O que causou a enchentejogo jogar1941jogo jogarPorto Alegre — e por que ela não é argumento para negar mudanças climáticas:jogo jogar

Crédito, Reuters

Legenda da foto, As inundaçõesjogo jogar1941 e 2024 tiveram origens e características diferentes, mostram pesquisas

No entanto, os acontecimentosjogo jogar1941 são frequentemente usados nas redes sociais como argumento para enfraquecer ou desbancar análises e projeções que apontam as mudanças climáticas como um fator decisivo para a crise atual.

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Fim do Matérias recomendadas

Segundo essa linhajogo jogarraciocínio, catástrofes climáticas acontecem naturalmentejogo jogartemposjogo jogartempos — e não estão relacionadas à ação humana.

Mas o que dizem as evidências científicas? Quais foram as causas da enchentejogo jogar1941? E será que é possível comparar os dois fenômenos?

Como você confere a seguir, especialistas ouvidos pela BBC News Brasil explicam que a frequência e a intensidadejogo jogareventos climáticos extremos vem aumentandojogo jogarvárias partes do mundo — inclusive na região Sul do Brasil.

O que separa 1941jogo jogar2024

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Um artigo publicadojogo jogar2022 por um grupojogo jogarpesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) fez uma sériejogo jogarsimulações para tentar explicar o que ocorreujogo jogarPorto Alegre entre abril e maiojogo jogar1941, quando a cidade foi atingida pela então maior catástrofe climáticajogo jogarsua história.

“A enchentejogo jogar1941 pode ser considerada um evento composto, porque ela foi causada por dois fatores: a precipitação [chuva] e os ventos”, explica a engenheira ambiental e sanitarista Thais Magalhães Possa, uma das autoras do estudo.

“Ambos tiveram um papel importante no aumento do nível do Guaíba durante as cheias daquele ano”, complementa a especialista, que também é doutoranda no Institutojogo jogarPesquisas Hidráulicas da UFRGS e hidróloga na SAFF Engenharia.

Como citado no início da reportagem, o lago que margeia a capital gaúcha atingiu à época 4,75 metros e inundou maisjogo jogar15 mil casas. Mas a forma como o fenômeno se desenrolou foi diferente do que aconteceu agora,jogo jogar2024.

“Em 1941, a precipitação se estendeu por um longo períodojogo jogar24 dias, entre 13jogo jogarabril e 6jogo jogarmaio. O volumejogo jogarchuva acumuladojogo jogarPorto Alegre nessas datas foijogo jogar600 milímetros (mm)”, calcula Possa.

“Jájogo jogar2024, observamos altos volumesjogo jogarchuva durante um período curto. Em algumas regiões, tivemos 200 mmjogo jogarprecipitaçãojogo jogarapenas três dias”, compara ela.

As enchentesjogo jogar83 anos atrás também tiveram a contribuição importante dos ventos, como mencionado por Possa.

“O que se sabe por meiojogo jogarrelatos é que ocorreu um ventojogo jogarintensidade forte na direção sul, que contribui para um aumento do nível das águas”, diz a hidróloga.

“Para o evento atual, não observamos ventos tão intensos que justifiquem níveis tão grandes do Guaíba”, pontua ela.

“Esse evento climáticojogo jogaragora está muito mais relacionado à vazão dessa grande precipitação num curto espaçojogo jogartempo, que encheu a bacia hidrográfica”, acrescenta o engenheiro ambiental Pedro Frediani Jardim, outro autor do artigo.

Mas o que explica tanta chuva no Rio Grande do Sul durante essas últimas semanas?

Meteorologistas ouvidos pela BBC News Brasil destacam uma conjunçãojogo jogarfatores por trás das tempestades.

Primeiro, um “cavado” (uma frente fria) que tomou todo o Estado. Segundo, uma ondajogo jogarcalor no Centro-Oeste e no Sudeste, que bloqueou a dissipação da frente fria vinda do sul.

Terceiro, a seca na Amazônia e um deslocamento dos “rios voadores”, que trazem umidade da maior floresta tropical do mundo para o resto do Brasil. E, quarto, o fenômeno El Niño, que aquece as águas do Oceano Pacífico e traz mais umidade para terras gaúchas.

Mas daí vem a grande questão: os eventos climáticos extremos que afetam tantas cidades gaúchas agora estão relacionados ou não às mudanças climáticas?

