'Ainda estou aqui' no Oscar: por que casoaposta renata fanRubens Paiva retratado no filmeaposta renata fanWalter Salles segue parado no STF:aposta renata fan
O deputado foi cassado e presoaposta renata fan1971 e dado como desaparecido. Sua morte, confirmada só 40 anos mais tarde, segue até hoje sem que os culpados tenham sido responsabilizados.
Isso porque a denúncia, feita há uma década, e o processo decorrente na Justiça brasileira está parado no Supremo Tribunal Federal (STF), nas mãos do ministro Alexandreaposta renata fanMoraes, sem qualquer sinalaposta renata fanque possa ser retomado. A demora é tal que três dos cinco militares acusados pelo crime já morreram.
Esse impasse está intimamente ligado ao debate sobre a constitucionalidade da Lei da Anistia, que concedeu perdão tanto a perseguidos políticos quanto a agentes do Estado que cometeram crimes durante o governo militar.
No centro da questão, há uma discussão se os crimes daquele período podem ou não ser ainda punidos e,aposta renata fanúltima instância, a disposição da sociedade brasileiraaposta renata fanacertar as contas com um dos períodos mais violentosaposta renata fansua história recente.
Este é o cerneaposta renata fanAinda Estou Aqui, diz Marcelo Rubens Paiva à BBC News Brasil,aposta renata fanqueaposta renata fanmãe, Eunice, interpretada por Fernanda Torres, é apresentada como uma mulher forçada a se reinventar diante da violência do Estado e a criar um novo futuro paraaposta renata fanfamília.
Seu livro e o longa derivado dele propõem mais do que uma reconstituição histórica. São uma reflexão sobre a impunidade e a resistência à revisãoaposta renata fancrimes da ditadura militar, tema que permanece atual e controverso no país.
“O nosso papel como cineasta, escritor, roteirista, pessoa das artes é falar aquilo que os vencidos não conseguem falar”, diz o filho do deputado.
“Mostrar, denunciar, apontar, é muito complicadoaposta renata fanum país que sofreu um processoaposta renata fanditadura tão longo e que na redemocratização fez um pacto sinistro entre a sociedade civil e os torturadores.”
Por que caso Rubens Paiva está parado no STF
Rubens Beyrodt Paiva nasceuaposta renata fan1929,aposta renata fanSantos, São Paulo. Casado com Eunice Facciolla Paiva, era paiaposta renata fancinco filhos: Vera, Maria Eliana, Ana Lúcia, Marcelo e Maria Beatriz.
Formadoaposta renata fanengenharia, Paiva foi eleito deputado federal pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB)aposta renata fan1962.
Durante seu tempo na Câmara dos Deputados, destacou-se como relator da Comissão Parlamentaraposta renata fanInquérito (CPI) do Instituto Brasileiroaposta renata fanAção Democrática (Ibad), que investigava o financiamentoaposta renata fangrupos que conspiravam contra o governoaposta renata fanJoão Goulart.
Com a instalação do regime militar,aposta renata fan10aposta renata fanabrilaposta renata fan1964, seu mandato foi cassado, levando-o ao exílio na Iugoslávia.
Após retornar ao Brasilaposta renata fannovembro do mesmo ano, Paiva estabeleceu-se com a famíliaaposta renata fanSão Paulo e, posteriormente, no Rioaposta renata fanJaneiro,aposta renata fanuma residência na Avenida Delfim Moreira, no bairro do Leblon.
Ele atuava como diretor-gerenteaposta renata fanuma empresaaposta renata fanengenharia e fundações, cultivando relações com jornalistas e políticosaposta renata fanoposição.
No entanto,aposta renata fan1971, Rubens Paiva foi sequestrado por agentes do regime militar e, conforme denúncia do Ministério Público Federal do Rioaposta renata fanJaneiro, morreu no antigo DOI-Codi, na Tijuca, na zona norte da capital.
Foi somente durante a Comissão da Verdade que foi confirmada a morteaposta renata fanRubens Paiva.
A comissão, instituídaaposta renata fan2012, no governoaposta renata fanDilma Rousseff, tinha como objetivo investigar e documentar as violações dos direitos humanos durante a ditadura militar.
