O tabu do suicídio assistido no Brasil: morte digna ou crime contra a vida?:betpix online
- André Bernardo
- Do Riobetpix onlineJaneiro para a BBC Brasil

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Debate sobre o suicídio assistidobetpix onlinecasobetpix onlinedoenças terminais ou sofrimento extremo divide opiniões
betpix online Aos 90 anos, o escritor Carlos Heitor Cony não perde o tom jocoso.
Quando indagado sobre o que ainda falta para se sentir realizado, o autorbetpix onlineO Ventre, O Piano e a Orquestra e Quase Memória, romances premiados da literatura brasileira, não pensa duas vezes: "Morrer". E arremata: "Mas, se quiserem me dar o Nobel, aceito!".
Desde que foi diagnosticado com um câncer linfático,betpix online2001, Cony tem pensado muito na morte. "De certa forma, somos todos terminais desde que nascemos", escreveubetpix onlineO Homem Terminal.
"Envelhecer é porcaria. Um homem depois dos 50 é anti-higiênico. Por isso, eu me mataria um dia", confidencioubetpix onlineMemorial do Inverno.
O câncer obrigou Cony a fazer quimioterapia, o que enfraqueceu seus braços e pernas. Em 2013, levou um tombo na Feira dio Livrobetpix onlineFrankfurt, que gerou um coágulo no cérebro "do tamanhobetpix onlineuma maçã".
Hoje, Cony andabetpix onlinecadeirabetpix onlinerodas, perdeu o movimento do lado direito do corpo e compara o apartamento onde vive, no bairro da Lagoa, zona sul do Riobetpix onlineJaneiro, a uma UTI. Por essas e outras, se diz solidário a quem cogita a hipótesebetpix onlinesuicídio assistido.
"Ninguém quer morrer sofrendo, chorando e gritando. Eu, pelo menos, não. Quero morrer numa boa", avisa.
Mas, para evitar abusos e mal-entendidos, ressalva, algumas premissas devem ser obedecidas. Uma delas é o paciente manifestarbetpix onlinevontade por escrito, com a concordânciabetpix onlinetrês ou quatro membros da família.
Outra é o médico emitir um atestado comprovando que o paciente é terminal e o estado dele, irreversível.
"Há casosbetpix onlineque os remédios já não produzem mais efeito, a família gasta um dinheiro que não tem e, pior, o paciente não tem mais condiçõesbetpix onlineviver, sóbetpix onlinesofrer. Se não há uma solução médica ou científica, o suicídio assistido é a saída mais humana que existe", afirma Cony.

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"Ninguém quer morrer sofrendo, chorando e gritando. Eu, pelo menos, não. Quero morrer numa boa", diz Carlos Heitor Cony
'Não quero que me mantenham vivo a qualquer preço'
O assunto, apesarbetpix onlinemacabro, como o próprio Cony admite, é recorrente.
Em outubro do ano passado, o ex-arcebispo sul-africano Desmond Tutu defendeu, na ocasiãobetpix onlineseu aniversáriobetpix online85 anos, o direito ao suicídio assistido ao pedir que, no fimbetpix onlinesua vida, seja tratado com compaixão.
"Por que tantos são obrigados a suportar terríveis sofrimentos contrabetpix onlinevontade?", indagoubetpix onlineartigo publicado no jornal americano The Washington Post. "Não quero que me mantenham vivo a qualquer preço", afirmou o Nobel da Paz, que há 20 anos luta contra um câncerbetpix onlinepróstata.
Desmond Tutu não é o único adepto da morte digna e indolor. Em junhobetpix online2015, durante entrevista à BBC Brasil, o físico britânico Stephen Hawking, 73, afirmou que, caso se tornasse um fardo para as pessoas ao seu redor ou se não tivesse "mais nada a contribuir", consideraria a hipótesebetpix onlinedar cabo da própria vida.
"Manter alguém vivo contrabetpix onlinevontade é a derradeira indignidade", declarou Hawking, que desde os 21 anos sofrebetpix onlineEsclerose Lateral Amiotrófica (ELA), doença degenerativa e incurável que ataca os neurônios responsáveis pelos movimentos do corpo e provoca perdabetpix onlinecontrole muscular.
'O prolongamentobetpix onlineuma vida sem qualidade pode ser considerado um crime!'
No Brasil, o tema já inspirou, alémbetpix onlinealgumas crônicasbetpix onlineCony, o romance A Mãe Eterna - Morrer É um Direito, da psicanalista e escritora Betty Milan.
Nele, a narradora fala da dificuldadebetpix onlinepassar da condiçãobetpix onlinefilha para mão da mãe. A certa altura, ela se pergunta até quando a vida deve ser prolongada e questiona a obsessão terapêutica do médico, que procura vencer a morte a todo custo.
"O suicídio assistido é um benefício sempre que a pessoa expressa claramente seu desejobetpix onlineir embora ou porque está sofrendo, como no casobetpix onlineDesmond Tutu, ou por considerar que cumpriubetpix onlinemissão na Terra, como Stephen Hawking", diz Betty, que buscou inspiração na própria história e nabetpix onlinesua mãe para escrever o livro.
Dona Rosa, hoje com 99 anos, anda com dificuldade, escuta pouco e enxerga mal.
"Para certas pessoas, o envelhecimento é insuportável e o fim da vida deve ser humanizado. Se nós tivermos certezabetpix onlineque vamos ser ajudados a morrer, viveremos muito melhor. O prolongamentobetpix onlineuma vida sem qualidade pode ser considerado um crime", afirma a escritora.

