Restaurantes podem ser solução para explosão da populaçãoesporte totaláguas-vivas?:esporte total

Ainda assim, Piraino recomenda que as pessoas não comam águas-vivas diretamente do mar, pois os animais crus contêm patógenos bacterianos que podem causar intoxicação alimentar (embora, no caso dele, possíveis bactérias teriam sido mortas pela radiação ultravioleta proveniente do sol).

Mas Piraino defende a inclusão desses invertebrados no cardápio. É uma possibilidade sendo explorada pelos pesquisadores, frente à populaçãoesporte totalpeixes que foi dizimada pelo homem e ao aumento da crise alimentar mundial.

O problema

Surgiram recentemente inúmeros relatosesporte totalinfestaçõesesporte totaláguas-vivas – eventos sazonais marcados por grandes e súbitos aumentos da população desses animais.

Essas explosões populacionais desequilibram os ecossistemas oceânicos e têm o potencialesporte totalprejudicar a biodiversidade e reduzir a quantidadeesporte totalpeixes.

Se não agirmos para refrear essa expansão populacional, o oceano deixaráesporte totalser um espaço da biodiversidade dos peixes para ser um ecossistema dominado pelas águas-vivas, segundo adverte um estudoesporte total2009.

Esta teoria sofre ampla contestação. Alguns cientistas afirmam que não existem provas do aumento global do númeroesporte totaláguas-vivas.

Uma análiseesporte totallongo prazoesporte total2012, por exemplo, concluiu que não há evidências concretasesporte totalum aumento da populaçãoesporte totaláguas-vivas. O estudo sugeriu que suas populações podem sofrer ciclosesporte totaloscilação que duram cercaesporte total20 anos.

Mas existem poucas dúvidasesporte totalque as explosões populacionais estejam se tornando mais comunsesporte totalalguns lugares. E elas podem trazer severas consequências para a vida marinha e humana.

Se a água-viva pode representar uma ameaça tão grande aos nossos oceanos e à segurança alimentar global, por que não simplesmente comê-las?

As águas-vivas se reproduzem com extrema rapidez. Algumas espécies chegam a ter propriedadesesporte totalquase imortalidade: a Turritopsis nutricula, por exemplo, consegue evitar a morte quando ferida, transformando-seesporte totaluma versão menos maduraesporte totalsi própria (conhecida como pólipo). É como se uma borboleta voltasse a ser lagarta.

O pólipo pode então produzir cópias idênticasesporte totalsi mesmo,esporte totalforma que, teoricamente, a água-viva pode viver indefinidamente.

Este é apenas um exemplo da imensa resiliência e capacidadeesporte totaladaptação das águas-vivas, que existem há 500 milhõesesporte totalanos no planeta. As águas-vivas conseguem ganhar tempo até que surjam condições favoráveisesporte totalreprodução, repousando por anos no fundo do oceano no seu estadoesporte totalpólipo, amadurecendo e se espalhando apenasesporte totalcondições ideais.

As águas-vivas também conseguem se beneficiar das atividades humanas que prejudicam outros animais marinhos. Elas precisamesporte totalmuito pouco oxigênio para sobreviver, por exemplo. Com isso, ao contrárioesporte totaloutras espécies marinhas, as águas-vivas conseguem cresceresporte totallocais atingidos por águas escoadas da agricultura, que reduzem os níveisesporte totaloxigênio da água do mar.

Mas a proliferação das águas-vivas, infelizmente, pode trazer efeitosesporte totalcascata. Quando elas se mudam para uma região, as outras espécies têm dificuldade para recolonizá-la, mesmo depois que os níveisesporte totaloxigênio voltam ao normal. Isso ocorre porque as águas-vivas adoram alimentar-seesporte totallarvasesporte totalpeixes.

É difícil prever exatamente como as águas-vivas irão se comportaresporte totalum clima mais quente, pois não existem muitos dados históricos sobre elas, segundo Monty Graham, diretor do Institutoesporte totalOceanografia da Flóridaesporte totalSt. Petersburg, nos Estados Unidos.

"Algumas décadas atrás, ninguém realmente prestava atenção nas águas-vivas", afirma ele. "Mas as águas-vivas são muito sensíveis aos ciclos climáticos. E, por extensão, elas também serão muito sensíveis às mudanças climáticas duradouras."

