Lula e Getúlio Vargas: semelhanças e diferenças entre os dois únicos presidentes que foram e voltaram ao poder na história do Brasil:dafabet cadastrar

Crédito, Palácio do Planalto
Essa característica que une ambos — o fatodafabet cadastrarter reassumido o posto depoisdafabet cadastrarum período sem função executiva — por muito pouco também não foi vivenciada por Francisco Rodrigues Alves (1848-1919). Presidente do Brasil entre 1902 e 1905, ele foi eleito novamentedafabet cadastrar1918. Contudo, pelo fatodafabet cadastrarter contraído a gripe espanhola, ele se viu impossibilitadodafabet cadastrarassumir o cargo. Morreudafabet cadastrarjaneirodafabet cadastrar1919.
A convite da BBC News Brasil, especialistas comentam as diferenças e semelhanças entre ambos os políticos, separados por décadas.
'Lula deve estar atento à reação conservadora'
Autordafabet cadastrartrês livros que, emdafabet cadastrartotalidade, compreendem uma completa biografiadafabet cadastrarVargas, o jornalista e escritor Lira Neto reconhece que tanto ele quanto Lula compartilham característicasdafabet cadastrarcomum, sobretudo o "imenso carisma" e a "popularidade", além da "marcante força eleitoral junto às classes médias e camadas populares".

"Não há precedentes, na história brasileira,dafabet cadastrarlíderes que tenham desfrutadodafabet cadastrartamanha empatia com as massas", afirma ele. "Ambos estabeleceram a questão social como prioridadedafabet cadastrarseus respectivos governos, ao mesmo tempodafabet cadastrarque articularam alianças pragmáticas com diferentes segmentos da população, incluindo desde o operariado até o patronato. Lula, a exemplodafabet cadastrarVargas, sempre defendeu que,dafabet cadastrarum paísdafabet cadastrardesigualdades tão abissais como o Brasil, o Estado não pode se eximirdafabet cadastrarseu papel como indutor do desenvolvimento econômico."
Lira Neto ressalta também que ambos "foram alvosdafabet cadastrarfortes tentativasdafabet cadastrardesconstrução política e moral". Segundo o biógrafo, isso se deu a partirdafabet cadastrarum "discurso seletivo dos adversários contra a corrupção" e a partir da "fantasmagoriadafabet cadastrarum suposto 'perigo vermelho'."
Mas, na visão do jornalista, nem tudo são semelhanças entre os políticos. Por um lado, Vargas é fruto do "seio das oligarquias gaúchas" e tevedafabet cadastrarformação "acadêmica e política no positivismo do movimento republicano,dafabet cadastrarmatriz autocrática e elitista". Além disso, como lembra o biógrafo, ele chegou ao poder, originalmente, "por meiodafabet cadastrarum movimento civil e militar, a chamada Revoluçãodafabet cadastrar30", sendo que governou "ditatorialmente até 1945, com exceção do pequeno interregno constitucional entre 1934 e 1937".

