O curioso efeito do Carnaval no aumentocasino hunterpartos naturais:casino hunter

"Já estava apavorada com a ideiacasino huntertomar aquela anestesia no meio da coluna e daí o cara me diz 'Eu tive que sair do bar', eu pensei 'Meu Deus, ele estava tomando uma cerveja e vai enfiar uma agulha no meio da minha coluna. Que loucura é essa? Não pode beber e dirigir, mas pode beber e enfiar agulha na coluna?'", recorda Bárbara.

"Mas eu já estava na posição,casino huntercamisola, com a bundacasino hunterfora, ia falar o quê? Não falei nada, mas aquilo me deixou muito mais tensa."

Apesar da situação desagradável, ela viu a filha nascer saudável, com maiscasino hunter3kg, por meiocasino hunteruma cesariana,casino hunterum hospital privado.

Por contacasino huntersituações como a vivida por Bárbara, muitas brasileiras temem ter filhos no feriado prolongadocasino hunterCarnaval.

Isso contribui para um fenômeno estatístico peculiar: uma queda acentuadacasino hunterpartos durante a folia e um aumento nos dias antes e depois da festa.

Os pesquisadores Carolina Melo e Naercio Menezes Filho, do Insper, se debruçaram sobre esse fenômeno, analisando o efeito do Carnaval sobre os nascimentoscasino hunterbebês no Brasil entre 2012 e 2019, com basecasino hunterdados do DataSUS, do Ministério da Saúde.

O que eles encontraram é um resultado curioso.

Por um lado, há um efeito negativo: uma reduçãocasino hunterpesocasino hunterbebês frutoscasino hunterpartoscasino hunteralto risco, antecipados para evitar o feriado.

Mas há outro impacto, estatisticamente até mais relevante: uma extensão do período gestacional, suficiente para resultarcasino hunteruma redução das mortes neonatais.

Melo e Menezes Filho constataram que isso é fruto do adiamentocasino hunterpartos que,casino hunteroutra forma, teriam sido realizados antes do tempo, por meiocasino huntercesarianas agendadas.

Isso fica claro, segundo os autores, no aumento no número diáriocasino hunterpartos naturais pós-Carnaval.

Para Melo, o resultado desse "experimento natural" propiciado pelo feriadocasino hunterCarnaval servecasino hunteralerta e pode ajudar a pautar decisõescasino hunterpolíticas públicascasino huntersaúde.

"Esse resultado deixa bem evidente que os partos no Brasil estão acontecendocasino hunteruma idade gestacional sub-ótima [antes do tempo ideal] e que os resultadoscasino huntersaúde ao nascer poderiam ser melhores se melhorássemos as práticascasino huntercuidado ao nascimento", diz a pesquisadora à BBC News Brasil.

Procurada para comentar os resultados do estudo, a Federação Brasileira das Associaçõescasino hunterGinecologia e Obstetrícia (Febrasgo) concorda com a análise.

"O Brasil figuracasino huntersegundo lugar do mundocasino huntercesarianas, com o sistema privado tendo quase 90% dos partos acontecendo por essa via", destacacasino hunternota o médico obstetra Romulo Negrini, vice-presidente da Comissãocasino hunterAssistência ao Abortamento, Parto e Puerpério da Febrasgo.

"Isso é péssimo, pois, apesar da falsa impressãocasino huntersegurança que a cesariana traz, ela se relaciona a um risco três vezes maiorcasino huntermorte materna, especialmente por tromboembolismo e hemorragia."

Por que analisar Carnaval e nascimentos

Carolina Melo conta que seu interesse pelo tema começou no doutorado, quando pensoucasino huntermensurar os efeitos da cesariana sobre os resultadoscasino hunternascimentos.

No entanto, ela explica que é difícil isolar os impactos do procedimento médico sobre os resultadoscasino hunterparto, uma vez que a realizaçãocasino huntercesáreas está correlacionada com outros fatores, como o nívelcasino huntereducação da mãe e suas condiçõescasino hunteracesso à saúde — questões que também afetam os indicadorescasino huntersaúde da gestante e do bebê.

"O que temos consolidado na ciência hoje é que a antecipaçãocasino hunterparto é um problema", observa Melo.

"Ainda que seja por um dia, a literatura mostra que ela é prejudicial ao bebê."

