Como consegui fugiresporte tecnico combinatoriomosteiro onde vivi por 12 anos como freira enclausurada:esporte tecnico combinatorio

De longe, Luce — que cresceuesporte tecnico combinatoriouma típica família argentinaesporte tecnico combinatorioclasse médiaesporte tecnico combinatorioum bairro tradicional — vê a experiência que teve como resultadoesporte tecnico combinatoriouma confusão interna, da necessidadeesporte tecnico combinatorioencontrar uma vozesporte tecnico combinatoriomeio a uma família numerosa e do esmagador peso das influências do ambienteesporte tecnico combinatorioque circulava.

O idealismo, o desejoesporte tecnico combinatoriomudar o mundo e os conselhos errados que recebeuesporte tecnico combinatorioum guia espiritual a levaram a um caminho completamente errado paraesporte tecnico combinatoriovida.

Embora reconheça ter passado belos momentos ("Gostava do canto gregoriano, do estudo, do carinho das minhas companheiras"), a vida monástica foi marcada pela pequena mesquinhez do dia a diaesporte tecnico combinatorioconfinamento, pela hipocrisia, pelo sigilo e pelo acúmuloesporte tecnico combinatoriopreocupações triviais longe da vida espiritual que ela tanto ansiava quando entrou na instituição.

Mesmo assim, ela levou maisesporte tecnico combinatoriouma década para conseguir sair.

"É como quando estaresporte tecnico combinatorioum casamento ruim e não entender o porquê estáesporte tecnico combinatorioum culto", explica, refletindo sobre a própria experiência, que capturou no romance El Cantoesporte tecnico combinatoriolas Horas ("A Canção das Horas",esporte tecnico combinatoriotradução livre), inspirado nas experiências que teve.

De Nova Jersey, nos Estados Unidos, onde trabalha e mora com o marido e a filha, Luce conversou com a BBC News Mundo, o serviçoesporte tecnico combinatorioespanhol da BBC para a América Latina. A seguir, você confere um resumo da história que ela contaesporte tecnico combinatorioprimeira pessoa.

Eu cresciesporte tecnico combinatorioBuenos Airesesporte tecnico combinatoriouma famíliaesporte tecnico combinatorioclasse médiaesporte tecnico combinatoriocinco irmãos. Embora na minha infância fôssemos à missa, a religião estava ausenteesporte tecnico combinatorionossa casa.

Mas as aulas do Ensino Médio tinham um forte componente religioso. Foi nesse ambiente, e por meio dos meus amigos, que absorvi esse espírito. Aos 19 anos, comecei a pensar na minha vocação.

Já como estudanteesporte tecnico combinatorioagronomia na Universidade Católica, senti o "chamado". Foi repentino. Lembro-me perfeitamente do momentoesporte tecnico combinatorioque tive a sensaçãoesporte tecnico combinatorioque Deus me convocava. Era algo físico.

Nessa época, comecei a ter um conselheiro espiritual, um padre que me falava do mosteiro e dizia que eu era a pessoa ideal para aquele lugaresporte tecnico combinatoriovida contemplativa.

Quando pensoesporte tecnico combinatoriotudo isso agora, não concordo mais com aquilo tudo. Acho que aquele "chamado religioso" fazia parte dos meus delírios e questionamentos.

Digo sempre que isso me foi apresentadoesporte tecnico combinatoriofora para dentro, e nãoesporte tecnico combinatoriodentro para fora. Hojeesporte tecnico combinatoriodia, vejo como algo que encontrei e tentei aceitar, porque senti necessidadeesporte tecnico combinatoriosairesporte tecnico combinatoriocasa.

Assim como meus amigos —esporte tecnico combinatorioum ambiente tradicional e conservador — se casaram aos 20 anos por causa da necessidadeesporte tecnico combinatoriosair da casa dos pais, me foi apresentada a possibilidadeesporte tecnico combinatorioir para um mosteiro.

