Exclusivo: Por dentroestrela bet cupomuma 'clínica secreta'estrela bet cupomaborto no WhatsApp:estrela bet cupom

  • Nathalia Passarinho
  • Da BBC News Brasilestrela bet cupomLondres
Ilustração mulher grávida

Crédito, Kako Abraham/BBC

Legenda da foto,

BBC acompanhou por cinco meses um grupo secretoestrela bet cupomWhatsApp que vende medicamento abortivo e funciona como espaçoestrela bet cupomapoio a mulheres que desejam interromper a gravidez

estrela bet cupom São 0h39 do dia 22estrela bet cupommarço. Ana* está tentando interromper a gravidez. "Comecei o meu procedimento. Não sei se é coisa da minha cabeça, mas estou sentindo calafrios." Ela está na nona semanaestrela bet cupomgestação.

Durante as primeiras duas horas, não sente efeito algum e questiona se os remédios que tomou vão funcionar. "Eu estou muito ansiosa para dar certo."

Após cinco horasestrela bet cupomexpectativa, começa a sentir dores muito fortes e se desespera. "Não sei mais o que eu faço! Está doendo demais, demais, demais. E não vou aguentar. Acho que eu vou desmaiar!"

O relato é feitoestrela bet cupomáudio e texto para outras 90 mulheresestrela bet cupomdiferentes regiões do Brasil que integram um grupo secreto no WhatsApp destinado a orientar mulheres que querem interromper a gravidez, e,estrela bet cupomúltimo caso, fornecer remédios abortivos e acompanhá-las durante o procedimento.

"Acho que eu nunca senti tanta dor na minha vida!", relata a jovem, chorando,estrela bet cupomáudio enviado ao grupo. Outras mulheres que também interromperam a gravidez com medicamentos tentam tranquilizá-la. "Amiga, calma. Eu senti essa dor ontem. Tem alguém com você?"

"Não tem ninguém comigo. Tem só o meu irmão. Só que ele é pequeno, ele é criança. Não sei mais o que eu faço!", responde Ana. Várias mulheres começam a se manifestar, tentando ajudá-la. "Esquenta uma bolsaestrela bet cupomágua quente e coloca na barriga. Logo vai passar a dor."

Elas passam toda a madrugada trocando mensagens. O desesperoestrela bet cupomAna, que dá detalhes das cólicas e do sangramento, continua. Às 7h, a jovem chega a cogitar chamar uma ambulância. "A dor está tão forte quanto antes. Será que eu já posso chamar uma ambulância? É muita dor, dor, dor!"

Legenda do vídeo,

Grupo secretoestrela bet cupomWhatsApp funciona como uma espécieestrela bet cupom'clínica virtual'estrela bet cupomaborto

Fazer isso seria se autoincriminar por práticaestrela bet cupomaborto. E abrir caminho para que as mulheres que venderam o medicamento fossem denunciadas também. No Brasil, aborto é crime. Só é permitido interromper a gravidezestrela bet cupomcasoestrela bet cupomestupro, risco para a vida da mãe e feto com anencefalia.

"Espera, essa dor vai passar", diz uma das integrantes do grupo.

A voz adolescente chama a atenção das outras mulheres. "Quantos anos você tem?", pergunta uma delas. "Tenho 16", responde a garota. Ela conta que a família não sabe da gravidez. "Minha mãe deve chegar daqui a pouco. A casa está imprestável, principalmente os lençóis. Vou ter que contar para ela."

Doze horas depoisestrela bet cupomcomeçar a abortar, a jovem diz que a mãe chegouestrela bet cupomcasa. "Contei para ela. Ela falou que vai me levar ao médico. Vou apagar essas conversas." Logo depois, a menina deixa o grupoestrela bet cupomWhatsApp.

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Podcast traz áudios com reportagens selecionadas.

Episódios

Fim do Podcast

A BBC Brasil teve acesso às conversas do grupo por cinco meses para uma reportagemestrela bet cupomportuguês eestrela bet cupominglês. Uma das administradoras vende os remédios, que são encaminhados pelo correio. As outras se comportam como "guias" do aborto, responsáveis por acompanhar e "instruir" virtualmente – por mensagens, vídeos e áudios – as mulheres durante o procedimento. Elas não têm formação médica. Apostam na experiência e na dicaestrela bet cupomenfermeiros e médicos que conhecem.

