É possível cassar o prêmio Nobel da Pazbetmaisalguém?:betmais

  • Letícia Mori
  • Da BBC BrasilbetmaisSão Paulo
Cartaz

Crédito, Getty Images

Legenda da foto,

Ativistas pedem que Aung San Suu Kyi "usebetmaisliberdade para promover a nossa"

betmais Quando a ativista mianmarense Aung San Suu Kyi ganhou o Nobel da Paz,betmais1991, ela era vista - ao ladobetmaisNelson Mandela - como um dos principais símbolos globaisbetmaisluta contra a tirania.

O prêmio foi dado a ela "porbetmaisluta não violenta pela democracia e pelos direitos humanos". Líder da oposição contra os militares que governavam Mianmar desde 1962, ela ficoubetmaisprisão domiciliar por quase 15 anos até retomarbetmaiscarreira políticabetmais2010, durante a redemocratização do país.

Hoje, no entanto, seu silêncio diantebetmaiscrise humanitária envolvendo os muçulmanos rohingyasbetmaisMianmar é alvobetmaiscríticasbetmaisoutros vencedores do prêmio ebetmaisprotestosbetmaisativistasbetmaisdireitos humanos.

Maisbetmais370 mil rohingyas fugirambetmaisMianmar para Bangladesh nas últimas semanas, depois que o exército começou uma operação militar contra a etnia que deixou centenasbetmaismortos. A Organização das Nações Unidas definiu a situação como catastrófica.

Refugiados rohingyasbetmaisCox's Bazar, Bangladesh

Crédito, Getty Images

Legenda da foto,

Centenasbetmaismilharesbetmaisrefugiados rohingyas foram para o Bangladesh

Suu Kyi se recusou a condenar a ação militar. Embetmaisúnica declaração até agora, disse que "há um icebergbetmaisdesinformação espalhado para promover interessesbetmaisterroristas".

E, até então presença confirmada na Assembleia Geral da ONU, que começa na segunda-feira, ela canceloubetmaisparticipação.

Com a vitóriabetmaisseu partido nas eleições geraisbetmais2015, a vencedora do Nobel da Paz é hoje a figura mais poderosa do governo, ocupando os cargosbetmais1ª ConselheirabetmaisEstado e chanceler.

A versão oficial do governo diz que o exército está "protegendo a populaçãobetmaisterroristas", já que a ação militar teria começado após ataquesbetmaismilitantes islâmicos a algumas instalações do governo.

Mas o Alto Comissariado da ONU aponta relatosbetmaisque a perseguição militar aos rohingyas que se seguiu matou civis, incendiou vilarejos e espalhou minas terrestres na fronteira. A entidade diz que a minoria é vítimabetmais"limpeza étnica".

Clamor público

Diante da recusabetmaisSuu Kyibetmaisagir para frear a ação do exército, maisbetmais423 mil pessoas assinaram um abaixo-assinado pedindo que o Comitê do Nobel retire o prêmio que foi concedido a elabetmais1991.

Suu Kyibetmais2002

Crédito, Getty Images

Legenda da foto,

A líder mianmarense saiu algumas vezesbetmaissua prisão domiciliar, momentosbetmaisque foi celebrada por apoiadores

Pule Podcast e continue lendo
BBC Lê

Podcast traz áudios com reportagens selecionadas.

Episódios

Fim do Podcast

Diversos líderes que também foram agraciados com a honra - como o professor bengali Muhammad Yunus e o bispo sul-africano Desmond Tutu - condenaram seu silêncio e pediram para que ela se posicionasse contra o massacre.

Embora o Comitê Norueguês do Nobel, responsável pelo prêmio da Paz, não comente o caso específico, Olav Njølstad, diretor do Instituto Nobel, afirma que não é possível revogar a láurea concedida.

"Não há nenhuma menção a essa possibilidade nem no testamentobetmaisAlfred Nobel (que estabeleceu o prêmio) nem nos estatutos da Fundação Nobel. Nenhum dos comitêsbetmaisOslo e Estocolmo, (responsáveis por escolher os vencedores) jamais considerou revogar um prêmio já concedido", diz elebetmaisum artigo publicado pelo instituto.

