‘Fomos cobaias’: programa contraceptivo para presos reacende debate sobre eugenia nos EUA:cassino casas

"Sou mãe solteiracassino casastrês lindas crianças e tenho um neto recém-nascido. Minha mãe é deficiente", disse Tollison ao juiz. "Todos dependemcassino casasmim, porque sou a única com carteiracassino casasmotorista. Amo muito minha família... nos últimos quatro anos, fiz tudo que podia para ter minha vidacassino casasvolta."
No fim da audiência, o juiz disse que, como Tollison estava desempregada e continuava a cometer erros, ela não poderia permanecercassino casasprisão domiciliar e ficaria atrás das grades até cumprircassino casassentença. Pouco depois, fez um anúncio supreendente para todos os presentes: um novo programa permitiria reduzir o tempocassino casasprisãocassino casasum mês se ela aceitasse um método contraceptivo gratuitocassino casasefeito duradouro.
Tão logo Tollison chegou à prisão começaram a circular formulárioscassino casasinscrição para que as presas se submetessem ao implante hormonal Nexplanon, que previne a gravidez por até quatro anos. Ela se inscreveu, ao ladocassino casaspelo menos mais 30 mulheres. Entre os presos, 38 aceitaram fazer vasectomias. Em uma prisão com ocupação diária médiacassino casas221 detentos, isso representava uma boa parcela dos internos.
Tollison tevecassino casasassistir a uma aulacassino casassaúde neonatal,cassino casasespecial sobre os efeitos do uso abusivocassino casasdrogas sobre um feto. Então, uma enfermeira usou uma agulha para injetarcassino casasseu braço esquerdo o implante, do tamanhocassino casasum fósforo. Os homens tiveramcassino casascomparecer a uma consulta com um urologista.
Cercacassino casasdois meses depois, um veículocassino casasimprensa local soube do programa, o que colocou a pequena Sparta no centrocassino casasum debate nacional e atraiu a atenção global. "O inominável mal do programacassino casaseugenia do Tennessee", dizia uma manchete.
"O programacassino casaseugenia do juiz Benningfield é revoltante", opiniou um blogueiro. "Ele não pode mais ficar no tribunal nem manter seu diplomacassino casasDireito."

Crédito, Empics
Esterilização forçada
Os Estados Unidos têm um históricocassino casasesterilizações forçadas entre os mais pobres, doentes mentais e minorias. Não faz muito tempo, índios, descendentescassino casasmexicanos e negros foram submetidos a esses procedimentos à força ou sendo enganados por representantes do Estado e governos locais.
Apesar desse movimentocassino casaseugenia - que despertava a admiraçãocassino casasAdolf Hitler e foi replicado por nazistas - ter atingido seu auge nos anos 1920, a prática continuou até meados dos anos 1980. Em algum momento da história, 32 dos 50 estados americanos tiveram um programacassino casasesterilização financiado pelo governo federalcassino casassuas prisões e hospícios.
Homens gays eram forçados a tal se instituiçõescassino casassaúde mental os considerassem "anormais" por causacassino casassua sexualidade, assim como mães que recebiam ajuda financeira do governo. Em alguns locais, a esterilização era condição para que uma pessoa pudesse deixar a prisão.
Casos isolados continuam a surgir no país. Em 2014, o governador da Califórnia assinou um veto à prática após mulheres passarem por laqueaduras sem seu devido consentimento enquanto estavam presas.
Autoridades do Tennessee argumentam que todos os presos se inscreveram voluntariamente no programa, que foi cancelado antescassino casasqualquer vasectomia ser realizada. Mas alguns questionam se um detento pode ou não consentir um procedimento do tipo - e essa questão será central nos processos decorrentes do que ocorreu no condadocassino casasWhite.
"Isso não é uma situaçãocassino casasque uma decisão autônoma é possível. Há uma relação hierárquica envolvida", diz a historiadora Alexandra Minna Stern, da Universidadecassino casasMichigan, autora do livro Nação Eugenia (não lançado no Brasil). "Você pode dizer que as pessoas escolheram, mas há uma relação assimétrica nas prisões, e é por isso que a esterilização não é permitida nesses locais."
O debate pode chegar à Suprema Corte americana, na qual uma decisão no caso Buck vs. Bell,cassino casas1927, que aprova a esterilizaçãocassino casas"deficientes mentais" ainda consta nos registros e foi citadacassino casascasos recentes.
Adam Cohen, autorcassino casasImbecis: A Suprema Corte, a eugenia americana e a esterilizaçãocassino casasCarrie Buck (não lançado no Brasil), um livro sobre o casocassino casas1927, não chega chamar o juiz do Tennesseecassino casasdefensor da eugenia, mas afirma que seu programa chega bem perto disso.
"Pode ser que o juiz realmente ache que está ajudando. Tendo dito isso, tenho certeza que muitas pessoas que apoiam a eugenia gostam do que ele está fazendo."
Arrependimento

