'Lentidão e descaso com os pobres': como governos brasileiros reagiram a epidemias na História:betano sistema

Montagembetano sistemacaravela e vírus

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Segundo especialistas ouvidos pela BBC News Brasil, apesarbetano sistematerem ocorridobetano sistemaépocas distintas, comportamento e açõesbetano sistemaautoridades públicas pouco mudarambetano sistemapandemias

"No início da colonização, a derrubada da Mata Atlântica para a plantaçãobetano sistemacanaviais propiciou a proliferaçãobetano sistemamosquitos e disseminação das 'febres'", explica ela, autorabetano sistemauma tese que deu origem ao livro Gripe Espanhola na Bahia - Saúde, Política e Medicinabetano sistemaTemposbetano sistemaEpidemia.

A circulaçãobetano sistemapovosbetano sistemaorigens diversas, europeus e africanos, e a introduçãobetano sistemaanimais como vacas, galinhas e porcos, por exemplo, também contribuíram para disseminar doenças desconhecidas no Novo Mundo, dizimando povos nativos, assim como enfermidades locais adoeceram os que vierambetano sistemafora.

"Durante séculos, tivemos que lidar com o assédiobetano sistemadoenças transmissíveis como a varíola, a peste bubônica, a malária, a febre amarela, a cólera, a gripe e as disenterias", diz Souza.

Mortes evitáveis

O que hábetano sistemacomum aos casos é o comportamento e ações das autoridades públicas durante todo este tempo.

"Os governos sempre temeram que o reconhecimento públicobetano sistemauma epidemia atrapalhasse os negócios, prejudicando a economia", explica Christiane.

"A eficiência e o comprometimento das autoridades públicas eram colocadosbetano sistemaxeque, na medidabetano sistemaque a crise se agravava e os adversários políticos se aproveitavam para tentar desestabilizar os que se encontravam no poder."

Escravos trabalhandobetano sistemaplantação do século 19

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Brasil já enfrentou epidemias graves, como asbetano sistemavaríola no século 19

O doutorbetano sistemaSaúde Pública Paulo Frazão, do Departamentobetano sistemaPolítica, Gestão e Saúde, da Faculdadebetano sistemaSaúde Pública da Universidadebetano sistemaSão Paulo (USP), vai além.

"A lentidão, a insuficiência na resposta e o descaso das autoridades para com as populaçõesbetano sistematrabalhadores, as famíliasbetano sistemabaixa renda e moradores da periferia e das favelas têm levado a um número elevadobetano sistemamortes evitáveis", diz.

De acordo com ele, contribui para isso "o descaso para a necessidadebetano sistemadotar o sistema públicobetano sistemasaúde dos recursos necessários, especialmente os órgãosbetano sistemavigilância ambiental, epidemiológica e sanitária, que se ressentem da campanha permanentebetano sistemadesvalorização do servidor público e do processobetano sistemaprecarização das estruturasbetano sistemaplanejamento estratégico e tático-operacional".

O especialistabetano sistemahistória da saúde coletiva brasileira André Mota, do Departamentobetano sistemaMedicina Preventiva e coordenador do Museu Histórico, ambos da Faculdadebetano sistemaMedicina da USP (FMUSP), a ação dos governos frente às epidemias será sempre uma complexa relação política, social ebetano sistematecnologia médica ebetano sistemasaúde pública, o que sempre resultarábetano sistemauma resposta também complexa.

No entanto, acrescenta ele, há um fato que merece ser pensado sobre esse tema e que pode servirbetano sistemaaprendizado.

"Na República, tivemos epidemias que foram debeladas, quase sempre sem articulação entre serviços e hospitais e com limites evidentes, já que não havia coberturabetano sistemasaúde para todas as pessoas, resultando, nesses casos,betano sistemamuitas vítimas", explica.

"O Sistema Únicobetano sistemaSaúde (SUS), criadobetano sistema1988, teve como primeiro desafio epidêmico a Aids e conseguiu demonstrar resultados importantes na prevenção e cuidado, justamente, por ter como objetivo essa integração: serviços, cuidados e direito ao acesso."

De todas as epidemias que assolaram o Brasil ao longo dos tempos, asbetano sistemavaríola - foram maisbetano sistemauma - estão entre as mais devastadoras.

