Violentada na infância, mulher vira policial e prende homem que a estuprou:aposta esportiva para hoje

Ilustração representa fotógrafo olhando Tábata quando criança

Crédito, André Valente/ BBC Brasil

Legenda da foto, Fotógrafo aproveitava mata fechada e distração dos pais para abusar da menina

Em entrevista à BBC Brasil, ela contou a história pela primeira vez a um jornalista. Tábata diz que fez isso para encorajar outras mulheres a denunciar seus agressores. "Denunciar e mexer nisso foi um processoaposta esportiva para hojecura", diz.

Acampamento

O paiaposta esportiva para hojeTábata conheceu o fotógrafo quando ela tinha 9 anos. Pouco tempo depois, os dois se tornaram amigos e pegaram o hábitoaposta esportiva para hojejogar futebol juntos.

Rapidamente, os amigos passaram a promover uma integração entre suas famílias. Elas passaram a sair e acampar juntas nos finsaposta esportiva para hojesemanaaposta esportiva para hojeverão. Os lugares preferidos eram campings próximos ao rio Uruguai, na divisa entre os Estadosaposta esportiva para hojeSanta Catarina e Rio Grande do Sul.

Tábata se recorda dos dias divertidos e dos banhosaposta esportiva para hojerio que tomava ao lado dos dois casais. Juntos, os cinco faziam viagensaposta esportiva para hojecarro, trilhasaposta esportiva para hojeáreasaposta esportiva para hojedifícil acesso e pernoitavamaposta esportiva para hojebarracas na mata.

"Logo, ele (o fotógrafo) começou a me molestar. Ele se aproximava e ficava passando a mãoaposta esportiva para hojemim. Eu não entendia. Aquilo me incomodava, mas eu não via o caráter criminoso naquilo que ele estava fazendo. Não falei nada para a minha família, até hoje não sei dizer o porquê", conta Tábata.

A garota tinha uma meia-irmã 8 anos mais velha, que não frequentava os acampamentos. "Ela não era muito próxima do meu pai por não ser filha biológica dele. Ela costumava ficaraposta esportiva para hojecasa assistindo à TV e estudando", conta.

Segundo Tábata, o agressor se aproveitavaaposta esportiva para hojesua fragilidade, do isolamento e da pouca visibilidadeaposta esportiva para hojemeio às árvores - distante dos olhares dos adultos - ou durante os mergulhos da menina na água para se aproximar e cometer os abusos.

"Certa vez, ele abusouaposta esportiva para hojemim quando ele precisava buscar água (para o acampamento) e me fizeram ir com ele para ajudar a carregar os galões. No caminho, ele se aproveitou para ficar passando a mãoaposta esportiva para hojemim, mas eu consegui escapar e correr na frente. Meus pais nem perguntaram por que cheguei antes dele. Nem passava pela cabeça dos meus pais que ele pudesse abusaraposta esportiva para hojemim porque confiavam muito nele", conta Tábata.

A frequênciaaposta esportiva para hojeabusos começou a aumentar na mesma proporçãoaposta esportiva para hojeque crescia o incômodo que a garota sentia. Sua vontade era contar os atos violentos para o pai dela.

"Meu pai sempre foi muito estressado, pilhado. Eu tinha medo que ele pudesse matar ele (fotógrafo), ir preso. Começam a passar mil coisas na cabeçaaposta esportiva para hojeuma criança. E também tem o receioaposta esportiva para hojeque seus pais não vão acreditar no que você está passando", afirma Tábata.

Tábata relata que os primeiros abusos ocorreramaposta esportiva para hojeacordo com as oportunidades. Mas logo o fotógrafo passou a estudar o dia a dia da família para saber quando a garota estaria sozinhaaposta esportiva para hojecasa.

Ele descobriu que a irmã mais velhaaposta esportiva para hojeTábata fazia magistério e a mãe trabalhava à noite. Conhecia a rotinaaposta esportiva para hojefutebol noturno do pai da garota e passou a procurá-la nesses horários.

"Ele dizia: 'Só um pouquinho, só um pouquinho'. Ele nunca me agrediu com tapas, mas me segurava à força, mesmo eu sendo uma menina grande para a minha idade", lembra Tábata.

Ilustração representa violência usada contra Tábata na infância

Crédito, André Valente/ BBC Brasil

Legenda da foto, Garota foi sofreu abusos dos 9 aos 11 anosaposta esportiva para hojeidade

Ela não se recordaaposta esportiva para hojeameaças feitas pelo estuprador, mas diz que ele pedia para que ela não comentasse com os pais o que acontecia entre eles. Os abusos ocorreram durante cercaaposta esportiva para hoje2 anos e meio.

Tábata conta que passou a ter maior consciência do crime aos 11 anos, quando começou a gritar, xingar e resistir,aposta esportiva para hojevão, aos abusos. Na época, ela decidiu que contaria para aaposta esportiva para hojemãe.

