Covid e aids: 6 semelhanças entre como a humanidade lidou com as duas pandemias:blaze blaze apostas
- André Biernath - @andre_biernath
- Da BBC News Brasilblaze blaze apostasSão Paulo
blaze blaze apostas Aids e covid-19 têm formasblaze blaze apostastransmissão, sintomas e tratamentos completamente diferentes. Mesmo assim, as doenças que marcaram o fim do século 20 e o início do 21, respectivamente, trazem semelhanças importantes, especialmente na forma como a sociedade e a ciência reagiram a elas.
E esses processos tiveram os mais variados desdobramentos. Por um lado, as duas pandemias demandaram a criaçãoblaze blaze apostassoluções rápidas, que resultaramblaze blaze apostastestes, remédios e vacinas modernos e disruptivos, que beneficiaram não apenas as duas condições, mas a medicina como um todo. Por outro, o surgimentoblaze blaze apostasproblemas novos reforçou (e até criou) preconceitos, estigmas e desigualdades que resistem até hoje.
Os dois momentos históricos também trazem aprendizados importantes sobre a prevenção, quais estratégias funcionam mais ou menos e o papel da comunicação neste contexto.
Essa é a análise feita por especialistasblaze blaze apostassaúde ouvidos pela BBC News Brasil. Eles avaliam que as duas crises sanitárias apresentam muitos paralelos e entendê-los pode nos ajudar a lidar com as futuras pandemias que virão pela frente.
1. Estresse, medo e incertezas
Nos últimos diasblaze blaze apostasdezembroblaze blaze apostas2019, veículos e agênciasblaze blaze apostasnotícias publicaram as primeiras informações sobre os casosblaze blaze apostasuma "pneumonia misteriosa" que começou a acometer algumas pessoasblaze blaze apostasWuhan, na China.
No inícioblaze blaze apostasjaneiro, veio a confirmaçãoblaze blaze apostasque o quadro estava relacionado a um novo tipoblaze blaze apostascoronavírus, que seria nomeado posteriormenteblaze blaze apostasSars-CoV-2.
Um processo parecido aconteceu com o HIV, o vírus da imunodeficiência humana. Apesarblaze blaze apostasexistirem evidênciasblaze blaze apostasque ele já circulava desde a décadablaze blaze apostas1930, o problema começou a chamar a atenção entre o final dos anos 1970 e o início dos 1980.
Nessa época, os especialistas perceberam o aumento na frequênciablaze blaze apostassintomas do que viria a ser conhecida como a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida, ou aids. No período, o quadro foi observado com mais intensidadeblaze blaze apostashomens que fazem sexo com homensblaze blaze apostasalgumas regiões dos Estados Unidos.
Para o médico Ricardo Sobhie Diaz, professorblaze blaze apostasinfectologia da Escola Paulistablaze blaze apostasMedicina da Universidade Federalblaze blaze apostasSão Paulo (Unifesp), as duas situações são marcadas pelo aumento do estresse generalizado diante das incertezas.
"Quando começamos a ouvir sobre HIV e aids, havia muito medo, pois não se sabia o que poderia acontecer com as pessoas e qual seria o tamanho da catástrofe que iríamos enfrentar", lembra.
"E nós vemos a mesma coisa agora com a covid-19. Todos nos sentimos um tanto incapazesblaze blaze apostasentender realmente o que acontece, especialmente nos primeiros meses da pandemia", completa.
2. Estigmas e preconceitos
Uma das consequências desse medo generalizado diante do desconhecido é o surgimentoblaze blaze apostasteorias da conspiração e movimentos que tentam encontrar algo (ou alguém) para jogar a culpa.
"No início, a aids era descrita pejorativamente como a doença dos cinco H's, pois acreditava-se que ela só afetaria homossexuais, prostitutas (hookers,blaze blaze apostasinglês), haitianos, hemofílicos e usuáriosblaze blaze apostasheroína", diz a infectologista Karen Morejon, do Hospital das Clínicas da Faculdadeblaze blaze apostasMedicinablaze blaze apostasRibeirão Preto da Universidadeblaze blaze apostasSão Paulo (USP), no interior paulista.
E esses estigmas e preconceitos eram reforçados pela própria imprensa. Na ediçãoblaze blaze apostas12blaze blaze apostasjunhoblaze blaze apostas1983 do jornal Notícias Populares, por exemplo, é possível ler uma manchete preconceituosa sobre a aids. Em letras garrafais, a capa anunciava: "A peste gay já apavora São Paulo".
Com a covid-19, houve um cuidado extra das autoridades, especialmente da Organização Mundial da Saúde (OMS), para que Wuhan, ou a China como um todo, não ficassem estigmatizados, ou virassem referência como o nome da doença ou do vírus.
E há exemplos clarosblaze blaze apostascomo evitar essa vinculação geográficablaze blaze apostasuma nova enfermidade é importante. Talvez o maior deles seja a gripe espanhola, que matou milhõesblaze blaze apostaspessoas entre 1918 e 1920.