As pílulas, as mesmas usadas como um dos métodosestrela bet cupomaborto legal nos hospitais, custam entre R$ 900 e R$ 1,5 mil, dependendo da dose para cada estágio da gravidez. Funcionam induzindo contrações do útero para que o feto seja expelido.

Uma "guia" é designada a cada grávida, e elas trocam mensagens diretamente durante o procedimento. As administradoras do grupo orientam que todas procurem um hospital após o aborto para verificar se é preciso fazer curetagem (limpeza do útero) e dão instruções sobre o que elas devem dizer para convencer os profissionaisestrela bet cupomsaúdeestrela bet cupomque perderam naturalmente o bebê e, assim, evitar serem denunciadas à polícia.

No grupoestrela bet cupomWhatsApp, as grávidas recém-chegadas compartilham medos e tiram dúvidas com outras mulheres que já abortaram. Também são comuns conversas sobre o papel do homem na gestação e criação dos filhos e as leis restritivas ao aborto no Brasil.

Entre os casos que chamaram atenção da reportagem da BBC está oestrela bet cupomuma meninaestrela bet cupomapenas 13 anos grávida do primo e oestrela bet cupomuma jovem que diz ter sido vítimaestrela bet cupomum estupro e que optou pelo aborto clandestino por temer ser humilhada e forçada a dar detalhes da violência que sofreu.

Remédio
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Doses custam entre R$ 900 e R$ 1,5 mil, dependendo do estágio da gravidez

"Eu tô com muito medo (de o aborto não dar certo), muito mesmo, até porque a minha gravidez veioestrela bet cupomum estupro, então eu não posso ter esse bebê. Eu tenho medo e vergonha", relata ela, que é confortadaestrela bet cupomseguida pelas outras mulheres.

"Meu anjo, se você foi estuprada você está protegida pela lei. Se você for ao hospital e contar o que aconteceu, eles farão o procedimento legal eestrela bet cupomgraça", aconselha uma das mulheres. "Mas eu tenho muito medo. Medo e vergonha", responde a jovem.

Os nomes das mulheres que participam do grupo foram trocados nesta reportagem. Várias podem ser menoresestrela bet cupomidade e algumas foram vítimasestrela bet cupomviolência ou estãoestrela bet cupomsituaçãoestrela bet cupomvulnerabilidade.

A médica Alessandra Giovanini, coordenadora do núcleoestrela bet cupomAborto Legal do Hospital Pérola Byington,estrela bet cupomSão Paulo, alerta para os riscosestrela bet cupomse fazer aborto sem acompanhamento médico.

"Acho que elas (administradoras do grupoestrela bet cupomWhatsApp) têm até a intençãoestrela bet cupomajudar. Mas essas pacientes correm o riscoestrela bet cupomter uma hemorragia muito grande, correm o riscoestrela bet cupomficar com restos ovulares e ter uma infecção que pode até levar à morte."

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Abortivos pelo correio

‬‬‬Para verificar a veracidade das promessasestrela bet cupomvenda do abortivo, a repórter da BBC News Brasil pagou R$ 930 via depósito bancário (R$ 900 pelo medicamento e R$ 30 do frete) após ser aceita no grupo identificando-se como uma jovem grávidaestrela bet cupomquatro semanas.

Dois dias úteis depois, o remédio chegou ao endereço indicado à vendedora. Seis pílulas vieram dentroestrela bet cupomuma caixaestrela bet cupomCD, envoltasestrela bet cupomuma pequena embalagemestrela bet cupompapel.

O volumeestrela bet cupomadesões eestrela bet cupomabortos feitos por meio desse grupoestrela bet cupomWhatsApp impressiona. Cercaestrela bet cupom20 grávidas entram nele a cada mês, pelas contas feitas pela BBC Brasil. Segundo uma das duas administradoras do grupo, cercaestrela bet cupom300 abortos foram realizadosestrela bet cupomtrês anos.

Muitas mulheres saem do grupo depoisestrela bet cupominterromper a gestação. A maioria relata sentir náuseas, fraquezas e dores durante o procedimento, mas destaca o apoio e a atenção recebida das mulheres que administram o grupo. Abortos são realizados diariamente sob a orientação das "guias". Só no dia 28estrela bet cupomdezembro, pelo menos três gestantes abortaram, conforme as trocasestrela bet cupommensagens observadas pela reportagem.

