A lutasorteesportiva bonusum homem negro pela liberdade entre Caribe, Brasil, África e Europa:sorteesportiva bonus

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Lá, José conseguiu fugir, mas, quando foi encontrado pelos portugueses não portava nenhum documento que atestassesorteesportiva bonusliberdade (o que era exigido a pessoas negras na época), o que o levou a ser preso novamente. Após passar meses na prisão, ele foi vendido como escravo ao vigário-geral Manoel Luiz Coelho, um posto que é indicado pelo bispo.
Tempos depois, Coelho alforriou José (o que não era incomumsorteesportiva bonusreligiosos católicos portugueses) e o levou consigo para o Riosorteesportiva bonusJaneiro.
José era um homem livresorteesportiva bonusnovo.

Crédito, Arquivo Histórico Ultramarinosorteesportiva bonusPortugal.
No Rio, Coelho morreu e José assumiriasorteesportiva bonuscasa. Entretanto, a ideia não agradou o irmão do vigário-geral, o cônego Domingos Luís Coelho — um homem que, nas palavrassorteesportiva bonusJosé, era "cheiosorteesportiva bonusambição esorteesportiva bonuspouco temorsorteesportiva bonusDeus", tomousorteesportiva bonuscartasorteesportiva bonusalforria e pediusorteesportiva bonusprisão ao governador da ilhasorteesportiva bonusSão Tomé, D. José Caetano Souto Maior. O pedido foi atendido e José foi preso com grilhões nos pés e no pescoço, maltratado e mais uma vez vendido como escravo — desta vez, a um capitão francês, que o levou à Europa.
Lá, José fugiu "de portosorteesportiva bonusporto", passando por Londres até Lisboa, segundo seu relato ao Rei Dom João 5º, a quem pede piedade, liberdade e indenização pelas injúrias passadas.
"Porque ao suplicante se tem feito na Ilhasorteesportiva bonusSão Tomé tantas injúrias vendendo-o por duas vezes; e usurpando-lhe o que tinha metendo-osorteesportiva bonusprisões públicas e privadas [...] recorre a piedade e clemênciasorteesportiva bonusVossa Majestade que não consente estes insultossorteesportiva bonusseus vassalos para que se digne mandar passar ordem ao governador e Justiça da Ilhasorteesportiva bonusSão Tomé porque sendo verdade o referido constando certamente será o suplicante livre [e] lhe façam restituir todos os seus bens, e ressarcir seus danos e injúrias deixando-o usarsorteesportiva bonussua liberdade que sempre teve [...]", diz o documento.
"Que odisseia", pensou o historiador brasileiro Rodrigosorteesportiva bonusAguiar Amaral, ao descobrir o documento, um dos 97 registros da caixa 7 da série sobre São Tomé e Príncipe dos arquivos do Conselho Ultramarinosorteesportiva bonus1530 a 1833.
"Há muitos casos interessantes nos arquivos. Temos acesso a relatos como este pois, durante suas trajetórias, os autores conheceram alguém com domínio da escrita e das leis e passaram os depoimentos para o papel para mandar para o rei", diz Amaral, que no doutorado passou uma temporadasorteesportiva bonuspesquisa junto à Universidade Técnicasorteesportiva bonusLisboa.
"O mais extraordinário é que o documento sobreviveu ao tempo."
Trajetórias extraordinárias
A partirsorteesportiva bonusdocumentos como petições, açõessorteesportiva bonusliberdade, cartassorteesportiva bonusalforria, interrogatórios, processos criminais, inventários e testamentos, historiadores vêm tentando resgatar a trajetóriasorteesportiva bonuspessoas negras escravizadas na época colonial.
"É como montar um quebra-cabeçasorteesportiva bonusmuitas peças perdidas", define Amaral, que transcreveu e destacou o casosorteesportiva bonusJoão José (um "andarilho cubano", segundosorteesportiva bonusexpressão) nasorteesportiva bonustesesorteesportiva bonusdoutorado defendida na Universidade Federal do Riosorteesportiva bonusJaneiro (UFRJ),sorteesportiva bonus2010, e publicada no livro Cativeiro, desigualdade e brutalidade: uma história das relações sociais entre elite e subalternos no Riosorteesportiva bonusJaneiro esorteesportiva bonusSão Tomé e Príncipe (c.1750-c.1850) (editora Autografia, 2018).
A busca desses vestígios vem se desenrolando desde a décadasorteesportiva bonus1980, quando historiadores passaram a olhar para os ditos grupos subalternos com outros olhos.
"Escravos, forros, livres pobres, camponeses, mulheres e trabalhadores eram vistos como coisas, não pessoas. Passaram a ser considerados atores sociais, sujeitos históricos", acrescenta o historiador, atualmente professor do Centro Universitário UniCBE, no Rio.
É difícil precisar quão comum ou incomum foram trajetórias transatlânticas como asorteesportiva bonusJoão José, marcada por períodossorteesportiva bonusliberdade, prisões e episódiossorteesportiva bonusescravidão. Mas é certo dizer que era muito presente o medosorteesportiva bonusser reescravizado devido à cor da pele, no Brasil esorteesportiva bonusoutras sociedades escravistas - "basta lembrar da históriasorteesportiva bonusSolomon Northup", exemplifica o historiador brasileiro Thiago Krause, professor da Universidade Federal do Estado do Riosorteesportiva bonusJaneiro (Unirio) e um dos autoressorteesportiva bonusBrazil-Africa Relations in the 21st Century (editora Springer, 2021).
Northup (1808-1863), um afro-americano nascido livre no Estadosorteesportiva bonusNova York, foi sequestrado por mercadoressorteesportiva bonusescravos e passou doze anos torturado por seus senhores no Estadosorteesportiva bonusLouisiana. Após reconquistarsorteesportiva bonusliberdade, escreveu e publicou o livrosorteesportiva bonusmemórias Doze anossorteesportiva bonusescravidão,sorteesportiva bonus1863, que se tornou filmesorteesportiva bonus2013.

