Por que é polêmico comparar as contas do governo com o orçamento doméstico?:esporte da sorte aposta

A BBC News Brasil entrevistou economistas para entender por que é preciso cuidado ao comparar as contas públicas com o orçamentoesporte da sorte apostauma família. Quem nunca ouviu um político fazendo isso?

Ex-ministro da Casa Civil do governo Jair Bolsonaro, Onyx Lorenzoni comparou o contingenciamentoesporte da sorte apostagastos com educação à dificuldadeesporte da sorte apostauma família para comprar um vestido para festaesporte da sorte aposta15 anos.

"É que nem o pai, que tem um salário e sabe que tem que comprar o vestidoesporte da sorte aposta15 anos da filha láesporte da sorte apostaoutubro, mas ele estáesporte da sorte apostamaio. Aí, ele vai vendo o que vai entrando, o que vai gastando, e diz: 'ih, pode ser quem não dê, então não vou sair para comprar churrasco, não vai ter cervejinha no finalesporte da sorte apostasemana, eu não vou comprar o tênis do João", disse.

Mas fazer essa relação não é moda lançada pelo atual governo.

Em 2016, o então presidente Michel Temer defendeu o ajuste das contas públicas citando uma fala da ex-primeira-ministra britânica Margareth Thatcher. "Ela até dizia uma coisa trivial: o Estado é como uma casa,esporte da sorte apostacasa, a casa daesporte da sorte apostafamília, você não pode gastar mais do que aquilo que arrecada."

Antes disso, a ex-presidente Dilma Rousseff também comparava as contas públicas com o orçamentoesporte da sorte apostauma casa.

"Nós precisamos também fazer ajustes. Eu faço ajuste no meu governo como uma mãe, uma donaesporte da sorte apostacasa, fazem na casa delas. Nós precisamos agora dar condiçõesesporte da sorte apostaa gente retomar um novo cicloesporte da sorte apostadesenvolvimento econômico para gerar mais emprego, para assegurar mais renda e para fazer que o Brasil continue a cresceresporte da sorte apostaforma acelerada", disse, enquanto era presidente.

Os economistas dizem que a comparação pode ter a intençãoesporte da sorte apostasimplificar um tema complexo, mas apontam diversos problemas.

"A metáfora é útil, mas tem severas limitações", afirma a economista Monicaesporte da sorte apostaBolle, pesquisadora do Peterson Institute,esporte da sorte apostaWashington.

O economista Manoel Pires, que já foi secretárioesporte da sorte apostaPolítica Econômica do Ministério da Fazenda, diz que a comparação normalmente é feita para "passar uma mensagemesporte da sorte apostaque o governo,esporte da sorte apostadeterminadas situações, tem que economizar recursos ou justificar determinada necessidadeesporte da sorte apostafazer um ajuste fiscal para equilibrar as contas".

No entanto, Pires diz que "quando a gente vai levar essa comparação mais a sério, as diferenças são muito grandes".

"As pessoas fazem essa analogia dizendo 'o governo é igual uma família e por isso tem que gastar o quanto arrecada'. Nem as famílias gastam o quanto elas arrecadam. Essa comparação já é limitada logoesporte da sorte apostacara, porque família também tem acesso a mercadoesporte da sorte apostacrédito, se endivida para comprar um casa, um carro. Muitas vezes a pessoa perde o emprego e,esporte da sorte apostasituação mais difícil, entra no cheque especial."

Em cinco pontos, entenda por que é polêmico comparar as contas do governo e o orçamentoesporte da sorte apostauma família:

1. Criação ou aumentoesporte da sorte apostaimposto

Uma trabalhadora ou um trabalhador podem buscar um aumento salarial ou tentar lucrar mais com o próprio negócio, mas não têm o poderesporte da sorte apostadeterminar qual seráesporte da sorte apostarenda no fim do mês.

"As famílias não definem a própria renda — mas o Estados sim, por meio do tributo, por exemplo", diz Grazielle David, doutorandaesporte da sorte apostadesenvolvimento econômico na Unicamp e assessora da Rede Latinoamericanaesporte da sorte apostaJustiça Fiscal.

O governo pode — embora possa desagradar setores específicos ou consumidores — criar novos tributos ou aumentar a alíquotaesporte da sorte apostaimpostos que já existem para tentar reforçar a arrecadação dos cofres públicos. As receitas, no entanto, também dependemesporte da sorte apostaoutros fatores, como crescimento econômico e a aprovaçãoesporte da sorte apostamedidas no Congresso.

Um exemplo recente foi a discussãoesporte da sorte apostatorno da criaçãoesporte da sorte apostaum tributo sobre transações financeiras similar à antiga CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira), que enfrentou resistênciaesporte da sorte apostaparlamentares eesporte da sorte apostaparte da população.

2. Imprimir dinheiro

Se a família não pode imprimir dinheiro para pagar a dívida, o Estado pode emitir moeda para pagar dívidasesporte da sorte apostamoeda nacional. Essa medida, no entanto, é considerada mais drástica porque pode desestabilizar a economia.

