Em 10 anos no Brasil, chikungunya atingiu 60% das cidades e afetou mais as mulheres :entrar no sportingbet

Mosquito Aedes aegypti

Crédito, Getty Images

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Assim como dengue e zika, o chikungunya também é transmitido pelo mosquito Aedes aegypti

"O chikungunya foi introduzido no Brasil apenas um ano antes do zika, vírus que provocou aquela emergência por causa das doenças congênitas que causaentrar no sportingbetcrianças pequenas", lembra o especialista.

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"E a dengue, porentrar no sportingbetvez, sempre esteve muito associada a casos graves e mortes."

Vale lembrar que a infecção pelo chikungunya tem uma fase aguda, marcada por febre, dor no corpo e fadiga. Porém, numa parcelaentrar no sportingbetpacientes, a doença evolui para a forma crônica, marcada por fortes dores nas articulações, que são incapacitantes e podem se prolongar por meses.

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O próprio nome do vírus e da doença, aliás, vem do maconde, uma das línguas faladas na Tanzânia, onde a primeira epidemia foi registrada no anoentrar no sportingbet1953.

Neste idioma, a palavra chikungunya remete a "contorcer-se" ou "dobrar-se", numa referência direta aos fortes incômodos que afetam as articulações e os músculos e fazem os pacientes ficarem encolhidos e prostrados.

"De forma geral as pessoas têm a noção erradaentrar no sportingbetque o chikungunya causa dor, mas não mata", observa Souza.

Portanto, no meioentrar no sportingbettantos surtos e epidemias por zika e dengue e uma pretensa baixa gravidade, o chikungunya passou a ser encarado como uma questãoentrar no sportingbetmenor importância.

Mas o estudo recém-publicado mostra que a história é bem mais complexa: nesses dez anosentrar no sportingbetcirculação pelo país, o vírus causou sete surtos e teve casos confirmadosentrar no sportingbetpraticamente 60% das cidades brasileiras. Ele também afetou mais as mulheres do que os homens — e apresentou uma taxaentrar no sportingbetmortalidade maior do que se imaginava.

Bolsõesentrar no sportingbetcasos

Para fazer a pesquisa, o grupoentrar no sportingbetcientistas reuniu dados genômicos e epidemiológicos sobre a doença.

Segundo o trabalho, entre 3entrar no sportingbetmarçoentrar no sportingbet2013 e 4entrar no sportingbetjunhoentrar no sportingbet2022, foram confirmados 253,5 mil casosentrar no sportingbetchikungunya no Brasil.

Nesse período, aconteceram sete ondas epidêmicas. Elas atingiram o pico nos primeiros meses do ano, principalmente na época das chuvas, e se repetiram entre 2016 e 2022.

Essas infecções foram confirmadasentrar no sportingbet3.316 dos 5.570 municípios do país, ou 59,5% das cidades.

E é justamente aqui que a história começa a ficar ainda mais detalhada. Os especialistas resolveram analisar a fundo o que aconteceu nos Estados mais atingidos: Ceará, Pernambuco e Tocantins.

Eles conduziram uma sérieentrar no sportingbetanálises para entender porque esses locais concentraram a maior parte dos casos.

No Ceará, por exemplo, ocorreram três grandes ondas nos anosentrar no sportingbet2016, 2017 e 2022.

"Nós sabemos que o chikungunya é um vírus que só se pega uma vez. Quando a pessoa tem a infecção, ela desenvolve uma imunidade por meioentrar no sportingbetcélulas e anticorpos que muito provavelmente impede um segundo episódio da doença", diz Souza.

Isso é diferente do que ocorre na dengue, que têm quatro tipos diferentes do mesmo vírus — ou seja, uma pessoa pode ter essa enfermidade até quatro vezes ao longo da vida.

O timeentrar no sportingbetacadêmicos até testou a hipóteseentrar no sportingbetexistirem novas variantes do chikungunya com capacidadeentrar no sportingbetreinfectar as pessoas — e, embora eles tenham encontrado genótipos diferentes do patógeno, eles não eram diferentes o suficiente para escapar das célulasentrar no sportingbetdefesa e causar novos episódios da doençaentrar no sportingbetindivíduos que já a tiveram no passado.

Como então um Estado teria surtos repetidos num curto espaçoentrar no sportingbettempo?

A resposta está na distribuição geográfica dos surtos: no caso do Ceará, os casosentrar no sportingbet2016 e 2017 se concentraram principalmente nos municípios localizados mais ao norte.

Jáentrar no sportingbet2022, a onda epidêmica aconteceu nas cidades mais ao sul.