Para entrar no grupo secretoestrela bet cupomWhatsApp, é preciso ser convidada por uma das administradoras. As novatas são recepcionadas por esta mensagem:

Imagemestrela bet cupomtutorialestrela bet cupomvídeo sobre como fazer o procedimentoestrela bet cupomaborto
Legenda da foto,

Coordenadoras do grupoestrela bet cupomWhatsApp encaminham tutorialestrela bet cupomvídeo sobre como fazer o procedimentoestrela bet cupomaborto com medicamento

"Olá, seja bem-vinda! Esse é um grupo feminista destinado à vendaestrela bet cupommedicamentos. Nosso grupo é um espaçoestrela bet cupomacolhimento e auxílio, então, por motivosestrela bet cupomsegurança, pedimos que apaguem o histórico do grupo no mínimo uma vez por semana, podendo haver verificaçãoestrela bet cupomcumprimento dessa solicitação."

E todas as participantes precisam seguir regras, como não "fazer julgamentoestrela bet cupomcunho machista" e não compartilhar as conversas com pessoasestrela bet cupomfora do grupo.

Elas recebem um PDF com instruções detalhadas sobre o procedimento, os contatos para a compra do medicamento e até o telefoneestrela bet cupomuma clínica clandestina na Grande São Paulo, caso prefiram fazer o aborto com um médico. Também é enviado um tutorialestrela bet cupomvídeo.

O procedimento na clínica, conforme repassado pelas administradoras no grupo, custaestrela bet cupomR$ 4,5 mil a R$ 7,5 mil, a depender do estágio da gravidez. Só a primeira consulta custa R$ 400, segundo uma gestante que procurou o serviço.

É uma possibilidade distante para a maior parte das mulheres que optam pela clínica virtual. Em várias ocasiões, mulheres relataram dificuldade até mesmoestrela bet cupomjuntar dinheiro para comprar o medicamentoestrela bet cupomR$ 900.

"Estou anunciando várias coisas pessoais para vender e fazendo doces, mas parece impossível levantar tanta grana sem que me faça falta dentroestrela bet cupomcasa", comentou Carolina*. "Me encontroestrela bet cupomuma situação financeira terrível e sozinha com dois filhos, umaestrela bet cupomapenas dez meses."

As mulheres que vendem o remédio justificam o custo alto dizendo que correm riscos ao comercializar o produto. O medicamento vendido por elas é proibidoestrela bet cupomser comercializado no Brasil desde 2005, justamente por causa do efeito abortivo. O uso é restrito a hospitais.

"Nosso estoque está limitado e não podemos dar desconto. Salvo casos raríssimos. Não existe isso, gente. Isso é um produto ilegal e MUITO difícilestrela bet cupomconseguir. O que mais tem por aí é falsificação. Respeitem o nosso trabalho. A gente cumpre com a nossa parte direitinho e sempre", disse uma das coordenadoras do grupo.

Comprimidosestrela bet cupomMisprostol
Legenda da foto,

Os medicamentos são vendidos a, no mínimo, R$ 900. Para quem estáestrela bet cupomestágio mais avançado da gestação, o preço pode chegar a R$ 1.500, pela necessidadeestrela bet cupommais comprimidos

A legislação brasileira prevê penaestrela bet cupomum a quatro anosestrela bet cupomprisão para quem provoca aborto com o consentimento da gestante.

Segundo o advogado criminalista Conrado Almeida Gontijo, as jovens que administram o grupo também correm o riscoestrela bet cupomserem denunciadas pelo comércioestrela bet cupomum remédio que não tem autorização da Anvisa (Agência Nacionalestrela bet cupomVigilância Sanitária) para ser vendido – a pena para esse crime variaestrela bet cupom10 a 15 anosestrela bet cupomprisão.

Origem do grupo

A BBC Brasil entrevistou a coordenadora do grupoestrela bet cupomWhatsApp. A jovem contou que decidiu abrir a "clínica virtualestrela bet cupomaborto" depoisestrela bet cupomengravidar aos 19 anosestrela bet cupomdecorrênciaestrela bet cupomum estupro.

"Eu não consegui interromper a gravidez legalmente porque o pai era uma pessoa influente. Eu amo meu filho. Mas a maternidade não era algo que eu escolhi para mim. Eu sentia que tinha a vida inteira pela frente e roubaram issoestrela bet cupommim", afirmou.