Outro conhecimento consolidado, diz a pesquisadora do Insper, é que as manipulaçõescasino hunterdatascasino hunterpartos estão altamente correlacionadas com a escolha da cesariana — procedimento que tem altíssima incidência no Brasil, representandocasino huntermédia 55% dos partos no país, percentual que chega a 86%casino hunterhospitais privados.

A cesárea é um recurso que pode ajudar a salvar vidas. Mas, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), taxascasino huntercesariana acimacasino hunter10% não contribuem para a redução da mortalidade materna, perinatal ou neonatal.

No Brasil, considerando as características específicas da população local, a taxacasino huntercesárea desejável seriacasino hunter25% a 30%, segundo o Ministério da Saúde — ou seja, muito abaixo dos atuais níveis no país.

Melo observa que a opção pela cesariana agendada tem motivos diversos, como a conveniência do médico e da gestante; ou a diferençacasino hunternívelcasino hunterconhecimento sobre os prós e contras dos procedimentos entre o médico e a grávida.

Também há casoscasino hunterque isso ocorre por uma busca do médico por evitar riscos. E, ainda, há mães que preferem não ter seus bebêscasino hunterdias específicos, como o Dia da Mentira, o diacasino hunterFinados, entre outras datas.

"A cesariana traz bastante conveniência para o agendamento do parto, e há até um grande negócio por trás disso,casino hunterserviços adicionais, como festinhascasino hunternascimento, preparação da mãe com depilação, maquiagem e outras coisas, que só são viáveis quando a mãe sabe quando o parto vai acontecer", diz Melo.

A pesquisadora observa que a literatura científica também mostra que,casino huntertornocasino hunterferiados prolongados, há uma manipulação das datascasino hunterpartos, já que há uma percepçãocasino hunterque, nessas ocasiões, com equipes reduzidas, os hospitais podem ficar pior preparados para receber gestantes, principalmente ascasino hunteralto risco.

Por conta disso, os economistas decidiram se debruçar sobre os efeitos do Carnaval sobre os nascimentos no Brasil.

"Escolhemos o Carnaval porque é a festividade mais longa e que mais mobiliza o país, não temos nenhum outro feriado que pare tudo dessa forma", diz Melo.

Os pesquisadores chegaram a analisar outros feriados, como Corpus Christi, e encontraram efeitos parecidos, mascasino huntermenor magnitude.

Como o estudo foi feito

Para fazer a pesquisa, Carolina Melo e Naercio Menezes analisaram dados do DataSUScasino hunternascidos vivos e mortalidade neonatal.

Como o feriadocasino hunterCarnaval caicasino hunterdatas diferentes a cada ano, os pesquisadores padronizaram a análise ao considerar a terça-feiracasino hunterCarnavalcasino huntercada ano como o ponto zero.

Por exemplo,casino hunter2012, quando a terçacasino hunterCarnaval caiu no dia 21casino hunterfevereiro, o primeiro dia do ano seria o dia -51 (ou seja, 51 dias antes do Carnaval), a terça-feiracasino hunterCarnaval o dia zero, a Quarta-feiracasino hunterCinzas o dia +1, e assim por diante.

Assim, para cada dia do ano, os pesquisadores tinham uma quantidadecasino hunternascidos vivos e características médicas desses bebês.

Depois, eles definiram uma janelacasino hunteranálisecasino huntertorno do Carnaval,casino hunter20 dias antes e 14 dias depois da terça-feira.

Essa janela corresponde ao períodocasino hunterque a soma dos partos realizados antes e depois da festa, descontados os partos que deixaramcasino hunterser feitos no Carnaval, se aproximacasino hunterzero.

Definido isso, os pesquisadores comparam os nascimentos ocorridos dentro dessa janela do Carnaval, com nascimentos ocorridoscasino hunteroutros dias do ano.

Um resultado surpreendente

"Confesso que a gente achava que ia encontrar um efeito negativo sobre os resultadoscasino hunternascimento, principalmente por causa da antecipaçãocasino hunterpartos", diz Melo.

"Há uma proporção parecidacasino hunterantecipações e postergações, mas o efeito da postergação é tão forte, que é capazcasino hunterreduzir a mortalidade neonatal. Isso foi um tanto surpreendente."

Os partos que ocorreram durante a janela do Carnaval tiveram,casino huntermédia, 3,5 dias a maiscasino huntergestação, segundo o estudo do Insper.