Historicamente, as águas-vivas são controladas pelos predadores marinhos, como as gaivotas, as tartarugas-marinhas, os peixes e as baleias. Mas a população dos seus predadores vem diminuindo, devido a uma combinaçãoesporte totalfatores que incluem a pesca excessiva, mudanças climáticas, poluição e perdaesporte totalhabitat.

Em todo o mundo, surtosesporte totaláguas-vivas vêm devastando a populaçãoesporte totalpeixes, sem falar na indústria da pesca e do turismo, para indicar algumas.

Em 2007, toda a indústria irlandesaesporte totalsalmão foi varrida pela infestaçãoesporte totalmilhõesesporte totaláguas-vivas,esporte totaluma áreaesporte total26 km² por 10,7 metrosesporte totalprofundidade. Elas infestaram as gaiolas das fazendasesporte totalsalmão, matando maisesporte total100 mil peixes.

No Japão, os pescadores vêm observando o crescimento extraordinário das águas-vivasesporte totalNomura, todos os anos, desde 2002. Esta espécie chega a atingir dois metrosesporte totaldiâmetro e pesa até 220 kg.

As águas-vivas gigantes devastaram a vida litorânea, com custo estimadoesporte totalbilhõesesporte totalienes (equivalentes a dezenasesporte totalmilhõesesporte totalreais) para a indústria pesqueira japonesa.

"Algumas regiões irão experimentar aumento das áreas povoadas por águas-vivas, dos seus números e da duração da procriação, especialmente se continuarmos a pressionar os pesqueiros que se encontram no ecossistema", explica Graham.

E se as comermos?

O mar fornece uma parcela significativa das proteínas consumidas pela humanidade.

Em 2020, a indústria pesqueira capturou cercaesporte total112 milhõesesporte totaltoneladasesporte totalorganismos aquáticos, segundo a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO, na siglaesporte totalinglês).

E, à medida que aumenta a demanda global por alimentos, questões sérias permanecem sobre nossas fontesesporte totalnutrientes.

Alguns cientistas, como Piraino, acreditam que uma solução é ampliar o nosso paladar. Ele sugere que, enquanto o mundo enfrenta a necessidade urgenteesporte totalbuscar recursos alimentícios sustentáveis, uma formaesporte totalatender à demanda é tentar integrar novos alimentos às receitas tradicionais e à culinária local.

"Talvez tenha chegado a horaesporte totalacrescentar um novo item ao nosso cardápio: a água-viva", afirma Piraino.

A água-viva é consumidaesporte totaltoda a Ásia, mas ainda é raro encontrá-la nos restaurantes ocidentais.

Na China, por exemplo, a água-viva é consumida há maisesporte totalmil anos. A saladaesporte totalágua-viva é uma iguaria popular no país.

Elas são ricasesporte totalproteínas e as microalgas no interior das célulasesporte totalalgumas águas-vivas contêm alto teoresporte totalácidos graxos. Esta prática ainda não foi muito adotada no mundo ocidental, mas alguns restaurantes estão incentivando seus clientes a abraçar o desconhecido.

A entrada da cozinha do restaurante Benu,esporte totalSão Francisco, nos Estados Unidos, é parecida com a maioria das outras na cidade: uma calma antecipação do burburinho que cresce rumo ao iminente caos do serviço, enquanto a conversa dos clientes invade a cozinha. Mas, ao contrário da maioria dos outros restaurantes finos, existe um item especial no cardápio: água-viva.

A água-viva enfeita um prato deslumbrante, envolvendo delicadamente um único camarão, com acompanhamentoesporte totalcaviar e raiz-forte. É uma "forma muito acessível"esporte totalprovar água-viva, segundo Corey Lee, fundador do Benu.

Lee é natural da Coreia do Sul, onde cresceu comendo águas-vivas. Ele conta que o animal era algo "delicioso e menosprezado", que ele sempre quis compartilhar com seus clientes.

A água-viva é servidaesporte totalvárias formas desde que Lee abriu seu restauranteesporte total2010 — que hoje tem três estrelas Michelin. Outra forma é frescaesporte totalum consomméesporte totalcarne bovina.