"Eu decidi criar o grupo porque eu não acho justo que as mulheres sejam obrigadas a ter um filho se elas não quiserem."

Questionada sobre ter medoestrela bet cupomser presa, ela responde que sim. "Não vou dizer que não penseiestrela bet cupomparar. Às vezes, ainda penso. Mas quando vejo que uma mulher tem as oportunidades que eu não tive, me sinto melhor. Gostoestrela bet cupomver as mulheres seguindoestrela bet cupomfrente."

Coordenadora do grupoestrela bet cupomWhatsApp
Legenda da foto,

A mulher que criou o grupoestrela bet cupomWhatsApp tem só 24 anos. Ela diz que parte da receita com a venda dos medicamentos são usados para doar pílulas abortivas a mulheres pobres que não querem seguir adiante com a gravidez

Segundo a jovem, os remédios são vendidos com uma pequena margemestrela bet cupomlucro, e a receita é compartilhada com aquelas que atuam como "guias" das grávidas durante o procedimento. Uma outra parte do dinheiro, segundo ela, vai para a doação das pílulas abortivas a mulheres que não podem pagar pelo remédio.

Durante os cinco mesesestrela bet cupomque a BBC News Brasil acompanhou as conversas do grupo, as administradoras não pressionaram para que as gestantes abortassem. Uma delas chegou a enviar a foto do bebêestrela bet cupomuma mulher que desistiuestrela bet cupominterromper a gravidez.

"Bárbara* faz parte do grupo e decidiu ter. Esse é o bebê dela. Ela desistiu do procedimento", escreveu a jovem que criou o grupo.

"Que lindeza!", reagiu outra integrante. ‬‬‬"Não é? Que fique claro que a gente apoia qualquer decisão. A que ela escolheu só é mais aceita pela sociedade. A alternativa a gente oferece, e fico felizestrela bet cupomvê-las felizes, independenteestrela bet cupomcomo decidam seguir a vida", concluiu a coordenadora.

O perfilestrela bet cupomquem procura o 'aborto por WhatsApp'

A grande maioria das mulheres que integram o grupo, incluindo as coordenadoras, é jovem – têm entre 18 e 25 anos.

Muitas moram com os pais e estudam – estão nos primeiros semestres da faculdade – e dizem nas conversasestrela bet cupomWhatsApp que optaram pelo aborto porque não querem deixar os estudos e não têm independência financeira.

"Gente, eu tenho uma última pergunta. Eu procurei a médica pelo meu planoestrela bet cupomsaúde, mas meus pais não sabemestrela bet cupomnada que aconteceu. Vocês sabem se esses procedimentos da transvaginal e do exameestrela bet cupomsangue costumam aparecer na folhaestrela bet cupompagamento do plano?", perguntou uma jovem do Rioestrela bet cupomJaneiro, preocupada com a possibilidadeestrela bet cupomos pais descobrirem o aborto.

Outra jovem,estrela bet cupom18 anos, contou que ela própria nasceuestrela bet cupomuma gravidez indesejada e não tem uma boa relação com os pais. "Eu fui feitaestrela bet cupomum 'acidente'.‬‬ Tenho 18 anos, e há dois anos estou sem contato com os meus pais. Virei um fardo para os meus avós."

"Eu tenho 23 anos e, se não fosse minha mãe, estava ferrada. Ela não vive até hoje por minha causa e do meu irmão", compartilhou outra mulher.

No dia 8estrela bet cupommarço, Lidiana*,estrela bet cupomGoiás, entrou no grupo com a intençãoestrela bet cupomcomprar o abortivo para a irmãestrela bet cupom13 anos, que havia engravidado do primoestrela bet cupomprimeiro grau. "Ela quer tirar e eu também aconselho, mas tenho medoestrela bet cupomo procedimento ser muito intenso para ela por causa da idade", contou.

"Por diversos motivos a gravidez não é desejada. Ela é muito nova, a criança é frutoestrela bet cupomum relacionamento com o primoestrela bet cupomprimeiro grau, entre outros." Até a publicação desta reportagem, Lidiana ainda não havia decidido se compraria o remédio.

Outras mulheres que integram o grupo já têm filhos, e comentam entre si sobre o impacto das dificuldades da maternidade na decisãoestrela bet cupominterromper a segunda ou terceira gestação.