Dificuldades na vacinação

O médico epidemiologista João Baptista Risi Junior, especialistabetano sistemapoliomielite ebetano sistemavigilância epidemiológica e ex-secretário nacionalbetano sistemaAções Básicasbetano sistemaSaúde do Ministério da Saúde, lembra que a doença foi introduzida no Brasil logo após o descobrimento, tendo causado enorme mortalidade entre as populações nativas.

Epidemias muito graves dela ocorreram nos séculos seguintes, até as primeiras décadas do 20. "De 1902 a 1926, a doença causou 21 mil mortes somente no Riobetano sistemaJaneiro, então capital da República", diz Risi.

"A vacinação contra a varíola foi introduzida no Brasil no início do século 19 e oficializada três anos após a chegada da corte portuguesa,betano sistema1811. Mas havia imensas dificuldades técnicas e operacionais para realizá-labetano sistemamodo efetivo."

Com a criação do Instituto Vacínico no Riobetano sistemaJaneiro,betano sistema1887, a vacina pôde ser produzidabetano sistemaescala e aplicada mais amplamente. Mas a população também não contribuía muito.

"Em 1904, Oswaldo Cruz tomou medidas para impor a vacinação obrigatória, o que provocou forte reação popular, conhecida como a Revolta da Vacina, no Riobetano sistemaJaneiro", conta Risi.

A doença continuou endêmica no Brasil, apesarbetano sistemavacinação rotineira nos serviçosbetano sistemasaúde do país. "O problema somente veio a ser solucionado com a criação da Campanhabetano sistemaErradicação da Varíola,betano sistema1966, como partebetano sistemaum esforço internacional coordenado pela Organização Mundial da Saúde (OMS)", lembra Risi.

"O último caso no Brasil ocorreubetano sistema1971, no Riobetano sistemaJaneiro. Em 1980 a vacina deixoubetano sistemaser aplicada no país."

betano sistema Gripe betano sistema e betano sistema spanhola

Em 1918, foi a vez da pandemiabetano sistemagripe espanhola, que atingiu duramente o Brasil. "Há relatos terríveis do sofrimento que causou à populaçãobetano sistemavárias cidades, como Riobetano sistemaJaneiro e São Paulo, por exemplo, com enorme mortalidade", diz Risi.

"Houve dificuldade até para recolher e sepultar os cadáveres, mas a crise desapareceu da mesma forma que havia surgido."

De acordo com ele, os problemas ocorreram, porque o sistemabetano sistemasaúde estava inteiramente despreparado para enfrentar a epidemia, e os dados disponíveis são muito precários.

"Uma das vítimas foi o presidente Rodrigues Alves, que iria iniciar o seu segundo mandato e nem chegou a tomar posse, sendo substituído provisoriamente pelo vice Delfim Moreira, até o resultadobetano sistemanova eleição", lembra. Ele morreubetano sistema16betano sistemajaneirobetano sistema1919.

Segundo o médico Eliseu Alves Waldman, do Departamentobetano sistemaEpidemiologia da Faculdadebetano sistemaSaúde Pública da USP, a décadabetano sistema1940 marcou o surgimentos das epidemiasbetano sistemapoliomielite no Brasil.

"Mas somente na década seguinte (as contaminações) são incluídas entre as prioridadesbetano sistemasaúde pública, à medida que os surtos se tornam mais severos e frequentes", diz ele, que é especialistabetano sistemaMedicina Tropical ebetano sistemaSaúde Pública e doutorbetano sistemaEpidemiologia.

Antes disso, no dia 2betano sistemafevereirobetano sistema1943, o filho do então presidente Getúlio Vargas, que tinha o mesmo nome do pai, morreu da doença.

"Sua morte, no entanto, não chamou a atenção dos governantes ou mesmo da sociedade civil, pouco mobilizada a época, pois estávamosbetano sistemaplena ditadura do Estado Novo", diz Waldman.

"A maior epidemiabetano sistemapoliomielite ocorreu, entretanto,betano sistema1959/60. O controle da doença começou nos anos 1960, com a introdução das vacinasbetano sistemavírus vivo atenuado (vacina Sabin) ebetano sistemavírus inativado (vacina Salk). Ela finalmente foi eliminadabetano sistema1989."

