'Fiquei seis anos sem ver meu pai e o reencontrei... na cracolândia':aposta ganha baixa

  • Carla Schtruk
  • De São Paulo para a BBC Brasil
Mylena Garbin e o pai

Crédito, Marcello Vitorino/Fullpress

Legenda da foto, A produtora Mylena Garbin e o pai na região da cracolândia paulistana: reencontro após anosaposta ganha baixaseparação

aposta ganha baixa A produtora cultural Mylena Garbin,aposta ganha baixa24 anos, peregrinouaposta ganha baixabaraposta ganha baixabar por muito tempo no centroaposta ganha baixaSão Paulo. E não foi para beber nem encontrar amigos.

A missão era procurar o pai, usuário crônicoaposta ganha baixacocaína e crack que abandonara a família durante a adolescência da jovem. "Ninguém sabia dele", conta a produtora.

Mylena tinha uma pista: sabia, desde os 18 anos, que o pai costumava frequentar a cracolândia, na região centralaposta ganha baixaSão Paulo. Mas não o via desde então.

"Talvez o tenha cobrado muito, para que parasseaposta ganha baixausar drogas, e ele se cansou", comenta.

Região da cracolândiaaposta ganha baixaSão Paulo

Crédito, Marcelo Camargo/Agência Brasil

Legenda da foto, Região da cracolândiaaposta ganha baixaSão Paulo,aposta ganha baixaimagemaposta ganha baixajaneiroaposta ganha baixa2013, quando governo estadual começou a promover internação involuntáriaaposta ganha baixausuários

No finalaposta ganha baixa2016, Mylena resolveu participar, como voluntária,aposta ganha baixaum evento que oferecia tratamentosaposta ganha baixabeleza a mulheres e transexuais da cracolândia. E pensou que, uma vezaposta ganha baixameio ao vaivémaposta ganha baixatraficantes e dependentes, poderia tentar novamente.

Ela decidiu perguntar a assistentes sociais do programa Braços Abertos - iniciativa da gestão Fernando Haddad (PT) na cracolândia e hojeaposta ganha baixareformulação pela administração João Doria (PSDB) - se alguém conhecia seu pai.

E elas,aposta ganha baixafato, sabiam do paradeiro do paiaposta ganha baixaMylena - o auxiliaraposta ganha baixaserviços Alcides Silva*,aposta ganha baixa52 anos, era um dos beneficiários do extinto programa, que oferecia aos usuáriosaposta ganha baixacrack remuneração diáriaaposta ganha baixaR$ 15 por diaaposta ganha baixatrabalho, refeições e vagasaposta ganha baixahotéis da região.

Mylena deixou um bilhete com as assistentes sociais. "Pai, me liga! Te amo e estou com saudades", dizia a mensagem com os númerosaposta ganha baixatelefone.

Bilhete deixado por Mylena para o pai

Crédito, Olivia Tesser

Legenda da foto, Após confirmar que pai vivia na cracolândia, produtora deixou bilhete que acabou viabilizando reencontro

O reencontro não demorou. E desde então, pai e filha não perderam mais o contato, e poderão conhecer, juntos, o novo membro da família - Mylena está grávidaaposta ganha baixaoito meses. "O importante agora é que vou ver e acompanhar esse netinho", diz o pai.

No ano passado, pai e filha passaram o Natal juntos pela primeira vezaposta ganha baixa20 anos. O encontro foi na casa da mãeaposta ganha baixaMylena, a comerciante Irene Cavalcanti.

"Finalmente tivemos um encontro familiar. Minha mãe recebeu meu pai muito bem, foi bem tranquilo, ele ficou muito feliz", conta a produtora cultural.

Alcides não largou o crack - mas diz estar consumindo menos. E Mylena o visita a cada 15 dias no hotelaposta ganha baixaque ele vive na cracolândia.

Fachadaaposta ganha baixahotel na cracolândia

Crédito, Marcello Vitorino/Fullpress

Legenda da foto, Fachada do hotel na cracolândiaaposta ganha baixaque Alcides (nome fictício), paiaposta ganha baixaMylena, passou a viver com benefício da prefeitura

"O espaço é muito limpo, me sinto bem lá. As pessoas acham que a cracolândia é o inferno na Terra, mas não é bem assim. Claro que ninguém irá andar sozinho no 'fluxo', onde se compra e vende droga, masaposta ganha baixageral não é um lugar muito mais perigoso do que outras regiões da cidade", opina a filha.

A conversa da filha e do pai com a BBC Brasil ocorreaposta ganha baixafrente à estação Júlio Prestes, marco arquitetônico da cidade esquecidoaposta ganha baixameio ao abandono da região central.

A poucos metros dali, na cracolândia, são comercializados cercaaposta ganha baixadez quilosaposta ganha baixacrack por dia, segundo a Polícia Civil do Estado. Na semana passada, um assalto terminouaposta ganha baixaconfronto e confusão generalizada envolvendo dependentes químicos, traficantes e forçasaposta ganha baixasegurança. Houve saques a lojas e um ônibus chegou a ser sequestrado por viciados.

Braços Abertos ou Recomeço?

Assim como o futuro do paiaposta ganha baixaMylena, o destino do programa anticrack da gestão do PT é incerto. Implantadoaposta ganha baixajaneiroaposta ganha baixa2014, a ação petista partia do princípio da reduçãoaposta ganha baixadanos: fazer com que o usuário amplieaposta ganha baixainserção social e diminua o consumo aos poucos, por meioaposta ganha baixaofertaaposta ganha baixaemprego e moradia, sem necessidadeaposta ganha baixainternação.