"Esse resultado considera tanto partos antecipados como postergados, o que significa que os postergados provavelmente foram adiadoscasino huntermais do que 3,5 dias", diz Melo.

"Qualquer coisa a mais do que isso são muitos dias, o que permite avaliar que, na ausência do Carnaval, esses partos estavam ocorrendo bem antes do que deveriam, e essa postergação é capazcasino hunterreduzir mortalidade neonatalcasino hunteruma magnitude bem alta."

A reduçãocasino huntermortalidade neonatal constatada foicasino hunter15 a 17 casos a cada 1 mil nascidos vivos.

É preciso levarcasino hunterconta que a mortalidade neonatal é um resultadocasino huntersaúde muito extremo, observa Melo.

"Se a gente é capazcasino hunterprevenir mortalidade neonatal com alguns diascasino hunterpostergação da datacasino hunternascimento, deve ser que esses bebês que nascem mais cedo têm uma saúde pior do que poderiam ter", considera.

O que fazer diante desses resultados

"A grande lição — se fôssemos dar uma recomendaçãocasino hunterpolíticas públicas — é que o governo deveria incentivar as gestantes a não anteciparem o parto, a esperarem um pouco mais para terem os bebês."

Melo observa que, desde 2016, uma portaria do Ministério da Saúde regulamenta que a gestante só pode optar por uma cesariana agendada a partir da 39ª semanacasino huntergestação, seja no setor público ou privado.

Romulo Negrini, da Febrasgo, lembra que o próprio Conselho Federalcasino hunterMedicina já se manifestou sobre o tema, em uma resolução, que estabelece que cesarianas a pedido sem indicação clínica somente devem ser realizadas a partircasino hunter39 semanas.

"Isso não é mera deliberação: crianças que nascemcasino hunterforma não espontânea abaixo dessa idade gestacional chegam a ter dez vezes mais chancescasino hunterdesconforto respiratórios e, consequentemente, maior probabilidadecasino hunterdoenças pulmonares crônicas, como asma", destaca o médico.

Para a pesquisadora do Insper, uma das formascasino hunterassegurar que essa norma seja cumprida é através da conscientizaçãocasino huntermédicos e gestantes.

"Temos uma cultura muito fortecasino huntercesariana no Brasil, é quase um símbolocasino hunterstatus no país. Isso tem mudado, há uma ondacasino hunterhumanização do parto acontecendo, mas não parece ser suficiente", avalia Melo.

Para ela, seria necessário também mudar os incentivos para os médicos, porque, se eles são remunerados por parto, a cesariana vale mais a pena, por ser mais rápida e permitir ao profissional fazer mais partos,casino hunterhorários mais convenientes.

Outra questão, relacionada à prática médica no setor privado brasileiro, é que médico e gestante desenvolvem uma relação próxima,casino huntermuita confiança.

"Mas a atenção ao parto deveria ser feita por uma equipe médica para que, se for necessário uma pessoa da equipe viajar no feriado para descansar, outras pessoas fiquem à disposição da gestante", afirma Melo.

"Isso raramente é o caso e dá muito poder ao médico. Se ele fala: 'Vou viajar no feriado, se você quiser fazer o parto comigo com certeza, vamos ter que antecipar', isso deixa a gestante muito insegura, porque ela confia naquela pessoa mais do que tudo e ela está num momento vulnerável da vida dela."

O representante da Febrasgo concorda com a análise e cita ainda outros três fatores que levam médicos e pacientes a preferirem a cesariana: a culturacasino hunterque o parto vaginal é doloroso; o medo dos médicoscasino hunterprocessos judiciais diantecasino hunterintercorrências no trabalhocasino hunterparto; e a faltacasino huntertreinamento prático para dificuldades no parto dos médicoscasino hunterformação.

Negrini defende que, além das mudanças já sugeridas pela pesquisadora do Insper, seria necessária a melhoria do ensinocasino hunterobstetrícia com maior usocasino huntersimulações que repliquem situações práticas; maior participação da enfermagemcasino hunterpartos, pois estudos mostram que isso reduz intervenções e aumenta a taxacasino hunterpartos naturais; e infraestruturas hospitalares adequadas ao parto vaginal.

"Na equação para sucesso do parto vaginal, precisam entrar três elementos: infraestrutura, equipe profissional e pacientes", conclui o médico.

