'Oportunidade' ou 'ação indefensável'? Intervenção federal divide ex-secretáriosbetnacional casa de apostasegurança do Rio:betnacional casa de aposta

  • Julia Dias Carneiro
  • Da BBC Brasil no Riobetnacional casa de apostaJaneiro
Militares participambetnacional casa de apostaoperaçãobetnacional casa de apostaSão Gonçalo, região metropolitana do Rio

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Militares participambetnacional casa de apostaoperaçãobetnacional casa de apostaSão Gonçalo, região metropolitana do Rio; trêsbetnacional casa de apostaquatro ex-secretáriosbetnacional casa de apostasegurança do Rio apontaram para caráter paliativo da medida

betnacional casa de aposta Mesmo quem já carregou a responsabilidadebetnacional casa de apostagerir a Segurança Pública no Rio se dividebetnacional casa de apostaforma diametralmente oposta perante a intervenção federal no Estado.

A BBC Brasil ouviu quatro ex-secretários, que estiveram à frente da pasta estadualbetnacional casa de aposta2002 para cá. Dois deles são terminantemente contra a medida, enquanto outros dois a veem como "necessária" diante da escaladabetnacional casa de apostaviolência. Três dos quatro, entretanto, consideram que a medida não ajudará a resolver o problemabetnacional casa de apostasegurança no Rio no longo prazo, tendo efeitos meramente paliativos.

Os ex-secretários divergem entre ver na ação uma "oportunidade" para "reestruturar a segurança e partir para cima da criminalidade", na opinião do ex-deputado federal Marcelo Itagiba; oubetnacional casa de apostaconsiderar a ação "inconstitucional" e "incompatível" com a garantiabetnacional casa de apostadireitos e a proteção à cidadania que devem ser intrínsecos a uma políticabetnacional casa de apostasegurança pública, na perspectiva do sociólogo Luiz Eduardo Soares.

O cargobetnacional casa de apostainterventor, entregue pelo governo federal ao General Walter Braga Netto, líder do Comando Militar do Leste (CML), se sobrepôs aobetnacional casa de apostasecretáriobetnacional casa de apostaSegurança Pública do Rio. Sua nomeação levou à exoneraçãobetnacional casa de apostaRoberto Sá, que ocupava a pasta desde 2016, após a saídabetnacional casa de apostaJosé Mariano Beltrame - o mais longevo no cargo, à frente da pasta entre 2007 e 2016. Procurado pela BBC Brasil, Beltrame não quis conceder entrevista.

O que representa e que mudanças podem trazer a figurabetnacional casa de apostaum "interventor" militar, pairando sobre o poder civil desempenhado pelo gestor da Secretariabetnacional casa de apostaEstadobetnacional casa de apostaSegurança (Seseg), e com responsabilidade sobre as forçasbetnacional casa de apostapolícia estaduais, federais e militares?

Para Marcelo Itagiba, delegado aposentado da Polícia Federal, a natureza do cargo lhe dá um poder maior do que tiveram os secretários - o que pode se traduzirbetnacional casa de apostamaior liberdadebetnacional casa de apostaação.

"Acho que ele tem uma independência para poder gerir a máquina da segurança pública sem as ingerências políticas que podem prejudicar seu trabalho", diz Itagiba, que foi secretário durante parte do governo Rosinha Garotinho, entre 2004 e 2006, e deixou o cargo para se candidatar a deputado federal (na legislaturabetnacional casa de aposta2007 a 2011).

Por não estar vinculado a partidos, ter sido nomeado por um decreto presidencial e estar descolado das forças políticas que compõem a base ou a oposição política ao governo estadual, o interventor seria muito menos poroso a pressões dos caciques locais por nomeações e cargos.

"Na condiçãobetnacional casa de apostainterventor, ele vai ter muito mais liberdade para agir e condiçõesbetnacional casa de apostase articular melhor com as Forças Armadas no combate à criminalidade", opina Itagiba.

Marcelo Itagiba, delegado aposentado da Polícia Federal
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Marcelo Itagiba: 'Acho que ele (o general Walter Braga Netto) tem uma independência para poder gerir a máquina da segurança pública sem as ingerências políticas que podem prejudicar seu trabalho' | Foto: Câmara dos Deputados

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Para Roberto Aguiar, entretanto, que comandou a pasta durante nove meses, no breve governobetnacional casa de apostaBenedita da Silva, o interventor não tem condiçõesbetnacional casa de apostapromover mudanças estruturais, sendo partebetnacional casa de apostaum "espetáculo" criado pelo presidente Michel Temer.

