A história por trás da 1ª e única entrevistapoker cenaJulinho da Adelaide, 'identidade secreta' criada por Chico Buarque para driblar censura há 50 anos:poker cena

Crédito, Arquivo Nacional
“Eu me lembro até da cara do Samuel Wainer [(1910-1980), jornalista e empresário, fundador e diretor do jornal] quando eu disse que estava pensandopoker cenaentrevistar o Julinho da Adelaide para o jornal dele. Ia ser um furo. Julinho da Adelaide, até então, não havia dado nenhuma entrevista. Poucas pessoas tinham acesso a ele. Nenhuma foto”, escreve Prata,poker cenatexto publicado 12 anos atrás.
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Espantado, Wainer perguntou se ele toparia. “Quem, o Julinho?”, rebateu o escritor. “Não, o Chico”.
Sim, entre parte da intelectualidade da época, se sabia a identidade do compositor. Quem ainda não havia sacado era a censura. E o grande público.
“A imprensa, bem-humorada, porém censurada, usavapoker cenaironia para noticiar a descoberta do compositor da favela da Rocinha”, afirma o jornalista Wagner Homem, no livro ‘Históriaspoker cenaCanções - Chico Buarque’.
“Compositores que já tivessem uma letra proibida ficavam marcados e passavam a integrar uma espéciepoker cenalista maldita da censura”, contextualiza Homem.
“Apostando na existência da tal lista e na falibilidade dos censores, Chico compôs ‘Acorda, Amor’ com os pseudônimospoker cenaJulinho da Adelaide e Leonel Paiva, autores contra os quais não pesava nenhuma suspeita. Ele tinha razão. Foi aprovada sem restrições.”
Em agostopoker cena1974, o jornalista Silvio Lancellotti (1944-2022) escreveu na revista Veja que Chico estava acometido por “uma terrível síndromepoker cenainfecundidade” que o obrigava, “pela primeira vez empoker cenacarreira, a recorrer a trabalhospoker cenaoutros autores”.
“Paradoxalmente, no entanto,poker cenadescoberta, um certo Julinho da Adelaide, originário da favela da Rocinha, no Rio, demonstrou que pode tranquilamente preencher os vazios deixados pelo autorpoker cena‘Fado Tropical’ e outras coisas”, anotou o jornalista, com fina ironia. “Seus estilos musicais são irmãos.”

Crédito, Acervo Pessoal/ Mario Prata
Embalado por uísque, o personagem foi criado
Prata conta que àquela altura, quando ele sugeriu a pauta a Wainer, “Chico já havia topado e marcado para aquela noite na casa dos pais dele, na rua Buri [no bairro do Pacaembu,poker cenaSão Paulo]” a hoje histórica entrevista.
“Demorou muitos uísques e alguns 'tapas' para começar. Quando eu achava que estava tudo pronto, o Chico disse que ia dar uma deitadinha. Subiu. Voltou uma hora depois”, prossegue o escritor e comparsa do inteligente embuste.
“Quando desceu, não era mais o Chico. Era o Julinho”, recorda. Havia testemunhas. A mãe do músico, Maria Amélia Buarquepoker cenaHollanda (1910-2010) “balançava o gelo no copopoker cenauísque”. O pai, o historiador Sérgio Buarquepoker cenaHollanda (1902-1982) estava “à mesa folheando uma enorme enciclopédia”.
Também acompanhavam a encenação duas das irmãs do Chico, Cristina e Miúcha (1937-2018); o músico Homero Ferreira Júnior (1944-2011), conhecido como Homerinho; o então chefe do Jornal da Tarde, o jornalista Melchiades Cunha Júnior; entre outros.
“Julinho, ao contrário do Chico, não era tímido. Mas, como o criador, a criatura também bebia e fumava. Falava pelos cotovelos, era metido a entenderpoker cenatudo”, comenta Prata. “Falou atépoker cenameningite nessapoker cenaúnica entrevista a um jornalista brasileiro.”
Foram pouco maispoker cenaduas horaspoker cenaconversa — “a entrevista e o porre”, como enfatiza o escritor, acrescentando que “Chico inventava, a cada pergunta, na hora, facetas, passado e presente do Julinho”.
“As informações jorravam. Foi ali que surgiu o irmão dele, o Leonel (nome do meu irmão), foi ali que descobrimos que a Adelaide [mãe do personagem, daí a alcunha] tinha dado até para o [arquiteto Oscar] Niemeyer, foi ali que descobrimos que o Julinho estava 'puto' com o Chico”, relata Prata.
O ranço seria porque o famoso artista estava “querendo aparecer” às custas do desconhecido compositor.
