'Epidemiaspaceman betssoncâncer'? Alto índicespaceman betssonagricultores gaúchos doentes põe agrotóxicosspaceman betssonxeque:spaceman betsson
- Paula Sperb
- De Porto Alegre para a BBC Brasil

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Falta da proteção necessária é um dos principais problemas
spaceman betsson O agricultor Atílio Marques da Rosa,spaceman betsson76 anos, andavaspaceman betssonmoto quando sentiu uma forte tontura e caiu na frentespaceman betssoncasaspaceman betssonBraga, uma cidadezinhaspaceman betssonmenosspaceman betsson4 mil habitantes no interior do Rio Grande do Sul.
"A tontura reapareceu depois, e os exames mostraram o câncer", conta o filho Osmar Marques da Rosa,spaceman betsson55 anos, que também é agricultor.
Seu Atílio foi diagnosticado há um ano com um tumor na cabeça, localizado entre o cérebro e os olhos. Por causa da doença, já não trabalha emspaceman betssonpequena propriedade, na qual produzia milho e mandioca.
Para ele, o câncer tem origem: o contato com agrotóxicos, produtos químicos usados para matar insetos ou plantas dos quais o Brasil é líder mundialspaceman betssonconsumo desde 2009.
"Meu pai acusa muito esse negóciospaceman betssonveneno. Ele nunca usou, mas as fazendas vizinhas sempre pulverizavam a soja com avião e tudo", diz Osmar.
O noroeste gaúcho, onde seu Atílio mora, é campeão nacional no usospaceman betssonagrotóxicos, segundo um mapa do Laboratóriospaceman betssonGeografia Agrária da USP, elaborado a partirspaceman betssondados do IBGE (Instituto Brasileirospaceman betssonGeografia e Estatística).
Para especialistas que lidam com o problema localmente, não há dúvidas sobre a relação entre o veneno e a doença.
"Diversos estudos apontam a relação do usospaceman betssonagrotóxicos com o câncer", diz o oncologista Fábio Franke, coordenador do Centrospaceman betssonAlta Complexidadespaceman betssonOncologia (Cacon) do Hospitalspaceman betssonCaridadespaceman betssonIjuí, que atende 120 municípios da região.
O glifosato é o agrotóxico mais usado no país, e fabricado pela Monsanto, que rechaça a relação do uso do produto com a doença.
A empresa diz tratar-sespaceman betsson"um dos herbicidas mais usados no mundo, por maisspaceman betsson40 anos espaceman betssonmaisspaceman betsson160 países", e que "nenhuma associação do glifosato com essas doenças é apoiada por testesspaceman betssontoxicologia, experimentação ou observações".
Já o Sindiveg (Sindicato Nacional da Indústriaspaceman betssonProdutos para Defesa Vegetal), que representa os fabricantesspaceman betssonagrotóxicos, encaminhou o questionamento da BBC Brasil para a Andef (Associação Nacionalspaceman betssonDefesa Vegetal), que responde basicamente pelas mesmas empresas.
Em nota, a Andef afirma que "toda substância química, sintetizadaspaceman betssonlaboratório ou mesmo aquelas encontradas na natureza, pode ser considerada um agente tóxico" e que os riscos à saúde dependem "das condiçõesspaceman betssonexposição, que incluem: a dose (quantidadespaceman betssoningestão ou contato), o tempo, a frequência etc.".