Embora não existissem grandes conflitos na minha família, havia muita gente na minha casa, muito barulho, e eu precisava encontrar um espaço próprio.

Foi um erro, um impulso. Eu era muito idealista e precisava encontrar algo transcendental, queria fazer algo pelo mundo. Poderia ter idoesporte tecnico combinatoriomissão para outros lugares se meu conselheiro espiritual tivesse sugerido. Mas ele me guiou até aquele mosteiro contemplativo.

A decisão

Tirando meus pais, nunca ninguém me disse que aquilo não era algo para mim. Quando lhes contei da minha decisão, eles reagiram mal, não conseguiram entender. Meus irmãos me disseram que eu era louca.

À época, antesesporte tecnico combinatorioentrar na clausura, eu tinha muitos amigos, era uma pessoa sociável, atleta, tinha namorado, ia dançar...

Porém, quando fui falar com a abadessa do mosteiro, não penseiesporte tecnico combinatoriomais nada. Fiquei fanática e decidi entrar.

Eles me aceitaramesporte tecnico combinatorioimediato, nunca me disseram para esperar, pensar direito, terminar a faculdade primeiro. Nem questionaram minha fé frágil.

E quando me contaram sobre a vida monástica, tudo parecia perfeito.

As regras

Ao entrar no mosteiro, você corta o vínculo com o mundo exterior. Peguei uma bolsa com roupas bem simples. Não se pode levar livros, rádio ou qualquer coisa pessoal.

Fui encaminhada para uma jovem, que me mostrou o lugar e explicou as rotinas e as regras — porque você entraesporte tecnico combinatorioum mundo onde terá que obedecer muitas regras.

A do silêncio, por exemplo: enquanto cozinha, limpa ou vai à aula, não pode falar nada. Há apenas um recesso onde é possível conversar livremente.

Você se levanta antes do amanhecer e o dia é marcado por orações litúrgicas — que na vida contemplativa são cantadasesporte tecnico combinatorioconjunto —, meditação, estudo, trabalho e mais orações.

Você ora pela família ou pelos conflitos que eles indicam a você. Hojeesporte tecnico combinatoriodia, por exemplo, um dos motivos das preces sem dúvida seria a guerra na Ucrânia.

A abadessa é quem decide tudo. Ela recebia o jornal todos os dias, recortava as páginas que consideravaesporte tecnico combinatoriointeresse geral e as deixavaesporte tecnico combinatoriouma sala onde todas podíamos ler.

Todas as informações eram filtradas e censuradas. Não havia acesso a outras notícias: a fonte era a superiora ou o que a família dizia se porventura viesse vê-la,esporte tecnico combinatoriovisitas cada vez mais espaçadas.

A ideia era que todas essas atividades a levassem a um estadoesporte tecnico combinatoriomeditação e adoração a Deus.

Mundo mesquinho

Eu me afeiçoei muito às irmãs que estavam lá. Eram pessoas que se tornaram uma família para mim.

Mas, pensando bem, agora vejo que havia muito conflito ali. Era um ambiente extremamente fechado com muitas regras a respeitar — mas que também eram constantemente quebradas.

O que se esperaesporte tecnico combinatoriovocê é que alcance a pureza espiritual, que se entregue a Deus. Mas é uma meta tão alta que poucas conseguem alcançá-la, e dá pra ver que há muita gente que não deveria estar ali.

Você descobre que, na realidade, vive num mundoesporte tecnico combinatorioinveja e competição, onde há grupos e pessoas que querem mandar, como se estivéssemos numa empresa.

Trata-seesporte tecnico combinatoriouma organização vertical onde a madre superiora é a guia espiritualesporte tecnico combinatoriocada uma das outras mulheres. Ela é a única com quem você tem permissãoesporte tecnico combinatoriofalar sobre os conflitos — e muitas vezes ela mesma está no centro deles. Aos poucos, você começa a se sentir atraída e a competir por afetos e favores que só ela pode oferecer.

