'Essa guerra não é nossa, mas nós morremos por conta dela': os jovensgolden state x utah palpitefavelas que querem ter voz na políticagolden state x utah palpitedrogas:golden state x utah palpite

  • Júlia Dias Carneiro
  • Da BBC Brasil no Riogolden state x utah palpiteJaneiro
Operação no complexo do alemão
Legenda da foto,

Famílias frequentemente se veemgolden state x utah palpitemeio ao fogo cruzado entre polícia e tráfico. Foto: Bento Fábio

golden state x utah palpite Jovens negrosgolden state x utah palpitefavelas são as vítimas mais frequentes da guerra às drogas no Riogolden state x utah palpiteJaneiro, segundo estatísticas. Um grupo quer, agora, inverter essa narrativa e assumir protagonismo no debate para buscar um fim a uma política que, na visão deles, mata, prende e viola direitos - sobretudo dos próprios moradoresgolden state x utah palpitefavelas.

Com o Complexo do Alemão, na Zona Norte do Rio, espraiando-se ao fundo, Sabrina Martina,golden state x utah palpite19 anos, a MC Martina, olha para a câmera para transmitir o recado do Movimentos, no vídeo que apresenta o coletivo.

"A guerra contra as drogas significa escolas fechadas, mudançagolden state x utah palpiterotina, preocupação com a nossa família. Em nome dessa guerra, o Estado justifica uma sériegolden state x utah palpiteviolaçõesgolden state x utah palpitedireitos contra nós, jovens moradoresgolden state x utah palpitefavelas. Essa guerra não é nossa", diz a moradora do Alemão.

"Mas somos nós que morremos por conta dela."

O Movimentos é um grupogolden state x utah palpite15 jovens que começou a se reunir há maisgolden state x utah palpiteum ano e lançou neste sábado o primeiro resultado desses encontros - uma cartilha sobre políticagolden state x utah palpitedrogas que começa com a questão: "Por que jovensgolden state x utah palpitefavelas precisam falar sobre drogas?"

"Nós nunca fomos inseridos nesse debate, mas nós vivemos a políticagolden state x utah palpitedrogas", diz Jéssica Souto,golden state x utah palpite24 anos, compositora e videomaker, também do Alemão.

"Quando entrei no projeto, eu não me dava contagolden state x utah palpiteque tudo que a gente vivia - um vizinho morrendo a cada semana, a escola fechada, o medogolden state x utah palpitesairgolden state x utah palpitecasa - é por causa das drogas. Por causa dessas substâncias egolden state x utah palpiteseus efeitos, morre essa cambadagolden state x utah palpitegente. São anos e anosgolden state x utah palpiteações truculentas, tirando vidas, acabando com milharesgolden state x utah palpitefamílias", diz ela.

"A gente não conseguia assimilar o quanto a políticagolden state x utah palpitedrogas afetava as nossas vidas", complementa André Galdino,golden state x utah palpite30 anos, do Complexo da Maré. "Nossos encontros e a formulação da cartilha permitiram desenvolver essa consciência."

Operação policial pertogolden state x utah palpiteescola
Legenda da foto,

Joven relatam experiências negativas no contato com a polícia. Foto: Bento Fábio

Tão longe, tão perto

Pule Podcast e continue lendo
BBC Lê

Podcast traz áudios com reportagens selecionadas.

Episódios

Fim do Podcast

A cartilha vai ser apresentada no Complexo da Marégolden state x utah palpiteum evento que inclui debate, rap e poesia. Haverá vans saindogolden state x utah palpitediferentes pontos do Rio para incentivar interessados a irem ao evento - simbolizando a dificuldadegolden state x utah palpitefazer a voz das favelas chegar ao asfalto egolden state x utah palpitetranspor a distância entre dois mundos tão próximos e tão díspares na mesma cidade.

A BBC Brasil conversou com parte dos jovens do Movimentosgolden state x utah palpiteoutro encontro simbólicogolden state x utah palpitemundos: a Escola Parque, na Barra da Tijuca, colégio particular construtivista frequentado por uma elite que almeja uma educação alternativa.