Crédito, Arquivo pessoal
Krause lembra que questões importantes muitas vezes não podem ser respondidas (ou quantificadas) por historiadores devido à ausênciasorteesportiva bonusdocumentos para ancorá-las.
"Nesse contexto, o estudosorteesportiva bonustrajetórias individuais tem sido uma estratégia recorrente na historiografia. Não se tratasorteesportiva bonusinvestigar uma pessoa porsorteesportiva bonusimportância intrínseca, mas de, atravéssorteesportiva bonusum 'causo' como esse, refletir sobre temáticas mais amplas", diz o acadêmico, que recentemente divulgou o link do documento do Arquivo Histórico Ultramarino, no Twitter.
"Esses casos têm, portanto, duas funções: uma heurística, ao usar uma documentação excepcional (como a petiçãosorteesportiva bonusJoão José) para explorar questões mais gerais que usualmente não ficam registradas na documentação; a outrasorteesportiva bonuscomunicação, pois narrativas pessoais podem ser apreendidas com mais facilidade pelos leitores, pois é mais fácil desenvolver empatia por indivíduos do que por grupos abstratos", pondera.
Não se sabe, por exemplo, as datas exatassorteesportiva bonusque José viveusorteesportiva bonusHavana ou passou por São Tomé, Rio e Londres até bater à porta da cortesorteesportiva bonusLisboa,sorteesportiva bonus1739. Sabe-se, porém, que Havana era parada importante para as frotas que levavam prata e ouro da América espanhola para a Espanha.
De Havana a São Tomé
Desde o século 16, Havana era um porto estratégico nas Américas. Cuba, a ilha no mar do Caribe, era "a artéria por onde passava o fluxosorteesportiva bonusriquezas para cruzar o Atlântico rumo à Espanha", define a historiadora americana Elena Schneider, professora da Universidade da Califórniasorteesportiva bonusBerkeley e autorasorteesportiva bonusThe Occupation of Havana (editora UNC Press, 2018). No porto trabalhavam muitos homens negros, nascidos livres, como militares e marinheiros.
Havana era base naval e o maior estaleiro então. Naviossorteesportiva bonusdiversas partes passavam por lá para serem consertados e abastecidos antessorteesportiva bonuscruzar o oceano, o que tornava a cidade um alvosorteesportiva bonusataquessorteesportiva bonuscontrabandistas, corsários e piratas, principalmente ingleses. Entre 1739 e 1748 enfrentaram-se frotas e tropas coloniais da Grã-Bretanha e da Espanha no Caribe. Em 1762, os britânicos invadiram e ocuparam Havana.