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Oncologista Fábio Franke vê relação direta entre agrotóxicos e câncer
Um dos principais problemas é que boa parte dos trabalhadores não segue as instruções técnicas para o manejo das substâncias.
"Nós sempre perguntamos se usam proteção, se usam equipamento. Mas atendemos principalmente pessoas carentes. Da renda deles não sobra para comprar máscaras, luvas, óculos. Eles ficam expostos", diz Emília Barcelos Nascimento, voluntária da Liga Femininaspaceman betssonCombate ao Câncerspaceman betssonIjuí.
Anderson Scheifler, assistente social da Associaçãospaceman betssonApoio a Pessoas com Câncer da cidade (Aapecan), corrobora: "Temos como relatospaceman betssonvida dessas pessoas um históricospaceman betssonutilização excessivaspaceman betssondefensivos agrícolas e, na maioria das vezes, sem usospaceman betssonproteção".
'Alarmante epidemia'
Um estudo realizado na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) comparou o númerospaceman betssonmortes por câncer da microrregiãospaceman betssonIjuí com as registradas no Estado e no país entre 1979 e 2003 e constatou que a taxaspaceman betssonmortalidade local supera tanto a gaúcha, que já é alta, como a nacional.
De acordo com o Inca (Instituto Nacionalspaceman betssonCâncer), o Rio Grande do Sul é o Estado com a maior taxaspaceman betssonmortalidade pela doença. Em 2013, foram 186,11 homens e 140,54 mulheres mortos para cada grupospaceman betsson100 mil habitantesspaceman betssoncada sexo.
O índice é bem superior ao registrado pelos segundos colocados, Paraná (137,60 homens) e Riospaceman betssonJaneiro (118,89 mulheres).
O Estado também é líder na estimativaspaceman betssonnovos casosspaceman betssoncâncer neste ano, também elaborada pelo Inca - 588,45 homens e 451,89 mulheres para cada 100 mil pessoasspaceman betssoncada sexo.
Em 2014, 17,5 mil pessoas morreramspaceman betssoncâncerspaceman betssonterras gaúchas - no país todo, foram 195 mil óbitos.

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Especialistas ligam usospaceman betssonagrotóxicos à alta incidênciaspaceman betssoncâncer no RS
Anualmente, cercaspaceman betsson3,6 mil novos pacientes são atendidos na unidade coordenada por Franke. Se incluídos os antigos, são 23 mil atendimentos. Destes, 22 mil são bancados pelo SUS (Sistema Únicospaceman betssonSaúde) - os cofres públicos desembolsam cercaspaceman betssonR$ 12 milhões por ano para os tratamentos.
Segundo o oncologista, a maioria dos doentes vem da área rural - mas o problema pode ser ainda maior, já que os malefícios dos agrotóxicos não ocorrem apenas por exposição direta pelo trabalho no campo, mas também via alimentação, contaminação da água e ar.
"Se esses números fossemspaceman betssonpacientesspaceman betssondengue ou mesmo uma simples gripe, não tenho dúvidaspaceman betssonque a situação seria tratada como a mais alarmante epidemia, com decretospaceman betssoncalamidade pública e tudo. Mas é câncer. Há um silêncio estranhospaceman betssontorno dessa realidade", afirma o promotor Nilton Kasctin do Santos, do Ministério Público da cidadespaceman betssonCatuípe.
"Milharesspaceman betssonpessoas estão morrendospaceman betssoncâncer por causa dos agrotóxicos", acrescenta ele, que atua no combate aos produtos.
Mas, segundo a Andef, "o setorspaceman betssondefensivos agrícolas apresenta o grauspaceman betssonregulamentação mais rígido do mundo".
Salto no consumo

