Fobia social: quando o sofrimento pela timidez é tanto que a saída é se esconder:bwin 94.6

Ilustração mostrando pessoa tímida, com a cabeça coberta por sacobwin 94.6papel, iluminada e sendo observada

Crédito, KAKO ABRAHAM/BBC

Legenda da foto, Tímidos estão sofrendo mais porque sociedade atual exige exposição para que se consiga sucesso, dizem especialistas

"Era um trabalho pelo telefone, eu atendia supervisores. Estava preocupado com um relatório que teriabwin 94.6entregar, e que eu nunca tinha feito antes. Fiquei tão preocupado que alguém viesse me cobrar que, durante o atendimento, senti tontura, comecei a suar. Guardei o telefone, fui pro banheiro. Chorava, falava: 'Tenhobwin 94.6ir emora daqui, eu vou morrer'."

A maioria das pessoas já se deparou com gente tímida. Mas o que poucos sabem é que, às vezes, essa timidez diante do contato social gera sofrimento tão profundo e paralisante que a pessoa se retira do convívio e torna-se reclusa, sem conseguir trabalhar ou ter relacionamentos íntimos.

Por não conseguirem comunicar seu sofrimento silencioso, são tidas como infantis, caprichosas, bobas ou desinteressantes.

Lili e João, dois tímidos que, com dificuldade, compartilharam suas experiências com a BBC News Brasil - ela, por e-mail, ele, ao longobwin 94.6três conversas por telefone-, dizem ter aceito o pedidobwin 94.6entrevista por acreditarem que a sociedade precisa saber a diferença entre um poucobwin 94.6timidez e o que eles - e muitos especialistas - chamambwin 94.6fobia social.

A seguir, entenda o que é esse problema e por que sentimos vergonha, conheça as históriasbwin 94.6Lili e João e os tratamentos disponíveis.

*Os nomes reais foram omitidos a pedido dos entrevistados

Pessoa sozinha

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Pessoas com fobias sociais tendem a se tornar reclusas

O que é a fobia social

A pessoa com fobia social tem uma sensaçãobwin 94.6que existe um holofote sobrebwin 94.6cabeça aonde quer que ela vá. Essa é uma entre várias analogias utilizadas por psiquiatras para explicar o problema.

A Organização Mundialbwin 94.6Saúde (OMS) define a fobia social (também conhecida como transtornobwin 94.6ansiedade social e timidez patológica, entre outros termos) como um "medobwin 94.6ser observado por outros, levando (a pessoa) a evitar situações sociais. Em casos mais extremos, ela está associada à baixa autoestima e ao medobwin 94.6ser criticado(a). Fisicamente, a fobia social pode se manifestar por meiobwin 94.6rubor na face, náusea e tremores nas mãos, por exemplo. Estes sintomas podem progredir e gerar ataquesbwin 94.6pânico.

Segundo o Royal College of Psychiatrists, entidade britânica que treina profissionais e regula a atividade psiquiátrica no Reino Unido, cercabwin 94.65% da população têm fobia socialbwin 94.6maior ou menor grau. Não se sabe se o problema está aumentando ou se apenas ficou mais evidente. Mulheres têm entre duas e três vezes mais probabilidadebwin 94.6apresentar o problema.

Profissionaisbwin 94.6saúde mental ouvidos pela BBC News Brasil alertam, no entanto, para uma tendência cada vez maior da psiquiatria atualbwin 94.6"medicalizar" o sofrimento que é natural à condição humana. E argumentam que a chamada fobia social precisa ser entendida no contextobwin 94.6uma sociedade que, cada vez mais, exige que o indivíduo se exponha para ter sucesso.

O espaço público tornou-se um espaçobwin 94.6exibicionismo, dizem. E ele é implacável com aqueles que resistembwin 94.6fazer isso.

A históriabwin 94.6Lili

"Eu criei o blog justamente para encontrar pessoas que, assim como eu, sofrem com o transtorno para trocarmos experiências e informações. No nosso grupo no WhatsApp a gente conversa sobre tudo e um consola o outro quando precisa. Se um dia um acorda mal, com pensamentos ruins, outros entram e começam a escrever palavrasbwin 94.6esperança.

Pessoa solitária ao ladobwin 94.6pessoas conversando

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Às vezes, essa timidez diante do contato social gera sofrimento tão profundo e paralisante que a pessoa se retira do convívio

É algo que nos incentiva porque percebemos que não estamos sozinhos nessa luta diária.