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Tanto Grã-Bretanha quanto Espanha recrutavam milharessorteesportiva bonusmarinheirossorteesportiva bonusascendência africana para lutar na linhasorteesportiva bonusfrente.
"Nesses conflitos, se fossem capturados por inimigos, marinheiros negros não eram tratados como prisioneirossorteesportiva bonusguerra. Eram escravizados e, mesmo que portassem documentos, era improvável que fossem reconhecidos ou legitimados como livres", diz Schneider. Um documentosorteesportiva bonus1745, por exemplo, registra reclamações da Coroa espanhola contra a capturasorteesportiva bonusseus soldados e marinheiros "de color quebrado"sorteesportiva bonusCuba por navios britânicos e vendidos como escravos.
No século 18, pessoassorteesportiva bonusascendência africana eram metade da populaçãosorteesportiva bonusHavana, entre negros ("morenos",sorteesportiva bonusespanhol, na época), mulatos ("pardos",sorteesportiva bonusespanhol), "criollos" (de origem africana, nascidossorteesportiva bonusCuba), livres e escravos. "Esse era o mundo onde João José nasceu e viveu."
Devido ao conflito, é possível compreender a presençasorteesportiva bonusbritânicos na históriasorteesportiva bonusJosé. Desembarcarsorteesportiva bonusSão Tomé, entretanto, lhe traria outro contexto. Dominada pelos portugueses, a ilha se tornou no início do século 16 um produtor importantesorteesportiva bonusaçúcar, ancorado no trabalhosorteesportiva bonusafricanos escravizados - o que se tornaria um tiposorteesportiva bonusmodelo para as plantações açucareiras que depois se desenvolveriam no litoral da América portuguesa. Em 1757, negros escravos e "forros" (libertos) eram 99% da populaçãosorteesportiva bonusSão Tomé: a cada 10 habitantes, 1 era considerado branco, 7 eram escravos negros e os demais eram livres ou recém-libertos, destaca o livrosorteesportiva bonusRodrigosorteesportiva bonusAguiar Amaral, da UniCBE.
"O casosorteesportiva bonusJosé indica hierarquia e ilustra estratégias das relações dentro dessa estruturasorteesportiva bonusescravidão. Ele foi arrematado por um vigário, que lhe concedeu alforria - muitos senhores prometiam, e muitas vezes cumpriam, dar liberdade a seus escravos, como um tiposorteesportiva bonusnegociação, o que fortalecia um vínculo entre eles", analisa Amaral. "Depoissorteesportiva bonuspassar pelo Rio e das demais reviravoltas, ele não pediu piedade a qualquer um, mas foi direto ao reisorteesportiva bonusPortugal, no topo da hierarquia, alguém que poderia ordenar, e ser obedecido, pelos demais: o governadorsorteesportiva bonusSão Tomé, o ouvidor e, por fim, o irmão do vigário para libertá-lo."