Crédito, ANTÔNIO NUNES/ACERVO FOTOGRÁFICO DO MUSEU DE COMUNICAÇÃO SOCIAL HIPÓLITO JOSÉ DA COSTA

Legenda da foto, As inundaçõesjogo jogar1941 foram o maior evento climático a afetar a capital gaúcha — até 2024

15% mais chuvas

Jardim, que também é hidrólogo na Hydrodata Engenharia, pondera que ainda é muito cedo para fazer uma ligação direta e afirmar categoricamente que as atuais inundações no Rio Grande do Sul estão relacionadas ao aquecimento global provocado pela ação humana.

“Com a extensãojogo jogardados que nós temos hoje, não é possível cravar com 100%jogo jogarcerteza que as cheias das últimas semanas foram causadas pelas mudanças climáticas. Nós podemos estar diantejogo jogarum período anômalo, que daqui a pouco volta ao normal”, avalia o especialista.

“No entanto, estamos vivenciando eventos climáticos com mais frequência, como as cheiasjogo jogarsetembro e novembrojogo jogar2023, além da atual. E esses fenômenos estão muito ligados àquilo que as projeções indicavam sobre os efeitos das mudanças climáticas no Estado”, complementa ele.

“Em outras palavras, a gente ainda não pode afirmar que as cheias atuais são decorrência direta das mudanças climáticas. Mas o que vemos agora condiz com aquilo que os modelos climáticos projetam para o Rio Grande do Sul”, explica Possa.

Aliás, os hidrólogos formados na UFRGS lembram que, das quatro maiores cheias já registradasjogo jogarPorto Alegre, três ocorreram nos últimos nove meses. A mais forte delas é a atual. Em segundo lugar, vem ajogo jogar1941. Na sequência, aparecem as inundaçõesjogo jogarsetembro e novembro do ano passado.

Uma ferramenta usada pelos cientistas para avaliar se eventos extremos estão relacionados ao aquecimento global (ou não) são os chamados estudosjogo jogaratribuição rápida.

O objetivo aqui é comparar dados, imagensjogo jogarsatélites e outros indicadores para entender se um fenômeno (chuvas intensas, secas, etc.) foi influenciado por uma variabilidade natural, que acontecejogo jogartemposjogo jogartempos, ou acabou reforçado justamente pelas mudanças climáticas.

Um dos grupos a fazer esse tipojogo jogaranálise é o ClimaMeter, que foi desenvolvido pelo Laboratóriojogo jogarCiências do Clima e do Ambiente da Universidade Paris-Sarclay, na França e é liderado por diversas instituições europeias.

O trabalho comparou os sistemasjogo jogarpressão atmosférica que causaram enchentes no Sul no presente (entre 2001 e 2023) com a forma que eles se comportavam no passado (entre 1979 e 2001).

Segundo o relatório, há 15% mais chuvas nos tempos atuais do que nas décadas anteriores.

“Nós atribuímos o aumento da precipitação que produziu as inundações no sul do Brasil às mudanças climáticas provocadas pelo homem. A variabilidade climática natural provavelmente desempenhou um papel modesto no evento”, concluem os pesquisadores.

“As pessoas podem argumentar que choveu tanto por causa do El Niño, que é uma variabilidade natural da realidade climática”, pontua a pesquisadora brasileira Luiza Vargas-Heinz, doutoranda no Centro Internacionaljogo jogarFísica Teórica Abdus Salam, na Itália, e uma das autoras do relatório do ClimaMeter.

“No estudo, levamosjogo jogarconta os indicadores da intensidade do El Niño, mas eles não são suficientes para explicar esse aumento da intensidade das chuvas. Por isso, chegamos à conclusãojogo jogarque essa intensificação está relacionada às mudanças climáticas”, reforça ela.

Crédito, Reuters

Legenda da foto, Eventos climáticos extremos estão mais intensos e frequentes, como indicam as projeções

Novas bolinhas nas faces dos dados

Mas por que eventos extremos ficam mais fortes e frequentes num contextojogo jogarmudanças climáticas, como apontam os modelos feitos por cientistas?

Para responder essa questão, o climatologista Alexandre Costa, da Universidade Estadual do Ceará, cita um cálculo do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC).

“As projeções apontam que, no momentojogo jogarque o aquecimento global ultrapassou a barreirajogo jogar1 ºC, os eventos extremos úmidos se tornaram 30% mais frequentes e 6% mais intensos”, informa ele.

Para explicar como isso ocorre na prática, o pesquisador faz uma comparação com um jogojogo jogardados.

“Vamos imaginar que um evento extremo, como chuvas muito fortes, equivale ao número 12”, começa ele.