Sempre digo que já nasci tímida.

Eu já sentia medobwin 94.6alguns familiares, meu tio e um primo. Quando os via, começava a chorar. As psicólogas (da escola) escreviambwin 94.6meu diáriobwin 94.6classe que eu era uma criança que prestava bastante atenção às aulas, porém nunca perguntava nada. Só tinha uma amiguinha, que ia no banheiro comigo, abria o meu refrigerante.

No ginasio, tudo foi piorando. Os meninos, como viam que eu era muito tímida, gostavambwin 94.6brincar comigo para verem eu ficar com o rosto ruborizado (esse é o meu principal e mais temível sintoma).

Já no colegial, sofri "bullying" até dizer chega. Atébwin 94.6um professorbwin 94.6matemática, que apontou pra mim e me perguntou o resultadobwin 94.6uma equação. Quando ele viu que eu fiquei roxabwin 94.6vergonha, disse a seguinte frase: 'Imagina quando você for se casar e o padre te perguntar se você aceita o seu noivo e você ficar assim, toda vermelha!'"

Por que sentimos vergonha?

"Não temos acesso ao que o outro vê (quando nos olha), estamos sempre imaginando o que o outro está olhando. E quando nos sentimos mal avaliados, sentimos vergonha", diz o psiquiatra e psicanalista Julio Verztman, pesquisador da Universidade Federal do Riobwin 94.6Janeiro (UFRJ).

"Você se expõe e percebe que não tem controle sobre como está sendo visto. Isso pode gerar muito sofrimento", explica Verztman, que atende pacientes que sofrem com timidez extrema há vários anos e publicou textos sobre fobia social.

"As pessoas tímidas imaginam que estão sendo mal vistas, sem que haja, necessariamente, um julgamento expresso ruim a respeito delas."

"Provavelmente porque o ambiente no qual o sujeito expõe abwin 94.6imagem lhe parece hostil. Pessoas que sentem vergonha desse tipo supõem esta sensação mal definidabwin 94.6hostilidade. Há aí um perigo. Não sabem, entretanto, defini-lo ou nomeá-lo."

Durante a entrevista, Verztman evita usar o termo fobia social, mas reconhece que dar nome ao problema é importante.

"Faz o sujeito reconhecer algo que está vivendo e que outros vivem, se sente menos sozinho, fica mais fácil procurar ajuda."

Por outro lado, tem havido muita rotulaçãobwin 94.6escolas, comenta.

"As síndromes psiquiátricas se popularizaram a tal ponto que viraram xingamento, jeitobwin 94.6punir o outro. Em nossa pesquisa, preferimos usar a palavra timidez para valorizar a denominação que os pacientes se dão, menos estigmatizante."

Jovem tímido no trabalho

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Na era da extroversão, jovens tímidos têm dificuldadebwin 94.6se dar bem no trabalho

A históriabwin 94.6João

João soa calmo falando ao telefone com a reportagem, mas explica que não é bem assim. "Eu estou tremendo um pouco", diz.

Na segunda entrevista, conta que não está tremendo, mas diz que se sentiu mal antesbwin 94.6começar a conversa. "Fiquei ansioso meia hora antes do combinado. Senti calor e desconforto abdominal."

João conta que descobriu que tinha fobia social lendo sobre o assunto na internet. Mas, assim como os pacientesbwin 94.6Verztman, não gostariabwin 94.6ser rotulado. "Eu sei o que acontece comigo, ninguém mais sabe. Alguém apontar o dedo e dizer, 'você é fóbico', eu não ficaria nem um pouco contente."

O medo do preconceito é uma das razões pelas quais ele prefere não ser identificado. "Se eu disser que tenho fobia, vão dizer que eu sou maluco, estranho, esquisito. Eu já ouvi isso sem falar que sou fóbico social. Imagina se eu falo."

João conta que, hojebwin 94.6dia, foge dos conhecidos. "Atravesso a rua, finjo que não vi."

Mas nem sempre foi assim.