"Mando meu filho para a escola doente, porque não posso ficar com ele. Ele fica dez horas na escola todo dia. Confesso que me corta o coração", confidenciou uma mulherestrela bet cupomMinas Gerais.

"Eu passo uns bocados com meu filho. Se eu tivesse tido mais coragem na época eu teria tirado, mas eu era muito ingênua, achava que era mais simples."

'Eu vou morrer?'

A primeira preocupação das mulheres que entram no grupo é saber se o remédio funciona e se "não vão morrer"estrela bet cupomtanto sangrar.

Segundo a Pesquisa Nacional do Aborto,estrela bet cupompesquisadores da Universidadeestrela bet cupomBrasília (UnB), 500 mil interrupçõesestrela bet cupomgravidez são feitas anualmenteestrela bet cupomforma clandestina no Brasil. Cercaestrela bet cupommetade terminaestrela bet cupominternações. Dados do Ministério da Saúde apontam que pelo menos quatro mulheres morrem por dia por causaestrela bet cupomcomplicações decorrentesestrela bet cupomabortos.

"Será que preciso pegar folga no dia que eu for fazer?‬‬ Sangra, tipo, muito? Aiiiii quantas perguntas"‬‬, escreveu Lara*, no dia 12estrela bet cupomdezembro, 15 dias antesestrela bet cupomtomar os remédios. "Tenho muitas dúvidas ainda. Queria saber das meninas que fizeram. Tô ansiosa."

"Tem chancesestrela bet cupomeu morrer?", perguntou outra gestante.

Várias mulheres passam a compartilhar suas experiências e tirar dúvidas, como Mariana*,estrela bet cupomSão Paulo, que havia abortado 11 dias antes.

"Quando eu fiz, demorou bastante pra sangrar. Fiquei morrendoestrela bet cupommedo, comecei a fazer o procedimento à 1h30 da madruga. Às 10h da manhã, senti cólicas absurdasestrela bet cupomfortes, o líquido amniótico desceu, eestrela bet cupompoucos minutos o feto saiu inteiro na privada."

Ela contou que foi ao hospital fazer curetagem.

mulher com celular na mão
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Normalmente, a primeira preocupação das mulheres que entram no grupo é saber se o remédio funciona e se "não vão morrer"estrela bet cupomtanto sangrar

"Sangrei horrores, e saiu bastante pedaço. Continuei sangrando e com cólicas, e dois dias depois saiu um pedaço grande da placenta. Porém, continuava com muitas cólicas insuportáveis. Em uma semana fui ao hospital, fiz exames e deu abortamento incompleto (quando sobram restos do feto ou placenta). Fiz a curetagem, que teve seus péssimos momentos, mas graças a Deus me livreiestrela bet cupomtudo."

Bárbara*,estrela bet cupomPernambuco, contou que quase desmaiou durante o procedimento. "Tem uns momentos que dá muita fraqueza. Eu não tive diarreia, mas vomitei bastante. E fiquei fraca, quase desmaiando e com calafrios. Mas foram umas três horas sofrendo e, depois, alívio."

A BBC Brasil entrevistou uma jovemestrela bet cupom28 anos que interrompeu a gravidez com auxílio do grupo.

"Eu fiz o uso dos comprimidos e, depoisestrela bet cupomalgum tempo, quando começaram os efeitosestrela bet cupomdor,estrela bet cupomcólica, eu me mantive calma, e conversei com algumas meninas. As meninas se ajudam e se apoiam ao nívelestrela bet cupomnão dormirem se alguém faz o procedimento na madrugada", relatou.

"O aborto não tem que ser utilizado como contraceptivo, não deve ser usadoestrela bet cupomforma banal. Mas, como mulher, eu tenho direito à autonomia do meu corpo."

Os riscos

A BBC Brasil consultou a ginecologista Renata Peixoto, que realiza procedimentos legaisestrela bet cupominterrupçãoestrela bet cupomgravidezestrela bet cupomum hospital públicoestrela bet cupomBrasília e atende lá mulheres que tiveram complicações por abortos clandestinos.

Ela disse que as doses recomendadas pelas administradoras do grupoestrela bet cupomWhatsApp são altas. O objetivo seria garantir eficácia, já que essas mulheres têm a possibilidadeestrela bet cupomfazer o procedimentoestrela bet cupomhospitais.

