O que o Brasil teria a perder com um afastamento da Argentina?:world poker

Mas quais consequências práticas que um eventual afastamento da Argentina teria para o Brasil?

Complementaridade produtiva

O setor que mais sofreria caso houvesse um estremecimento das relações bilaterais seria a indústria.

A Argentina é o principal destino das exportaçõesworld pokerprodutos manufaturados brasileiros e o terceiro se contabilizados todos os produtos.

Enquanto o Brasil exporta muita soja e minério para a China e para os EUA, por exemplo, vende para o vizinho itensworld pokermaior valor agregado, que vão desde calçados e automóveis a máquinas e peças.

Ele é o principal parceiro comercial da Argentina, respondendo por 27%world pokertodas as importações do país (dadosworld poker2017). A China ficaworld pokersegundo lugar, com 19%.

Desde a criação do Mercosul,world poker1991, a indústria dos dois países tem ficado mais integrada. Isso fica mais claro quando se olha no detalhe a composição das exportações brasileiras para a Argentina.

Um estudo conduzido pelas economistas Mayara Santiago e Luana Miranda, do Instituto Brasileiroworld pokerEconomia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV), mostrou que 58%world pokertudo o que é vendido para o parceiro são bens intermediários.

Ou seja, são motores, peças e outros manufaturados que são usados pela indústria argentina, que vão compor produtos acabados feitos no país.

Assim,world pokerum cenárioworld pokerdistanciamento entre os dois países, a Argentina também seria prejudicada, já que poderia perder fornecedores importantes paraworld pokerindústria.

"Manter uma boa relação é benéfico para os dois lados", pondera Mayara Santiago.

O impacto da atual crise argentina sobre o setor no Brasil também dá dimensão dessa interdependência. Aindaworld pokeracordo com o estudo das economistas do Ibre-FGV, a recessão da Argentina tirou 0,2 ponto percentual do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiroworld poker2018.

Ou seja, sem o "choque argentino", a economia brasileira teria crescido 1,3%world pokervezworld poker1,1% (o estudo foi feito antes da revisão do PIBworld poker2018 pelo IBGE, que alterou o dado do ano passado para 1,3%).

Para 2019, a projeção éworld pokerque esse impacto negativo seja ainda pior,world poker0,5 ponto percentual.

Este será, aliás, o primeiro ano desde 2003 que a balança comercial do Brasil com a Argentina vai ficar no vermelho. Entre janeiro e novembro, o saldo é negativoworld pokerUS$ 641,8 milhões.

A redução das exportações para o vizinho, acrescenta a economista, tem ainda um "efeito transbordamento" importante, que vai além da indústria e afeta o comércio e os serviços. Uma máquina que deixaworld pokerser exportada, por exemplo, significa menos um frete, menos volumeworld pokertrabalho no escritórioworld pokerrepresentação comercial e por aí vai.

A recuperação da demanda interna pode atenuar o "efeito Argentina"world poker2020, afirma Mayara, e compensar a queda nas vendas para o vizinho.

Ainda assim, a manutenção da boa relação do Brasil com seus parceiros comerciais se mantém uma variável importante, já que a indústria como um todo vem perdendo espaço na economia. Para o Institutoworld pokerEstudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), o país passa por um dos mais graves casosworld poker"desindustrialização prematura" do mundo.

Um estudo divulgado pela entidadeworld pokeragosto mostrou que, enquanto o setor industrial perdeu 36,1%world pokerpeso no PIB global entre 1980 e 2018, no Brasil o recuo foiworld poker58,6% no mesmo período.

A política e a 'vida real'

Para o economista Guillermo Tolosa, analista da Oxford Economics, o discurso muitas vezes agressivoworld pokerambos os lados tem o objetivo principalworld pokeragradar as respectivas bases eleitoraisworld pokerBolsonaro eworld pokerAlberto Fernández.

Enquanto o presidente brasileiro se define como um político conservador e liberal, o colega argentino é um veterano do peronismo - movimento que, apesarworld pokeragregar os mais diferentes matizes ideológicos, lançou os principais nomes da esquerda que chegaram à Casa Rosada, como Néstor e Cristina Kirchner.

Ele vê as trocasworld pokerfarpas como naturais. A expectativa, entretanto, é que elas se mantenham na esfera da política e não tenham grandes desdobramentos práticos.

"O incentivo para se colocar barreirasworld pokercomércio não existe,world pokerum lado eworld pokeroutro", avalia. "Não faz sentido se autoinfligir 'mais dor' (além daquela causada pela recessão argentina)world pokeruma guerra comercial ou algo parecido."

A aparente hostilidade entre os dois presidentes seria algo como, na expressãoworld pokerespanhol, "mucho ruido y pocas nueces", brinca o economista, citando o ditado que no Brasil equivale a "muito barulho por nada".