"O sabor do oceano fornece um forte contraste e salinidade à sopa rica e gelatinosa, enquantoesporte totaltextura instável lembra aesporte totalmúsculos bovinos cozidos por muito tempo", explica Lee.

Mas, apesar do seu apelo para os consumidores aventureiros do mundo ocidental, a água-viva não é um substituto viável para os peixes ou outras fontesesporte totalproteínas, se considerarmos o que é melhor para o meio ambiente.

É verdade que ampliar o nosso paladar para incluir fontesesporte totalproteína alternativas é vital para ajudar a reduzir as mudanças climáticas, mas a água-viva pode não ser a solução.

Em primeiro lugar, a água-viva tem 95%esporte totalágua. Os 5% restantes contêm seus nutrientes essenciais. Esta proporção entre massa e nutrientes significa que ela é uma fonteesporte totalproteína bastante ineficiente.

"Comê-las é um grande esforço", afirma Graham. "Muita energia é gasta no processo, porque elas têm muita água. Elas também não são muito boas para comer."

"Elas provavelmente são mais úteis como um tipoesporte totalcolágeno e nãoesporte totalproteína propriamente dita", segundo o professoresporte totalbiologia marinha Jonathan Houghton, da Universidade Queen’sesporte totalBelfast, no Reino Unido. "Mas, certamente, não como substituto do peixe, que é várias vezes melhor como potencial fonteesporte totalalimento."

Existem diversas empresas que já utilizam água-viva como substituto do colágeno bovino e suíno, frequentemente empregadoesporte totaltratamentos médicos humanos. A empresa britânica Jellagen, com sedeesporte totalCardiff, no Paísesporte totalGales, afirma que o colágeno da água-viva oferece uma alternativa melhor, porque o seu colágeno é compatível com uma ampla variedadeesporte totaltiposesporte totalcélulas humanas.

Águas-vivas teimosas

Mas permanece o fatoesporte totalque, apesar do amplo consumoesporte totalágua-vivaesporte totaltoda a Ásia, as infestações ainda são um problema.

Graham salienta que comer água-viva pode reduzir parte da pressão sobre a populaçãoesporte totalpeixes, mas não resolverá as causas latentes das infestaçõesesporte totaláguas-vivas, que são indicadores do que está se passando nos oceanos do planeta.

"Se você retirar os peixesesporte totalum ecossistema, a tendência é que as águas-vivas se deem muito bem", afirma ele.

As águas vivas se multiplicam nas condições criadas pelos seres humanos — particularmente, a pesca excessiva, águas mais quentes, poluição e a urbanização costeira, que fornecem condições ideais para o aumento da quantidadeesporte totaláguas-vivas. E o fatoesporte totalque existe maior quantidadeesporte totaláguas-vivas certamente demonstra como os nossos oceanos estãoesporte totalperigo.

A populaçãoesporte totaláguas-vivas sempre flutuou naturalmente ao longo do tempo, já que elas são regidas pelos ciclos climáticos naturais. A questão, segundo Graham, é "quais mudanças feitas pelo homem irão forçar a mudança da trajetória dos ecossistemas para sempre?"

O que também precisa mudar é a nossa atitudeesporte totalrelação à alimentação, segundo Lee. "Não sou biólogo marinho, mas, se as pessoas começarem a consumir águas-vivas com o mesmo vigor que consumimos outros frutos-do-mar, acredito que também haverá consequências adversas."

Este ponto é destacadoesporte totalum estudoesporte total2021, sobre a pesca da água-viva-bala-de-canhão, no México.

Nos últimos 20 anos, o interesse por esse tipoesporte totalágua-viva explodiu, depois que investidores identificaram aquela região como repleta dessa espécie. No auge do processo,esporte total2011, foram capturadas quase 40 mil toneladasesporte totaláguas-vivas. A maioria delas foi exportada para a China.

Mas a exploração excessiva desses animais causou a redução drástica daesporte totalpopulação desde aquela época. O títuloesporte totalum estudo elaboradoesporte total2015 talvez resuma a situação: "Não devemos presumir que a pescaesporte totaláguas-vivas resolverá nosso problema com águas-vivas".

O que pode realmente ajudar a resolver é gerenciar os estoquesesporte totalpeixeesporte totalforma responsável.

Leia a versão original desta reportagem (em inglês) no site BBC Future.