Ana Rosa e 'Leila': desaparecidas que inspiraram livro e canção :vegas cassino
- Mônica Vasconcelos
- Da BBC Brasilvegas cassinoLondres

Crédito, xx
A Comissão da Verdade tenta desvendar paradeirovegas cassinovítimas da ditadura que continuam desaparecidos
vegas cassino Há mais ou menos um ano, ganheivegas cassinopresente um livro que me lançouvegas cassinouma jornada inesperada pela história recente do Brasil, da minha família evegas cassinouma música.
Trata-se do romance político K, do escritor e acadêmico brasileiro Bernardo Kucinski.
O livro narra a busca desesperadavegas cassinoum pai porvegas cassinofilha desaparecida política durante a ditadura militar no Brasil. É ficção, mas baseadovegas cassinofatos verídicos – a desaparecida, Ana Rosa Kucinski, é a irmã do autor. A verdade sobre o desaparecimentovegas cassinoAna Rosa vem emergindo aos poucos. Em 2012, o ex-delegado do Dops Cláudio Guerra confessou ter incinerado seu corpovegas cassinouma usinavegas cassinoprocessamentovegas cassinocana.
Enquanto lia aquela história comovente e triste, me vi resgatando cenas do meu passado, ainda adolescente, crescendovegas cassinoSão Paulo.
Frases do meu pai. "Não fiquevegas cassinogrupos na porta da escola depois da aula. Venha direto para a casa".
Histórias da família. Por que mesmo o vovô foi preso?
E as músicas. Músicas que refletiam o clima daquele tempo,vegas cassinosegredos e meias verdades. Que traziam mensagensvegas cassinocódigos. Músicas que eu cantava, mas não entendia.
Entre elas, Aparecida,vegas cassinoIvan Lins e Maurício Tapajós, incluída no álbum Somos Todos Iguais Nessa Noite, lançadovegas cassino1977. Não saíavegas cassinominha cabeça enquanto refletia sobre a tragédiavegas cassinoAna Rosa. Era como se a música tivesse sido feita para ela.
"Diz, Aparecida
Me conta por onde que você andou?
Me conta por que é que você
Não tem mais a mesma afeição
Não tem mais a mesma euforia
Não tem mais a mesma paixão?"
50 Anos do Golpe
A históriavegas cassinoAna Rosa me levou a sugerir um documentáriovegas cassinorádio para o Serviço Mundial da BBC que explicasse ao mundo o que foi o golpevegas cassino1964. E mostrasse como o Brasil tenta, hoje, lidar com esse capítulo sombrio da nossa história.
Fui ao Brasil falar com Bernardo Kucinski e várias outras pessoas, inclusive meu próprio pai. Acabei me lançandovegas cassinouma viagem sobre a história, nunca bem detalhada para mim, da minha família.
Descobri, por exemplo, que meu avô tinha sido preso duas vezes. A primeira, na décadavegas cassino30,vegas cassinoGoiás.
Influenciado pelas ideias do líder comunista Luís Carlos Prestes, ele tinha se filiado a um partidovegas cassinotendências comunistas.
Por causa desse "crime", meu avô foi parar na prisão.

Crédito, xx
Milharesvegas cassinoestudantes foram presos durante a ditadura
Ele foi preso por "algum governo ligado a ideologias nazistas", meu pai contou. Foi amarrado e torturado sob guarda militar.
Meu avô sobreviveu, mas a vidavegas cassinoGoiás tinha ficado muito perigosa para ele. Temendo porvegas cassinovida, vendeu suas terras às pressas e se mudou com a família para Minas Gerais. Perdeu tudo o que tinha. Nunca mais quis se meter com política.
No entanto, 30 anos depois, o passado comunista voltou a assombrar a vida da família.
Em 64, quando o golpe militar estourou, meu avô foi preso novamente.
Ele não foi torturado dessa vez, mas aquela experiênciavegas cassinoviolência, tortura, perseguição e empobrecimento ficou marcada nele e na nossa família. Era como um trauma silencioso.
Entrevistei ainda brasileiros que hoje tentam ajudar o país a superar o trauma da ditadura e seguirvegas cassinofrente.