Crédito, Reuters
Do Rio a Lisboa
No século 18, o Riosorteesportiva bonusJaneiro vivia diassorteesportiva bonuscrescimento econômico e demográfico, começando a ultrapassar Salvador como principal possessão ultramarina portuguesa. "O aumento do tráficosorteesportiva bonusafricanos escravizados e o desenvolvimento urbano tinham ampliado muito o númerosorteesportiva bonuscativos, que provavelmente perfaziam cercasorteesportiva bonusmetade da população", assinala Thiago Krause, da Unirio. Na época, também se ampliava a concessãosorteesportiva bonusalforrias, o que fez aumentar o númerosorteesportiva bonushomens livres "de cor" na cidade.
"O Rio tinha poucas conexões com São Tomé e contatos praticamente inexistentes com Cuba, pois o regime dos ventos, a faltasorteesportiva bonuscomplementaridade econômica e as restrições mercantilistas limitariam sobremaneira esses contatos. Assim, é provável que o casosorteesportiva bonusJoão José tenha sido único", acrescenta Krause, coautorsorteesportiva bonusA América portuguesa e os sistemas atlânticos na época moderna (editora FGV, 2013).
Na época, franceses frequentavam o litoral do Riosorteesportiva bonusJaneiro,sorteesportiva bonusolho no contrabando. Em 1711, por exemplo, uma esquadra francesa invadiu a baíasorteesportiva bonusGuanabara, destruiu navios portugueses e tomou a cidade como "refém" por meses, só a liberando após receber o pagamentosorteesportiva bonusum resgatesorteesportiva bonusdinheiro, caixassorteesportiva bonusaçúcar e bois.
Levado pelos franceses, José teria passado por diferentes portos europeus até chegar a Lisboa, onde fez, finalmente, seu requerimento à Coroa portuguesa. Livros como Em defesa da liberdade (editora Fino Traço, 2018),sorteesportiva bonusFernanda Domingos Pinheiro, e Liberata, a lei da ambiguidade (Relume Dumará, 1994),sorteesportiva bonusKeila Grinberg, tratamsorteesportiva bonusaçõessorteesportiva bonusliberdade reivindicadas por escravos e libertos nos séculos 18 e 19. Não era incomum, portanto, levar a causa às autoridades da época - e, às vezes, os autores eram bem-sucedidos nas suas demandas.

Crédito, Divulgação/Julie Wolf
Narrativassorteesportiva bonusliberdade
Para Elena Schneider,sorteesportiva bonusBerkeley, é importante dar visibilidade a tais trajetórias.
"São milharessorteesportiva bonusanônimos, escravizados, torturados. Pessoas sistematicamente silenciadas que, quando tiveram a oportunidadesorteesportiva bonuscontarsorteesportiva bonushistóriasorteesportiva bonusvida, elas contaram. O registro ficou. Devemos escavar esses arquivos para tornar essas histórias conhecidas", diz a historiadora, que atualmente está trabalhandosorteesportiva bonusum projeto intitulado "Freedom Narratives", que busca reconstruir e analisar narrativassorteesportiva bonuspessoas que foram escravizadas e/ou fugiram ou reivindicaramsorteesportiva bonusliberdade e seus direitos.
Uma delas é asorteesportiva bonusAntoniosorteesportiva bonusSoledad, um soldado negro que, depoissorteesportiva bonuslutar por Havana e receber medalhas como um heróisorteesportiva bonusguerra, passou a ser maltratado na ilha, que caminhava para um acirramento do tráfico negreiro com o boom do açúcar no início do século 19. Soledad escreveu uma cartasorteesportiva bonusprotesto, assinada junto a outros soldados negros, e a encaminhou para a Coroa espanhola,sorteesportiva bonus1789.
Outra é asorteesportiva bonusAntoniosorteesportiva bonusFlores, um carpinteiro mulato, que também lutou para defender Havana, era livre e viu seus filhos impedidossorteesportiva bonusestudar, pois não era permitido para crianças "de cor". Em 1759, Flores escreveu à Espanha para pedir que eles pudessem ingressar na universidade para poderem buscar as profissões que quisessem no futuro. O pedido foi negado.
Não se sabe, porém, o desfecho do casosorteesportiva bonusJosé, nem sequer se viveu seus últimos diassorteesportiva bonusLisboa ou se voltou a Havana. Rodrigosorteesportiva bonusAguiar Amaral considera que, se seu pedido não foi atendido pelas vias legais, o destino mais provávelsorteesportiva bonusJosé seria fugir e/ou tentar assassinar seu senhor, não necessariamente nessa ordem. "Atossorteesportiva bonusrebeldia e violência desse tipo eram o extremo, o último recurso."
Já Thiago Krause pondera que, considerando que não era incomum a Coroa aceitar esse tiposorteesportiva bonuspetição extrajudicial, talvez José tenha obtidosorteesportiva bonusliberdade. "A imaginação é essencial para o historiador."

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