Segundo Njølstad, a escolha jamais é reconsiderada e não é possível que sejam feitas apelações, independentementebetmaisquais sejam as ações subsequentes dos premiados.

Ele diz que os comitês acompanhambetmaisperto e "com grande preocupação" as críticas a pessoas que receberam a láurea. "No entanto, por uma questãobetmaisprincípios, Comitê Norueguês do Nobel jamais comenta sobre o que os laureados possam falar ou fazer depois que receberam o prêmio", afirma.

Segundo Njølstad, o comitê é restrito à avaliação sobre o trabalho e os esforços dos nomeados até o momento da premiação.

Rohingya que chegaram a Bangladesh

Crédito, Getty Images

Legenda da foto,

ONU afirma que os Rohingya são vítimasbetmaislimpeza étnica

Para Reginaldo Nasser, professorbetmaisRelações Internacionais da PUC-SP, o prêmio Nobel "sempre foi mais uma ação política do mainstream (a ordem dominante) do que uma promoção realbetmaisdireitos humanos".

"Se você avalia os critérios pelos quais se concedem o prêmio, percebe que o Nobel não tem esse purismo que as pessoas imaginam", afirma. "É um prêmio que responde à situação política do momento, aos interesses do mainstream naquele período."

Crimesbetmaisguerra

Não é a primeira vez que um vencedor do Nobel da Paz é cercado por controvérsias.

O ex-secretáriobetmaisEstado americano Henry Kissinger - premiadobetmais1973 - chegou a ser acusadobetmaiscrimesbetmaisguerra por seu envolvimentobetmaisintervenções americanas no Timor Leste, no Chile e no Camboja. Ele foi laureado por esforços pelo fim da Guerra do Vietnã, que só terminou efetivamentebetmais1975.

Suun Kyi e Htin Kyaw

Crédito, Getty Images

Legenda da foto,

Na prática, o presidente do Mianmar, Htin Kyaw, se reporta à Suu Kyi

Diferentemente do casobetmaisSuu Kyi, o prêmio concedido a Kissinger gerou polêmica imediatamente. Pela primeira vez na história, dois membros deixaram o comitê do Nobelbetmaisprotesto contra a decisão.

O líder vietnamita Le Duc Tho, que dividiria o prêmio com Kissinger, se recusou a aceitar a honraria por causa da situação da guerra. E o comediante americano Tom Lehrer tornou célebre seu ácido comentáriobetmaisque o prêmio "tornou a sátira política obsoleta".

Sob pressão

O processo abertobetmaisnomeação - qualquer governo pode indicar pessoas, por exemplo - também gera situações controversas, mesmo que os indicados não levem o prêmio.

O ditador soviético Joseph Stálin, por exemplo, foi nomeado duas vezesbetmais1945 e 1948 por seus esforços para pôr fim a Segunda Guerra Mundial.

Menino
Legenda da foto,

Muçulmanos rohingyas não são reconhecidos como cidadãosbetmaisMianmar

Para o cientista político Reginaldo Nasser, a polêmicabetmaistorno do NobelbetmaisSuu Kyi é uma "distração". Segundo o especialista, mesmo que houvesse uma revogação do prêmio, a pressão que isso exerceria para uma mudançabetmaisatitudebetmaisSuu Kyi não seria relevante.

"É muito mais uma questãobetmaisprestígio para essas elites do que algo que vai mudar a vida das milharesbetmaispessoas que estão sofrendo", diz ele, que acredita que o massacrebetmaisMianmar tem motivações econômicas.

"Hoje Suu Kyi está sendo cobrada como alguém do governo, não como uma militante. E como política ela tem uma sériebetmaisconexões com grupos que têm seus interesses na região", diz ele. "Isso não muda com Nobel ou sem, que é algo puramente simbólico", afirma.

Com reportagembetmaisJonathan Head, correspondente da BBC no sudeste da Ásia.