"Ele (General Braga Netto) foi colocado nesse grande esquema e vai tentar apresentar alguns atos espetaculosos, mas não vai ter condiçõesbetnacional casa de apostaimplementar mudanças. Porque não há um grande processobetnacional casa de apostareflexão por trás da intervenção, buscando soluções para além das ações já corriqueiras da polícia", considera.

Para Aguiar, que foi secretáriobetnacional casa de apostaSegurança Pública tambémbetnacional casa de apostaBrasília, alémbetnacional casa de apostareitor e professor da Universidadebetnacional casa de apostaBrasília (UNB), a intervenção é uma manobra políticabetnacional casa de apostaTemer diante da "impossibilidade"betnacional casa de apostaaprovar a Reforma da Previdência. Assim, o presidente optou por promover uma "substituiçãobetnacional casa de apostaprioridades", na qual colocou a pauta da segurança nos holofotes da agenda governamental.

"Com isso, implementaram uma medida que traz grandes indefinições. Não se sabe como vai ser aplicada, quais são os limites, quem vai aplicar", afirma Aguiar. "Comandos abstratos não funcionam. Comandos precisam ser operacionais."

'Improviso'

Para Luiz Eduardo Soares, não há como avaliar eventuais benefíciosbetnacional casa de apostauma medida que já nasce "indefensável". Para ele, a intervenção tem uma sériebetnacional casa de apostacontradições internas e foi lançadabetnacional casa de apostamaneira improvisada, sem um planobetnacional casa de apostaação concreto e desconsiderando experiências pregressasbetnacional casa de apostaações militares que "não trouxeram resultados".

Soares foi subsecretáriobetnacional casa de apostaSegurança Pública durante o governo Anthony Garotinho, entre 1999 e 2000, ocupando à época o cargobetnacional casa de apostaCoordenadorbetnacional casa de apostaSegurança, Justiça e Cidadania, e secretário nacionalbetnacional casa de apostasegurança pública no início do governo Lula,betnacional casa de aposta2003. Ele diz que a adoçãobetnacional casa de apostaoperações urbanas com as Forças Armadas, autorizados por decretosbetnacional casa de apostaGarantiabetnacional casa de apostaLei e da Ordem (GLOs), deixaram claro que uma "ocupação militar" não resolve os problemasbetnacional casa de apostasegurança do Rio.

"Sempre que as tropas se retiraram dos territórios, os problemas retornaram, até com intensidade maior", diz o sociólogo, reverberando as palavras do próprio ministro Wellington Moreira Franco (Secretaria-Geral), quebetnacional casa de apostaentrevista à Folhabetnacional casa de apostaS. Paulo nesta semana admitiu que as GLOs não tiveram resultado - defendendo, portanto, a ampliação da ação com a intervenção federal.

Militares e um tanque próximo a casas no Rio

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Com intervenção federal na segurança do Rio, Comando Militar do Leste passa a ter responsabilidade sobre as forçasbetnacional casa de apostapolícia estaduais

Para Soares, a decisão ignora a resistênciabetnacional casa de apostacomandantes do próprio Exército às experiências com GLOs, temerosos não apenas pelo eventual desgaste da imagem das Forças Armadas no casobetnacional casa de apostaações resultarembetnacional casa de apostaferimentos ou mortesbetnacional casa de apostacivis, como também pela exposição dos soldados a riscos físicos e a um possível envolvimento das tropas com práticasbetnacional casa de apostacorrupção.

"O combate ao crime organizado exige investigações, inteligência, um longo trabalhobetnacional casa de apostaamadurecimento. Isso não está no horizonte da intervenção, que é federal, masbetnacional casa de apostanatureza militar. Seu comandante supremo tem função definida como estritamente militar", afirma, considerando que isso gera incoerências, por exemplo, com a Polícia Civil, a quem cabem as investigações.

"O fatobetnacional casa de apostaque a polícia que investiga seja civil tem significado. O universo civil exige organização, hierarquia, mas pressupõe autonomiabetnacional casa de apostaseus membros e a possiblidadebetnacional casa de apostadissenso, inclusive nos trabalhos investigativos. E isso não existe na ordem militar."

'Um passinho'

O delegado federal aposentado Roberto Precioso Júnior, sucessorbetnacional casa de apostaMarcelo Itagiba na secretaria no período final do governobetnacional casa de apostaRosinha Garotinho,betnacional casa de aposta2006, considera a intervenção "válida" diante da deterioração da situaçãobetnacional casa de apostasegurança no Rio.

"Acho que é um passinho. Qualquer iniciativa para melhorar e sair dessa situação que estamos vivenciando é válida. Deve melhorar alguma coisa. Mas resolver, não vai. É paliativo."

