América Latina deve ter 'lideranças mais fracas e ciclos políticos mais curtos', diz analista argentino:bet3x

Crédito, AFP l Reuters
bet3x Marcelo Cavarozzi - Acho que existem pontosbet3xcomum no casobet3xBrasil e Argentina. Mas o Peru é diferente: nesta eleição, como na anterior, as forças políticas queriam impedir que (a candidata) Keiko Fujimori chegasse à Presidência. Muitos votarambet3xPedro Pablo Kuczynski (conhecido como PPK) para que Keiko não ganhasse - e ele, como seus antecessores ao longo da história peruana, será um presidente fraco, sem capacidadebet3xmudar nada.
bet3x BBC Brasil - Por quê? Pelo resultado eleitoral?
bet3x Cavarozzi - Ele foi eleito sem apoiobet3xforça partidária, com um Congresso opositor (a maioria do Parlamento é ligada a Keiko), e curiosamente, apesarbet3xser um liberal apoiado pelo eleitoradobet3xdireita, recebeu apoio da esquerda. O Peru tem uma história diferente do Brasil e da Argentina, que têm trajetóriasbet3xEstados mais consolidados.

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bet3x BBC Brasil - Mas apesarbet3xperfis diferentes, nos três casos - Brasil, Argentina e Peru - os resultados foram mais apertados nas últimas eleições. Foi o eleitor que mudou? Por que um líder já não reúne mais a maioria dos votos como ocorreu até recentemente?
bet3x Cavarozzi - No Peru não havia nenhum líder que aglutinasse nada, nenhuma figura forte. Mas o problema, e nisso os três países se parecem, é que apesarbet3xa pobreza ter caído, a desigualdade se manteve. E quando o pobre é menos pobre e o rico é mais rico, essa percepção da desigualdade persistente gera indignação e rejeição política.
bet3x BBC Brasil - Decepção do eleitor com a política?
bet3x Cavarozzi - Mais que decepção, existe um desencanto com a política. E por mais que nestes anos tenham ocorrido melhoras para os setores populares, essa profunda desigualdade social contribui para a seguinte percepção: 'estou melhor graças ao meu esforço'.
bet3x BBC Brasil - Qual ébet3xpercepção hoje sobre a América Latina?
bet3x Cavarozzi - Sou pessimista. No início do século, parecia haver alternativas. (O ex-presidente colombiano Alvaro) Uribe era uma alternativa. De direita, mas uma alternativa. Mais claramente o PT, no Brasil, os Kirchner, na Argentina, o chavismo (na Venezuela). Evo (Morales), na Bolívia, apesarbet3xEvo estar indo muito melhor que o restante. Eles simbolizavam a mensagembet3xque a política pode fazer algo. O fracasso destas experiências leva à pergunta: 'e agora, o quê'? Acho que estamos num períodobet3xlonga transição, para onde não sabemos.

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bet3x BBC Brasil - Qual ébet3xopinião sobre o Brasilbet3xhoje, com Michel Temer na Presidência e Dilma Rousseff afastada?
bet3x Cavarozzi - Me parece complicado que Temer termine o mandatobet3xdois anos. Evidentemente, antes, ele tem que conseguir o impeachment (de Dilma). Masbet3xpouco tempo, ele já perdeu três ministros, incluindo obet3xTransparência.
bet3x BBC Brasil - Vamos para um caminho mais democrático?
bet3x Cavarozzi - Acho que o risco que temos na América Latina, e por isso sou pessimista, é que a gente tenha mudanças rápidas, que nenhuma etapa política seja consolidada. Que é o que ocorre no Peru. Lideranças fracas e a dificuldade ou impossibilidadebet3xum líder fazer sucessor. Ciclos políticos curtos.