"O governo tem uma capacidade adicional, que obviamente famílias não têm: o poder e a responsabilidade únicaesporte da sorte apostacriar e emitir essa moeda na qual as dívidas estão denominadas. Então,esporte da sorte apostaúltima análise, quando acontece uma situaçãoesporte da sorte apostaque as dívidas estão excessivamente elevadas, o governo pode pagar a si próprio emitindo moeda", diz Monicaesporte da sorte apostaBolle.

"Essa possibilidade do governoesporte da sorte apostase autofinanciar por meio da emissãoesporte da sorte apostamoeda, evidentemente que num prazo maior pode gerar desequilíbrio muito severo. Pode gerar, por exemplo, situaçãoesporte da sorte apostainflaçãoesporte da sorte apostaalta ou hiperinflação, como vimosesporte da sorte apostapaíses latinoamericanos que faziam isso nos anos 1970 e 1980."

3. Taxas e prazos das dívidas

Os governos têm a possibilidadeesporte da sorte apostadeterminar como vão remunerar o endividamento — ou seja, determinar qual será o critério para pagar os juros a quem emprestou o dinheiro. Os títulos da dívida pública, que são uma formaesporte da sorte apostao governo se financiar, têm remunerações que dependem do prazo e podem estar baseadas, por exemplo, na taxa Selic ou na inflação.

Outro ponto importante é a rolagem das dívidas — ou seja, a conversãoesporte da sorte apostauma dívida antigaesporte da sorte apostauma nova dívida.

"Países como Estados Unidos, Japão, diversos países europeus têm dívidas muito elevadas e carregam essas dívidas há anos, sem que isso seja um empecilho. Isso acontece porque governos, diferentementeesporte da sorte apostafamílias, têm domínio sobre quem vai absorver suas próprias dívidas", diz Monicaesporte da sorte apostaBolle.

"Quando uma família pega um empréstimo no banco porque gastou mais do que recebeu, ela não tem poderesporte da sorte apostainfluência sobre o banco. O banco determinou um contratoesporte da sorte apostacrédito com essa família esporte da sorte apostaque estão estipuladas as condições para que pagueesporte da sorte apostavolta o empréstimo. No caso dos governos, eles exercem um poder sobre a economiaesporte da sorte apostamodo geral e, portanto, sobre os detentores finais da dívida pública."

Por isso, segundo a economista, os países conseguem "carregar dívidas elevadas" e "sustentar uma situaçãoesporte da sorte apostadeficit grande".

4. Relação entre a receita e a despesa

Os diferentes efeitos do corteesporte da sorte apostauma despesa são outro ponto frequentemente discutido.

"Se eu sou uma residência e faço um corteesporte da sorte apostauma despesa minha, isso não necessariamente vai afetar a minha receita. Se eu deixaresporte da sorte apostair ao cinema, por exemplo", diz Graziella David. "Mas essa lógica não é verdadeira para o Estado. Quando o Estado gera uma despesa pública, muitas vezes ele também gera uma receita para ele."

Ela diz que gastos públicos com saúde e educação, por exemplo, podem gerar retornos tambémesporte da sorte apostatermosesporte da sorte apostaarrecadaçãoesporte da sorte apostatributos e, no futuro, reforçar o caixa do governo. "Se eu diminuo gastoesporte da sorte apostasaúde e educação, diminuo a capacidade arrecadatória, diminuo o crescimento econômico, diminuo a minha receita."

Neste ponto, há uma discussão entre as diferentes correntes da economia sobre quais os estímulos adequados para uma economiaesporte da sorte apostacrise. Os keynesianos, por exemplo, defendem políticas anticíclicas para evitar um colapso econômico — ou seja, estímulos do governoesporte da sorte apostamomentoesporte da sorte apostacrise, mesmo que isso signifique aumento da dívida — enquanto os liberais tendem a defender corteesporte da sorte apostagastos nessas situações.

5. Títulos da dívida como poupança

Manoel Pires aponta que a dívida pública também tem um "papel macroeconômico importante", no sentidoesporte da sorte apostaque as pessoas que compram os títulos do governo usam isso como uma poupança — ou seja, para transportar seus recursos para o futuro.

"O governo não tem que ter dívida zero, porque essa dívida serve para outros propósitos, como as pessoas usarem títulos para poupar e para financiar políticas ao longo do tempo. O problema surge quando você fica muito refém dessa formaesporte da sorte apostafinanciamento, que é o que acontece quando você tem uma crise fiscal", diz o economista.

"Eu vejo essa comparação (do orçamento público com as contasesporte da sorte apostauma família)esporte da sorte apostauma maneira muito restrita para um determinado fim didático. Ela serve ao propósitoesporte da sorte apostadizer que governo também se depara com restrições, que muitas vezes resultamesporte da sorte apostaescolhas difíceis, como se fosse o chefeesporte da sorte apostafamília resolvendo como alocar recursos no orçamento. Mas até onde isso vai, é limitado."

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