Christiane Maria Cruzbetano sistemaSouza

Crédito, Arquivo pessoal

Legenda da foto, Christiane Maria Cruzbetano sistemaSouza é autora do livro Gripe Espanhola na Bahia - Saúde, Política e Medicinabetano sistematemposbetano sistemaepidemia

A meningite foi outra doença que causou um número elevadobetano sistemamortes e muito sofrimento. "Houve uma epidemia que duroubetano sistema1945 e 1957, que não foi reconhecida, mas omitida pelas autoridadesbetano sistemasaúde", conta Mota.

"Fosse como tragédia ou como farsa, ela voltou a se alastrar na décadabetano sistema1970, ganhando mais força, mesmo com o silêncio das autoridades e a proibição do regime militar sobre os números assombrosos que, aos poucos, foram criando pânico entre a população."

Waldman lembra que essa epidemia ocorreubetano sistemapleno período autoritário, quando o governo tentou negá-la, somente a confirmando quando haviam sido esgotados os leitos hospitalares para atendimento dos pacientes.

"Para termos uma ideia, nos períodosbetano sistemapico da epidemia, que durou cinco anos, chegamos a ter, somente no municípiobetano sistemaSão Paulo, 200 casos por dia com uma letalidadebetano sistema10%, ou seja,betano sistemacercabetano sistema20 mortes diárias", diz. "Isso foi nos mesesbetano sistemaabril e maiobetano sistema1974."

Segundo Mota, conforme estudos realizados posteriormente, no caso paulista "a epidemia pôs a descoberto a anarquia na organização dos serviçosbetano sistemasaúde no municípiobetano sistemaSão Paulo, revelando a inoperância da rede hospitalar e a total faltabetano sistemaintegração entre os serviços locais, destinados ao primeiro atendimento, e os hospitais". "Centenasbetano sistemapessoas morreram até seu controle", acrescenta. "Muitas sem saber o que tinham."

Depois veio a Aids, mas que teve uma forte reação governamental, porque já existia o SUS. Mais recentemente surgiram as epidemias sazonaisbetano sistemadengue, chikungunya e zika, todas transmitidas pelo mosquito Aedes aegypti.

A história deste inseto é antiga no Brasil. Em 1900, ele foi identificado como o transmissor da febre amarela urbana, da qual houve várias epidemias. "No Riobetano sistemaJaneiro, foram registradas 58 mil mortes pela doença entre 1850 e 1902", informa Risi.

Ilustração da igreja da Glória no Riobetano sistemaJaneiro

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Açõesbetano sistemacombate a epidemias quase sempre foram lentas e pouco voltadas às populações mais carentes

Depois da identificação do transmissor, tiveram início as açõesbetano sistemacombate a ele,betano sistemaSão Paulo e no Riobetano sistemaJaneiro. "Oswaldo Cruz foi reconhecido internacionalmente porbetano sistemaluta contra a febre amarela, mas ela continuou um grande problemabetano sistemavários estados litorâneos", diz Risi.

"Em 1928, voltou a causar uma importante epidemia no Riobetano sistemaJaneiro. Por isso, na décadabetano sistema1930, a Fundação Rockefeller cooperou com o governo brasileiro para organizar um programabetano sistemacombate à doençabetano sistematodo o país."

Desse trabalho resultou o desenvolvimento da vacina contra a febre amarela,betano sistema1937, e o início dabetano sistemaprodução no Instituto Oswaldo Cruz.

"Em 1955, o mosquito Aedes aegypti foi considerado erradicado no Brasil", conta Risi. "Em 1966, no entanto, ele foi reintroduzido nas cidadesbetano sistemaSão Luiz e Belém, e novamente erradicado. Mas na décadabetano sistema1970, a presença desse vetor foi mais uma vez detectada, agora no litoral da Bahia, e rapidamente se propagou a todo o país, tornando-se impossível voltar a erradicá-lo."

As epidemias que atingiram o Brasil nesses maisbetano sistemacinco séculosbetano sistemaHistória não trouxeram apenas desgraças, mortes e sofrimentos, no entanto.

"Com erros e acertos, podemos dizer que a saúde pública brasileira amadureceu e se consolidou como um dos setores que influenciaram e contribuíram para o desenvolvimento do país", diz Waldman.

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