Em seu texto, Prata ressalta que viveu naquela noite o “privilégiopoker cenaver o Chicopoker cenaum total e superempolgado momentopoker cenacriação”. “Até então, o Julinho era apenas um pseudônimo para driblar a censura. Ali, naquela sala, criou vida. Baixou o santo mesmo. Não tínhamos nem 30 anos”.

Crédito, Acervo Pessoal/ Mario Prata
“Melhor não ter cara do que ter a cara que eu tenho”
Como que para justificar a ausênciapoker cenauma fotografia, a conversa começou com Julinho contando que havia estado antes apenas uma vezpoker cenaSão Paulo, para assistir à ediçãopoker cena1967 do Festivalpoker cenaMúsica Popular Brasileira organizado pela TV Record. O evento ficaria conhecido por um incidente envolvendo o músico Sérgio Ricardo (1932-2020) — e Chico se aproveitou disso para seu personagem.
“Inclusive, tenho um fato interessante para contar: eu estava na plateia quando o Sergio Ricardo jogou aquele violão [em resposta às vaias do público]. Acertou aqui, ó”, afirmou, na entrevista.
“Essa cicatriz é do violão?”, rebateu Prata.
“É. Inclusive eu pedi para não fotografar, por isso”, continuou Julinho.
“Mas são duas cicatrizes”, Mario Prata parecia querer forçá-lo a abusar mais da criatividade.
“É que pegou o cabo aqui e a caixa aqui deste outro lado. Eu tenho a pele queloide, entende?”, Chico não se fezpoker cenarogado.
O escritor então comentou que Julinho era “um sujeito marcado pela música popular brasileira”.
Na entrevista, o compositor afirmou que embora não fosse cantor, “um dia eu pretendo gravar um disco”.
Argumentou que “se gente que não canta bem, como o Chico Buarque, o Viníciuspoker cenaMoraes, o Antonio Carlos Jobim”, cantava, então ele também poderia. Mas já foi adiantando que “é claro que eu não vou pôr na capa [do eventual LP] minha foto”, porque a fisionomia atrapalharia “a vendagem do disco”.
“Assim, uma dessas menininhas bonitas da rua Augusta pode comprar pensando que é um sujeito bonito e vende mais o disco, não é? Com a minha cara eu acho que vai vender menos”, avaliou. “Então, é melhor não ter cara do que ter a cara que eu tenho.”
Ele contou que tinha “muito mais do que três” músicas — Chico atribuiria a ele ‘Acorda, Amor’, ‘Jorge Maravilha’ e ‘Milagre Brasileiro’. “Eu queria, inclusive, aproveitar e dizer que eu não quero criar nenhum problema com a censura, porque, através do Leonel, eu tenho um diálogo muito bom com eles, entende? O Leonel sendo meu procurador, me quebra todos os galhospoker cenatodos os sentidos”, destacou Julinho.
Leonel é situado na entrevista como uma espéciepoker cenamentorpoker cenaJulinho, empresáriopoker cenasua carreira, conselheiro. “[…] o Leonel que mandou eu dizer que eu sou pragmático. Quando perguntassem coisa mais complicada, pra dizer isto”, disse.
“Por exemplo: ‘O que você acha da censura?’ Sou pragmático. Ele falou ecumênico, também. Disse que quando me perguntassem o que eu achopoker cenaCuba, para eu responder que sou pragmático e ecumênico. Senão eu me meteriapoker cenacomplicações. Mas eu não posso definir exatamente como eu sou. Eu sou pragmático, pô!”
“Leonel, o meio-irmão louropoker cenaJulinho da Adelaide, o explora sem nenhum escrúpulo — chegou a exigir que ele o fizesse parceiro seupoker cena‘Acorda, Amor’. Ainda assim, o humilde Julinho o tem na contapoker cenaguia e protetor”, analisa o jornalista Humberto Werneck, na reportagem biográfica publicada no livro ‘Chico Buarque - Tantas Palavras’.

Crédito, Getty Images
Paipoker cenaChico arranjou foto “da mãepoker cenaJulinho”
Na histórica entrevista, Julinho também não poupou referências à mãe, Adelaide, “a pessoa que me orientou a minha vida inteira”. Ela é apontada como supostamente “uma das mulheres” do poeta Viníciuspoker cenaMoraes (1913-1980) e há uma insinuaçãopoker cenaque teria vivido um relacionamento com o arquiteto Oscar Niemeyer (1907-2012). “Ela casou maispoker cenauma vez, mas casou sempre, viu?”, disse Julinho, defendendo a honra da progenitora.
