O que um assaltoroleta olineSão Paulo tem a ver com a discussão jurídica que pode beneficiar Lula:roleta oline

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Na altura do número 25 da rua, quando chegava na casaroleta olineuma das pessoas que receberiam o dinheiro, Paulo foi abordado por dois homensroleta olineuma moto Twister amarela. Um dos homens tinha um revólver e obrigou o cabo eleitoral a passar o dinheiro. A dupla fugiu.
Apesarroleta olineo assalto ter suscitado uma "batalha" jurídica por anos, a dupla apontada como autora do crime já cumpriu a pena pelo roubo, mas continua presa por outras condenações.
Duas horas depois do crime, três mulheres que receberiam o valor foram até a casa do assistenteroleta olinegarçom Márcio Rodrigues Dantas, mas não o encontraram. Elas acreditavam que era ele, morador do bairro, quem conduzia a moto usada no assalto. Segundo a denúncia do Ministério Público, Márcio tinha uma motocicleta do mesmo modelo e da mesma cor.
Na faseroleta olineinvestigação, uma testemunha disse que Márcio era o condutor da moto "com certeza", mas no julgamento ela mudouroleta olineversão. Outra testemunha não o reconheceu.

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Uma terceira pessoa disse inicialmente que o homem com o revólver era Antônio Sérgio Lopes, conhecido no bairro. Ela disse que o reconheceu "pelo olhar", pois ele estava com o rosto encoberto por um capuz. Essa testemunha mudouroleta olineversão e disse que "achava" que o assaltante era Antônio, mas "não tinha certeza".
Emroleta olinedefesa, os dois contaram que, na hora crime, estavam entregando currículos. Segundo o juiz do caso, esses relatos não foram confirmados. Por outro lado, o magistrado afirmou ter provas "substanciais" para condená-los.
Márcio pegou cinco anos e quatro mesesroleta olineprisão. E Antônio, seis e oito meses.
Cláudia Seixas, advogadaroleta olineMárcio, recorreu da condenação, mas a sentença foi confirmadaroleta olinesegunda instância. Para ela, não havia provasroleta olineque seu cliente participara do crime, pois os depoimentos da vítima e das testemunhas eram contraditórios.
Um habeas corpusroleta olinemeio à Lava Jato
Antesroleta olineo caso chegar à terceira instância, no Superior Tribunalroleta olineJustiça (STJ), um juiz pediu a prisãoroleta olineMárcio. A defesa então entrou com um pedidoroleta olinehabeas corpus no Supremo Tribunal Federal (STF), pois alegava que seu cliente não poderia ser preso antesroleta olineesgotados todos os recursos.
A Constituição brasileira diz que um réu é considerado inocente até que o processo transiteroleta olinejulgado, ou seja, até que se esgotem os recursosroleta olinetodas as instâncias. Porém, a carta não fala explicitamente sobre prisão, deixando margem para interpretações.
O habeas corpusroleta olineMárcio foi levado ao plenário do STF sob o númeroroleta oline126.292. Até 2016, o Supremo entendia ser necessário esperar todos os recursos antesroleta olineprender um réu - isso não valia para crimes mais graves, como homicídio e latrocínio, pois, nesses casos, o condenado pode ser preso imediatamente.
Em fevereiroroleta oline2016, com a Operação Lava Jato, a mudançaroleta olineentendimento era defendida por procuradores e juízes, entre eles, Sergio Moro.
O habeas corpusroleta olineMárcio ganhou importância porque ele serviriaroleta olinejurisprudência para todos os casos do país, inclusive osroleta olinepolíticos e empresários acusados na Lava Jato.
Na sessão, seis dos 11 ministros votaram a favor do cumprimento antecipado da prisãoroleta olineMárcio - cinco foram contra.