Dependentes químicos que trabalhassem ao menos quatro horas por dia (em atividades como varriçãoaposta ganha baixarua e jardinagem) ou participassemaposta ganha baixaoficinasaposta ganha baixaarte e pintura, como é o casoaposta ganha baixaAlcides, ganhavam R$ 15 por dia. Cercaaposta ganha baixa400 pessoas eram atendidas até o final do ano passado.

Integrantes do programa Braços Abertos

Crédito, João Luiz/Secom SP

Legenda da foto, Dependentes químicosaposta ganha baixaatividadeaposta ganha baixavarriçãoaposta ganha baixa2015 dentro do Braços Abertos; prefeitura não confirma se manterá pagamentoaposta ganha baixadinheiro a usuários
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Na campanha eleitoral, o atual prefeito João Doria (PSDB) disse que o programa "não era bom para a cidade" e prometeu extingui-lo. Após confronto na semana passada, Doria disse que a "cracolândia tem prazo final para acabar" e que isso ocorreria "em breve".

Relatos na imprensa após a eleição sugeriram que a gestão tucana manteria parte das ações da iniciativa, mas a prefeitura ainda não divulgou detalhes do plano - diz apenas que tudo será incorporado ao programa Recomeço, do governo do Estado (também do PSDB) e focado no tratamento dos dependentes.

"O projeto tem como eixo fundamental o acolhimento e tratamentoaposta ganha baixadependentes químicos. O conceito básico é primeiramente dar abrigo aos dependentes fora da área (cracolândia). O programa inclui também açõesaposta ganha baixaassistência social, zeladoria e segurança, com apoio à polícia no combate ao tráfico. As iniciativas serão feitasaposta ganha baixaconjunto com o governo do Estado, governo federal e sociedade civil", informou a prefeituraaposta ganha baixanota à BBC Brasil.

A administração não respondeu pedidos específicosaposta ganha baixainformação, como número atualaposta ganha baixabeneficiários, ações que serão ou não mantidas e qual será a estruturaaposta ganha baixagestão.

O sociólogo Benedito Mariano, coordenador do Braços Abertos na gestão Haddad, defende a iniciativa que gerenciava. "A lógica do acolhimento e do resgate socialaposta ganha baixapessoas que se viam à margem da sociedade pode provocar grandes mudanças", afirma.

Uma pesquisa da Plataforma Brasileiraaposta ganha baixaPolíticaaposta ganha baixaDrogas, rede que promove políticasaposta ganha baixareduçãoaposta ganha baixadanos, apontou que 67%aposta ganha baixa80 beneficiários ouvidos haviam relatado redução no consumo.

Alcides Silva

Crédito, Marcello Vitorino/Fullpress

Legenda da foto, Alcides Silva diz ter reduzido consumoaposta ganha baixacrack, mas ainda não conseguiu largar vício e a vida na cracolândia

Há quem considere, por outro lado, que tratamentos que visem a abstinência, como a proposta das gestões do PSDB, sejam mais adequados. Para Ana Cecília Marques, coordenadora da Comissãoaposta ganha baixaDependência Química da Associação Brasileiraaposta ganha baixaPsiquiatria e professora da PUC-SP, viciados devem passar primeiramente por tratamentosaposta ganha baixadesintoxicação eaposta ganha baixadoenças relacionadas ao consumoaposta ganha baixadrogas.

"A maioria dos usuários adquire as chamadas comorbidades, como enfisema e inflamação dos nervos, que precisam ser tratadas", diz Marques, citando programasaposta ganha baixauniversidades como USP e Unifesp que alcançariam taxasaposta ganha baixaabstinênciaaposta ganha baixa60%.

A descontinuidade das iniciativas anticrack do setor público não se restringem a São Paulo. No plano federal, a principal aposta do governo Dilma Rousseff (PT) - microônibus superequipados para monitorar as cracolândias - resultouaposta ganha baixaveículos parados, subutilizados ou funcionandoaposta ganha baixaforma precária, como mostrou a BBC Brasilaposta ganha baixa2015. e até o momento, não há indicaçãoaposta ganha baixaque essa política seja prioridade da gestão Michel Temer (PMDB).

aposta ganha baixa Futuro

Ainda longe da abstinência, Alcides fica à espera da nova proposta da Prefeituraaposta ganha baixaSão Paulo para resolver o problema da cracolândia e seus viciados. "Espero que não mude muita coisa porque a ação tem me ajudado", diz.

De acordo com estimativa feitaaposta ganha baixa2015 pelo governo federal, 340 mil pessoas usavam crack regularmente no país naquele ano.

Mylena e o pai hoje e no passado

Crédito, Marcello Vitorino/Arquivo pessoal

Legenda da foto, Mylena e Alcidesaposta ganha baixadois momentos: hoje, enquanto buscam se reaproximar, e no passado

"O uso compulsivo da droga muitas vezes não está diretamente relacionado à substânciaaposta ganha baixasi, mas à ausência ou rupturaaposta ganha baixavínculos sociais", lembra José Luis Ratton, professor do departamentoaposta ganha baixaSociologia da UFPE e integrante do Fórum Brasileiroaposta ganha baixaSegurança Pública.

Sem dar detalhesaposta ganha baixasua vida, o homemaposta ganha baixafala agitada e gestos largos reconhece que as drogas o "empurraram para outro mundo". Pouco depois, passa a mão na barriga da filha grávida e abre um sorriso. "Quero abrir uma barracaaposta ganha baixasucos no centro", conta. "Voltei a sonhar, antes estava jogado, não queria saberaposta ganha baixanada."

* Nome fictício. O paiaposta ganha baixaMylena falou com a reportagem com a condiçãoaposta ganha baixanão ter o nome divulgado, apenas imagens e declarações.