“Para que isso aconteça no jogo, você tem uma chancejogo jogar36. Isso porque, para obter esse resultado, você precisa que os dois dados caiam no seis.”

Transportando o exemplo para a vida real, para que uma catástrofe relacionada ao clima aconteça, é preciso uma conjunçãojogo jogarfatores um tanto rara — nas enchentes que acometem as cidades gaúchas, houve a frente fria, a ondajogo jogarcalor, o El Niño, a seca na Amazônia…

“O problema é que as mudanças climáticas causadas pelo homem produzem uma forte mudança na distribuição das probabilidades dos eventos extremos”, explica Costa.

“No exemplo do jogo, é como se nós estivéssemos pintando uma bolinha preta a maisjogo jogarcada face dos dados. Com isso, teríamos os numerais dois, três, quatro, cinco, seis e sete.”

Ou seja: se antes só havia uma possibilidadejogo jogarsomar 12 nos dados (6+6), agora existem duas (6+6 e 5+7), ou o dobro.

“E, pior, essa modificação abre uma outra possibilidade: tirar o número 13. Ou, na vida real, ter eventos extraordinários ainda mais extremos e imprevisíveis”, acrescenta o cientista.

Costa reforça que, quando a atividade humana lança gases que elevam as temperaturas e mudam o ciclo hidrológico do planeta, isso gera uma gamajogo jogarnovas possibilidades, como secas numa região ou tempestades fora do comumjogo jogaroutra.

Além disso, a tendência é que esses eventos extremos — que acontecem naturalmente,jogo jogartemposjogo jogartempos, segundo os ciclos climáticos do planeta — se repitamjogo jogarespaçosjogo jogartempo mais curtos.

“O tempojogo jogarrecorrência dessas catástrofes se reduz. Cheias extraordinárias ou ondasjogo jogarcalor fortíssimas, que aconteciam a cada 50 anos, passam a ocorrer todas as décadas”, exemplifica ele.

Crédito, Reuters

Legenda da foto, Será necessário repensar na forma como casas, bairros e cidades estão projetados para se adaptar às mudanças climáticas, apontam especialistas

Mas será que isso já é realidade quando pensamos no Rio Grande do Sul? Ou a enchente atual é um evento isolado?

A bióloga Patricia Eichler-Barker, pesquisadora visitante do Laboratóriojogo jogarGeologia e Geofísica Marinha e Monitoramento Ambiental da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), observa que toda a região Sul do Brasil sofre com uma sériejogo jogarproblemas relacionados ao clima nas últimas duas décadas.

“Em 2004, tivemos um furacãojogo jogarSanta Catarina que destelhou muitas casas e afetou a vidajogo jogardezenasjogo jogarpessoas”, lembra ela.

“Sempre ouvimos que o Brasil não sofria com catástrofes naturais. Furacões e tufões eram coisas dos Estados Unidos. Tsunamis só ocorriam na Tailândia. Mas começamos a ver que isso não correspondia mais à realidade.”

O fatojogo jogartrês das quatro grandes cheiasjogo jogarPorto Alegre terem acontecido nos últimos nove meses também corrobora essa tendência.

“E isso tudo é frutojogo jogarpolíticas públicas e privadas dos últimos 30 anos que não têm o mínimo respeito pelo meio ambiente”, opina a especialista, que também faz projetosjogo jogarpesquisa na Universidade da Califórniajogo jogarSanta Cruz, nos Estados Unidos.

“E agora o país inteiro se mobilizajogo jogarsolidariedade ao Rio Grande do Sul. Mas o que pode acontecer quando catástrofes do tipo começarem a acontecerjogo jogartrês ou quatro Estados ao mesmo tempo? Precisamos pensarjogo jogarcomo atender múltiplas demandas”, sugere Costa.

Os especialistas ouvidos pela BBC News Brasil foram um unânimesjogo jogarafirmar que, além das medidas para frear o aquecimento do planeta, será necessário pensarjogo jogarplanosjogo jogarresiliência climática — ou seja, como adaptar moradias, bairros e cidades inteiras a eventos como secas, inundações, ondasjogo jogarcalor, entre outros.

“No caso do Rio Grande do Sul, precisaremos pensar nos padrõesjogo jogarocupação e nos tiposjogo jogarestruturas que permitirão a gente conviver com essas cheias”, antevê Jardim.

“E aquilo que já está implantando, como nossos sistemasjogo jogarproteção contra enchentes ou as pontesjogo jogarcimajogo jogarrios, terão que ser estudados e com garantiasjogo jogarmanutenção”, conclui ele.