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bet3x BBC Brasil - Uma fragilidade da política?
bet3x Cavarozzi - Exatamente. Nenhum projeto político que consiga ser consolidado.
bet3x BBC Brasil - Nabet3xvisão, a política se enfraquece e a democracia também?
bet3x Cavarozzi - Claro. (São) democracias frágeis, que não conseguem se consolidar, mas sem ameaças do passado, como as militares.
bet3x BBC Brasil - Como são as democracias frágeis?
bet3x Cavarozzi - Não é que vai haver ruptura democrática macro, mas sim rupturas micro da democracia, como no México, onde por exemplo muitos territórios são governados por "máfias", quadrilhas, que fazem o que querem, e o Estado não demonstra capacidade política para recuperá-los.
O risco que temos hojebet3xmuitos países da América Latina é mantermos uma crostabet3xlegalidade democrática, mas que no fundo inclui estas máfias, estes governos paralelos e que têm a ver com a vida cotidiana das pessoas.
bet3x BBC Brasil - Um desgoverno?
bet3x Cavarozzi - Governos paralelos. E com Estados tão fracos, com políticos encurralados que dependem semprebet3xganhar a próxima eleição para continuar com apoio para governar.
bet3x BBC Brasil - O senhor acha que esses fatores estão vinculados - fragilidade da política, 'governos' paralelos e o desencanto eleitoral com a política?
bet3x Cavarozzi - Claramente. O eleitor percebe que a política não é capazbet3xmelhorar abet3xvida cotidiana, não é capazbet3xresolver questões fundamentais, como a segurança pública ebet3xvida econômica.
bet3x BBC Brasil - O eleitor destes países ficou mais exigente? Mais informado?

Crédito, Reuters
bet3x Cavarozzi - Na minha opinião, não existe um eleitor comum, mas sim diferentes setores que votam por diferentes motivos. Eu acho que, no geral, o nívelbet3xinformação sobre a política, se você olhar as pesquisas regionais, mostram quebet3xtodos os países é maior o desinteresse pela política. Isto é clarobet3xtoda a América Latina.
Existe um desencanto com a políticabet3xtodo o continente. Não importa se o governo foi ou ébet3xesquerda oubet3xdireita. Existe uma crise generalizada da política que ocorre também no Chile, onde o índicebet3xabstenção nas eleições é altíssimo e isso também está ligado ao desencanto com a política.
bet3x BBC Brasil - Quais seriam as razões para este desencanto?
bet3x Cavarozzi - Muitos setores da população constatam que a ação do Estado não mudabet3xvida cotidiana. "O que faz o Estado?", perguntam. E se soma a isso a questãobet3xque praticamente todos os governos são corruptos, sejambet3xdireita ou esquerda, e acho que neste sentido a corrupção prejudica mais os governos que se dizem progressistas.
bet3x BBC Brasil - O que o senhor chamabet3xgoverno progressista?
bet3x Cavarozzi - Quando (Hugo) Chávez, Lula, os Kirchner, Evo e (Rafael) Correa (do Equador) chegaram ao poder, muitos analistas, principalmente americanos, disseram que havia uma "guinada à esquerda da América Latina". Isso foi, pra mim, uma invenção. Tanto no Brasil como na Argentina houve algum movimento na política social, mas não se tocou (no sistema). Quando foram feitas as negociações estranhas envolvendo a Petrobras? Na décadabet3x1990 e antes. Mas o PT não mudou (o esquema).
Há uma percepção generalizadabet3xque todos os políticos são corruptos, o que não é verdade. Certamente existem alguns que não são corruptos. É muito difícil hoje que um político se livre desta acusação. "Você está na política porque fará algobet3xcorrupção".
bet3x BBC Brasil - Se o eleitor está decepcionado com o Estado, que não melhorabet3xvida, e com os políticos porque os associa à corrupção, para onde caminhamos?
bet3x Cavarozzi - O panorama na América Latina é tétrico. Porque qualquer caminho político adotado não consegue convencer a maioria do eleitoradobet3xque a política serve.
Acho que, no caso do Brasil e da Argentina, os resultados também foram influenciados por erros na escolha dos candidatos. De parte tanto do PT, no Brasil, quantobet3xCristina Kirchner aqui na Argentina. Todos sabíamos que Dilma era uma candidata fraca, inclusive como resultadobet3xsua primeira Presidência e pelo fatobet3xela ter sido eleita na primeira vez porque contava com o então prestígiobet3xLula.
Mas quando a situação ficou mais critica, ficou mais evidente que Dilma é uma pessoa pouco carismática, incapaz das negociações políticas, as quais Lula administrava bem, como no caso da relação com o PMDB ebet3xoutros. No casobet3xCristina, do peronismo, e do chavismo existe outra dificuldade, abet3xencontrar sucessor.