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''O suicídio assistido é um benefício sempre que a pessoa expressa claramente seu desejobetpix onlineir embora ou porque está sofrendo', diz Betty Milan
'Viver com dignidade. Morrer com dignidade'
Apenas alguns poucos países, como Holanda, Suíça e Bélgica, autorizam a prática. A Holanda se tornou o primeiro a descriminalizar o suicídio assistido,betpix online2002. Lá, é preciso que a doença seja incurável e que o paciente esteja "lúcido e consciente" ao pedir ajuda para morrer.
A Suíça é o único país do mundo onde um estrangeiro pode se matar com a ajudabetpix onlineterceiros. Para tanto, precisa desembolsar cercabetpix online4.400 francos suíços - o equivalente a R$ 13.200, fora as despesas com hotel, traslado e passagem aérea.
Desde 1998, quando foi fundada, até 2014, a associação Dignitas, o mais famoso centrobetpix onlinesuicídio assistido da Suíça, já ajudou maisbetpix online1.700 doentes terminais ou pacientes com doenças incuráveis e progressivas a terem uma morte rápida e indolor com uma dosebetpix online15 mgbetpix onlineuma substância letal misturada com 60 mlbetpix onlineágua.
O lema da instituição é "Viver com dignidade. Morrer com dignidade".
A legislação suíça permite o suicídio assistido desde que não seja por "motivos egoístas". Por exemplo: ajudar uma tia a morrer só para colocar as mãos embetpix onlinefortuna. Já nos EUA, a decisão cabe a cada Estado. Atualmente, é permitidobetpix onlineapenas seis: Washington, Oregon, Vermont, Novo México, Montana e Califórnia.
O Brasil não tem legislação sobre o tema. Por meiobetpix onlineseu artigo 122, o Código Penal proíbe o atobetpix online"induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou prestar-lhe auxílio para que o faça". O crime é passívelbetpix onlinepenabetpix onlinedois a seis anosbetpix onlineprisão quando o suicídio é consumado, oubetpix onlineum a três, caso a tentativa resultebetpix onlinelesão corporal grave.
"Os que se opõem à prática sustentam ser dever do poder público preservar, a todo custo, a vida humana", analisa a advogada Mariabetpix onlineFátima Freirebetpix onlineSá, pesquisadora do Centrobetpix onlineEstudosbetpix onlineBiodireito (CEBID) e autora do livro Direitobetpix onlineMorrer - Eutanásia e Suicídio Assistido. "Muitas vezes, eventuais direitos do indivíduo estariam subordinados aos direitos do Estado. Para os que a defendem, o conceitobetpix onlinevida precisa ser repensado. Será que vida digna é aquela segundo a qual o indivíduo ainda se mantenha ligado a aparelhos, totalmente infeliz e dependente da boa vontade dos outros?"
Associação médica debaterá tema no Brasil