Entre eles, o presidente da Comissão da Verdade do Estadovegas cassinoSão Paulo, Ivan Seixas. Os psicanalistas Moisés Silva e Cristina Ocariz, que estão oferecendo apoio psicológico às vítimas da violência do Estado durante o governo militar.
Veroca Paiva, filha do deputado Rubens Paiva, que investigava o envolvimento dos Estados Unidos no golpe. Paiva foi torturado e morto pela ditadura. Até hoje seu corpo não foi encontrado.
Falei com tanta gente. Nem todos entraram no corte final – o velho e dolorido dilema do jornalismo - mas suas vozes estiveram comigovegas cassinominha jornada.
Finalmente, entrevistei o generalvegas cassinobrigada, hoje na reserva, Durval Andrade Neri. Orgulhoso do golpe, o general defendeu e justificou a ditadura militar.
Trilha Sonora
Enquanto mergulhava nas histórias da minha família,vegas cassinoBernardo Kucinski evegas cassinotantos outros, entrelaçadas na história do meu país, a canção Aparecida continuava a tocar na minha cabeça.
"Diz, Aparecida
Sumir desse jeito não tem cabimento
Me conta quem foi, por que foi
E tudo o que você passou
Preciso saber seu tormento
Preciso saber da aflição"
Quem seria essa Aparecida que - hoje me dou conta - era na verdade uma Desaparecida?
Procurei Ivan Lins. Ocupado,vegas cassinoturnê, ele não achava tempo para falar comigo.
Falei com João Lins, filhovegas cassinoIvan. Simpático, orgulhoso do pai. Mas não conhecia a história por trás da canção.
Maurício Tapajós, autor da letra, já não está entre nós.
Decidi procurar Heloísa Tapajós, esposa do irmãovegas cassinoMaurício – o compositor Paulinho Tapajós. Quem sabe o Paulinho conhece a história? – pensei.
Para minha tristeza, descobri que Paulinho – com quem, por sinal, trabalheivegas cassino2007, quando gravei uma canção dele - também havia partido.
Que aflição. Não é possível que desapareça também a história por trás da música.
Apelei novamente ao Ivan. E dessa vez, fui recompensada com uma históriavegas cassinosuperação.
"Essa canção foi escritavegas cassino1976. A ideia foi do Maurício. Ele me falouvegas cassinouma amiga dele que tinha desaparecido por uns quatro anos, presa pela repressão, e que tinha reaparecido. Como foi brutalmente torturada, trazia sequelas do vandalismo repressor", escreveu Ivan Lins,vegas cassinoum e-mail.
Três anos depoisvegas cassinocomporem a canção, Maurício e Ivan viajaram para o casamentovegas cassinoum dos músicos da bandavegas cassinoAlfenas, Minas Gerais. E foi lá que Ivan conheceu a "desaparecida".
"O Maurício me apresentou. Ainda bonita, com grandes olhos verdes. Seu nome era, se não me engano, Leila - não posso afirmar com certeza".
"Ainda a encontrei mais uma vez, num evento (não lembro qual). Depois, nunca mais".
"E essa é a historia. Posso ter errado um pouquinho as datas, mas foi bem perto disso", concluiu Ivan Lins.
Aparecida não ficou tão conhecida como outras faixas do LP Somos Todos Iguais Nessa Noite.
Porém, quatro décadas depois, quando a Comissão da Verdade se esforça para recuperar a memóriavegas cassinoum tempovegas cassinotrevas na história do Brasil, me soa ainda mais bela e comovente. E não poderia ser mais relevante e atual.
"Diz, Aparecida
Diz, conta o segredo
Diz e denuncia
Que a verdade escondida
É mentira, é medo"
E por onde andará Leila? E quantas outras histórias deste doloroso período da nossa história se mantêm anônimas?
A canção 'Aparecida', interpretada por Mônica Vasconcelos (voz) e Swami Jr (violão), é trilha sonora do documentário Brazil: Confronting the Past, transmitido pelo BBC World Service como parte da cobertura dos 50 anos do golpe militar brasileiro.