Durante a comissão, foi confirmado e esclarecido que Rubens Paiva foi torturado e mortoaposta renata faninstalações militares.
Em 2014, a Comissão Nacional da Verdade (CNV) apresentou informações sobre o caso do desaparecimento do ex-deputado Rubens Paiva.
Em um relatório parcial divulgado no Arquivo Nacional, no Rioaposta renata fanJaneiro, a CNV apontou o então tenente Antônio Fernando Hughesaposta renata fanCarvalho como um dos torturadores responsáveis pela morteaposta renata fanPaiva.
Essa revelação veio à tona com base no depoimentoaposta renata fanuma testemunha, identificada apenas como "agente Y", que afirmou ter visto Hughes pressionar o ex-deputado contra uma parede durante uma sessãoaposta renata fantortura no Destacamentoaposta renata fanOperaçõesaposta renata fanInformações (DOI).
Segundo o relatório, Rubens Paiva morreuaposta renata fandecorrência das torturas infligidas pelos militares. Apesar das novas provas, como recibosaposta renata fanpagamentoaposta renata fandiárias que contradizem a versãoaposta renata fanque José Antônio Nogueira Belham, comandante do Doi-Codi à época, estariaaposta renata fanférias durante a prisão e morteaposta renata fanPaiva, o destino final do corpo do ex-deputado ainda não foi esclarecido.
Cláudio Fonteles, ex-procurador geral da República e um dos coordenadores da Comissão Nacional da Verdade, explica que a recusa das Forças Armadasaposta renata fanabrir seus arquivos, mantendo a documentação sob sigilo, dificultou a investigação dos crimes.
Neste sentido, os depoimentos colhidos pela comissão tiveram um papel central.
“Nesses crimes antigos, as provas testemunhais são muito importantes”, pontua Marlon Alberto Weichert, procurador regional da República e coordenador do Grupoaposta renata fanTrabalho Memória e Verdade da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão.
“Especialmente nos casosaposta renata fangraves violações a direitos humanos, onde as evidências da tortura se perdem um pouco com o tempo e a documentação até hoje é mantida sob sigilo.”
Em 2014, após investigações iniciadasaposta renata fan2011, o Ministério Público Federal (MPF) denunciou cinco ex-integrantes do sistemaaposta renata fanrepressão da ditadura militar pelo assassinato e ocultação do cadáver do deputado Rubens Paiva. As acusações incluíam homicídio doloso, ocultaçãoaposta renata fancadáver, associação criminosa armada e fraude processual.
Os denunciados foram José Antonio Nogueira Belham, Rubens Paim Sampaio, Jurandyr Ochsendorf e Souza, Jacy Ochsendorf e Souza e Raymundo Ronaldo Campos.
A Justiça Federal do Rioaposta renata fanJaneiro aceitou a denúncia, que foi mantida pelo Tribunal Regional da 2ª Região.
Esse desdobramento foi considerado um marco pelos membros do MPF, pois representou a primeira ação penal contra militares por homicídios ocorridos durante a ditadura. Os acusados solicitaram um habeas corpus à 2ª turma do TRF2, mas o pedido foi negado.
A defesa dos réus, então, recorreu ao STF alegando que a anistia já havia sido discutida na Arguiçãoaposta renata fanDescumprimentoaposta renata fanPreceito Fundamental (ADPF) 153, que é um instrumento jurídico utilizado no Brasil para questionar atos do Poder Público que violem preceitos fundamentais da Constituição, como direitos humanos básicos.
Em 29aposta renata fansetembroaposta renata fan2014, apenas 19 dias após o julgamento do habeas corpus, o ministro-relator Teori Zavascki concedeu uma liminar para suspender o andamento do processo.
Zavascki faleceuaposta renata fan2017aposta renata fanum acidenteaposta renata fanavião, e o processo foi paralisado. Em 2018, o caso foi encaminhado ao ministro Alexandreaposta renata fanMoraes, que sucedeu Zavascki e herdou os processos pendentes. Desde então, o caso permanece paralisado no STF, sem previsãoaposta renata fanjulgamento.
O Supremo não forneceu detalhes à BBC News Brasil sobre a razão da demora no julgamento.
