Privilégio do servidor público é um dos maiores problemas do país, diz juiz do trabalho:ru poker

  • Camilla Veras Mota - @cavmota
  • Da BBC Brasilru pokerSão Paulo
Carteiraru pokertrabalho

Crédito, RAFAEL NEDDERMEYER/FOTOS PÚBLICAS

Legenda da foto,

MP que complementará reforma trabalhista trará artigos para evitar pejotização, diz juiz

ru poker "O servidor público é um dos maiores problemas que o Brasil tem hoje". É com essa afirmação polêmica que o juiz do Tribunal Regional do Trabalho do Paraná (TRT-9) Marlos Melek defende que o país precisa ter um Estado menor.

Um dos oito integrantes da comissão que redigiu a nova legislação trabalhista no início do ano, aprovada pelo Congresso, Marlos Melek argumenta que parte do funcionalismo é engrenagemru pokeruma grande burocracia alimentada pelo pagamento excessivoru pokerimpostos, que gozaru pokerbenefícios aos quais a maioria dos brasileiros não tem acesso.

"Nós precisamos pagar menos impostos e, para isso, não tenho dúvidas, isso passa necessariamente por uma racionalização do serviço público do Brasil."

Para ele, a única maneiraru pokeracabar com os privilégios é por meioru pokeruma reforma da Constituição, que corrigiria todas essas assimetriasru pokerdiretosru pokeruma vez só. "Aí ninguém vai se sentir otário", diz.

Apesarru pokerconsiderar que a remuneração dos magistrados, que há sete anos não têm aumento real, esteja defasada, o paranaense não concorda com o pedido da categoriaru pokerreajusteru poker16,38%ru poker2017, percentual também pleiteado pelos procuradores. A presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia, tem demonstrado resistência para incluir a demanda no orçamento da Corte, que será votado no próximo dia 9.

Hoje com 41 anos, Melek começou a trabalhar aos 14,ru pokeruma pequena torneria mecânicaru pokerCuritiba. Foi dono da marcaru pokercosméticos Ramelk, que chegou a ter, sobru pokergestão, 3 mil funcionários. Como empregador, foi processado cinco vezes e fez acordoru pokeruma.

Há 13 anos é juiz e atualmente faz parte do gruporu pokertrabalho convocado pela Presidência para implementar a Reforma Trabalhista e discutir as mudanças que serão feitas na lei via Medida Provisória.

Leia a seguir os principais trechos da entrevista concedida à BBC Brasil.

ru poker BBC Brasil - O senhor mudaria algo na lei trabalhista que entraru pokervigorru pokernovembro?

ru poker Marlos Melek - O que eu mudaria no texto? Eu delimitaria, mostraria pra sociedade brasileira que nem todo mundo pode ser autônomo.

Autônomo é aquele que, alémru pokertrabalhar por conta própria, sem subordinação da relação típicaru pokertrabalho, tem lei própria que regulamenta a possibilidaderu pokerele ser autônomo. Como, por exemplo, o motoristaru pokercarga, o representante comercial, o corretorru pokerimóveis. Para que a sociedade brasileira não interprete que todo mundo pode ser autônomo.

ru poker BBC Brasil - Para que não haja carta branca para a pejotização?

ru poker Melek - Exatamente. Não é por aí. A Medida Provisória - e nós estávamos discutindo issoru pokerBrasília ontem ou anteontem - vai colocar mais três ou cinco parágrafos para explicar melhor a questão do autônomo.

Juiz Marlos Melek, do TRT-9

Crédito, Walter Fernandes/Divulgação

Legenda da foto,

Para o juiz do trabalho Marlos Melek, este não é um momento oportuno para o pedidoru pokeraumentoru poker16,38% feito por procuradores e magistrados

Outra coisa que eu gostaria que fosse um pouco diferente seria a delimitação da reparaçãoru pokerdano moral quando esse dano fosse gravíssimo. Nós criamos uma parametrizaçãoru pokerbandasru pokerreparação moralru pokerdano leve, médio, grave e gravíssimo, porque a Justiça não pode ser uma loteria, comoru pokermuitos casos acaba sendo.

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Eu entendo que o gravíssimo deveria ter um valor maiorru pokerteto. Mas isso também, ao que me parece, será corrigido na Medida Provisória. Esse valor atual,ru poker50 salários contratuais, deve basicamente duplicar. Acredito que ele vai atender ao objetivo da lei, a intenção do legisladorru pokerpermitir ao juiz que fixe uma reparação maior quando dano for gravíssimo.

ru poker BBC Brasil - A Medida Provisória vai criar um novo mecanismoru pokerfinanciamento das entidades sindicais?

ru poker Melek - A Casa Civil está bastante convictaru pokerque o texto que foi aprovado, como foi aprovado, é o texto ideal. Mas temos setores do Ministério do Trabalho que ainda estão se esforçando para obter alguma formaru pokerfinanciamento não obrigatório, mas facultativo.

