A história da jornalista branca que viveu um ano como uma mulher negra nos anos 1960:grupo telegram bet7k mines

Assim como Griffin, o método escolhido foi a medicação para vitiligo, uma doença que causa despigmentação da pele pela falta ou diminuiçãogrupo telegram bet7k minesmelaninagrupo telegram bet7k minesdeterminadas áreas. A ideia era tomar as pílulas para "potencializar" a exposição ao sol, adquirindo um tomgrupo telegram bet7k minespele mais escuro, o que finalmente alcançou após uma viagem para Porto Rico. "Para ter certeza, coloquei o meu braço junto ao dele [de umgrupo telegram bet7k minesseus médicos]. Ele é negro, mas eu estava mais escura", descreveu no livro.

Naquele outono, embarcou para o Harlem, bairro da cidadegrupo telegram bet7k minesNova York com uma grande comunidade afro-americana. Com um vestidogrupo telegram bet7k minesalgodão simples e sapatilhas, um lenço sujo amarrado no cabelo, lentesgrupo telegram bet7k minescontato pretas e US$ 20 no bolso, entrou no ônibus rumo agrupo telegram bet7k minesnova vida, porque "parecia bobo voar para um gueto", escreveu.

Seus medos eram muitos: que descobrissem que era branca e a castigassem por isso, que os homens negros a estuprassem ou roubassem (como acreditava a população branca), e que encontrasse algo parecido com o infernogrupo telegram bet7k minesDante. "Abandone toda esperança aquele que por aqui entrar", pensava enquanto o ônibus se aproximava do bairro.

Transformações como nicho

Mas nada disso aconteceu. Na verdade, o Harlem era tão diferente do que ela havia esperado, que alguns meses depois ela decidiu ir para o Mississippi, no sul do país, trabalhar como empregada doméstica na casagrupo telegram bet7k minesuma família branca.

"Sempre que encontrava alguém que não se enquadravagrupo telegram bet7k minesum padrão que ela tinhagrupo telegram bet7k minesmente, ela os descartava", explica a professoragrupo telegram bet7k minesestudos afro-americanos Alisha Gaines, da Universidade do Estado da Flórida, autora do livro Black for a Day: Fantasies of Race and Empathy (Preto por um Dia: Fantasiasgrupo telegram bet7k minesRaça e Empatia,grupo telegram bet7k minestradução livre, publicadogrupo telegram bet7k mines2017). "Ela aplicava estereótipos e enxergava a negritude somente como sofrimento, dor e vulnerabilidade."

Foi na casa da família branca, porém, que ela chegou pertogrupo telegram bet7k minester uma das experiências que tanto a atemorizavam. Um dia, o homem (branco) da família tentou estuprá-la, e ela conseguiu se livrar quebrando um retrato da família na cabeça dele. Halsell interrompeu a experiência ali, faltando alguns meses para completar o ano a que se havia proposto. E concluiu, no livro, que "o problema é maior que branco ou preto. É a desumanidade do homem com o homem (e mulher) sempre e por toda a parte".

Onde começa e termina o romantismogrupo telegram bet7k minesseus relatos, é difícil saber. Halsell, que morreu aos 77 anosgrupo telegram bet7k minesmielomagrupo telegram bet7k minessetembrogrupo telegram bet7k mines2000, encontrou nas transformações raciais um "nicho"grupo telegram bet7k minescarreira. Depoisgrupo telegram bet7k minesviver como mulher negra, passou uma temporada entre os índios Navajo, conviveu com imigrantes mexicanos ilegais e viveu com famílias israelitas, palestinas e judaicasgrupo telegram bet7k minesJerusalém.

"Soul Sister égrupo telegram bet7k minesmuitas formas um livro irritante, mas também muito poderoso dependendo da parte que você lê, e ela cita [o romancista negro James] Baldwin", disse o historiador Robin Kelley, professor da Universidade da Califórniagrupo telegram bet7k minesLos Angeles,grupo telegram bet7k minesuma apresentação na Universidadegrupo telegram bet7k minesIllinoisgrupo telegram bet7k minesChicago.