A mesma coisa acontece com os outras oportunidades que aparecem vez ou outra, por meio das demais freiras.

São gerados laços que não são nada saudáveis. Você começa a viver por isso, para que essas pessoas prestem atençãoesporte tecnico combinatoriovocê. Aos poucos, é como se deixássemosesporte tecnico combinatorioviver para Deus e passássemos a viver para a madre superiora.

Em relação ao desejo físico, cada uma viviaesporte tecnico combinatoriouma maneira diferente e encontrava formasesporte tecnico combinatoriosublimá-lo. Mas tudo isso era deslocado para a parte psicológica — e por isso persistia aquele desejoesporte tecnico combinatorioque a superiora ou outra freira olhasse ou prestasse atençãoesporte tecnico combinatoriovocê.

Tudo isso foi a causaesporte tecnico combinatoriomuitos transtornos mentais que se traduziamesporte tecnico combinatoriosintomas físicos. Eu vi garotas com muita doresporte tecnico combinatoriocabeça, que foram medicadas.

Muitas irmãs sofriamesporte tecnico combinatorioproblemas estomacais e dores. Quando um médico as examinava, nunca encontravam nada.

Ao meu ver, tudo tinha a ver com o confinamento. Éramos um grupoesporte tecnico combinatoriomulheres trancadas sempre no mesmo lugar, sem distrações, onde se via cada pequeno problema amplificado com uma lupa.

Quando se estáesporte tecnico combinatoriosilêncio e não se pode falar, você fica presa pensando nas pequenas coisasesporte tecnico combinatoriovezesporte tecnico combinatoriose concentrar no transcendental.

Além disso, não nos exercitávamos.

Era possível ver muitas jovens confusas. Aquele ambiente era mental e emocionalmente muito desgastante, e isso me fez começar a questionar o que eu realmente estava fazendo lá.

As dúvidas

Comecei a questionar se tinha ou não vocação religiosa desde o primeiro ano. Mas, no início, gostava da vida comunitária. Além disso, adorava o estudo e a música.

Mas eu tinha crises vocacionais muito regulares e a abadessa sempre me dizia que isso acontecia com todas, que era apenas algo passageiro, que eu havia me adaptado muito bem e tinha uma verdadeira vocação.

Fui vê-la algumas vezes. Tinha vontadeesporte tecnico combinatoriochorar, mas sempre me segurava. Sinceramente, não acho que houve má intenção, mas acho que ela estava tentando fazer com que as garotas que tinham uma certa formação intelectual ficassem. Ela nos colocou "sob a asa" e nos favoreceu, porque pensou que poderia nos moldar para o futuro.

Como eu sabia dirigir, a abadessa me levava para ver a mãe dela, ir almoçar, tomar chá, fazer compras... Todas as coisas que eu não podia fazer por conta própria e sobre as quais não devia falar nada.

No começo, eu gostavaesporte tecnico combinatoriotudo isso. Mas foi justamente isso o que causou a crise.

A crise

Chegou um momentoesporte tecnico combinatorioque percebi que, embora você entre pensando que vai se transformar e ajudar a mudar o mundo, a vida ali envolve cuidaresporte tecnico combinatoriocoisas muito pequenas.

Rezei bastante, mas, no final das contas, o mais importante eram outras coisas — como estar bem com as outras pessoas dali, que podiam gostaresporte tecnico combinatoriomim e acabavam me colocando numa tarefa melhor do que lavar os banheiros.

É algo paradoxal, porqueesporte tecnico combinatoriovezesporte tecnico combinatorioesqueceresporte tecnico combinatoriosi mesmo e pensaresporte tecnico combinatorioDeus, você acaba olhando para o próprio umbigo.

Mas o gatilho foi uma viagem que fiz a um mosteiro na França, onde fui enviada para ajudar. A distância me permitiu ver as coisasesporte tecnico combinatoriooutra perspectiva.