Jéssica, André e Aristênio Gomes,golden state x utah palpite24 anos, saíram cedogolden state x utah palpitesuas casas, na Maré e no Alemão, para chegar ao campus arborizado na Barra. Segundo André, o encontro foi "uma troca saudável", interessante para "confrontar realidades", mas com perguntas que expunham a faltagolden state x utah palpiteconhecimento sobre a vida nas favelas - desconhecimento que o grupo está lutando para reduzir.

Fotogolden state x utah palpiteprisão

Crédito, Getty Images

Legenda da foto,

Leigolden state x utah palpiteDrogasgolden state x utah palpite2006 provocou aumento na população carcerária brasileira

Jéssica emocionou os estudantes ao apresentar umagolden state x utah palpitesuas composições, Aborto Social. A música narra a breve vidagolden state x utah palpiteum "famoso pivete", abandonado pelo pai após um aborto malogrado, antes mesmogolden state x utah palpitenascer. "Nasce outro feto sem afeto nesse mundo complicado", diz a canção, sobre uma criança que logo virará bandido e não chegará à vida adulta.

Drogas sem mitos

O guia apresenta informações sobre quando jovens começam a ser criminalizados e as consequências da guerra às drogas - citando o aumentogolden state x utah palpite90% no númerogolden state x utah palpitepessoas presas no Brasil entre 2005 e 2013, relacionado à Leigolden state x utah palpiteDrogasgolden state x utah palpite2006.

A cartilha será distribuída entre ativistas, militantes e liderançasgolden state x utah palpitefavelas, no Rio egolden state x utah palpiteoutras cidades. O objetivo é oferecer subsídios para multiplicar o debate.

"A cartilha é para discutir como a guerra às drogas afeta as favelas e a sociedade como um todo", opina Jéssica. "Um dos pontos centrais é olhar para o usuário pela ótica da saúde. Assim como temos usuários pesadosgolden state x utah palpiteálcool, e eles não são tratados à miragolden state x utah palpiteum fuzil."

Jéssica diz ter perdido um amigo há dois meses no Alemão, baleado durante uma trocagolden state x utah palpitetiros. Aristênio diz ter perdido a contagolden state x utah palpitequantas vezes viveu ou presenciou "achaques" da polícia na Maré, ou que teve a casa revistada, inclusive no meio da noite.

Jovens reunidos
Legenda da foto,

Grupogolden state x utah palpitejovens, que começou a se reunir há maisgolden state x utah palpiteum ano, quer protagonismo no debate sobre políticagolden state x utah palpitedrogas. Foto: Divulgação

"Acordei com os gritos da minha mãe. Saí do quarto correndo e deigolden state x utah palpitecara com um fuzil no peito", lembra. Os três relatam "quase ter morrido" algumas vezes, e delatam a truculência policial como corriqueira nas favelas cariocas.

Questionada sobre as críticas feitas pelo grupo, a Polícia Militar não atendeu ao pedidogolden state x utah palpiteresposta da BBC Brasil.

A assessoriagolden state x utah palpiteimprensa da Secretariagolden state x utah palpiteSegurança Pública ressaltou que o secretário Roberto Sá formou, como umagolden state x utah palpitesuas ações estratégicas, um grupogolden state x utah palpitetrabalho para debater políticagolden state x utah palpitedrogas. Com a participaçãogolden state x utah palpitedez instituições - que reúne das polícias Militar e Civil à Uerj e ao Instituto Igarapé -, o grupo se reuniu três vezes desdegolden state x utah palpitecriação neste ano para "estabelecer um diagnóstico sobre a políticagolden state x utah palpitedrogas e fomentar parcerias para elaborar ações preventivas".

"Criminalizados, estigmatizados"

A crise econômica no Rio e o aumento da criminalidade no Estado levaram o governo federal a enviar,golden state x utah palpitejulho, o Exército para reforçar a segurança.