Assim esperam os setores exportadores brasileiros.

Haroldo Ferreira, presidente da Abicalçados, que representa a indústria calçadista, diz acreditar que a diplomacia vai resolver eventuais desentendimentos entre os chefesworld pokerEstado.

"A parte política é uma coisa, o mundo real é outra."

Mesmo com a retração da economia argentina, conta Ferreira, o país segue sendo o segundo principal comprador dos calçados brasileiros, absorvendo a produçãoworld pokerdiferentes polos, do Rio Grande do Sul e São Paulo à Bahia e ao Ceará.

Assim, a principal expectativa do setorworld pokerrelação ao novo governo, diz ele, éworld pokerrelação àworld pokercapacidadeworld pokerreaquecer a economia argentina.

Ferreira, que trabalhou na Azaleia por 23 anos, lembra das barreiras à importação impostas por Cristina Kirchner - hoje viceworld pokerAlberto Fernández - quando ela esteve na presidência, entre 2007 e 2015.

No pior momento, os obstáculos colocados pelo governo argentino para a compraworld pokerprodutos brasileiros, que precisavamworld pokerlicenças especiais para entrar no país que às vezes demoravam meses para sair, impôs prejuízosworld pokerquase US$ 200 milhões ao setor.

"Mas é melhor lidar com barreiras alfandegárias e ter uma Argentina que compre nossos produtos do que o contrário", diz ele, referindo-se à situação do país nos últimos dois anos.

A chegadaworld pokerMauricio Macri ao poder,world poker2015, foi um pontoworld pokerinflexão na orientação protecionista da políticaworld pokercomércio exterior. A crise econômica que se intensificou a partirworld poker2018, entretanto, corroeu o poderworld pokercompra dos argentinos e derrubou a demanda.

De janeiro a outubro, as exportaçõesworld pokercalçados para o país recuaram 35,7%world pokerrelação ao mesmo período do ano anterior.

O percentual é parecido com o observado pela indústriaworld pokermáquinas e equipamentos. Entre janeiro e novembro, o recuo foiworld poker31,9%, para US$ 621,3 milhões,world pokeracordo com os números da Abimaq, que representa o setor.

"Para nós, é extremamente importante que o Brasil busque o diálogo, não só com a Argentina, mas com qualquer mercado", diz Patrícia Gomes, diretoraworld pokermercado externo da entidade.

Segundo ela, o Brasil vende ao país um leque amploworld pokerprodutos, que vãoworld pokermáquinas usadas no setor têxtil e do plástico, por exemplo, a maquinário agrícola. A Argentina é o segundo principal destino para as empresas associadas à Abimaq, atrás apenas dos EUA.

Morde e assopra

Bolsonaro e Alberto Fernández têm trocado provocações desde meados deste ano.

Quando a crise na Argentina apertou e a possibilidadeworld pokerreeleiçãoworld pokerMacri, que era dada praticamente como certa até 2018, foi colocadaworld pokerdúvida, o presidente brasileiro chegou a dizer que um eventual retornoworld pokerCristina Kirchner ao poder poderia transformar o país "em uma Venezuela".

Em julho, porworld pokervez, Alberto Fernández visitou o ex-presidente Lula na prisãoworld pokerCuritiba e,world pokeragosto, após a vitóriaworld pokersua chapa nas primárias, ressaltou que o Brasil continuaria sendo o principal parceiro comercial do país, para depois emendar que Bolsonaro era "um elemento da conjuntura na vida do Brasil" e alguém "misógino, racista e violento".

Dias depois, o presidente brasileiro também causou polêmica ao dizer que avalizava as declarações do ministro da Economia, Paulo Guedes, que afirmara que, se o peronismo vencesse e Fernández impusesse restrições à abertura comercial do Mercosul, o Brasil poderia deixar o bloco.

No diaworld pokerque os argentinos foram às urnas, durante a apuração dos votos, Fernández postou no Twitter uma foto parabenizando Lula.

"Faz aniversário hoje o meu amigo Lula, um homem extraordinário que está preso injustamente", escreveu.

No mesmo dia, Bolsonaro afirmou que o Brasil pretendia ampliar o comércio com o vizinho, mesmo que o favoritismo da chapaworld pokerFernández e Cristina se confirmasse.

No dia seguinte, após a confirmação, declarou que os argentinos haviam "escolhido mal" e disse que não parabenizaria o colega.

Finalmente, na semana passada, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, visitou o presidente eleitoworld pokerBuenos Aires e levou um recadoworld pokerBolsonaro,world pokerque esperava que se construísse uma "boa relação" entre os dois governos.

"Se nos respeitamos, fica mais fácil conviver", disse Fernández. "Transmitam ao presidente Jair Bolsonaro meu respeito e apreço por trabalharmos juntos."

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