“Eu me chamo Julinho da Adelaide porque todo mundo só me chama assim lá no morro. Acontece que a minha mãe é mais famosa do que eu lá no Rio. Ainda é. Minha mãe é célebre”, destacou, completando que Adelaide era “netapoker cenaescravos”. “A mãe dela foi beneficiada pela Lei do Ventre Livre. A gente tem uma gratidão muito grande pelo José Bonifácio, o Moço”, disse.
Conforme conta Prata, quando Julinho estava descrevendo a mãe, Sérgio Buarquepoker cenaHollanda paroupoker cenauma das páginas da enciclopédia que folheava, “compenetrado e cordial”. “De repente, ele a coloca na minha frente, aberta. Erapoker cenaalemão e tinha a fotopoker cenauma negra. Para não interromper a gravação, foi lacônico, apontando com o dedo: — Adelaide.”
Foi a foto utilizada para ilustrar a entrevista nas páginas do Última Hora. “Com o crédito: Arquivo SBH”, completa o escritor — ou seja, as iniciais do pai do Chico.
A carreirapoker cenaJulinho chegaria ao fim pouco tempo depois. Conforme Homem relatapoker cenaseu livro,poker cena1975 uma matéria sobre censura publicada no Jornal do Brasil “revelou que Julinho da Adelaide e Chico Buarque eram a mesma pessoa”. “A partirpoker cenaentão a Polícia Federal passou a exigir cópias do RG e do CPF dos autores”, salienta o jornalista.
“Julinho da Adelaide morreupoker cena1975, apunhalado por uma reportagem do Jornal do Brasil sobre censura que revelavapoker cenaidentidade. Julinho era Chico”, escreve a jornalista e escritora Regina Zappa no livro ‘Chico Buarque Para Todos’.

Crédito, Getty Images
Solução genial e bem-humorada
À BBC New Brasil, Zappa define a criaçãopoker cenaJulinho como “uma saída bem-humorada” do músico para driblar a censura.
“Não podemos considerá-lo como um heterônimo, com os do [poeta português] Fernando Pessoa. Durou pouco tempo, era uma brincadeira séria do Chico para poder fazer passar suas canções pela censura”, diz a biógrafa.
"Foi um pseudônimo, uma tentativa atépoker cenamostrar como ele era perseguido. As músicas assinadas pelo Julinho, passavam. Se fossem assinadas pelo Chico, não passariam.”
“Foi uma passagem séria mas divertida na careira do Chico, que mostrapoker cenacriatividade,poker cenacapacidadepoker cenaentrar na pelepoker cenapersonagens diferentes”, acrescenta ela.
No recém-lançado livro ‘Para Seguir Minha Jornada’, a biógrafa define Julinho como “o herói sem caráter”, “preguiçoso, oportunista, vaidoso”, um homem que fazia “samba pragmático” e “dizia se aproveitarpoker cenaChico Buarque na mesma medidapoker cenaque Chico se aproveitava dele”.
Ela lembra que,poker cenaentrevista sobre o tema dada logo depois dapoker cenaJulinho à jornalista Maria Lúcia Rangel, do Jornal do Brasil, Chico jogou lenha na fogueira e trocou farpas com seu pseudônimo.
“Eu me aproveito dele como me aproveitopoker cenaoutros compositores. Vou te contar uma coisa, e acho que ele não vai ficar chateado porque tem muito fair play. O Julinho faz muito mais barulho do que música”, alfinetou.
“Julinho aprontou durante um ano inteiro, entre 1974 e 1975. Gostava da fama, mas fugia da imprensa e não se deixava fotografar porque ‘era cantorpoker cenarádio e tinha uma imagem a preservar’”, conta a biógrafa.
“Além do mais, só queria aparecer quando estivesse mais apresentável. Ele mesmo argumentava: ‘Faço copidesque do cotidiano do morro. Não moro lá, mas tô sempre lá porque não posso me afastar das minhas raízes. Pelo menos uma vez por semana durmo na casa da minha mãe, dona Adelaide, lá na Rocinha. Com 15 anos, eu alisava o cabelo, depois usei afro. Agora deixo normal. Mas eu sou muito feio. Quero fazer um apelo ao dr. [Ivo] Pitanguy [(1923-2016), famoso cirurgião plástico], ou à ordem dos músicos. Pode ser um showpoker cenameu benefício para melhorar o aspecto’.”
Para o músico, compositor e diretorpoker cenaarte Bruno Leo Ribeiro, do podcast Silêncio no Estúdio, a invençãopoker cenaJulinho foi uma solução “genial” encontrada por Chico para driblar os censores do regime. “Criou toda uma mitologiapoker cenavolta disso e é importante que isso seja sempre lembrado para que não se cometam os mesmos erros”, diz ele, à BBC News Brasil.