Porém, a mãeaposta esportiva para hojeTábata foi diagnosticada com transtorno bipolar e seu estadoaposta esportiva para hojesaúde a desencorajou a revelar os estupros.

Mais vítimas

Nessa mesma época, o pai da garota teve um relacionamento extraconjugal com a mulher do fotógrafo. O caso foi descoberto e colocou um ponto final na amizade entre os casais e na rotinaaposta esportiva para hojeabusos.

Nessa época, Tábata decidiu relatar as agressões apenas paraaposta esportiva para hojeamiga mais próxima, que passava o dia todo com ela e tinhaaposta esportiva para hojeconfiança. A única condição foi que a menina não contasse para ninguém, o que foi respeitado.

Durante um período, Tábata preservou a mãe, que tinha frequentes crises psiquiátricas - mesmo à baseaposta esportiva para hojemedicamentos - e decidiu não contar para a irmã porque as duas não eram tão próximas e tinham algumas brigas.

A doença da mãe, no entanto, reaproximou as duas e Tábata decidiu relatar os abusos pela primeira vez à irmã,aposta esportiva para hojeoutubroaposta esportiva para hoje2006. "Quando contei, ela entrou numa criseaposta esportiva para hojechoro desesperadora. Imediatamente, ela ligou para o meu pai, que já era divorciado da minha mãe havia dois anos. Até hoje eu fico com um arrependimentoaposta esportiva para hojefazer as pessoas sofrerem tanto. Eu fico pensando se valeu a pena contar", diz Tábata.

Ela diz que, ao longo dos anos, tentou esquecer os detalhes dos estupros para se proteger emocionalmente. O tempo passou e as memórias dos abusos continuavam a rondar seus pensamentos.

Numa tentativaaposta esportiva para hoje"não surtar" e aliviar o peso das lembranças, Tábata passou a contar a história para outras amigasaposta esportiva para hojecolégio na adolescência.

Em 2008, quando tinha 16 anos, umaaposta esportiva para hojesuas amigas contou o caso para a mãe, que, por coincidência, conhecia o fotógrafo e chamou Tábata para conversar.

"Ela me disse que tinha ouvido falar que esse fotógrafo também tinha abusadoaposta esportiva para hojeoutras meninas. Aquilo me deu muita revolta. Eu achei que ele tinha feito aquilo só comigo, mas logo pensei que aquele cara estava acabando com a vidaaposta esportiva para hojeoutras pessoas, outras meninas", disse.

Ilustração representa julgamento do fotógrafo condenado por estuprar criançaaposta esportiva para hojeSanta Catarina

Crédito, André Valente/ BBC Brasil

Legenda da foto, Fotógrafo foi condenado a 7 anos e seis mesesaposta esportiva para hojeprisão, mas ficou apenas um ano na cadeia

Sete anos após o primeiro abuso, Tábata relatou o históricoaposta esportiva para hojeagressões à Polícia Civil, registrou um boletimaposta esportiva para hojeocorrência e uma investigação foi iniciada. Mas ela nunca foi chamada para voltar a depor e o inquérito ficou engavetado.

Quatro anos depois, o processo foi para o Ministério Público, onde a ação ficou mais dois anos parada. Tábata, então, foi pessoalmente à Promotoria perguntar o motivo da estagnação.

"Eu estava conversando com uma assessora do promotor, mas ela não sabia me dizer porque ele não tinha denunciado o caso, quando eu me alterei e passei a levantar a minha voz. Nesse momento, ele (promotor) saiu da sala dele e foi grosseiro comigo. Disse que fazia muito tempo, que não tinha provas e que eu demorei pra denunciar", conta.

Tábata entrouaposta esportiva para hojedesespero. Contou chorando para o pai que seu caso tinha acabado e que o fotógrafo nunca seria julgado. Mas o pai dela se lembrou que um comerciante que morava na região havia relatado que o fotógrafo também tinha abusadoaposta esportiva para hojesua filha quando ela tinha 9 anos.

Na época do crime, o comerciante agrediu o fotógrafo quando soube que ele tinha passado a mão nos seiosaposta esportiva para hojesua filha. Tábata foi pessoalmente falar com a mãe da vítima para pedir auxílio.

"Eu pedi para ela depor para que o Ministério Público soubesse da conduta dele e pudesse denunciar. Eles aceitaram depor, então levei o nome dela e dos pais à Promotoria para que tivessem provas", disse.

Após o novo depoimento, a Promotoria entendeu que o fotógrafo tinha um históricoaposta esportiva para hojeabusos e, finalmente, o denunciou por pedofilia. Um ano depois,aposta esportiva para hoje2013, ocorreu a primeira audiência.

Julgamento

Durante a audiência no tribunal, conta Tábata, o fotógrafo negou ter tido relações sexuais com a menina. "Eu só li a sentença. Mas ele disse que eu inventei tudo aquilo porque eu queria me vingar dele. Ele dizia que eu fiz aquilo porque meu pai não teria conseguido sair com a esposa dele", conta Tábata.