Quando Tollison tomou a decisãocassino casasreceber o implante contraceptivo, ela não estava pensando emcassino casassaúde ou nacassino casasseus possíveis futuros filhos. Ela pensava apenas na pequena casa na parte rural do condadocassino casasWhite repletacassino casasfamiliares que precisavamcassino casassua ajuda.
Sentada no quintal, diz que a única razão pela qual aceitou o implante foi para ficar mais pertocassino casasvoltar para casa. Hoje livre, se arrepende da decisão. "Fui uma cobaia. As pessoas fazemcassino casastudo para sair da prisão", diz.
Sparta fica bem no centro do condado,cassino casasuma região bucólica do Tennessee onde há muitos pecuaristas e operários. Maiscassino casas90% da população é branca. A maioria se declara conservadora e religiosa. "Em geral, são pessoas que não veem com bons olhos forasteiros que se metemcassino casasseus assuntos", diz Brandon Griffin, advogadocassino casasdefesacassino casasduas mulheres que receberam implantes.
O jornal local publica às quintas-feiras as fotoscassino casastoda pessoa presa no condado, e na cidade não é difícil achar quem apoie o juiz Benningfield, que assumiucassino casas1998 e foi reeleito duas vezes para o cargo.
Christopher Sapp, donocassino casasuma lojacassino casasreparoscassino casascomputadorescassino casasSparta, diz que perdeucassino casasmulher devido ao uso abusivocassino casasopioides. Uma mulher que ele trata como filha está presa por envolvimento com drogas. Ele soube que ela aceitou o implante. "Foi uma atitude responsável. (O víciocassino casasopioides) é algo terrível nesta região. Não há uma família que não tenha sido afetadacassino casasalguma forma."
Mike Gilber, que tem uma lojacassino casasantiguidades próxima dali, discorda um pouco. Ele não aprova que detentos sejam libertados mais cedo ou que o governo se envolva com os direitos reprodutivos dos cidadãos. "Acho que muitas vezes os juízes vão além do que deveriam e fazem coisas que não cabem a eles."
'Uma surpresa'
Em seu escritóriocassino casasuma manhã, antes do início do diacassino casastrabalho, o juiz Benningfield diz ter ficado impressionado com o tantocassino casasatenção e críticas que vem recebendo: "Foi uma surpresa para mim. Ninguém havia dito nada antescassino casasa imprensa tratar do assunto".

