatamente a adoçãof12 appum discursof12 appdireita, mas a aproximaçãof12 appfiguras como Bolsonaro.
Marques atribui essa tendência ao "momento conservador" pelo qual o país passa. Porf12 appvez, Miskolci menciona a escaladaf12 app"discursos fundamentalistas religiosos" desde as eleiçõesf12 app2010.
Ele ainda avalia que certos segmentos do público LGBT podem se identificar com a pauta mais conservadora para se distanciarf12 appestigmas.
"O desejof12 appparecer 'bom cidadão' e se dissociar dos que sofrem preconceito gera uma despolitização desses sujeitos, os quais preferem uma pauta moral a uma política."
'Uma pessoa qualquer'
Menções sobre normalidade e a necessidadef12 appmanterf12 appvida sexual entre quatro paredes, longe dos olhos do público, são recorrentes entre os membros desse grupo. É justamente por tratá-lo como "uma pessoa qualquer" que Hays, por exemplo, diz apreciar Bolsonaro.
"De gays, a gente quase não fala. Ele me trata como um ser humano, como qualquer pessoa. Se eu pisar na bola com ele, vai me tratar mal. Assim como tem que serf12 appqualquer relação."
A relação do arquiteto e o deputado é ilustrada por selfies que Clóvis postaf12 appseu Facebook. Em uma delas estáf12 appum carro entre Jair e Eduardo Bolsonaro e os três sorriem.
Com maisf12 app4 mil curtidas, a imagem traz a legenda: "Homofobia total rolando por aqui (risos)".