Você pode ver a diferença no mapa a seguir — quanto mais fortes as cores com as quais as cidades estão pintadas, maior a incidênciaentrar no sportingbetcasosentrar no sportingbetchikungunyaentrar no sportingbetcada local.

Mapasentrar no sportingbetincidênciaentrar no sportingbetchikungunyaentrar no sportingbetcidades cearenses

Crédito, Cortesia William M.entrar no sportingbetSouza

"Anteriormente, nós achávamos que o chikungunya iria chegar num Estado, causar uma explosãoentrar no sportingbetcasos e desaparecer", analisa Souza.

"Porém, diferentemente da dengue, que se alastra por regiões maiores, este vírus afeta bolsões menoresentrar no sportingbetcada surto", complementa.

Impacto maior no público feminino

Outro achado do estudo foi oentrar no sportingbetque as mulheres são mais afetadas pelo chikungunyaentrar no sportingbetcomparação com os homens, especialmente na vida adulta.

O riscoentrar no sportingbetelas testarem positivo para essa doença é significativamente maiorentrar no sportingbetrelação a indivíduos do sexo masculino.

Souza explica que os númerosentrar no sportingbetcasos são relativamente parecidos nos extremosentrar no sportingbetidades — entre as crianças e os mais idosos.

A diferença fica aparente, como é possível observar no gráficoentrar no sportingbetinglês a seguir, entre pessoasentrar no sportingbet20 a 70 anos. As mulheres estão representadas pela cor verde e os homens, nas colunasentrar no sportingbetazul.

Incidênciaentrar no sportingbetcasosentrar no sportingbetchikungunya por sexo

Crédito, Cortesia William M.entrar no sportingbetSouza

Em algumas faixas etárias, as mulheres chegam a responder por mais da metade das infecções por esse vírus.

Existem algumas hipóteses que ajudam a entender esse fenômeno. A principal delas tem a ver com o comportamento humano.

"Nós sabemos que as infecções por dengue, zika e chikungunya acontecem principalmente no ambiente doméstico", contextualiza Souza.

"A configuração da sociedadeentrar no sportingbetmuitos lugares do Brasil ainda segue aquela lógicaentrar no sportingbeto homem sair para trabalhar enquanto a mulher cuida da casa e dos filhos", responde o virologista.

Ou seja: comoentrar no sportingbetmuitos municípios a mulher adulta permanece mais no ambiente doméstico do que o homem, ela fica naturalmente exposta por um tempo maior às picadas do Aedes aegypti que podem carregar o chikungunya e outros vírus

Essa tese é corroborada por estudos feitos no exterior e também pelo fatoentrar no sportingbetas crianças e os idososentrar no sportingbetambos os sexos terem uma incidênciaentrar no sportingbetcasos parecida, uma vez que eles tendem a ficar um tempo similar dentro ou foraentrar no sportingbetcasa.

Letalidade surpreendente

Em trabalhos anteriores, dos quais Souza também participou, o timeentrar no sportingbetcientistas chegou a outra conclusão relevante: aquela históriaentrar no sportingbetque chikungunya não mata também não corresponde à realidade.

Num artigo publicadoentrar no sportingbet2021, o grupo reavaliou 100 mortes que ocorreram no Ceará durante a grande onda que assolou o Estadoentrar no sportingbet2017.

Em todos os óbitos, a principal suspeita eram as arboviroses (doenças provocadas por uma famíliaentrar no sportingbetvírus da qual fazem parte dengue, zika e chikungunya).

Os testes encontraram o chikungunyaentrar no sportingbet68 das vítimas (ou 52,9% do total). Em muitos desses indivíduos, o patógeno chegou a provocar danos no sistema nervoso central.

Isso permitiu estabelecer uma taxaentrar no sportingbet1,8 morte a cada mil casos da infecção naquele anoentrar no sportingbet2017 no Ceará.

"São números que parecem baixos, mas, quando temos dezenas ou centenasentrar no sportingbetmilharesentrar no sportingbetinfecções, eles ganham uma escala muito grande", aponta Souza.

"No período dessa onda, é possível afirmar que a chikungunya chegou a provocar mais óbitos que a dengue na região", compara.

"Ou seja, a frase correta para definir essa doença é 'a chikungunya causa muita dor — e também pode matar'", completa.

Ilustração do vírus chikungunya

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Legenda da foto,

Vírus chikungunya causa infecção que pode evoluir para uma forma crônica, marcada por fortes dores nas articulações

Conexão entre estatísticas e vida real

A médica Claudia Marques, professoraentrar no sportingbetreumatologia da Universidade Federalentrar no sportingbetPernambuco (UFPE), viu na prática aquilo que foi descrito no trabalho recém-publicado.