Kelley está trabalhandogrupo telegram bet7k minesum livro sobre a jornalista que deve ser lançado neste ano. "Baldwin nos ensinou que não precisamos ser como os outros para construir solidariedade. E ela fala algo parecido com isso, sobre encontrar o que haviagrupo telegram bet7k minesdiferente e entender como as pessoas sofrem, sairgrupo telegram bet7k minesdentrogrupo telegram bet7k minesnós mesmos. É por isso que ela fez o experimento, não porque queria ser uma mulher negra."

Solidariedade versus empatia

Embora se abstenhagrupo telegram bet7k minesemitir opinião sobre seu objetogrupo telegram bet7k minespesquisa — "eu não preciso gostar do meu sujeito", explicou na apresentação —, Kelley reconhece que os experimentosgrupo telegram bet7k minesHalsell são delicados. E um dos problemas é a linha tênue entre falar sobre solidariedade e empatia: a primeira leva a uma ação concreta, enquanto a segunda tende a ser considerada o suficiente.

"A minha definição favoritagrupo telegram bet7k minesempatia vemgrupo telegram bet7k minesLeslie Jamison, que diz que a empatia está sempre empoleirada entre presente e invasão. O gestogrupo telegram bet7k minesempatiagrupo telegram bet7k minesquerer entender o outro é bom, mas quando esse entendimento se torna invasão, ou o peso dele é colocado nas pessoasgrupo telegram bet7k minescor, isso não é empatia", diz Gaines.

"Outro problema é quando ela é considerada o suficiente, aquela coisa do 'oh, eu sinto tanto, sinto profundamente, estou chorando, mas enfim…' Se não te propulsiona para solidariedade, construçãogrupo telegram bet7k minescoalizão e ação, qual o sentido?"

Para muita gente, gestos como ogrupo telegram bet7k minesHalsell e Griffin são considerados o ápice da empatia pelo outro — nada poderia demonstrar maior vontadegrupo telegram bet7k minescompreender outra pessoa do que literalmente se colocar no lugar dele. Em seu obituário no New York Times, por exemplo, Halsell é descrita como "a jornalista que buscou a verdade no disfarce". O livrogrupo telegram bet7k minesGriffin é, até hoje, incluído na listagrupo telegram bet7k minesleitura nas escolas estadunidenses.

Além deles, há outros casosgrupo telegram bet7k minespessoas brancas que se fingiram negras. O mais recente e amplamente divulgado na mídia é ogrupo telegram bet7k minesRachel Dolezal, quegrupo telegram bet7k mines2015 acendeu um debate ao mentir sobregrupo telegram bet7k minesverdadeira raça. Ela, uma mulher brancagrupo telegram bet7k minesMontana, declarou-se negra e chegou a ser presidente da Associação Nacional para o Progressogrupo telegram bet7k minesPessoasgrupo telegram bet7k minesCor (NAACP)grupo telegram bet7k minesSpokane, no estadogrupo telegram bet7k minesWashington, até tergrupo telegram bet7k minesverdadeira identidade revelada e se declarar "transracial": embora tenha nascido e sido criada como branca, ela dissegrupo telegram bet7k minesdiversas entrevista, sentia-se e se identificava como uma mulher negra. A controvérsia virou o documentário "The Rachel Divide", lançadogrupo telegram bet7k mines2018 pela Netflix.

"A luta antirracista não é ter empatia pelo outro, e sim lutar por uma sociedade melhor. Quando um branco faz algo pelo negro, ele precisa se colocar como dever cívico, e nãogrupo telegram bet7k minessuperioridade moral", explica a professora Lia Vainer Schucman, da Universidade Federalgrupo telegram bet7k minesSanta Catarina (UFSC), especialistagrupo telegram bet7k minesracismo, branquitude e relações raciais. "E a tentativagrupo telegram bet7k minesse parecer negro é a pior coisa que alguém pode fazer na luta antirracista, porque mesmo que viva por um dia como negro, ele pode tirar aquela roupa, e ser negro é o acúmulogrupo telegram bet7k minesdias, é uma continuidade histórica."