Quando voltei, senti que tinha sido deslocada (algo que eu deveria aceitar porque era a vontadeesporte tecnico combinatorioDeus) e, para acabaresporte tecnico combinatoriovez com a situação, minha avó morreu.

Eu tinha uma relação muito próxima com ela, e a direção do mosteiro não permitiu que eu fosse ao seu funeral, embora eu tivesse permissão para ir tomar chá com a mãe da abadessa.

Isso me ajudou a ver tudo com mais clareza e comecei a questionar ainda mais a minha vocação. O mais grave foi que percebi que estava ficando doente e com a saúde mental abalada.

Então, depoisesporte tecnico combinatorio12 anos, consegui tomar a decisão.

A fuga

Tentei muitas vezes sair, mas a superiora sempre me convencia a ficar. Por isso, pareiesporte tecnico combinatoriofalar com ela e, um dia quando ela estava fora, deixei uma carta na mesaesporte tecnico combinatorioque explicava que ia embora porque não podia seguir por outro caminho.

Peguei minhas coisas e, sem dizer nada a ninguém, pedi que abrissem a porta para mim.

Não considero a minha decisão como uma fuga. Era a única maneiraesporte tecnico combinatorioter 100%esporte tecnico combinatoriocertezaesporte tecnico combinatorioque poderia sair dessa escravidão psicológica e afetiva. Mas soube que depois, no mosteiro, fui duramente criticada por isso.

Saí sem planejar, mas sabia que precisava deixar o local e que teria o apoio da minha família.

Chegaresporte tecnico combinatoriocasa resultouesporte tecnico combinatorioum encontro emocionante. Muitos anos se passaram e eles não tinham noção dos meus conflitos internos. Conversamos, choramos e minha família ficou feliz.

Uma nova vida

Quando saí, estava pálida, quase transparenteesporte tecnico combinatoriotão magra. Estava comendo muito pouco, consumida pela angústia. Demorou semanas para me reconstruir fisicamente.

Aos poucos, comecei a estudar, consegui um emprego, fui morar no centro, conheci o meu marido, que é americano, e o resto é história.

A terapia me ajudou a sair dessa, assim como o apoio da família e dos amigos. Tive muita sorte.

Ao retornar ao mundo real, minha mente voltou praticamente para onde estava antesesporte tecnico combinatorioeu entrar. Eu estava curiosa sobre tudo.

Me adaptei com facilidade, era como se fosse um peixe voltando à água.

O que me custou foi questionar por que fiquei presa tantos anos. Isso ainda é uma grande pergunta para mim.

Gostava da vidaesporte tecnico combinatoriocomunidade,esporte tecnico combinatorioter tempo para estudar e ler, mas acho que a maior força foi a influência da abadessa, uma mulher carismática e com muito poder sobre todos.

É como quando você se pergunta por que as pessoas permanecemesporte tecnico combinatorioum culto ou por que alguns insistemesporte tecnico combinatorioum casamento disfuncional.

Não considero um erro ter entrado no mosteiro, porque foi uma experiência muito rica. Mas me arrependoesporte tecnico combinatorioter ficado tanto tempo por lá.

A minha experiência não me fez perder a féesporte tecnico combinatorioDeus ou na vida espiritual, mas agora a encontro muito mais nos textos literários, ou ao ouvir um concerto. Não percebo mais o mesmo na instituição da Igreja, cujas contradições, hipocrisias e mandatos ainda me provocam uma grande rejeição.

Aconselharia a quem pensa iniciar uma vida monástica a não tomar decisões abruptas, a ter antes outras experiências e a não desistiresporte tecnico combinatoriouma carreira.

Aos sacerdotes, que são guias espirituais, pediria que não convençam imediatamente as jovens a entrar no mosteiro. Peça que elas esperem um pouco. No momentoesporte tecnico combinatorioque estão vulneráveis, elas acreditam 100% que a palavraesporte tecnico combinatorioum líder religioso é sempre a palavraesporte tecnico combinatorioDeus.

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