Apesar da alcunha, a doença provavelmente surgiublaze blaze apostasacampamentos militares dos Estados Unidos. Mas, como ocorria a Primeira Guerra Mundial e a maioria dos países envolvidos controlava a imprensa, quem noticiou sobre a chegadablaze blaze apostasuma infecção desconhecida foram os veículos jornalísticos da Espanha, que mantinha uma posiçãoblaze blaze apostasneutralidade naquele momento.
Passado maisblaze blaze apostasum século, o termo "gripe espanhola" continua a ser usado, apesar da imprecisão histórica.
Mesmo com as precauçõesblaze blaze apostasrelação à pandemia atual, ainda existem muitas teorias da conspiração infundadas que acusam a Chinablaze blaze apostaster criado o coronavírus e é comum ler o termo "peste chinesa"blaze blaze apostasmuitos desses conteúdos falsos.
3. Riscos e vulnerabilidades
Um erro que ocorreu nas duas pandemias,blaze blaze apostasacordo com os especialistas, foi o foco excessivo nos chamados "gruposblaze blaze apostasrisco"
Como mencionado anteriormente, existia uma ideia enviesada nos anos 1980blaze blaze apostasque só homossexuais, usuáriosblaze blaze apostasdrogas injetáveis ou pacientes que precisamblaze blaze apostastransfusão sanguínea se infectavam com o HIV.
Já na covid-19, circulou muito a ideia erradablaze blaze apostasque a doença só matava idosos e indivíduos com comorbidades, como os portadores doenças cardiovasculares ou pulmonares.
"E,blaze blaze apostasambos os casos existe uma diferença enorme entre gruposblaze blaze apostasrisco e indivíduos com maior vulnerabilidade", diferencia Diaz.
Ou seja: estatisticamente e na comparação com as outras faixas etárias, pessoas acimablaze blaze apostas60 anos são mais suscetíveis à infecção pelo coronavírus e desenvolvem com maior frequência as formas graves da enfermidade, que exigem internação e intubação. Mas isso não significa que os mais jovens estão absolutamente livres da covid-19 oublaze blaze apostassuas repercussões no organismo.
O mesmo se repete quando pensamos nos primeiros anos da aids: a noção distorcidablaze blaze apostasque homossexuais seriam os únicos afetados fez com que indivíduos com outras orientações sexuais relaxassem e pensassem que não corriam perigo, quando se sabe que a realidade é muito mais complexa.
"O foco nos gruposblaze blaze apostasrisco fez com que houvesse uma sensaçãoblaze blaze apostastranquilidade daqueles que não apresentavam aquelas características, pois eles achavam que não adoeceriam", acrescenta Morejon, que também integra a Sociedade Paulistablaze blaze apostasInfectologia.
4. Desigualdade escancarada
A bióloga americana Claudia Velasquez, diretora do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids (Unaids) no Brasil, chama a atenção para outro pontoblaze blaze apostascomum entre as duas pandemias.
"As desigualdades têm um papel extremamente relevante [nos dois momentos históricos] e, por isso mesmo, é preciso atuarblaze blaze apostasforma conjunta e simultânea", analisa.
"A resposta ao HIV evidencia a lacuna entre ricos e pobres. Onde um bom progresso foi feito, as pessoas que vivem com HIV têm uma vida longa e saudável. Já onde as desigualdades são grandes, foi alcançado um progresso limitado", compara.
Na covid-19, a diferençablaze blaze apostasacesso a insumos, testes, remédios e vacinas também é enormeblaze blaze apostasacordo com cada país.
Essa disparidade fica escancarada no númeroblaze blaze apostasimunizantes contra o coronavírus aplicados até o finalblaze blaze apostassetembro: de acordo com informações disponibilizadas pela Organização das Nações Unidas (ONU), 61,4% dos cidadãosblaze blaze apostaspaíses ricos haviam recebido ao menos a primeira dose. Nos lugares mais pobres do planeta, apenas 3,5% das pessoas foram contempladas nas campanhasblaze blaze apostasvacinação.
Os mesmos números podem ser lidosblaze blaze apostasoutra maneira: enquanto 1blaze blaze apostascada 2 indivíduos das nações ricas estão mais protegidos contra a covid-19, somente 1blaze blaze apostascada 28 que moram nos locais mais pobres tiveram essa mesma oportunidade.
5. Avanços nos métodosblaze blaze apostasprevenção
Esse talvez seja o ponto onde as semelhanças mais impressionam. Tanto a aids quanto a covid-19 seguiram uma sequência similarblaze blaze apostasorientações preventivas.
Nos primeiros meses, quando as informações sobre as doenças eram escassas, restava apelar às medidas proibitivas: para evitar o HIV, não faça sexo; para fugir do coronavírus, não saiablaze blaze apostascasa.
Com o passar do tempo, surgiram métodos um pouco mais rebuscados, que servemblaze blaze apostasbarreira contra a entrada dos vírus. Falamos aqui das camisinhas e das máscaras.