"Em 2003, minha mãe faleceu. Acho que eu não fui preparado pra isso. Sou o mais novobwin 94.6cinco irmãos. Um deles falou, 'você vai ser o homem da casa'. Eu ia fazer 18 anos. Eu tinhabwin 94.6arrumar trabalho, mas não conseguia fazer um currículo, não tinha a menor ideabwin 94.6como fazer, tinha medobwin 94.6ir nos lugares, não sabia onde mandar o currículo, não tinha experiênciabwin 94.6nada na vida. Minha mãe me protegia muito. Eu brincava com minhas duas sobrinhas. Eram as únicas duas pessoas com quem eu brincava. Gostavabwin 94.6brincar, mas minha mãe me chamava pra ir estudar, ou ir fazer algo na rua. Meu irmão mais velho queria me levar pra praia, pra um jogo, mas minha mãe não deixava. Não consegui desenvolver habilidade social nenhuma."

João está desempregado. Diz que precisa trabalhar, mas não sabe como vai vencer suas dificuldades.

A era da extroversão

O que talvez dificulte muito a situaçãobwin 94.6pessoas como João e Lili é que, nos diasbwin 94.6hoje, a extroversão se tornou a norma.

"A preservação da intimidade e da interioridade é muitas vezes combatida. Para galgar postos, conseguir sucesso, você tembwin 94.6se expor, e isso tem um custo", diz Verztman.

"Nas redes sociais, as pessoas postam coisasbwin 94.6sua intimidade. Imaginamos um circulo íntimobwin 94.6destinatários, mas a postagem se dissemina para pessoas fora desse círculo. O outro pode receber isso mal. E o julgamento negativo chegabwin 94.6maneira dificil, as pessoas se sentem expostas, se sentem mal."

Outra tendência da sociedade atual é uma exigência cada vez maiorbwin 94.6que as pessoas sejam assertivas e saibam se vender, diz o psicanalista Rafael Raicher, membro do Núcleobwin 94.6Referênciabwin 94.6Atenção à Adolescência e Juventude (Nuraaj) do instituto Sedes Sapientiae,bwin 94.6São Paulo.

"De um lado, temos a sociedade exigindo que jovens sejam bonitos, autosuficientes, que façam a vida por conta própria, sem chefe. O trabalho é coletivo, mas autogestado, e o jovem tembwin 94.6fazerbwin 94.6vida a partirbwin 94.6suas capacidades."

Terapia

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Terapia e técnicasbwin 94.6autoajuda podem auxiliar fóbicos

Esse jovem, diz Racher, é o oposto do tímido.

"Ele é perfeito, descarado, fala tudo. O sucesso é o oposto do tímido."

Se você é um tipo mais envergonhado, diantebwin 94.6exigências tão impossíveisbwin 94.6ser atendidas, a solução, às vezes, é se esconder do mundo. Como fazem Lili e João. Mas eles contam nembwin 94.6casa, com a família, se sentem acolhidos.

"Com 40 anos, não é fácil ainda morar com os pais, principalmente sendo filha única", escreve Lili.

"Minha mãe é do tipo totalmente protetora, alémbwin 94.6ser mandona, autoritária, não entende até hoje o meu transtorno, isso porque é uma pessoa esclarecida, com curso superior, mas que nunca teve curiosidadebwin 94.6pesquisar mais a fundo sobre a fobia social para tentar me ajudar. E isso é algo muito triste para mim porque eu gostariabwin 94.6ter a ajuda dela ebwin 94.6demais familiares. Como a maioria das pessoas, eles acham que é frescura nossa, que ainda não crescemos e que temos que enfrentar nossos medos."

O que é surpreendente nas históriasbwin 94.6João e Lili é que os dois já conseguiram confiar muitobwin 94.6alguém - o suficiente para namorar.

"Estávemos pensandobwin 94.6morar juntos, mas ela faleceu", conta João. "Quando estava com a minha namorada, não parecia que eu era fóbico."

O que era diferente no comportamento dela? "Ela era tranquila. Também tinha ansiedade, mas me passava tranquilidade. Era uma pessoa tão serena. Fazia tudobwin 94.6uma maneira que eu não me sentia mal, ficava no meu pé: 'Está tudo bem? Está triste?'. Era até engraçado. Fazíamos parte do mesmo forum sobre depressão. Namoramos quase três anos. Ela teve um aneurisma cerebral, morreu dormindo."

A reportagem pergunta se ele gostariabwin 94.6ter outra pessoa como ela embwin 94.6vida.

"Difícil. Ela era diferente, especial pra caramba." João chora ao telefone.