De que forma seria isso? Seria a possibilidaderu pokeruma convenção coletiva criar uma obrigação financeira para o trabalhador e para o empregador, que poderiam se oporru pokermaneira simplificada a esta cobrança, sem precisar ir pessoalmente, levar documento no dia tal.

É esse jogoru pokerforças neste momento que interageru pokerBrasília. Certamente as autoridades constituídas saberão desmembrar esse nó e iremos conhecer no curto prazo como ficará a questão do financiamento dos sindidatos.

ru poker BBC Brasil - Em suas palestras, o senhor costuma dizer que os servidores públicos estão entre os maiores problemas do país. Em que sentido?

ru poker Melek - Hoje nós temos um Estado que é muito grande, que se intromete demais na vida das pessoas. E nós temos, nesse aspecto, um problema que me parece bastante grande, que é o servidor público.

Veja, eu não me refiro, quero deixar muito claramente aqui, ao policial Marcos,ru poker37 anos, que morreu assassinado com um tiro na cabeçaru pokerplena luz do diaru pokerMinas Gerais,ru pokerum assalto a banco quando estava defendendo a sociedade; não me refiro à professora que está lutando para dar aula no interiorru pokerMinas Gerais, do Ceará, muitas vezes ganhando um salário hostil, um salário ridículo.

O que eu quero dizer com "o problema é o servidor público" não é nem a figura do servidorru pokersi, mas um sistema que gera esse servidor público.

O exemplo mais patente que eu dou é do ônibus. Para rodar um ônibus no Brasil você precisaru pokerseis licenças diferentes: a do órgãoru pokertransporte municipal, da Embratur, da ANTT, licenciamento, emplacamento, IPVA... o que está por trásru pokertudo isso? Um monteru pokerservidor público. Por que tem que ter seis carimbos para rodar um ônibus no Brasil? Porque atrásru pokercada carimbo tem três, quatro servidores públicos. Isso custa muito caro.

Isso sem falar que muitos servidores públicos têm privilégios que precisam ser eliminados. Penso que deveríamos fazer uma lista profundaru pokertodos os privilégios que existem no Brasil - o fatoru pokerum deputado, por exemplo, depoisru pokerdois mandatos, poder se aposentar - e eliminar todos ao mesmo tempo. Aí ninguém vai se sentir otário.

Não adianta alguém falar aqui, "eu vou abrir mão, como um paladino da justiça,ru pokerum benefício que eu tenho,ru pokerum privilégio que eu tenho". Nada justifica esses privilégios que levam a críticas, seja do servidor público, seja da iniciativa privada.

Nós temos realmente que acabar com todos os privilégios no Brasil. O servidor público é um problema nesse sentido. Nós precisamos pagar menos impostos e, para isso, não tenho dúvidas, isso passa necessariamente por uma racionalização do serviço público do Brasil. É nesse sentido que eu digo que o servidor público hoje é um problema no Brasil.

Cármen Lúcia

Crédito, STF

Legenda da foto,

Presidente do STF tem demonstrado resistênciaru pokerincluir demandaru pokerreajusteru poker16,38% no orçamento da corte

ru poker BBC Brasil - O senhor diz que o ideal é que não haja "paladinos", mas que a gente faça tudoru pokeruma vez só. Como isso seria possível?

ru poker Melek - Com uma reforma constitucional, não tenho dúvidas. O ser humano sempre sofre um abalo com qualquer mudança. Ninguém,ru pokersã consciência, individualmente posto, vai dizer "olha, eu topo, como servidor público, que a partirru pokeragora não tenha estabilidade". Ninguém,ru pokersã consciência, vai dizer "eu topo trabalhar mais".

Precisamosru pokeruma reforma constitucional que retire simultaneamente todos esses privilégios. É o único mecanismo que eu vejo que poderia criar esse choqueru pokercultura eru pokergestão no Brasil, assim como fez a reforma trabalhista na relação capital e trabalho.

ru poker BBC Brasil - Em seus quase 15 anosru pokermagistratura, o que viu nesse sentido? São comuns no Judiciário casosru pokerque auxílios e gratificações são usados por juízes e procuradores para furar o teto constitucional.

ru poker Melek - Sabe que, na Justiça do Trabalho, eu não vejo. Eu, por exemplo, não tenho nem planoru pokersaúde. A população desconhece que, hoje, o juiz federal do trabalho está há exatamente sete anos sem aumento.