A BBC Brasil questionou as administradoras do grupo sobre as doses prescritas. As jovens disseram que a dosagem foi recomendada por médicos que conhecem. Elas afirmam que nenhuma grávida que integrou o grupo morreu, mas reconhecem que há riscos.

"Não é 100% seguro. Mas se eu não acompanhar essas mulheres, elas vão acabar fazendoestrela bet cupomoutra forma, talvez mais insegura. Não quero deixá-las sozinhas", disse uma das administradoras.

Quando uma grávida faz aborto supervisionado na rede pública, ela toma um comprimidoestrela bet cupomcada vez e é observada para verificar se o procedimento foi concluído e se o sangramento está dentro do esperado. O objetivo é justamente evitar que tomem o medicamentoestrela bet cupomdose maior que o necessário. Em alguns casos, a interrupção da gravidez é feita por sucção, mediante anestesia, por ser um procedimento rápido e sem dor.

Mulher sendo atendida por médico

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Quando aborto é realizado na rede pública, a mulher toma o medicamento sob monitoramento dos médicos e nem sempre precisaestrela bet cupommaisestrela bet cupomdois comprimidos. Objetivo do acompanhamento é controlar a hemorragia e intervirestrela bet cupomcasoestrela bet cupomcomplicação

Nos Estados Unidos, no entanto, o aborto com medicamento é, muitas vezes, realizado legalmenteestrela bet cupomcasa, por orientação médica. As gestantes podem entrarestrela bet cupomcontato com a clínica durante o procedimento e são orientadas a retornarestrela bet cupomcasoestrela bet cupomhemorragia.

A médica Renata Peixoto diz que atende todos os dias mulheres com "abortamento incompleto" e que, pelo menos três vezes por semana, recebe pacientes que tiveram claramente complicações decorrentesestrela bet cupomprocedimentos clandestinos.

Segundo a especialista, os riscosestrela bet cupomfazer o procedimento sem supervisão médica vãoestrela bet cupomhemorragia – que pode levar à necessidadeestrela bet cupomtransfusão ou morte, se a mulher não procurar ajuda – à ruptura e infecção do útero, especialmente se realizado por mulheres submetidas anteriormente a cesárea ou que estejamestrela bet cupomgestação avançada, ou seja,estrela bet cupommaisestrela bet cupom11 semanas.

"Atendi uma vez uma meninaestrela bet cupom19 anos que estava com infecção tão avançada no útero que tivemos que retirar o útero dela, porque o tratamento com antibiótico não daria conta. Infelizmente, é uma menina nova que não poderá mais ter filhos", disse.

"O que a gente vê é que a proibição do aborto não impede que ele aconteça. As mulheres que realmente não querem ter acabam abortandoestrela bet cupomqualquer jeito, mas correm riscos."

As administradoras do grupoestrela bet cupomWhatsApp recomendam às mulheres irem ao hospitalestrela bet cupomdois dias a uma semana depoisestrela bet cupomtomarem os abortivos. O objetivo é verificar se há resquícios do feto e evitar infecções.

Paula* não seguiu as orientações, o útero dela infeccionou e ela precisou ser internada. ‪"Eu saí do hospital (agora). Era pra começar a tomar antibióticos hoje, mas só consigo amanhã", disse ela às demais integrantes do grupo no dia 15estrela bet cupomdezembro.

"Não vou morrer, né?", perguntou. Uma das administradoras tentou acalmá-la. "Vai não. Pode ficar tranquila. Mas, por favor, tome direitinho (os antibióticos) a partirestrela bet cupomamanhã."

No dia seguinte, Paula voltou a dar notícias. "Eu enrolei para ir ao hospital achando que a dor ia parar, e ainda tinha restoestrela bet cupommaterial que infeccionou meu útero. Agora estou tomando antibióticos. Se você sentir dor demais, é muito importante ir ao hospital", aconselhou às outras gestantes.

fachadaestrela bet cupomhospital
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As coordenadoras do grupoestrela bet cupomWhatsApp recomendam que todas as mulheres procurem o hospital dois dias após o aborto. Mas muitas temem ser denunciadas à polícia pelos médicos e enfermeiros

Além dos riscos à saúde, as mulheres que abortam clandestinamente vivem o medoestrela bet cupomserem denunciadas ao procurarem atendimento no hospitalestrela bet cupomcasoestrela bet cupomcomplicação ou para fazer curetagem (retirar eventuais resquícios do feto do útero).