Crédito, Getty Images
"Lula nasceudafabet cadastrarfamília nordestina pobre, formou-se politicamente no meio sindical e chegou à Presidência pelo voto, seguindo e respeitando os ritos democráticos ao longo dos oito anosdafabet cadastrarque passou no Planalto", compara Lira Neto.
Enquanto muitos classificam o segundo mandatodafabet cadastrarVargas como pior que o primeiro — e usam desse argumento para desqualificar,dafabet cadastrarantemão, a voltadafabet cadastrarLula —, Lira Neto não concorda. "Penso exatamente o contrário", enfatiza. "Creio que o segundo governodafabet cadastrarGetúlio, entre 1951 e 1954, consolidou,dafabet cadastrarforma eficaz e democrática, todas as iniciativasdafabet cadastrarprol do desenvolvimento do país forjadas no período anterior, ditatorial, no Estado Novo."
"No contexto da Guerra Fria,dafabet cadastrarpolítica nacionalista e independente da tutela americana atraiu a ira dos conservadores, daí a perversa campanha desencadeada pelos adversários, [o políticodafabet cadastraroposição a ele] Carlos Lacerda [1914-1977] à frente, que resultou na trágica crise que o levaria à morte", analisa o biógrafo.
Na opinião do escritor, "Lula deve estar atento à reação conservadora que, por certo, enfrentará". "A extrema-direita, embora tendo sido derrotada, estará à espreita, com seus golpes baixos, incluindo o apelo ao moralismo seletivo".
'Adesão por afeto'
O historiador Carlos Fico, pro fessor da Universidade Federal do Riodafabet cadastrarJaneiro (UFRJ), lembra que, com a eleição deste ano, Lula é o "primeiro presidente eleito pelo voto direto três vezes" da história do Brasil. Nesse sentido, fazer um paralelo com Vargas significa compará-lo a um presidente que só foi eleito "dessa maneira uma vez".
Nesse sentido, para ele, "as duas situações são diferentes".
"A única semelhança que vejo é a seguinte: ambos se beneficiaram da 'adesão por afeto', quando partedafabet cadastrarseus apoiadores permanece política e eleitoralmente fiel independentemente do que façam os líderes", ressalta. "Getúlio Vargas e Lula conquistaram esse tipodafabet cadastrarapoio por causa do fascínio que exercem e, sobretudo,dafabet cadastrarfunção impacto da legislação social e trabalhista do primeiro e do programa Bolsa Família [de redistribuiçãodafabet cadastrarrenda mínima] do segundo."
Na visão do historiador, é impossível comparar o "segundo mandato"dafabet cadastrarVargas com o mandato que Lula terá a partir do ano que vem. Isso porque o primeiro acabou acumulando uma sucessãodafabet cadastrargovernos diferentes, do Provisório dos primeiros quatro anos e da presidência indicada pela Constituinte dos anos seguintes à ditadura do Estado Novo e à eleição pelo voto diretodafabet cadastrar1950.
Como lembra Fico, o governo Vargas dos anos 1950 "foi marcado por crescente inflação, greves, crises políticas e militares". "Mas o presidente conseguiu [nesse período] criar a Petrobras e o BNDE. Discutiu-se muito o nacionalismo econômico e a abertura ao capital estrangeiro. A oposição da UDN foi muito forte. O contexto internacional era o da Guerra Fria. O atentado contra Lacerda levaria ao suicídio [de Vargas]", frisa o historiador. "Não vejo nada nesse período que permita estabelecer correlações com o terceiro mandatodafabet cadastrarLula."

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'Lula é um negociador'
Professor na Escola Superiordafabet cadastrarPropaganda e Marketing (ESPM), o cientista político, filósofo e sociólogo Paulo Niccoli Ramirez ressalta a coincidência históricadafabet cadastrarque tanto Lula quanto Vargas são expoentes do chamado "desenvolvimentismo". "Os dois defendem uma maior intervenção do Estado nas políticasdafabet cadastrarbem-estar social, ou seja, saúde, educação, moradia, relaçõesdafabet cadastrartrabalho…", enumera. "Também têm um amplo projeto econômicodafabet cadastrardesenvolvimento, isto é um aspectodafabet cadastrarcomum."
Mas, na visãodafabet cadastrarRamirez, é preciso enfatizar a diferença grande entre ambos, principalmente pelo fatodafabet cadastrarque Vargas,dafabet cadastrarseu primeiro governo, foi líderdafabet cadastraruma ditadura, "em que havia pouca margem para liberdadedafabet cadastrarexpressão e perseguição a partidosdafabet cadastraresquerda". "Lula, pordafabet cadastrarvez, foi eleito pelas vias democráticas, com consenso populardafabet cadastrartornodafabet cadastrarsua pessoa", recorda.
Contudo, na visão do pesquisador, há uma característica que os une. "Eles são considerados populistas, ou seja, atraíram um grande contingentedafabet cadastrarapoiadores. São líderes carismáticos capazesdafabet cadastrarsensibilizar a população mais pobre no processo eleitoral", ressalta.
Segundo Ramirez, a diferença nesse movimento é que o segundo governodafabet cadastrarVargas foi "marcado por um amplo níveldafabet cadastraroposição", principalmente "pelas elites econômicas". "E isso é diferentedafabet cadastrarLula agora, quando grandes banqueiros e grandes industriais o estão apoiando. Ele tem uma margemdafabet cadastrarapoio muito maior do que aquela que Vargas tinha na décadadafabet cadastrar1950", compara.