Além dos medicamentos

Lili e João já tentaram tratamentos. Fizeram um poucobwin 94.6psicoterapia e também tratamento psiquiátrico, com remédios. Ele interrompeu os tratamentos; ela ainda é atendida por um psiquiatra e toma medicamento há maisbwin 94.6dez anos. Nenhum dos dois parece ter esperançabwin 94.6melhora. "Ainda não conheci ninguém que tenha se curado da fobia social", escreve Lili.

O site do Royal College of Psychiatrists oferece um guia completo com informações sobre fobia social, que inclui várias técnicasbwin 94.6autoajuda, como técnicasbwin 94.6relaxamento, por exemplo.

Entre os tratamentos disponíveis, o site menciona a autoexposição gradativa (o paciente vai experimentando a interação social aos poucos) e a Terapia Cognitivo Comportamental (TCC), que tenta reorganizar a formabwin 94.6pensar - ebwin 94.6agir - do paciente. Quando nada disso funciona, uma outra alternativa é o usobwin 94.6remédios - mas somente com acompanhamento médico, enfatiza o site.

Os especialistas ouvidos pela reportagem explicam que, no Brasil, a práticabwin 94.6consenso tem sido tratar a fobia social com remédios. Entre as psicoterapias, é dada preferência à Terapia Cognitivo Comportamental.

O psicanalista Rafaeil Raicher argumenta, no entanto, que o caminho para a melhora do paciente é encontrar o que é particular a cada caso, ou seja, a origem da fobia na história do indivíduo. Esse é o processo que ocorre na psicanálise, explica.

"Contando a históriabwin 94.6cada sujeito, eles (paciente e terapeuta) vão tecendo as tramas. De onde vem esse medo? Como lidar?"

Júlio Verztman, que é psiquiatra e psicanalista, também vê bons resultados na psicanálise. "Entre as psicoterapias, é a que, a meu ver, traz efeitos mais duradouros. O processo às vezes é longo, não tem efeitos imediatos. Mas são mais duradouros."

"Na psicanálise, a gente espera que a pessoa possa viver com mais liberdade, com outra relação com seus sintomas. E, sim, a gente vê isso ocorrer."

Escola

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, A escola se tornou um espaço que não acolhe pessoas com fobias sociais, diz especialista

Ele diz, no entanto, que o remédio pode ter um papel importante.

"O sofrimento pode ser muito agudo e intenso. Nesse caso, merece o usobwin 94.6medicação. Na minha opinião, não precisa ser uma coisa ou outra. Vi melhoras às vezes com as duas abordagens combinadas."

Há também o paciente que não quer psicoterapia.

"Depende muito do paciente. Tem pessoas que querem ajuda pontual, que não têm desejobwin 94.6fazer psicoterapia mas estão sofrendo e precisambwin 94.6ajuda. Podem ser auxiliadas por remédios ou outras abordagens."

Ele prossegue: "O importante é que a pessoa que sofrebwin 94.6timidez seja escutada", ressalta Verztman. "Mais do que um nome para o seu mal ou uma medicação, esses sujeitos buscam compreender o que sentem e ser acolhidos."

Como a sociedade pode ajudar?

Verztman diz que há várias formasbwin 94.6acolher a pessoa que sofre com timidez. Sentir pena não é uma delas.

"É importante que a gente não tenha pena, não coloque essas pessoasbwin 94.6situaçãobwin 94.6exceção. 'Que pena, que chato...' Isso é uma maneirabwin 94.6rebaixar a pessoa ao nosso olhar. É importante conversar com a pessoa, se ela der abertura e quiser, poder falar sobre isso", diz.

Para Verztman, as pessoas que sofrembwin 94.6vergonha estão trazendo uma mensagem a respeito do mundo que construímos.

"Estão refletindo um pouco do que nós somos. A escola, por exemplo, se tornou um espaço que não acolhe esse tipobwin 94.6sujeito. Empresas ou outros locaisbwin 94.6trabalho, onde as pessoas têmbwin 94.6se expor o tempo todo para provar que têm capacidadebwin 94.6liderança, também podem não ser espaços acolhedores."

"As coisas que vão melhorar a vida dos mais envergonhados são também coisas que podem melhorar a situaçãobwin 94.6todos. Mais tolerância pela diferença é uma delas."

Quem sabe nesse mundo mais tolerante caberia o sonhobwin 94.6Lili - ebwin 94.6tantos outros tímidos.

"O sonho dos fóbicos, embwin 94.6maioria, seria sair desse casulobwin 94.6que vivemos para explorar o mundo, conhecer novas pessoas, ser admirados pelos outros."

Línea.

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