E aí, se você pegar reajuste, que é a reposição da inflação, o último que aconteceu foi há cercaru pokercinco anos e foiru poker5%. Por isso que o governo nos deu esse auxílio-moradia (de R$ 4,8 mil), que está previstoru pokeruma lei muito antiga. Assim ele ainda economizou, é importante que a população saiba. Eles pagam só para os que estão na ativa e não pagam nem um centavo para os que estão aposentados, que estão sem reajuste e sem auxílio-moradia.

Esse negócioru poker'vale paletó',ru pokermotorista, gasolina. Eu lhe asseguro aqui: meu contracheque está na internet, meu subsídio éru pokerR$ 14,5 mil por mês (segundo o portal da Transparência do TRT-9, este é o valor líquido da remuneraçãoru pokerjuiz do trabalho substituto; o valor bruto éru pokerR$ 27,5 mil), é isso que eu ganho.

Michel Temer

Crédito, AFP

Legenda da foto,

Temer prevê complementar Reforma Trabalhista por meioru pokerMedida Provisória

ru poker BBC Brasil - Então o senhor é favorável ao aumentoru poker16,38% pleiteado pela categoria?

ru poker Melek - Neste momento, apesarru pokera magistratura estar há sete anos sem reajuste, vou ser bem sincero, eu tenho dito isso nos gruposru pokermagistratura dos quais participo: eu não penso ser razoável, neste momento histórico do Brasil,ru pokerque nós temos 13 milhõesru pokerdesempregados, não sou favorável a nenhum tiporu pokerreajuste para a magistratura neste momento.

Se for possível aos tribunais, com o orçamento que eles próprios têm, remanejar alguma verba, como verba para obras, aí eu seria favorável, porque isso não onera o Estado. Quando o Brasil voltar a crescer, quando tiver melhores condiçõesru pokerempregabilidade para o seu povo, a magistratura pode negociar com o governo toda essa reposiçãoru pokerperdas.

ru poker BBC Brasil - O senhor recebe pelas palestras que vem dando desde a publicação do livro ( ru poker Trabalhista! E agora?, ru poker lançado pela editora Estudo Imediato)?

ru poker Melek - Eu não ganho dinheiro diretamente com as palestras, eu aufiro direitos autorais do meu livro. A editora que me dá suporte, cobra pelo deslocamentoru pokerum empregado, alguma coisa para montar a palestra, por conta dos custos que ela tem. Não são valores elevados. Até onde eu sei não passaru pokerR$ 5 mil, isso já inclui passagens aéreas, a estadaru pokerquem é escalado para ir.

ru poker BBC Brasil - As palestrasru pokerservidores do Judiciário viraram tema polêmico depois que a corregedoria do Ministério Público instaurou procedimento para investigar a comercializaçãoru pokerpalestras dadas pelo procurador da República Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Lava Jatoru pokerCuritiba. O que o senhor pensa a esse respeito?

ru poker Melek - Eu entendo que o magistrado, o procurador, não pode receber nada do setor privado. Por isso que, quando dou palestrasru pokeruniversidades,ru pokerOABs,ru pokeruma sérieru pokerinstituições, eu vou por conta própria, não levo livros, não permito que a editora participe.

Essa minha palestra é remunerada como se fosse uma hora-aula, e como é um assunto acadêmico, isso está absolutamenteru pokeracordo com a legislação. Agora,ru pokerrelação a um magistrado ou um procurador receber um valor diretamenteru pokerquem quer que seja, não vejo isso com bons olhos, não seria correto.

ru poker BBC Brasil - Como donoru pokerempresa, o senhor chegou a tomar algum processo, esteve do outro lado da mesa?

ru poker Melek - Sim. Em dez anosru pokerempresa, eu tive no máximo cinco ações trabalhistas no Brasil inteiro. Eu era muito cuidadoso, até porque eu gosto desse tema. Ninguém era demitido sem aviso. Dessas cinco ações, fiz acordo na primeira, que realmente eu não pagava RSR (repouso semanal remunerado) sobre comissões, porque eu não sabia que tinha que pagar, foi um descuido. Eu, reconhecendo que estava errado, paguei.

As outras causas foramru pokerfranqueadosru pokerque o trabalhador postulava a responsabilidade subsidiária da franqueadora. Nesses casos, a Justiça afastou a responsabilidade porque a lei é expressa, diz que o franqueador não responde pelos débitos trabalhistas do seu franqueado. Nós ganhamos essas causas por ilegitimidaderu pokerparte.