Lei da Anistiaaposta renata fanxeque
Os rumos do caso Rubens Paiva está ligado a uma discussão sobre a constitucionalidade da Lei da Anistia.
Esta legislação, decretadaaposta renata fan1979, durante a ditadura, ao conceder perdão geral aos crimes cometidos durante o regime, permitiu por um lado o retornoaposta renata fanexilados e a libertaçãoaposta renata fanpresos políticos.
Por outro, ressaltam especialistas ouvidos pela BBC News Brasil, impediu que agentes da ditadura que torturaram e mataram opositores do governo militar fossem processados.
“A transição controlada, dominada pelos militares, com as elites brasileiras, levou a esse modeloaposta renata fanimpunidade eaposta renata fanesquecimento”, diz Weichert.
“Esses assuntos foram assuntos interditados, assuntos proibidos.”
Em 2010, o STF decidiu que a Lei da Anistia é constitucional, o que é questionado ainda hoje.
Para Claudio Fonteles, a Lei da Anistia é inconstitucional, porque contraria princípios fundamentais da Constituição Federal.
Ele argumenta que uma lei ordinária, como a Leiaposta renata fanAnistia, não pode, sob a ótica constitucional, anistiar crimes cometidos por aqueles que violaram o Estado Democráticoaposta renata fanDireito, já que a Constituição é a base permanente da democracia e deve ser preservada acimaaposta renata fanqualquer legislação infraconstitucional
“Manter essa lei é preservar a figura do torturador. Não colabora para a defesa da democracia e coloca uma pedra sobre esse assunto”, afirma Fonteles à BBC News Brasil.
Weichert argumenta que, apesar da decisão do STF ter declarado a Leiaposta renata fanAnistia constitucional, a Corte Interamericanaaposta renata fanDireitos Humanos a considerou incompatível com a convenção americana sobre direitos humanos.
Ele explica que a Corte só pode agir quando provocada pela Comissão Interamericanaaposta renata fanDireitos Humanos ou por um Estado, já que pessoas físicas não têm permissão para entrar com ações diretamente.
A comissão, poraposta renata fanvez, é responsável por receber denúnciasaposta renata fanviolações, apresentadas por qualquer vítima, e analisar se essas denúncias cumprem os requisitos estabelecidos pela convenção.
Caso a comissão conclua que houve,aposta renata fanfato, uma violaçãoaposta renata fandireitos humanos, ela tenta, primeiramente, um acordo com o Estado. Se não houver sucesso nessa tentativaaposta renata fanconciliação, o caso é então levado à Corte.
Exemplosaposta renata fanprocessos envolvendo o Brasil incluem os casos da guerrilha do Araguaia (Gomes Lund), do jornalista Vladimir Herzog e Collen Leite, todos levados à Corte após a comissão ter realizado esse procedimento.
Em decisões importantes, a Corte Interamericana declarou que tanto crimes contra a humanidade quanto graves violaçõesaposta renata fandireitos humanos são imprescritíveis e não podem ser anistiados.
O fatoaposta renata fanos próprios militares terem decretado a lei que perdoa os crimes cometidos por agentes do regime seria uma formaaposta renata fan“autoanistia”, defende Sergio Suiama, procurador da República do Ministério Público do Rioaposta renata fanJaneiro.
“Isso é inadmissívelaposta renata fancasosaposta renata fancrimes contra a humanidade”, pontua Suiama.
O procurador destaca que isso tem travado o avançoaposta renata fanações penais como aaposta renata fanRubens Paiva.
"O casoaposta renata fanRubens Paiva está suspenso devido a essa indefinição”, diz Suiama.
Segundo Suiama, o MPF já propôs maisaposta renata fan40 ações penais, mas a maioria delas foi suspensa ou derrubada justamente porque o STF não julga essas arguiçõesaposta renata fandescumprimentoaposta renata fanpreceito fundamental (ADPF).
“As provas reunidas durante a investigação do MPF, incluindo confissõesaposta renata fanfarsaaposta renata fantentativasaposta renata fanfuga, permanecem sem análiseaposta renata fanmérito, esperando por uma decisão que determine se esses crimes são ou não imprescritíveis".
O advogado Rodrigo Roca, que representa os acusadosaposta renata fantorturar e matar Rubens Paiva, questiona a argumentaçãoaposta renata fanque os crimes da ditadura podem ser enquadrados como crimes contra a humanidade.