Ela conta que, no auge da crise do chikungunyaentrar no sportingbetRecife no anoentrar no sportingbet2016, a chegadaentrar no sportingbetpacientes com queixasentrar no sportingbetdores na junta configurava um cenário "muito grave".

"Naquela época, as pessoas faziam fila na porta do hospital. Elas estavam aflitas e sequer conseguiam andar direito", relata a médica, que não esteve envolvida na pesquisa publicada no The Lancet Microbe.

"Depois desse período, não observamos mais ondasentrar no sportingbetcasos por aqui. É como se o vírus 'esgotasse' um lugar e fosse para o outro", raciocina a especialista, que hoje recebe relatos parecidos ao que viveuentrar no sportingbet2016entrar no sportingbetcolegas médicos que atuamentrar no sportingbetoutras cidades, como Salvador e Fortaleza.

"Eu mesma nem me lembro da última vezentrar no sportingbetque atendi um paciente com dores reumáticas relacionadas ao chikungunya por aqui", diz Marques, que também é gerenteentrar no sportingbetensino e pesquisa do Hospital das Clínicas da UFPE.

A médica acrescenta que, com o passar do tempo, os próprios profissionaisentrar no sportingbetsaúde foram aprendendo a lidar com a fase crônica do chikungunya, quando a dor se prolonga por maisentrar no sportingbettrês meses e impede o indivíduoentrar no sportingbetrealizar as atividades diárias.

"No início, pensávamos que a maioria dos acometidos tinha um quadro inflamatório e precisaria lidar com um tipoentrar no sportingbetartrite pelo resto da vida", pontua.

"Hoje sabemos que a minoria vai desenvolver esses quadros inflamatórios, que exigem o usoentrar no sportingbetmedicamentos imunossupressores."

Segundo a reumatologista, metade dos pacientes infectados tem o quadro agudoentrar no sportingbetchikungunya, que dura 14 dias e depois melhora.

Dos que continuam com sintomas após essas duas semanas, cercaentrar no sportingbet30% evoluem para a forma crônica,entrar no sportingbetque os incômodos se prolongam por três meses ou mais.

"Cercaentrar no sportingbet95% desses pacientes com a forma crônica têm uma dor não inflamatória, que pode ser manejada por meioentrar no sportingbetalongamentos, fisioterapia e atividade física. Apesar do longo tempoentrar no sportingbetrecuperação, que se estende por até dois ou três anos, é possível se recuperar", calcula Marques.

Reservatórioentrar no sportingbetágua parada

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Criar políticas públicas a partir dos dados recém-publicados pode tornar o controle do chikungunya mais efetivo, explica pesquisador

O que fazer?

Souza espera que a pesquisa sobre os dez anos do chikungunya no Brasil inspire mudanças nas políticas públicas para conter o vírus daquientrar no sportingbetdiante.

Afinal, se casosentrar no sportingbetinfecção foram confirmadosentrar no sportingbet60% dos municípios na última década, isso significa que o patógeno ainda pode se espalhar e causar surtos pelos outros 40% que estão livres até agora.

"Provavelmente continuaremos a ver aquelas ondas epidêmicas nos próximos anos, que acometem pequenos bolsõesentrar no sportingbetmunicípios dentro dos Estados", antevê o virologista.

"Nossa ideia com esse trabalho foi justamente aentrar no sportingbetfornecer subsídios para que o governo possa determinar quais locais estão mais suscetíveis", complementa.

Em outras palavras, a partir da análiseentrar no sportingbetdados, as prefeituras, os governos Estaduais e até o Ministério da Saúde podem concentrar os esforçosentrar no sportingbetprevenção, diagnóstico precoce e tratamento naqueles lugares que ainda não registraram surtos (e estão pintadosentrar no sportingbetbranco ou com cores claras nos mapas).

Outra ação possível, segundo Souza, é criar estratégias públicas para proteger os mais vulneráveis, como as mulheres adultas. Já que elas são mais atingidas, será que não é possível criar uma campanhaentrar no sportingbetconscientização para controlar o Aedes aegypti no ambiente doméstico voltado a esse público?

Ao eliminar qualquer reservatórioentrar no sportingbetágua parada — que serveentrar no sportingbetcriadouro para o mosquito — é possível diminuir o risco não apenasentrar no sportingbetchikungunya, mas tambémentrar no sportingbetdengue e zika.

"O Brasil é o país das Américas mais afetado pelo chikungunya. Num cenárioentrar no sportingbetque ainda não temos remédios ou vacinas à disposição, precisamosentrar no sportingbetpolíticas públicas para prevenir os casos", conclui o pesquisador.