Mas os confrontos entre facções criminosas ou entre tráfico e polícia têm sido constantesgolden state x utah palpitefavelas cariocas. Na quinta-feira, maisgolden state x utah palpite5 mil alunos ficaram novamente sem aulas, com 17 escolas fechadas devido a confrontosgolden state x utah palpitefavelas cariocas. A rede municipalgolden state x utah palpiteensino só teria funcionadogolden state x utah palpitemaneira plena durante oito dias neste ano.

Um vídeo lançado pelo governo federal para promover a atuaçãogolden state x utah palpitemilitares causou polêmica ao contrapor imagens idílicasgolden state x utah palpitepaisagens do Rio à presençagolden state x utah palpitetanquesgolden state x utah palpitefavelas, dizendo que o Rio está "ferido", mas seguegolden state x utah palpitefrente cheiogolden state x utah palpite"vida, alegria e beleza", e resiste, sabendo que a luta "égolden state x utah palpitetodos nós" - exibindo o aparato militar nas comunidades.

"A guerra às drogas criminaliza e cria estigmas sobre quem vive nas periferias", diz André. "Esse recorte racial ocasiona o genocídio da juventude negra e pobre das favelas."

policiais fazem mira com armasgolden state x utah palpitealto calibre apesar da presençagolden state x utah palpitecrianças ao redor

Crédito, Bento Fabio

Legenda da foto,

Policiais fazem mira com armasgolden state x utah palpitealto calibre, apesar da presençagolden state x utah palpitecrianças ao redor

Sem apologia

O Movimentos nasceugolden state x utah palpitemaio do ano passado, quando uma oficina promovida pelo Centrogolden state x utah palpiteEstudos e Cidadania da Universidade Cândido Mendes (Cesec) juntou jovens do Rio,golden state x utah palpiteSão Paulo e da Bahia para discutir políticagolden state x utah palpitedrogas.

A partirgolden state x utah palpiteentão, os encontros se tornaram regulares, passando a ocorrer cercagolden state x utah palpiteduas vezes por mêsgolden state x utah palpitefavelas ou no Cesec, n o Centro do Rio, com um intercâmbio constante entre a pesquisa acadêmica e a vivência nas comunidades - palavra que o grupo se nega a usar, preferindo falar sempregolden state x utah palpitefavelas.

Jéssica, Aristênio, André e Ana Clara Teles
Legenda da foto,

Da esquerda para a direita: Jéssica, Aristênio, André e Ana Clara Teles, pesquisadora do Cesec. Foto: Júlia Dias Carneiro

"Ninguém está fazendo apologia do uso ou da vendagolden state x utah palpitedrogas. O que esses jovens querem é desafiar o senso comum, desafiar ideias preconcebidasgolden state x utah palpiterelação à políticagolden state x utah palpitedrogas e contribuir para mostrar que a atual políticagolden state x utah palpitedrogas acaba por legitimar a violência da polícia dentro das favelas", diz a socióloga Julita Lemgruber, uma das coordenadoras do Cesec.

Ana Clara Teles, pesquisadora do Cesec, considera que o grupo tem um duplo papel: trazer o debate sobre políticagolden state x utah palpitedrogas para dentro das favelas, aumentando a conscientização o impacto da guerra às drogas sobre seu dia a dia; e levar a favela para o centro do debate na cidade, que vê a favela como "coadjuvante".

"A academia tende a construir um olhar enviesado sobre políticagolden state x utah palpitedrogas. Quando se adota a perspectiva da favela, surgem problemas e questões que precisam estar no centro da discussão. A partir daí, podemos chegar a soluções mais pertinentes e justas para a população como um todo", avalia Teles.

Depoisgolden state x utah palpitelançar a cartilha, o grupo vai começar a trabalhargolden state x utah palpiteum documento propositivo para políticagolden state x utah palpitedrogas e planeja para o fim do ano um encontro nacional reunindo jovensgolden state x utah palpitefavelas e periferias para ampliar o debate.