Na sequência, vêm as intervenções biomédicas. No HIV, foram aprovados remédios para a PrEP (profilaxia pré-exposição) e para a PEP (profilaxia pós-exposição). Quando bem indicadas, essas estratégias ajudam a evitar a infecção pelo vírus.
Já na covid-19, as vacinas testadas e aprovadasblaze blaze apostastempo recorde permitiram controlar o númeroblaze blaze apostascasos mais graves, internações e mortes.
Durante os dois processosblaze blaze apostasevolução, os especialistas aprenderam que não costuma dar muito certo depender unicamente dos métodos baseados no comportamento das pessoas, como a abstinência sexual, o isolamento social, a camisinha ou a máscara.
Pela experiência com as pandemias recentes, é justamente a combinação e a adaptaçãoblaze blaze apostasdiferentes estratégias que permite obter um bom resultado.
"É fácil dizer para as pessoas usarem camisinha ou máscara, como se todo mundo fosse respeitar essa recomendação 100% das vezes", comenta o infectologista Rico Vasconcelos, pesquisador do Hospital das Clínicasblaze blaze apostasSão Paulo.
"Conforme aparecem as intervenções biomédicas, como os remédios ou as vacinas, é que começamos a ver uma queda da incidência tanto das infecções por HIV ou pelo coronavírus", observa.
O cientista social Alexandre Grangeiro, pesquisador da Faculdadeblaze blaze apostasMedicina da USP, concorda: "Recomendações muito normativas, que dizem aquilo que as pessoas precisam fazer e não consideram a autonomiablaze blaze apostascada um, não funcionam", entende.
"Ou a gente adequa os métodosblaze blaze apostasprevenção ao cotidiano ou eles vão falhar", completa o especialista, que foi diretor do Programa Nacionalblaze blaze apostasDST/Aids do Ministério da Saúde entre 2003 e 2004.
Já Diaz destaca o papel da comunicação nesse contexto e usa as orientações sobre o uso da camisinha como exemplo.
"Nós erramos feio ao dizer que fazer sexo com camisinha é igualblaze blaze apostastermosblaze blaze apostasprazer. Isso é mentira. A mensagem correta é que existe, sim, um prejuízo na sensibilidade, mas um ganho no aspecto preventivo", analisa.
"Nossa comunicação foi sempre no sentidoblaze blaze apostasque, ao se prevenir, você estará fazendo um bem para todo mundo, para a coletividade. E me parece que essa mensagemblaze blaze apostasfazer as coisas pelos outros nunca funcionou direito", acrescenta.
6. Conquistas contra outras doenças
Vale observar aqui que o trabalho dos cientistas para trazer soluções às pandemiasblaze blaze apostasaids e covid-19 também permitiu pensarblaze blaze apostassaídas para outros problemasblaze blaze apostassaúde.
"O esforço científico para entender a aids na décadablaze blaze apostas1980 propiciou o desenvolvimentoblaze blaze apostasremédios que impedem a replicaçãoblaze blaze apostasvírus. Muitos deles compõem o coquetel antirretroviral", exemplifica Diaz.
"E esses tratamentos beneficiaram não apenas os portadoresblaze blaze apostasHIV, mas também serviramblaze blaze apostasbase para a criaçãoblaze blaze apostasterapias contra a hepatite C, o vírus sincicial respiratório e talvez até o coronavírus", conta o infectologista.
Já no contexto atual, algumas das vacinas contra a covid-19 usam tecnologias absolutamente novas. É o caso dos produtos que se baseiam no vetor viral não replicante, como aqueles desenvolvidos por AstraZeneca/Universidadeblaze blaze apostasOxford e Janssen, ou os imunizantesblaze blaze apostasmRNA, criados por Pfizer/BioNTech e Moderna.
Essas mesmas plataformas já são testadas para obter imunizantes contra outras doenças infecciosas e podem até servir como solução para diversos problemasblaze blaze apostassaúde, como o câncer.
"A pandemiablaze blaze apostascovid-19 mostrou que a ciência pode avançar rapidamente, quando existe a vontade política e o envolvimentoblaze blaze apostastodas as pessoas", resume Velasquez, da Unaids Brasil.
Morejon pondera que os avanços e as conquistas contra as infecções não foram frutosblaze blaze apostasuma iniciativa isoladablaze blaze apostasum especialista ou um grupoblaze blaze apostaspesquisadores, masblaze blaze apostasum apoio constante à ciência.
"Só tivemos uma vacina contra a covid-19blaze blaze apostasmenosblaze blaze apostasum ano porque já existia toda uma pesquisa anterior, que buscava soluções para outros tipos coronavírus que surgiramblaze blaze apostas2003 e 2011", aponta a médica.
"E, mesmo na aids, que começou a chamar a atenção nos anos 1980, tínhamos investigações e amostrasblaze blaze apostaspacientes guardadasblaze blaze apostaslaboratórios desde os anos 1970", lembra.
"Quando há investimento, a ciência prepara o terreno e nos permite lidar com as crisesblaze blaze apostasforma muito mais fácil", completa.
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