O homem foi condenado por estupro a 7 anos e 6 mesesaposta esportiva para hojeprisãoaposta esportiva para hojeregime fechado. O depoimento da segunda vítima foi essencial para comprovar o históricoaposta esportiva para hojeviolência sexual do fotógrafo. O criminoso entrou com recurso e respondeu ao processoaposta esportiva para hojeliberdade. Depoisaposta esportiva para hojeum ano e meio, houve a confirmação da sentençaaposta esportiva para hojesegunda instância.

Ilustração representa momentoaposta esportiva para hojeque policial prendeu seu estuprador

Crédito, André Valente/ BBC Brasil

Legenda da foto, Tábata trancou seu estuprador na cela após um longo processo

Nesse meio tempo, Tábata, aos 24 anos, concluía seu curso na Academia da Polícia Civilaposta esportiva para hojeSanta Catarina. "Eu fui focadaaposta esportiva para hojefazer o meu trabalho, sem me apegar ao que tinha ocorrido no passado. Procurei deletar tudo da minha cabeça", conta.

Mas, no fundo, os abusos que sofreu foram decisivos na decisãoaposta esportiva para hojeser policial. A vontadeaposta esportiva para hojeTábata era "pegar todos os estupradores", mas decidiu não só evitar, mas se afastar completamenteaposta esportiva para hojecasos ligados a crimes sexuaisaposta esportiva para hojeseu cotidiano profissional.

"Eu não teria autocontrole para não agredir um abusador, manter o profissionalismoaposta esportiva para hojecasos bárbaros como osaposta esportiva para hojeagressões a bebês. E meu papel na polícia é exercer a minha profissão conforme a lei", diz.

E, quando ela menos esperava, surgiuaposta esportiva para hojeoportunidadeaposta esportiva para hojecumprir a lei. A polícia recebeu a ordemaposta esportiva para hojecumprir o mandadoaposta esportiva para hojeprisão contra o fotógrafo. Tábata estava junto.

"No dia 22aposta esportiva para hojedezembroaposta esportiva para hoje2016, pedi apoio, fomosaposta esportiva para hojeoito ou dez policiais até que o localizamos e executamos o mandado. Ele estava escondido numa chácara isolada, na beiraaposta esportiva para hojeum rio. Naquele dia, meu colega fez a revista e a prisão. Mas eu fiz questãoaposta esportiva para hojebater a porta da cela, como se fosse para encerrar esse ciclo."

Menosaposta esportiva para hojeum ano depois, no dia 19aposta esportiva para hojedezembroaposta esportiva para hoje2017, o fotógrafo saiu pela porta da frente do presídio. Devido ao seu bom comportamento e dias descontados por trabalhar na horta e na cozinha do presídio, ele teveaposta esportiva para hojepena reduzida e hoje está livre.

Tábata não esconde a insatisfaçãoaposta esportiva para hojesaber que o homem que a estuprou durante dois anos está solto. "Foi uma pena muito curta. Ele precisava ficar preso só um sexto da pena. Mas ele trabalhou e, no fim, ficou só um ano. A nossa execução penal tem muitos privilégios e a pessoa acaba ficando pouco tempo pagando pelo seu crime", diz.

Trauma

Desde a infância, Tábata sempre foi muito falante e extrovertida. Mas os abusos criaram nela barreiras até o início da fase adulta.

"Eu sentia uma sensação ambígua: queria me relacionar com as pessoas, mas tinha medo porque sempre lembrava das agressões e tinha vergonha do meu corpo. Quando as meninas falavamaposta esportiva para hojesexo e filhos, eu achava aquilo o fim do mundo porque via o sexo como uma coisa ruim", relata Tábata.

Hoje, ela diz que evita lidar no cotidiano profissional com casosaposta esportiva para hojeviolência sexual e conta que revive seu caso sempre que atende casosaposta esportiva para hojeestupro. Para as famílias, no entanto, ela acredita queaposta esportiva para hojehistória pode servir como um alerta.

"Eu diria para as mães conversarem muito com seus filhos e instigá-los a contar sobre qualquer comportamentoaposta esportiva para hojeadultos que sejam impróprios . E dizer que vão acreditar na versão deles. Às vítimas, digo que tive dificuldade e superei, mas que eles não podem se revitimizar porque o problema ocorre na proporção que você o alimenta. Eu sempre digo que a vítima não é culpada. O que aconteceu não foiaposta esportiva para hojedecorrência da postura ou da roupa que ela estava usando, mas pelo fatoaposta esportiva para hojeo agressor ser uma pessoa doente."

*A pedido da policial civil, seu nome verdadeiro foi omitido nesta reportagem. O nome do agressor e a cidade onde os abusos aconteceram também foram omitidos para proteger a identidade das vítimas.