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"A vida não nos pertence. Não podemos concebê-la. Da mesma forma, uma vez perdida, não podemos recuperá-la. Somos administradoresbetpix onlineum dom recebido por Deus", defende Dom Antônio Augusto, bispo auxiliar do Riobetpix onlineJameiro
Procurada pela reportagem, a Associação Médica Brasileira (AMB) informou que não tem uma posição sobre o assunto. Mas adiantou que,betpix onlinemarço, representantes da entidade vão se reunir com membros do Conselho Federalbetpix onlineMedicina (CFM) para debater o tema.
Desde 2006, o CFM procura disciplinar o usobetpix onlinetratamentos fúteis (considerados inúteis)betpix onlinepacientes na fase terminal da vida. Por meiobetpix onlineuma resolução, os médicos podem suspender o tratamento ou os procedimentos que estão prolongando a vida desse doente, se for o desejo dele, com o objetivobetpix onlinelhe abreviar a morte, sem sofrimento.
Na maioria dos casos, mantêm-se as medidas ordinárias, como as que visam reduzir a dor do paciente, e suspendem-se as extraordinárias ou as que estão dando suporte à vida.
"A ortotanásia (ou "morte correta") dá ao cidadão enfermo grave,betpix onlinecircunstânciasbetpix onlinedoença terminal e irreversível, o direitobetpix onlinemorrer com dignidade, sem a obrigatoriedadebetpix onlineusobetpix onlinemeios desproporcionaisbetpix onlinerespeito abetpix onlinevontade", explica o médico Carlos Vital, presidente do CFM.
"Seu advento garante a humanização do processobetpix onlinemorte ao evitar prolongamentos irracionais e cruéis da vida do paciente", acrescenta ele.
'Uma coisa é matar. Outra é não conseguir impedir uma morte'
A posição do CFM é endossada pela Igreja Católica. O bispo auxiliar da Arquidiocese do Riobetpix onlineJaneiro, Dom Antônio Augusto Dias Duarte, explica que a vida é um dombetpix onlineDeus e, como tal, temos um poder relativo sobre ela.
"A vida não nos pertence. Não podemos concebê-la. Da mesma forma, uma vez perdida, não podemos recuperá-la. Somos administradoresbetpix onlineum dom recebido por Deus. Por essa razão, a Igreja recomenda às pessoas que não optem pelo suicídio assistido", explica Dom Antônio Augusto.
Ex-professor do Cursobetpix onlinePós-Graduaçãobetpix onlineBioética da Pontifícia Universidade Católica (PUC-RJ), Dom Augusto, que também é médico, lembra que,betpix onlineseus últimos dias, o papa João Paulo 2º tomou a decisãobetpix onlinenão mais ir ao hospital para se submeter a meios desproporcionaisbetpix onlinetratamento.
Na ocasião, a doença já tinha evoluídobetpix onlinetal maneira que permanecer ligado aos aparelhos apenas prolongaria seu sofrimento físico e moral.
"No suicídio assistido, você mata a pessoa. Na ortotanásia, a exemplo do que aconteceu com o santo padre, você não consegue impedir a morte dela. São duas coisas completamente diferentes", enfatiza Dom Antônio.
Quanto a Carlos Heitor Cony, embora diga que, da vida, só espera a morte, ele já trabalhabetpix onlinedois novos livros: Missa para o Papa Marcelo e Cinco Prudentes Virgens, ambos sem previsãobetpix onlinelançamento.
"No meu primeiro romance, já dizia que não queria morrer como negociante falido ou amante renegado. Quero morrer lúcido. Por isso, sigo trabalhando", justifica o escritor.

Agrotóxicos, depressão e dívidas criam ‘bomba-relógio’betpix onlinesuicídios no RS
Alto númerobetpix onlinecasos entre produtoresbetpix onlinetabaco do centro do Estado Sul envolve, segundo pesquisas e especialistas, efeitos dos defensivos agrícolas, tabus e relação conflituosa com empresas compradoras.