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Quem é a favor argumenta que o méritoroleta olineum processo, ou seja, se houve ou não o delito que levou à condenação, não pode mais ser julgado nas cortes superiores. Em casoroleta olineum roubo, por exemplo, não é mais analisado se o réu praticou ou não o crime, mas se todos os ritos jurídicos foram seguidos legalmente durante o processo.
Outro argumento diz que incontáveis recursos costumam prolongar demais os processos, tendo como consequência a prescrição dos crimes e a impunidade.
No início do ano, o STJ divulgou uma pesquisa que mediu quantos casos tiveram suas sentenças anteriores modificadas na terceira instância.
Apenas 0,6% das 68.944 decisões analisadas entre 1ºroleta olinesetembroroleta oline2015 e 31roleta olineagostoroleta oline2017 resultaramroleta olineabsolvição do réu. Outros 6,4% tiveram penas diminuídas eroleta oline4,5% o regimeroleta olinepunição foi trocado. O levantamento foi pedido pelo ministro Luís Roberto Barroso, que é a favor da prisão nessas condições.
Mas o que essa história tem a ver com Lula?
A decisão do STF no habeas corpusroleta olineMárcio passou a valer para outros casos - dois anos depois, foi esse entendimento que mandou Lula para a cadeia.
Em entrevista à BBC Brasil, a advogada Cláudia Seixas criticou a postura do STF sobre o casoroleta olineseu cliente. "Com respeito aos ministros que votaram a favor desse novo entendimento, simplesmente rasgaram, naquela triste tarderoleta olinefevereiro, a nossa Carta Máxima", disse.
Para ela, o caso foi usadoroleta oline"forma política" pela Suprema Corte. "O que acredito é que o momento era delicado, aliás continua delicado por conta dos escândalosroleta olinecorrupção que assolam nosso país. Mas não podemos discordar que foi um julgamento mais político do que jurídico, o que é lastimável", afirma.
O precedente aberto pelo habeas corpus 126.292 foi bastante criticado por entidadesroleta olineclasse, como a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), e pela Defensoria Pública da União.

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Quem é contra argumenta que a prisão antecipada contraria o princípio da presunçãoroleta olineinocência, previsto na Constituição. E que, por mais que a maioria dos casos não tenha sentenças modificadas, os réus continuam a ter o direitoroleta olinese defenderroleta olinetodas as instâncias do Judiciário.
Em 2016, a OAB pediu um parecer sobre o tema ao advogado Cláudio Pereiraroleta olineSouza Neto. Ele é radicalmente contra a posição atual do STF.
"A principal Corte do país não pode se voltar contra o texto da Constituição, esse era um assunto resolvido. Aquele habeas corpus teve um efeito perverso no Judiciário. Não podemos jogar as pessoas no sistema prisional se depois elas serão inocentadas", disse o defensor,roleta olineentrevista à BBC Brasil. "E se, daqui a pouco, começarmos a repensar outros direitos fundamentais, como a censura?", diz.
Ele e outros dois advogados procuraram o PEN (Partido Ecológico Nacional) para entrar como uma Ação Declaratóriaroleta olineInconstitucionalidade contra a decisão do STF tomada no casoroleta olineMárcio. Essa medida, conhecida como ADC, só pode ser acionada por partidos políticos e por entidadesroleta olineclasse, como a OAB.
"Escolhemos o PEN porque queríamos um partido que não tivesse políticos envolvidosroleta olinedenúnciasroleta olinecorrupção", diz Souza Neto. Um dos advogados da ação é Antonio Carlosroleta olineAlmeida Castro, o Kakay, defensorroleta olinevários investigados na Lava Jato.
A própria OAB acionou outra ADC sobre o mesmo tema.
Em 2016, o Supremo votou as duas açõesroleta olinemaneira cautelar,roleta olineregimeroleta olineurgência, e manteve a decisão anterior. No entanto, o mérito ainda não foi julgado: o ministro Marco Aurélio Mello, relator das ADCs, liberou os processos para votação no plenário.

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Por que Lula pode se beneficiar?
Em 2016, o ministro Gilmar Mendes votou a favor do cumprimento antecipado da pena. Agora, ele tem dito que mudouroleta olineopinião sobre o tema: pensa parecido com seu colega Dias Toffoli, que prega que o réu só poderia ser preso depois da passagem do processo pelo STJ.
Marco Aurélio pretende levar a discussão ao plenário, à revelia da presidente da Corte, Carmén Lúcia, que é contra rediscutir o tema neste momento.
Caso a maioria dos ministros vote contra o cumprimento antecipado da pena, a nova jurisprudência passará a valer para todos os casos semelhantes, inclusive oroleta olineLula. Ele poderá ser solto.
A posição da ministra Rosa Weber sobre o tema é considerada decisiva. Na semana passada, ela negou conceder o habeas corpus ao petista, apesarroleta olineentender que a prisão antes do fim dos recursos é inconstitucional - desde 2016, ela vem seguindo a decisão da maioria.
Há quem diga que a ministra pode mudarroleta olineopinião e manter a maioria que prevê a prisão após condenaçãoroleta olinesegunda instância. Outros dizem que Weber deve seguirroleta olineposição original.
Diferentemente da discussão no STF e o futuroroleta olineLula, a história do rouboroleta olineItapecerica da Serra foi encerradaroleta olinetodos os tribunais: as condenações foram mantidas.
*Colaborou Fernanda Odilla