Quem é levado a seu tribunal normalmente cometeu delitos menos graves, como portar drogas, dirigir embriagado, roubar menoscassino casasUS$ 1 mil (R$ 3,2 mil) ou deixarcassino casaspagar pensão alimentícia. A sentença máxima que ele pode proferir écassino casas11 meses e 29 dias.
Segundo Benningfield, a iniciativa começou quando o departamentocassino casassaúde estadual propôs a ele um cursocassino casasdois dias sobre o efeito das drogascassino casasfetos. Para estimular a participação dos detentos, quem se inscrevesse teria a sentença reduzidacassino casasdois dias. O juiz diz que o próximo passo natural foi incentivar presos a recorrerem a serviços contraceptivos.
Uma porta-voz do departamento disse que seus funcionários fizeram uma parceria com o condadocassino casasWhite para as aulas, mas negou envolvimento da criação do novo programa. O departamento não quis comentar se os funcionários fizeram os implantes.
Benningfield compara isso a fazer serviços comunitários, como recolher lixo na beiracassino casasestradas, ou a aceitar ser um informante da polícia. "Muitas das mulheres que havia mandado para a prisão eram as mesmas das quais eu tinha que tirar os filhos como juizcassino casascasos envolvendo jovens, porque eles nasceram viciadoscassino casasdrogas", disse elecassino casasum comunicado.
Quando a história veio à tona, Benningfield disse ter ficado chocado com o fatocassino casasque um preso faria uma vasectomia com o único propósitocassino casasficar 30 dias a menos atrás das grades.

Ele criou um novo documento para os detentos assinarem deixando claro que não estavam participando do programa apenas pela redução da sentença. Mas, a essa altura, o programa já era amplamente criticado pela União Americanacassino casasLiberdades Civis, por juízes locais, pelo procurador-chefe do Estado e por legisladores do Tennessee. Seis semanas após o início da iniciativa, o juiz a cancelou.
Segundo autoridades, nenhuma vasectomia foi realizada. Benningfield reforça quecassino casasintenção não era controlar quem tem filhos ou não no condadocassino casasWhite, mas prevenir o nascimentocassino casascrianças doentes. "Minha preocupação número um eram as crianças. Grande parte da polêmica começou quando as pessoas usaram a palavra esterilização, mas nunca se tratou disso, nunca foi algo forçado."
Em dado momento, ele diz ter encontrado emcassino casasmesa uma pequena pilhacassino casascartas sobre o programa, "todas positivas, com exceçãocassino casasuma". "Você é meu herói", dizia uma delas. "Precisamoscassino casasmais contraceptivos gratuitos nesse país. Ajudar essas pobres crianças a ter um rumo. Acimacassino casastudo, prevenir bebês indesejados."
Outra disse: "Fique tranquilo que a maioria dos cidadãos aprecia seus esforços, mas muitos são forçados a usar uma mordaça - não é irônico que nós sejamos os oprimidos?".
"Seu programa é brilhante e está à frentecassino casasseu tempo", escreveu mais uma. "Criminosos são as últimas pessoas do planeta que deveriam estar se multiplicando."
Efeitos colaterais

Kristi Seibers,cassino casas30 anos, não tem filhos nem um longo históricocassino casascondenações por envolvimento com drogas. Ela foi mandada para a cadeia no condadocassino casasWhitecassino casasfevereiro por violar uma condicional - foi a primeira vez que ela foi parar atrás das grades.
Ela costumava receber a cada seis meses uma injeção anticoncepcional gratuita administrada pelo Departamentocassino casasSaúde, mas, ao saber que seria libertada um mês antes se aceitasse o implante, aproveitou a oportunidade.
Os efeitos colaterais começaram quase imediatamente, conta. Uma menstrução com dois mesescassino casasduração. Infecção vaginal. Cólicas e ganhocassino casaspeso. E Seibers diz nunca ter recebido a redução na sentença. "Essa foi a única razão pela qual fiz. Não é certo."
Dos seis detentos participantes do programa com os quais a BBC conversou, apenas um manifestou que tinha interesse nos benefícios para a saúde e para o planejamento familiar do programa - neste caso, a pessoa acreditava que a medida poderia ajudar comcassino casasendometriose, condição uterina bastante dolorida e que pode causar infertilidade.
O restante disse quecassino casasúnica preocupação era sair da prisão o quanto antes. A penitenciária do condadocassino casasWhite está à beiracassino casasser descredenciada pelo Estado por causacassino casassua superlotação crônica, e várias pessoas a descrevem como um lugar sujo e desagradável.
"Consentimento voluntário não é consentimento se há coerção do governo", afirma Mario Williams, advogado especializadocassino casasdireitos humanos para ex-detentos. "Você está se aproveitandocassino casaspessoas vulneráveis."