Lugargrupo telegram bet7k minesescuta

Na visão das especialistas, a empatia pode acabar reforçando os privilégios da população branca. "Por exemplo, o que está acontecendo agora, com George Floyd. Tenho visto muitas pessoas brancas dizendo 'imagine se ele fosse branco'", diz Gaines. "O fatogrupo telegram bet7k minesque pessoas brancas têm que fazer esse exercício imaginativo para entender que não está certo ajoelhar no pescoçogrupo telegram bet7k minesalguém por 8 minutos, isso é privilégiogrupo telegram bet7k minesseu auge."

No fim, o que deveria ser uma demonstraçãogrupo telegram bet7k minesempatia ou um atogrupo telegram bet7k minessolidariedade, coloca o branco no centro da questão. "Algumas pessoas brancas não conseguem olhar para uma pessoa negra e enxergar uma pessoa, elas têm que torná-la seus próprios filhos brancos e reimaginar todo o cenário para sentir raiva", conclui a professora.

E é esse o maior problemagrupo telegram bet7k minesexperiências como agrupo telegram bet7k minesHalsell, Griffin ou casos como ogrupo telegram bet7k minesDolezal:grupo telegram bet7k minesvezgrupo telegram bet7k minesouvir o que pessoas negras ou outras minorias têm a dizer, eles acreditam que precisam falar por elas. "Assim como tem o lugargrupo telegram bet7k minesfala, tem o lugargrupo telegram bet7k minesescuta. As pessoas brancas escutam melhor outras pessoas brancas, porque na própria ideiagrupo telegram bet7k minesbranquitude, há a ideiagrupo telegram bet7k minesque o branco é neutro egrupo telegram bet7k minesque o negro fala com viés, o que é um engano, porque não existe um lugar sem viés", diz a pesquisadora brasileira. "Mas a branquitude pauta a ideiagrupo telegram bet7k minesuma pseudo neutralidade para o branco, então se ele fala, ele está sendo acadêmico, se o negro fala, ele está sendo militante, vitimista. Então é um lugargrupo telegram bet7k minesque brancos escutam melhor os brancos, e que faz parte da própria lógica racista."

"A Grace não amplificou as vozesgrupo telegram bet7k minespessoas negras, ela se enfiou no meio e falou por eles. Ela dizia 'estou falando por minhas irmãs mais escuras', como se essas irmãs não tivessem voz", diz Gaines. "As pessoas não são mudas, elas só precisamgrupo telegram bet7k minesamplificação. Chamo Gracegrupo telegram bet7k minesuma aliada que falhou, porque ela estava no centrogrupo telegram bet7k minestudo, o tempo todo."

As obras assinadas por autores negros no período evidenciam isso. No mesmo anogrupo telegram bet7k minesque Halsell publicou Soul Sister, Maya Angelou lançou o primeiro volumegrupo telegram bet7k minessua autobiografia, Eu sei por que o pássaro canta na gaiola, editado pela primeira vez no Brasilgrupo telegram bet7k mines2009. Em 1970, Toni Morrison publicou o aclamado O Olho Mais Azul — quatro livros depois,grupo telegram bet7k mines1993, foi reconhecida com um Nobelgrupo telegram bet7k minesLiteratura.

O próprio James Baldwin, que teria inspirado Halsell, publicougrupo telegram bet7k minesmais importante coletâneagrupo telegram bet7k minesensaios sobre racismo entre 1955 e 1963. Isso sem falar nos que vieram antes, entre eles Ralph Ellison, que lançou O Homem Invisívelgrupo telegram bet7k mines1952, e Langston Hughes, mortogrupo telegram bet7k mines1967, que deixou uma prolífica bibliografiagrupo telegram bet7k minespoesias, romances, contos, teatro e dramaturgia. Não faltavam autores negros para falarem do próprio sofrimento e experiências. Faltavam pessoas brancas dispostas a ouvi-los.

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