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Maisspaceman betsson1,1 mil pessoas morreram por intoxicação com agrotóxico no paísspaceman betsson8 anos
A comercializaçãospaceman betssonagrotóxicos aumentou 155%spaceman betssondez anos no Brasil, apontam os Indicadoresspaceman betssonDesenvolvimento Sustentável (IDS), estudo elaborado pelo IBGE no ano passado - entre 2002 e 2012, o uso saltouspaceman betsson2,7 quilos por hectare para 6,9 quilos por hectare.
O número é preocupante, especialmente porque 64,1% dos venenos aplicadosspaceman betsson2012 foram considerados como perigosos e 27,7% muito perigosos, aponta o IBGE.
O Inca é um dos órgãos que se posicionam oficialmente "contra as atuais práticasspaceman betssonusospaceman betssonagrotóxicos no Brasil" e "ressalta seus riscos à saúde,spaceman betssonespecial nas causas do câncer".
Como solução, recomenda o fim da pulverização aérea dos venenos, o fim da isenção fiscal para a comercialização dos produtos e o incentivo à agricultura orgânica, que não usa agrotóxico para o cultivospaceman betssonalimentos.
Márcia Sarpa Campos Mello, pesquisadora do instituto e uma das autoras do "Dossiê Abrasco - Os impactos dos Agrotóxicos na Saúde", ressalta que o agrotóxico mais usado no Brasil é o glifosato - vendido com o nomespaceman betssonRoundup e fabricado pela Monsanto.
Segundo ela, o glifosato está relacionado aos cânceresspaceman betssonmama e próstata, alémspaceman betssonlinfoma e outras mutações genéticas.
"A Organização Mundial da Saúde (OMS) afirma que 80% dos casosspaceman betssoncâncer são atribuídos à exposiçãospaceman betssonagentes químicos. Se os agrotóxicos também são esses agentes, o que já está comprovado, temos que diminuir ou banir completamente esses produtos", defende.
A Monsanto, entretanto, rechaça a opinião. Procurada pela BBC Brasil, a empresa afirma que o registro do glifosato na União Européia foi renovado por 18 meses,spaceman betssonjunho.
A renovação, porém, não passou sem polêmica. A intenção inicial era que a renovação fosse por 15 anos. França, Itália, Suécia e Países Baixos foram contra. Um dos motivos é a recente classificação da Agency for Research on Cancer (IARC), parte da Organização Mundial da Saúde, que classificou o glifosato como "provavelmente cancerígeno para humanos".

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Fabricante afirma que glifosato é seguro para a saúde
Procurada, a Monsanto afirma que "todos os usosspaceman betssonprodutos registrados à basespaceman betssonglifosato são seguros para a saúde e o meio ambiente, o que é comprovado por um dos maiores bancosspaceman betssondados científicos já compilados sobre um produto agrícola".
Três vezes mais
Segundo a Associação Brasileiraspaceman betssonSaúde Coletiva (Abrasco), o brasileiro consome até 12 litrosspaceman betssonagrotóxico por ano.
A bióloga Francesca Werner Ferreira, da Aipan (Associação Ijuiensespaceman betssonProteção ao Ambiente Natural) e professora da Unijuí (Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul), alerta que a situação é ainda pior no noroeste gaúcho, onde o volume consumido pode ser três vezes maior.
Ela conta que produtores da região têm abusado das substâncias para secar culturas foraspaceman betssonépoca da colheita e, assim, aumentar a produção. É o caso do trigo, que recebe doses extrasspaceman betssonglifosato, 2,4-D, um dos componentes do "agente laranja", usado como arma química durante a Guerra do Vietnã, e paraquat.

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A agricultura é uma das atividades mais importantes para a economia do noroeste gaúcho
Segundo o promotor Nilton Kasctin do Santos, este último causa necrose nos rins e morte das células do pulmão, que terminamspaceman betssonasfixia sem que haja a possibilidadespaceman betssonaplicaçãospaceman betssonoxigênio, pois isso potencializaria os efeitos da substância.
"Nada disso é invençãospaceman betssonpalpiteiro,spaceman betssonambientalistaspaceman betssonesquerda ouspaceman betssonalgum cientista maluco que nunca tomou sol. Também não é invençãospaceman betssonalgum inimigo do agronegócio. Sabe quem diz tudo isso sobre o paraquat? O próprio fabricante. Está na bula, no rótulo", alerta o promotor.
No último ano, 52 pessoas morreram por intoxicação por paraquatspaceman betssonterras gaúchas, segundo o Centrospaceman betssonInformação Toxicológica do Estado.
No Brasil, 1.186 mortes foram causadas por intoxicação por agrotóxicospaceman betsson2007 a 2014, segundo a coordenadora do Laboratóriospaceman betssonGeografia Agrária da USP, Larissa Bombardi.
A estimativa é que para cada registrospaceman betssonintoxicação existam outros 50 casos não notificados, afirma ela. A pesquisa da professora aponta ainda que 300 bebêsspaceman betssonzero a um anospaceman betssonidade sofreram intoxicação no mesmo período.
A Syngenta, fabricante do paraquat, não se manifestou sobre os casosspaceman betssonintoxicação e afirmou endossar o posicionamento da Andef.