Segundo Roca, para ser um crime contra a humanidade, a conduta precisa ter sido voltada contra uma população civil, o que, segundo ele, não seria o caso.
“Uma conduta para ser considerada crime contra a humanidade, ela precisa se voltar contra a população civil como um todo. E não contra determinados grupos insurgentes. Isso legalmente, ou seja, tecnicamente, penso até que dogmaticamente, não poderia jamais ser tipificado como crime contra a humanidade”, diz.
O advogado avalia ainda que o processo movido pelo MPF que busca um desfecho para a morteaposta renata fanRubens Paiva, iniciado durante o governo Dilma e na esteira das conclusões da Comissão da Verdade, teve um "viés político".
Segundo ele, sempre que um governoaposta renata fanesquerda chega ao poder, há um "recrudescimento desse movimento", que ele qualifica como "delírios”.
“É preciso se perguntar antes a quem isso vai interessar, qual é a relação custo-benefícioaposta renata fanuma nova mobilização dessas, do governo,aposta renata fanalguns setores do judiciário,aposta renata fantornoaposta renata fanpessoas com questões jurídicas plenamente resolvidas, quer dizer, é uma perda para todos, é uma guerra sem vencedores”, acrescenta.
“Há um revolvimentoaposta renata fanuma matéria jurídica já bem desgastada e resolvida do pontoaposta renata fanvista social. Caberia ao plano jurídico apenas aderir a essa consciência popular e por um fim nessa história”, acrescenta.
Governo reabriu investigação do caso
Em paralelo, o Conselho Nacionalaposta renata fanDireitos Humanos (CNDH), órgão do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, reabriu o casoaposta renata fanabril deste ano.
O objetivo é investigar e produzir mais provas que comprovem o que aconteceu com Rubens Paiva.
Em agostoaposta renata fan1971, o caso foi arquivado pelo Conselhoaposta renata fanDefesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH), órgão antecessor do atual Conselho Nacionalaposta renata fanDireitos Humanos (CNDH).
A votação evidenciou divisões: enquanto membros ligados à ARENA (Aliança Renovadora Nacional) apoiaram o arquivamento, representantes do MDB e da OAB se posicionaram contra.
O então ministro da Justiça, Alfredo Buzaid, exerceu o votoaposta renata fandesempate, decidindo pelo arquivamento. A justificativa oficial baseou-seaposta renata faninformações falsas do Exército, que alegava que Rubens Paiva havia desaparecido após uma intervençãoaposta renata fandesconhecidos duranteaposta renata fandetenção.
Essa versão foi desmentida posteriormente pela Comissão Nacional da Verdade. Ademais, um dos conselheiros que votou pelo arquivamento afirmou ter sido coagido a tomar essa decisão.
Segundo André Carneiro, vice-presidente do CNDH, a medida tem caráter administrativo, com possibilidadesaposta renata fancontribuir com essa ação penal do MPF.
Carneiro afirma ainda que será produzido um relatório que conterá recomendações ao Poder Público específicas para o caso Rubens Paiva e também gerais sobre o direito à memória, à verdade e à Justiça. O documento deve ser entregue até o fim deste ano.
“Como existe um processo no STF, esse relatório será entregue ao MPF e compartilhado com o Supremo”, ressalta Carneiro.
“Esse caso é bastante simbólico.Tratava-seaposta renata fanum ex-deputado federal, alguém que não tinha vínculo com a luta armada. A forma como foi tratado revela a estruturaaposta renata fanfuncionamentoaposta renata fanespionagem e uma máquinaaposta renata fantortura no país.”
Marcelo Rubens Paiva reforça a importânciaaposta renata fanmanter viva a memória do pai, seja por filmes, livros ou reportagens.
Para o escritor, a formaaposta renata fanimpedir que a ditadura volte é colocaraposta renata fanevidência o aconteceu durante o regime — e isso inclui o assassinatoaposta renata fanRubens Paiva.
“Tem que mostrar o que é a ditadura, o que foi o AI-5, o que foi a tortura, o que foi o Estado autoritário”, diz Marcelo Rubens Paiva.
“É algo que não se deve defender jamais.”