Para Precioso, diante do problemabetnacional casa de apostaviolência "que vem se arrastando no Rio há décadas", são necessárias mudanças radicais para "transformar" o sistemabetnacional casa de apostasegurança no Estado e responder a uma situação que só se torna mais desafiadora. Ele insiste na necessidadebetnacional casa de apostamudanças estruturais no sistemabetnacional casa de apostasegurança desde 2006, quando estava na secretaria.

"O que o governo não conseguiu fazer, o PCC (Primeiro Comando da Capital) está fazendo agora. Eles se coordenaram, se organizaram e conseguiram criar uma política nacional, até internacional, atuando no Brasil e na América Latina. Cresceram e assumiram o papel que o sistemabetnacional casa de apostasegurança não conseguiu assumir."

Roberto Aguiar, que foi secretáriobetnacional casa de apostaSegurança do Rio por nove meses
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Roberto Aguiar, secretáriobetnacional casa de apostaSegurança do Rio por nove meses, destaca a importânciabetnacional casa de apostamudanças estruturais que possam ir alémbetnacional casa de apostaaçõesbetnacional casa de apostapolícia | Foto: Arquivo pessoal

Como vantagem da intervenção, ele considera que o general Walter Braga Netto terá mais condiçõesbetnacional casa de apostacoordenar as diferentes forçasbetnacional casa de apostasegurançabetnacional casa de apostacomparação a um secretário estadual, já que centralizará o comandobetnacional casa de apostatodas as forças repressivas. "Isso começa a corrigir ao menos uma deficiência crônica do sistema" - a faltabetnacional casa de apostaintegração e sinergia entre as corporações.

No ano passado, por exemplo, quando as Forças Armadas começaram a reforçar a segurança no Rio, as ações foram marcadas por desencontros na comunicação. Além disso, a estrutura policial dividida entre a Polícia Militar, responsável pelo policiamento ostensivo, e a Polícia Civil, pelas investigações, são um desafiobetnacional casa de apostalonga data para um sistemabetnacional casa de apostasegurança integrado.

A saída, no entanto, não será uma panaceia, prevê Precioso. "Temos que batalhar sistematicamente ao longobetnacional casa de apostaduas ou três gerações para ver alguma melhorabetnacional casa de apostatermosbetnacional casa de apostacriminalidade. Mas, pelo menos estão procurando fazer alguma coisa, e tomaram uma medida radical, o que era necessário."

'Bandido precisa sentir a mão pesada do Estado'

Em contraste com a reticência dos outros ex-colegas, Marcelo Itagiba considera que a intervenção federal era necessária e "foi aquém do que deveria ser", defendendo que o efeito da medida se estendesse às outras áreas da administração do Rio.

"O que levou a essa situação não foi a segurança públicabetnacional casa de apostasi, mas a estrutura governamental como um todo. Você tem um ex-governador preso e condenado (Sérgio Cabral), e um governador (Luiz Fernando Pezão) investigado. Essa estrutura corroída do Estado nos leva a essa necessidadebetnacional casa de apostaintervenção. Deveria ter sido completa. Vamos botar o Riobetnacional casa de apostaordem", diz.

Delegado federal aposentado e atualmente suplentebetnacional casa de apostadeputado federal pelo PSDB, Itagiba considera que a primeira providência da intervenção precisa ser dar os meios e condiçõesbetnacional casa de apostatrabalho para as forçasbetnacional casa de apostasegurança - que vêm sofrendo após um longo períodobetnacional casa de apostacortesbetnacional casa de apostarecursos, com salários atrasados, viaturas sucateadas e delegacias "abandonadas".

Itagiba afirma que a intervenção é uma "oportunidade"betnacional casa de apostaadotar uma medida que sempre defendeu e buscou implementar: a criaçãobetnacional casa de apostauma força-tarefa reunindo agentes destacados da Justiça, do Ministério Público, além das polícias Federal, Rodoviária Federal, Civil, Militar e das Forças Armadas.

Mãe dá banho no filho na rua, pertobetnacional casa de apostaum militar armado

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Especialistas debatem bordão sobre a segurança no Rio que diz não ser possível fazer um omelete sem quebrar ovos - o que indica os custos humanos da cruzada do Estado contra o crime

Perguntado sobre o temorbetnacional casa de apostaque a açãobetnacional casa de apostamilitares exponha moradoresbetnacional casa de apostafavelas do Rio a mais violência, Itagiba afirma que as operações devem ser feitas por grupos especialmente treinados para que não haja "efeitos colaterais".

"Intervenções cirúrgicas. Vai lá, extirpa o câncer e vamos embora", descreve. "Claro que a cidade está preocupada com a vida das pessoas, eu também estou. Mas não podemos permitir que essas comunidades estejam submetidas a pessoas armadasbetnacional casa de apostafuzil", diz.