Atenção ao parto como um trabalhocasino hunterequipe

Em São Paulo, desde 2018, um grupo formado por médicas, enfermeiras obstétricas e obstetrizes (profissionais especializadas no acompanhamentocasino huntergestações, partos e pós-parto) busca colocarcasino hunterprática a ideia da atenção ao parto como um trabalho coletivo.

Com uma taxacasino huntercesáreacasino hunter13%, o Coletivo Nascer trabalha com a promoção do parto normal ecasino hunteresquemacasino hunterplantão para atendimento 24 horas, sete dias por semana.

"De maneira geral, no setor privado, a mulher tem um médico que fica à disposição dela da 37ª à 41ª semana e daí, seja lá que dia da semana ou que horas o parto aconteça, ou quanto tempo ele dure, é só ele para fazer tudo", diz Ana Cristina Duarte, obstetriz e coordenadora do Coletivo Nascer.

"Esse modelo é muito difícilcasino hunterexecutar e nossa taxacasino huntercesárea no Brasil é muito altacasino huntergrande medida por causa disso."

No coletivo, cada profissional tem seu horáriocasino hunteratendimento. Então é uma equipe que presta serviço particular, mas que atendecasino hunterregimecasino hunterplantão – um plantão com a qualidade controlada e onde os profissionais seguem protocolos rigorosos.

A disponibilidadecasino hunterprofissionais, que trabalhamcasino hunterturnoscasino hunter12 horas e por isso estão sempre descansados, contribui para a taxa elevadacasino hunterpartos naturais feitos pela equipe, segundo Duarte.

Com o sistema, o coletivo também consegue oferecer partos mais baratos do que aqueles realizados no setor privado que trabalha sob o esquema tradicional, diz a coordenadora.

Experiência internacional

Ana Cristina Duarte diz que a inspiração do coletivo vemcasino huntermodelos internacionaiscasino hunterassistência a gestantes, nos quais não vigora uma cultura comum no Brasilcasino hunterque um único médico acompanha o pré-natal e faz o parto.

Essa cultura, segundo a especialista, é frutocasino hunteruma busca por conforto que deturpa a assistência, por não ser um modelo sustentável.

No Reino Unido, por exemplo, quando não há riscos para a mãe ou para o bebê, o NHS (sistemacasino huntersaúde público britânico) indica o parto normal e oferece algumas opções para a horacasino hunterdar à luz.

Além do hospital, é possível parircasino huntercasa com a ajudacasino hunterparteiras (chamadas por lácasino huntermidwives) oucasino hunterclínicas conhecidas como centroscasino hunternascimento, que têm um ambiente mais caseiro que o dos hospitais.

A cesariana planejada ou acasino hunteremergência são admitidascasino hunterpoucas circunstâncias.

"No mundo inteirocasino hunterprimeiro mundo, onde você tem os melhores resultados [de nascimentos], a mulher é atendida por plantões. Não é uma pessoa, são equipes grandes, que vão dividir o trabalho", diz Duarte.

"O Coletivo Nascer foi pioneiro no Brasilcasino hunterfazer isso [na saúde privada] e agora já há iniciativas similarescasino hunteroutros lugares, como Curitiba, Riocasino hunterJaneiro e outros."

Segundo a obstetriz, as vantagens da maior taxacasino hunterpartos naturais incluem menor ocorrênciacasino hunterinfecções e hemorragias, recuperação pós-parto menos problemática por não se tratarcasino hunterum procedimento cirúrgico e, para os bebês, menos chancecasino huntereles desenvolverem asma, bronquite, obesidade, diabetes e doenças autoimunes.

"Não quer dizer que nenhum vai ter, mas todos os riscos diminuem com o parto normal."

Diante dacasino hunterexperiência com a assistência ao parto, Duarte destaca a importância do estudo realizado pelo Insper sobre o efeito do Carnaval nos nascimentos.

"Esse é mais um estudo que reforça uma tese antiga, mas é importante manter a pesquisa viva para que os tomadorescasino hunterdecisão não se esqueçam desse problema, porque esse é um problema crônico, que dependecasino hunterpolíticas públicas", diz a obstetriz.

"Nossa chaga é a cesariana marcada, porque ela é justamente a cesariana desnecessária. Falta vontade públicacasino huntertomar decisões difíceis para mudar isso."