O Código Penal brasileiro prevê penaestrela bet cupomprisãoestrela bet cupomum a três anos a mulheres que fizerem um aborto.

A BBC Brasil entrevistou uma jovemestrela bet cupomSão Paulo que foi denunciada por interromper a gravidez justamente pela médicaestrela bet cupomplantão que a atendeu. Ela tomou pílulas sozinhaestrela bet cupomcasa e se desesperou com as dores. Acabou indo a um hospital público, e a médica chamou a polícia.

A mulher,estrela bet cupom24 anos, contou que os policiais foram até o hospital e a interrogaram enquanto ainda sangrava estrela bet cupom .

"Assim que acabeiestrela bet cupomabortar o feto, eu tive uma convulsão. Eles entraram na sala falando que era para eu confessar, senão eu ficaria algemada, que eu iria para um presídio. Foi autuado crimeestrela bet cupomflagrante", disse. Ela teve que pagar fiança para ser liberada e hoje enfrenta um processo penal.

No grupoestrela bet cupomWhatsApp a que a BBC Brasil teve acesso, várias conversas giramestrela bet cupomtorno do medoestrela bet cupomser denunciada ao procurar atendimento.

"Oi, meninas. O que vocês falaram no hospital? Tenho muito medo da curetagem. Foramestrela bet cupomhospital normal, emergência?", perguntou uma das mulheres.

"Eu fui ao hospital normal. Disse que tinha acordado com sangramento e cólicas. E que estava grávidaestrela bet cupomseis semanas‬‬‬‬‬", relatou outra jovem,estrela bet cupomCampinas (SP).

Um dos receios delas é que o remédio abortivo seja detectado. "Eu tô sem unha para roerestrela bet cupomtão ansiosa para poder dormir sem ter pesadelo com isso. Li que se o sangramento encher quatro absorventes noturnosestrela bet cupommenosestrela bet cupomduas horas, é para procurar o hospital", comentou uma estudanteestrela bet cupomveterináriaestrela bet cupom23 anos que havia acabadoestrela bet cupomreceber os remédios abortivos.

As administradoras do grupo dão uma sérieestrela bet cupomorientações às gestantes para evitar que sejam descobertas ao procurar ajuda. Elas dão dicasestrela bet cupomcomo fingir um aborto espontâneo e evitar suspeitas. "Atue", resumem elas.‬

celular
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A maioria das mulheres que integram o grupo é jovem. Muitas ainda moram com os pais e estão na faculdade ou terminando o ensino médio

‬‬Problemas com métodos contraceptivos

A professora Diana Greene, da Universidade da Califórnia, que faz pesquisa demográfica sobre abortoestrela bet cupomtodo o mundo, disse que a maior causaestrela bet cupomgravidez indesejada é a dificuldade das mulheresestrela bet cupomencontrar métodos contraceptivos adequados para o organismo delas.

"É importante lembrar que ninguém engravida sozinha. Os homens fazem parte deste processo. E o grande problema é que muitas mulheres não encontram métodos contraceptivos adequados às necessidades delas", disse à BBC Brasil.

"Algumas sofrem com efeitos colaterais dos métodos com hormônio, os homens não aceitam usar camisinha ou o governo dificulta o fornecimento gratuitoestrela bet cupomoutros métodos", exemplifica.

Esse é um dos principais assuntos discutidos pelas mulheres que integram o grupoestrela bet cupomWhatsApp. Muitas dizem que pararamestrela bet cupomtomar anticoncepcional porque tinham efeitos colaterais. Outras relatam que enfrentaram burocracias ao pedir, na rede pública ou ao planoestrela bet cupomsaúde, para implantar o DIU (Dispositivo Intra-Uterino).

"E o DIU que meu plano não deixa, porque eu não tenho filho? Só depoisestrela bet cupomter o primeiro! Absurdo. E meu direitoestrela bet cupomnão querer ser mãe? Não sou materna", se queixou uma mulherestrela bet cupomSão Paulo na vésperaestrela bet cupomNatal.

"Eu queria muito algo sem ser hormônio. Expliquei ao médico que não queria, porque fumo e que vou passar por um procedimento cirúrgico para emagrecer‬‬‬‬‬. Mas ele não passou nada. Só anticoncepcional", comentou uma jovemestrela bet cupomMinas Gerais.