"Você não faz um omelete sem quebrar os ovos. O bandido precisa sentir que existe uma mão pesada do Estado. Ele não pode acuar a sociedade e o Estado. Ele tem que temer a polícia, e não a sociedade temer sairbetnacional casa de apostacasa com medobetnacional casa de apostaser assaltada e morta", afirma.

Fins e meios

A afirmaçãobetnacional casa de apostaque não se faz um omelete sem quebrar os ovos tem sido recorrente para justificar as mais diversas medidas na gestão da segurança pública do Rio ao longo das últimas décadas, diz o sociólogo Luiz Eduardo Soares. Com a intervenção federal, ele teme que a ideia volte a ganhar força ou mesmo venha a ser naturalizada.

"A ideiabetnacional casa de apostaque, para o fim visado, você pode instrumentalizar a vida humana, sacrificar vidas, é absolutamente inconstitucional e autoritária. Mas agora virou bandeira explícita. Por todos os cantos, há gente saindo do armário. Sabemos quem paga esse preço", diz, referindo-se aos moradores das áreas mais pobres do Rio. "Estamos normalizando o desprezo à dignidade."

O sociólogo Luiz Eduardo Soares
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'A ideiabetnacional casa de apostaque, para o fim visado, você pode instrumentalizar a vida humana, sacrificar vidas, é absolutamente inconstitucional e autoritária', diz Luiz Eduardo Soares | Foto: Divulgação

Tanto Soares quanto Roberto Aguiar ressaltam que há uma incompatibilidade da missão das Forças Armadas com as atribuiçõesbetnacional casa de apostapoliciamento urbano.

"A missão das Forças Armadas é a defesa do país, do território nacional, e não a vigilância da cidade. A formação e o treinamento são completamente diferentes", frisa Aguiar. "Sinto que estamos vendo mais uma ilusão ser vendida. E com uma ilusão, temos uma grande chancebetnacional casa de apostanos decepcionarmos."

Para Soares, a medida podebetnacional casa de apostafato trazer uma melhora ao longo dos próximos meses - ao menos perante a opinião públicabetnacional casa de apostauma maneira geral. Já nas favelas, o momento ébetnacional casa de apostatensão e medo diante da possibilidadebetnacional casa de apostaoperações, especialmente após as declarações do ministro da Defesa Raul Jungmannbetnacional casa de apostaque poderiam ser pedidos mandadosbetnacional casa de apostabusca e apreensão coletivos.

"Pode ser que a saturação na presençabetnacional casa de apostasoldados e esse maior poderbetnacional casa de apostafogo provoque um deslocamentobetnacional casa de apostatraficantes, como vimos no início das UPPs (Unidadesbetnacional casa de apostaPolícia Pacificadora). Por que isso não seria bom? Basta olhar para o passado. Já fizemos isso antes, e quando recuamos, o problema volta, intensificado. Intervenção não é política pública", diz Soares.

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Garoto joga bola, que vaibetnacional casa de apostadireção a militar

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De quatro ex-secretários consultados pela BBC Brasil, dois são terminantemente contra a intervenção, enquanto outros dois a veem como 'necessária' no momento atual

Roberto Aguiar considera ter tido sorte à frente da Secretariabetnacional casa de apostaSegurança Pública, tendo permanecido no cargo por apenas nove meses e encontrado apoiobetnacional casa de apostacentrosbetnacional casa de apostapesquisa, cientistas, universidades, com os quais diz ter conseguido implementar cursos para aprimorar o treinamentobetnacional casa de aposta24 mil policiais militares.

"Tínhamos esperançasbetnacional casa de apostafazer um treinamento brutalbetnacional casa de apostatodas as forças policiais, no sentidobetnacional casa de apostahumanizá-las. Humanizar não significa tornar bobocas, mas sim tornar mais técnicas, introduzindo novas formasbetnacional casa de apostaagir e tentando estabelecer algo que parece banal, mas não é: o mínimobetnacional casa de apostagentileza", diz.

Para Aguiar, "atos espetaculosos" com expectativabetnacional casa de apostaresultados imediatos não vão conter a violência.

"O pobre do interventor federal vai ter um problema. Vão querer que ele resolva as coisas imediatamente e ele não vai conseguir. É um processo."

Para Aguiar, manter ativas as pontes com instituições da sociedade civil especializadasbetnacional casa de apostasegurança é fundamental para buscar soluções e desenvolver ações no setor. Ele lamenta que a intervenção federal tenha vindo sem realizar essa articulação.

"Nós perdemos a capacidadebetnacional casa de apostareunir as pessoas. Reunirbetnacional casa de apostaprol da cidadania. Precisamos dar condições para que as pessoas nos ajudem e nós ajudemos as pessoas. E não que nós sejamos uma mãobetnacional casa de apostaferro tentando corrigir a sociedade."