Ele lembra que o compositor usou várias artimanhas criativas para conseguir emplacar suas canções naquele período.
“A própria ideiapoker cenacriar um alter ego para tentar passar pelos critérios já é um jeito criativopoker cenatentar não ser tão perseguido. Até como ele fazia pra mandar as letras era genial. Ele mandava uma letra enorme e no miolo do texto ele colocava a letra que queria gravar. Quando era aprovado, não precisava gravar a letra toda, então ele usava só a parte que queria. De certa forma, aquele texto enorme deveria dar preguiçapoker cenaler tudo e ele uso isso a seu favor”, comenta.
Olhando para trás, usar um pseudônimo para conseguir passar pela censura canções repletaspoker cenacríticas ao regime só parece ter funcionado porque os agentes encarregadospoker cenaavaliar o material não eram competentes o suficiente. Estudioso do período, o historiador Victor Missiato, concorda.
“Existiam militares [na funçãopoker cenacensores] que tinham dificuldade para interpretaçãopoker cenatexto, para lidar com isso”, diz ele, que é pesquisador na Universidade Estadual Paulista e professor no Colégio Presbiteriano Mackenzie Tamboré, à reportagem da BBC News Brasil.
“Há vários documentospoker cenaque eles classificavam alguémpoker cenacomunista sendo que o comunismo não tinha nada a ver com a proposta da pessoa. E eles já viam ali uma ameaça subversiva.”

Crédito, Marina Garcia/FFC
50 anos depois, o “calote”
A BBC News Brasil tentou descobriu o “paradeiro”poker cenaJulinho, 50 anos depois da entrevista, buscando reconstituir o que ele teria feito nesse tempo todo. Na virada dos anos 1990 para os anos 2000, um aluno chegou a apresentar como trabalhopoker cenafaculdadepoker cenajornalismo uma suposta entrevista com o compositor — levantando suspeitaspoker cenaque, apesar do ostracismo, ele ainda estaria vivo.
Na semana passada, este repórter procurou Mario Prata para esclarecer a questão.
“O público deve ter muita curiosidadepoker cenasaber o que ele fez da vida pós-pontual fama. Vive até hoje dos direitos autorais? Foi embora do país? Casou-se com alguma subcelebridade? Virou bicheiro? Abriu um canal no YouTube? Entrou para o mundo da criminalidade? Está empresariando jogadorespoker cenafutebolpoker cenaqualidade duvidosa?”, mandei, via WhatsApp, ao escritor.
“Rapaz, seguinte: o Julinho da Adelaide, segundo o Doi-Codi [Destacamentopoker cenaOperaçõespoker cenaInformações - Centropoker cenaOperaçõespoker cenaDefesa Interna, órgãopoker cenarepressão do governo ditatorial] ele morreu atropelado na Barra da Tijuca [no Rio]”, comenta Prata,poker cenamensagempoker cenaáudio. “Na verdade, ele foi metralhado, morreu com 27 anos, um pouquinho depois da entrevista. Apagaram ele. É claro que nenhum jornal pôde noticiar.”
O jornalista Humberto Werneck conta que numa carta escrita por Chico a Mario Pratapoker cena1975, o músico narrou que Adelaide havia ficado “paralítica ao perder o filho”.
Na trocapoker cenamensagens com a reportagem, Prata aproveita a oportunidade para prosseguir com o climapoker cenalorota.
“Mas o irmão dele, Leonel Paiva Kuntz, eu encontreipoker cenaNatal [no Rio Grande do Norte] outro dia. Ele foi assistir a uma palestra minha, veio falar comigo”, afirma. “Estava puto porque o Chico não estava pagando os direitos autorais dele e do irmão. Estava bêbado, rapaz, todo fodido. Tinha um caminhãozinho, fazia frete o Leonel.”
“Fiquei com dó dele, que pena. Falou que o Chico estava sacaneando ele, não tem jeito”, conta.
Solicitei então que “intermediasse” uma entrevista minha com o Leonel. “Não vale a pena”, rebateu Prata, cortando o assunto. Ao que consta, o irmãopoker cenaJulinho, consumido pelo alcoolismo, não consegue mais articular bem suas ideias.
De qualquer forma, diantepoker cenatão grave acusaçãopoker cenacalote, beirando a calúnia, a BBC News Brasil procurou Chico Buarque por meiopoker cenasua assessoriapoker cenaimprensa. Até o momento, ele não respondeu à reportagem.