Outra mulher, do Rioestrela bet cupomJaneiro, disse que o médico dela recomendou não fazer sexo como método contraceptivo. "Meu médico disse que se não quero engravidar é só eu não dar. Só porque não tenho parceiro fixo há três anos." ‬‬‬‬‬‬‬‬‬‬

Também há discussões sobre a resistência dos homensestrela bet cupomusar camisinha. "Sempre arrumam um jeitoestrela bet cupomculpar a mulher. E depois querem que ela se lasque parindo uma criança que não quer", reclamou uma participante.

Elas também questionam o fatoestrela bet cupomnão haver anticoncepcionais masculinos no mercado. "Está muito confortável para eles. Desistem das pesquisas, porque o anticoncepcional masculino causaria os mesmos efeitos que os femininos. Mas os homens são muito egoístas para assumir essa responsabilidade."

pílulas

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Diana Greene Foster, da Universidade da Califórnia, diz que as mulheres têm dificuldade para achar métodos contraceptivo que se adequem às necessidades dela. Alguns homens se recursam a usar camisinha e algumas mulheres tem reações adversas a hormônios

Outro tema recorrente é a criminalização do aborto no país.

"Meninas, deixa eu falar uma coisa para as moças que ainda não fizeram por medoestrela bet cupomalgo. ‬Eu curso engenharia, e na minha faculdade só tem filhaestrela bet cupomrico. Aborto entre elas é normal. Elas debatem numa boa, e a maioria já fez, só que fora do país", comentou uma jovem do Rioestrela bet cupomJaneiro. "Aborto só é pecado para pobre", criticou.

Outra mulher, do Espírito Santo, disse que foi "obrigada" a ter o filho e que tentou se matar durante a gestação. "Eu tive um filho obrigada... O pai furou o preservativo‬‬‬‬‬‬. Botaram um cãoestrela bet cupomguarda atrásestrela bet cupommim 24h para eu não abortar‬‬‬. Me senti um lixo‬‬‬. Tentei me matar duas vezes", relatou. ‬‬‬"Até hoje não me sinto feliz com meu filho... É um trauma olhar pra ele e lembrar daquele inferno‬‬‬. Amo ele, mas o trauma não some‬‬‬."

"Engravidei com 18 anos e, como eu era superingênua e não tinha contato com dinheiro, não pude abortar. Minha mãe até fez uns remédios caseiros para ver se funcionava, mas claro que não funcionou. Hoje tenho 26 anos, faço faculdade e trabalho, mal consigo ter tempo para meu filho exatamente para tentar garantir um futuro para ele. E poucas pessoas entendem isso", compartilhou outra jovem do Espírito Santo.

O aborto é permitido na maior parte dos países desenvolvidos, como Estados Unidos, Canadá e os integrantes da União Europeia. Na América Latina, Cuba e Uruguai permitem a prática. Na Colômbia, o aborto passou a ser permitido para resguardar a saúde mental da mulher o que, na prática, contempla a gravidez indesejada.

Apesarestrela bet cupomo Brasil ter uma das legislações mais restritivas do mundoestrela bet cupomrelação ao aborto, segundo a OMS, uma proposta, no Congresso Nacional, pode tornar a lei ainda mais rígida.

Uma comissão da Câmara aprovou no ano passado uma emenda à Constituição que estabelece a proteção da vida desde a concepção. Na prática, a proposta pode criminalizar até abortosestrela bet cupomcasoestrela bet cupomestupro e feto com anencefalia. O texto segueestrela bet cupomtramitação.

Por outro lado, o Supremo vai decidir se o aborto até o terceiro mês deve deixarestrela bet cupomser crime.

Os debates nas duas casas já começaram e podem determinar o futuroestrela bet cupomum tema polêmico que envolve a saúdeestrela bet cupommilharesestrela bet cupommulheres.

"Fazer um aborto não é uma decisão fácil. Ninguém quer passar por isso. Quando eu fiz, eu tinha 17 anos. Eu fiz o aborto sozinha num quartoestrela bet cupomhotel. O pior sentimento é oestrela bet cupomabandono", descreveu uma jovemestrela bet cupom24 anos no grupoestrela bet cupomWhatsApp.

*Os nomes foram trocados para proteger a identidade das mulheres.‬‬‬‬‬‬‬