Remoção difícil
David Stoll se inscreveu para submeter-se a uma vasectomia, mas, no fim das contas, desistiu. Ele acredita que "99% dos homens com quem conversou na prisão eram motivados pela redução da sentença". "Não quero dizer que eles estavam brincandocassino casasDeus, mas tentar controlar algo assim não é algo que cabia a eles", diz.
Três mulheres contaram à BBC que queriam remover seus implantes, mas ouviram que teriamcassino casasesperar 60 dias e pagar US$ 250 (R$ 792). Houve outros problemas, como mulheres com idade avançada demais para engravidar inscritas no programa. Benningfield confirmou ter ouvido um relatocassino casasuma mulher que já havia passado por uma histerectomia (cirurgiacassino casasretirada do útero), mas recebeu um implante.
Detentos também se increveram sem ter qualquer históricocassino casasabusocassino casasdrogas, o que, segundo Williams, prova que o condado queria impedir presoscassino casasprocriarem, e não só proteger bebêscassino casasproblemas neonatais.
Seibers não foi a única a não ter a pena encurtada. Advogados da ex-detenta Christel Ward dizem que ela não recebeu a redução porque seu caso eracassino casasuma vara criminal, e não da varacassino casasassuntos gerais do juiz Benningfield.
Nos processos que movem contra o condado, Ward e Seibers argumentam que, mesmo não sendo elegíveis para a soltura antecipada, o programa - classificado como "eugenia" por seus representantes legais - foi oferecido a elas.
Em frente à corte federalcassino casasNashville na semana passada, Williams e Ward falaram à imprensa. "Não vamos parar até isso ser declarado inconstitucional", afirmou o advogado, que diz representar atualmente 16 detentos e que esse número pode dobrarcassino casasbreve.
Há uma reviravolta no processocassino casasWard - ela mostrou à BBC uma cópiacassino casasum cartão que foi dado às presas após receberem o implante. O documento indica a data do procedimento: 5cassino casasmaio, dez dias antes da ordem judicial emitida por Benningfield,cassino casas15cassino casasmaio.
Não está claro se estava sendo realizada uma versão não oficial do programa antes da determinação judicial e, se for o caso, por quanto tempo isso ocorreu. O processo cita o xerife do condadocassino casasWhite, Oddie Shoupe, como o verdadeiro criador do programa e, diz que Benningfield emitiu a ordem a pedidocassino casasShoupe.
O xerife não respondeu aos contatos da BBC. O juiz se recusou a comentar sobre o processo.

O casocassino casasWard é o primeiro, diz Williams,cassino casasuma sériecassino casasprocessos contra o condado, inclusivecassino casaspessoas que foram "punidas" por não participarem do programa.
O advogado afirma que essa é a única formacassino casasprevenir que a iniciativa seja replicadacassino casasoutras prisões.
"A percepção que as pessoas têm dos detentos é negativa, seja qual for o motivo pelo qual estão presos. 'São pessoas ruins para a sociedade - quem liga para eles?'", afirma Williams. "Com toda a tensão racial no país, as pessoascassino casasfato têm pensamentos assim. Se você não retruca logo que eles emergem, eles só crescem."
Seibers quer retirar seu implante o quanto antes, mesmo que não saiba quanto isso custará. Assim que se livrar dele, ela será teoricamente capazcassino casaster filhos, salvo por algum outro problemacassino casassaúde. Desde que voltou para casa, ela conseguiu um trabalho como assistentecassino casassaúde domiciliar e voltou a ajudar seu namorado com o aluguel e as contas.
Mas ela se sente diferente - diz que não tem mais desejo sexual. Seu relacionamento foi afetado por isso. Ela se sente enganada pelo condado: "Estou deprimida". Ainda assim, espera que a atenção da mídia mude a forma como detentos são tratados. "Tenho esperançacassino casasque isso vai acontecer. Vai ser algo grande, as coisas mudarão depois disso."