Crédito, Tomaz Silva/Agência Brasil
O professor salienta que a forte oposição, inclusive da mídia, sofrida por Vargasdafabet cadastrarseu segundo mandato fez com que o período fosse marcado por "forte instabilidade". "Isto acabou presente até emdafabet cadastrarcartadafabet cadastrardespedida,dafabet cadastrarsuicídio, quando ele disse que 'forças ocultas' o pressionavam", comenta. "Mas, no casodafabet cadastrarLula, há um cenário diferente. Ele tem amplo apoiodafabet cadastrarempresários, movimentos sociais… Então, provavelmente terá um governo mais tranquilo. Conseguiu uma basedafabet cadastrarapoio partidário, permitiu uma aliança inclusive com [o ex-tucano histórico] Geraldo Alckmin [seu vice-presidente], uma figura conservadora e representativa dos interesses do grande capital."
"Vargas não conseguiu promover uma ampla negociação com opositores da direita brasileira e parte da imprensa, inclusive do Lacerda", diz. "Lula, ao que me parece, vai pela via oposta, se apresentando como negociador, capazdafabet cadastrarpromover alianças com grupos conservadores do grande capital. Esse parece ter sido o grande aprendizado do populismo brasileiro: não se governa por si só, somente com o apoio do povo, mas principalmente é preciso ter apoio dos grandes do setor econômico."
'Grandes estadistas'
"Desde 2002, as campanhasdafabet cadastrarLula sempre tentaram relacioná-lo à figuradafabet cadastrarGetúlio Vargas", analisa o historiador e sociólogo Wesley Espinosa Santana, professor na Universidade Presbiteriana Mackenzie.
"Porém, como historiador, não consigo fazer uma comparação diacrônica,dafabet cadastrardois tempos diferentes, sem marcar a ideiadafabet cadastrarque a história não é cíclica. Ela aparentemente traz alguns elementos que podem ser repetidos, mas com outro panodafabet cadastrarfundo, outro contexto histórico", argumenta ele.
Nesse sentido, Santana ressalta que, embora tanto Lula quanto Vargas tenham sido "grandes estadistas", é preciso ressaltar que o presidente do Estado Novo foi "autoritário, ditador". "Mas foi um grande estadista, porque criou o Estado brasileiro. Ao mesmo tempo, ficou à mercê dos interesses internacionais", pondera. "Vargas fez os direitos sociais, mas ligados aos interesses do desenvolvimento e da consolidação do capitalismo industrial."

Crédito, Reuters
"Não acredito que nenhum governo se repita, e o segundo governodafabet cadastrarLula não será tão ruim como o segundo governodafabet cadastrarde Getúlio Vargas. Não vejo dessa forma", avalia. "Lula fez um bom primeiro governo até quando houve o escândalo do Mensalão. Mais tarde, ele foi preso e as razõesdafabet cadastrarsua prisão são discutidas ainda hoje, justamente por contadafabet cadastrarum funcionário público, o então juiz Sergio Moro, ter sido parcialdafabet cadastrarseu trabalho, extrapolando suas funções. Ele investigou e julgou, o que é bem complicado, depois virou ministro do concorrente [do PT], o que é um problema ético já consolidado. Fora as questões jurídicas que estão vindo pela frente."
Para Santana, contudo, o que se vê hoje é "um estadodafabet cadastrarexceção na política das narrativas, das fake news". "É um climadafabet cadastrarguerra", frisa, deixando claro que isso pode tumultuar um futuro governo.
"Se o próximo governo Lula vai ser pior ou melhor do que os anteriores, é muito difícil falar. A situação vai estar difícil, crítica, tanto no cenário político quanto no externo", acredita.
- Texto originalmente publicadodafabet cadastrarhttp://roberthost1.accountsupport.com/brasil-63087984
